GASTROSQUISE: A REALIDADE EM UM MUNICÍPIO NO INTERIOR DO PAÍS

GASTROSCHISIS: THE REALITY IN A SMALL CITY IN THE COUNTRYSIDE

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8415365


Ana Letícia de Aragão Oliveira Araripe1
Priscila Favoritto Lopes2
Vanessa Cristina de Castro Aragão Oliveira3


Resumo

A gastrosquise é o defeito de parede abdominal anterior mais frequente entre os recém-nascidos e que se caracteriza pela abertura de todas as suas camadas com exteriorização das vísceras sem qualquer cobertura. O presente trabalho tem como objetivo o desenvolvimento de um protocolo de conduta para atendimento ao paciente com gastrosquise a fim de aperfeiçoar os cuidados aos recém-nascidos. Para tanto, leva em conta a epidemiologia desta condição em uma cidade do interior do país, através da análise de dados de prontuário de um hospital referência em urgência e emergência situado na planície litorânea do Piauí e fundamentado por pesquisa bibliográfica nas diversas bases de dados. Nos resultados encontrados, percebeu-se que a idade materna mais baixa está relacionada à presença de gastrosquise, assim como a primiparidade. Notou-se também que a maioria das mulheres não realizou adequadamente o pré-natal e, desta forma, não estavam cientes da malformação até o momento do parto. Percebeu-se ainda que 55,5% dos pacientes recebeu fechamento primário da parede abdominal, enquanto apenas 11,1% necessitou do silo, além de que, o desfecho clínico dos pacientes que receberam intervenção cirúrgica em até 24h foi melhor do que aqueles que somente o fizeram após 48h. Concluiu-se, desta forma, que as genitoras que realizam de forma correta o pré-natal preparam-se melhor para receber seus filhos com gastrosquise, os quais podem ser mais rapidamente abordados, em busca de um melhor desfecho.

Palavras-chave: Gastrosquise; Mortalidade Perinatal; Saúde da Criança.

Abstract

Gastroschisis is the most common defect in the anterior abdominal wall among newborns and is characterized by the opening of all its layers with the exteriorization of the viscera without any covering. This study aims to develop a protocol of conduct for patient care with gastroschisis in order to improve the care of newborns. Therefore, it takes into account the epidemiology of this condition in a city in the countryside, through the analysis of data from the medical records of a reference hospital in urgent and emergency care located in the coastal plain of Piauí and supported by bibliographical research in several databases. In the results found, it was noticed that lower maternal age is related to the presence of gastroschisis, as well as primiparity. It was also noted that most women did not adequately perform prenatal care and, therefore, were not aware of the malformation until the time of delivery. It was also noticed that 55.5% of patients received primary closure of the abdominal wall, while only 11.1% needed the silo, and the clinical outcome of patients who received surgical intervention within 24 hours was better than those who only did so after 48 hours. It was concluded, therefore, that mothers who perform prenatal care correctly are better prepared to receive their children with gastroschisis, which can be approached more quickly, in search of a better outcome.

Keywords: Gastroschisis; Perinatal Mortality; Child Health

1 Introdução

Durante a quarta semana de desenvolvimento intrauterino acontece um evento relevante no tocante ao estabelecimento da forma do corpo humano, o dobramento do embrião, resultado do rápido crescimento deste e, que se dá nos planos mediano e horizontal, onde o primeiro produz as pregas cefálica e caudal, que sucedem no alongamento vertical do embrião e, o segundo, que gera as pregas laterais direita e esquerda. Neste dobramento lateral, que advém do crescimento da medula espinhal e dos somitos, é possível observar a formação do primórdio da parede abdominal que se curva em direção ao plano mediano. Com a formação desta parede parte da camada germinativa endodérmica é incorporada ao embrião como o intestino médio, primórdio do intestino delgado (Moore, 2016).

Ainda para este autor, a gastrosquise resulta da falha na fusão completa das pregas laterais do corpo com a parede abdominal anterior, no decorrer da quarta semana de gestação, sendo, portanto, um defeito congênito da parede abdominal, resultante de uma falha linear lateral ao plano mediano abdominal, que permite a extrusão das vísceras, sem envolver o cordão umbilical. Contudo, sua causa exata ainda é incerta, apesar de várias sugestões já propostas, como: lesão isquêmica da parede abdominal anterior, ausência da artéria onfalomesentérica direita, ruptura da parede abdominal, debilidade da parede causada por involução anormal da veia umbilical direita, entre outras.

Corroborando, Hijkoop et al. (2019), conceitua gastrosquise como um defeito congênito da parede abdominal que traz consigo risco de vida e, portanto, requer tratamento cirúrgico após o nascimento. Relatam também que atualmente, é possível realizar o diagnóstico ainda no pré-natal, o que permite aconselhamento parental na busca de melhorar o prognóstico deste recém-nascido.

Para Barreiros (2019) a gastrosquise é um defeito de parede abdominal que se caracteriza pela abertura de todas as suas camadas, com exteriorização de vísceras abdominais, sem qualquer cobertura, seja membrana peritoneal ou pele. Sua localização se dá, corriqueiramente, à direita do cordão umbilical, o qual se apresenta sem alteração em sua inserção.

Segundo Ormaechea (2019) trata-se do defeito congênito de parede abdominal anterior mais frequente, o qual normalmente mede menos de 4 cm e pode ser classificada como simples ou complicadas conforme a presença ou não de anormalidades intestinais como necrose, atresia, volvo ou mesmo perfuração. 

A despeito de ser a gastrosquise uma malformação benigna, não há ainda um consenso com relação ao melhor tratamento para sua correção, principalmente no que concerne a idade gestacional para se realizar o parto e a técnica cirúrgica a ser utilizada, todavia, até o momento, recomenda-se que o seu reparo seja feito o mais precoce, para que desta forma se possam minimizar os danos como, por exemplo, e a exsudação dos órgãos herniados, os quais levam podem levar a um pior prognóstico devido a possibilidade de o paciente desenvolver e infecção neonatal, além de desidratação e hipotermia. As principais técnicas atualmente utilizadas consistem na redução completa do conteúdo exposto, com consequente fechamento primário da malformação ou na redução gradual durante os primeiros dias de vida, utilizando-se um silo para auxiliar nesta etapa (Oliveira, et al, 2017) .

Para Wright, Sekabira e Ade-Ajayi (2018) há uma grande discrepância global no prognóstico de bebês nascidos com gastrosquise no que tange à mortalidade, a qual ainda se apresenta elevada em muitos países de baixa renda, enquanto que em países de alta renda a sobrevivência melhorou significativamente nos últimos anos. De acordo com estes autores, isto se deve á algumas barreiras que incluem falta de diagnóstico pré-natal, atendimento pré-hospitalar deficiente, instalações de terapia intensiva limitadas, acesso precário à sala de cirurgia e anestesia neonatal segura e falta de nutrição parenteral neonatal. Desta forma, a gastrosquise tem sido sugerida como uma condição de referência para avaliar o acesso e os resultados da prestação de cuidados cirúrgicos neonatais, em nível mundial.

Diante do exposto, deseja-se desenvolver um protocolo de conduta para atendimento ao paciente com gastrosquise a fim de aprimorar as condutas adotadas na busca de melhores desfechos com relação a esta patologia. Para tal, levantou-se a hipótese de que quanto antes for instituído o tratamento definitivo melhor será o prognóstico do paciente.

Pretende-se, portanto, relatar os casos de gastrosquise tratados no Hospital Estadual Dirceu Arcoverde, ocorridos durante dezessete meses consecutivos, com o intuito de conhecer os dados epidemiológicos relacionados à ocorrência desta, para que se possa identificar fortalezas e fraquezas do nosso serviço, objetivando otimizar o cuidado ao recém-nascido com gastrosquise, na busca de melhores desfechos.

Destarte, a importância deste trabalho consiste no fato de que o reconhecimento e o tratamento precoces da gastrosquise se fazem essenciais para evitar complicações fatais, já que desta forma é possível considerar diferentes abordagens cirúrgicas para alcançar um maior percentual de sobrevida, principalmente em áreas de grande incidência desta patologia. 

2. Metodologia

Pesquisa desenvolvida de acordo com a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (2013), respeitando princípios éticos que constam na declaração de Helsinque e, com a carta circular 39/2011 da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (2011) que versa sobre utilização de dados secundários, com a finalidade de assegurar o sigilo destes. Trabalho iniciado a partir da autorização do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) (CAAE 53152821.6.0000.0192), bem como da instituição co-participante, mediante apreciação e assinatura de Carta de Anuência. Não foi necessária a utilização de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em razão da natureza secundária dos dados analisados. Trata-se de uma pesquisa retrospectiva e com abordagem descritiva, que para Silva (2021) é aquela que visa descrever as características de determinada população ou mesmo o estabelecimento de relações entre variáveis. O presente estudo foi realizado em um hospital de referência em urgência e emergência, situado na cidade de Parnaíba – PI, que atende toda a planície litorânea, bem como e região de cocais, tendo como finalidade avaliar a epidemiologia dos casos de gastrosquise que chegaram a este hospital no período compreendido entre os meses de março de 2020 e julho de 2021 e correlacionar com as informações presentes na literatura. Os dados foram coletados em registros de prontuários, os quais ficam arquivados no Serviço de Arquivo Médico e Estatísticas – SAME – do Hospital Estadual Dirceu Arcoverde, onde foram vistos todos os registros referentes aos meses desta pesquisa, através de instrumento de coleta pré-estrututado, em formato de tabela, no qual constavam dados epidemiológicos da mãe, como idade, local do parto, histórico gestacional e de pré-natal, bem como do recém-nascido, intervenção cirúrgica e desfecho do caso, onde se constatou o total de 9 pacientes atendidos neste hospital, seja os que nasceram neste serviço ou que chegaram após transferência. Após coletados, os dados foram agrupados e analisados para, então, serem apresentados em forma de tabelas, utilizando para isso, Excel®, Word® e PowerPoint®. Simultaneamente, foi realizado levantamento bibliográfico sobre o tema abordado nas bases de dados Scielo, Pubmed e Ebsco, utilizando-se as palavras-chave: gastrosquise, mortalidade perinatal e saúde da criança. O critério de inclusão utilizado foi a presença de gastrosquise nos recém-nascidos, o que leva ao critério de exclusão, o qual foi a ausência desta patologia.

3. Resultados e Discussão

Dados oficiais brasileiros acerca das malformações congênitas são procedentes do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC), pela variável do algarismo 41, no qual delineia, na ocasião do nascimento, a malformação detectada. Em consonância com o SINASC, o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) auxilia na busca de maior compreensão da gastrosquise suscitando as principais causas que realçam esse resultado (Barreiros, et al., 2020).

Vale ressaltar que a notificação compulsória de todas as anomalias congênitas detectadas ao nascimento está assegurada pela Lei Nº 13.685 de 25 de junho de 2018, assim em relação à gastrosquise, 6.770 casos foram registrados no período de 2010 a 2019, atingindo seu ápice em 2014 (n=739 notificações), seguido do ano de 2013 (n=715 notificações). A prevalência geral desta patologia ao nascimento, no intervalo analisado, foi de 2,3/10.000 nascidos vivos (Brasil, 2021).

Em comparação com o Chile, onde Herrera, Essedin, Ovalle, & Cuevas (2016) realizaram um estudo em 26 hospitais com 721.901 recém-nascidos e perceberam uma prevalência de gastrosquise entre 3 e 4:10.000 nascidos vivos respectivamente entre os anos 2013 e 2014, demonstrando um incremento de 300% o Brasil possui ainda taxas de notificação menores no que concerne a esta patologia.

Já Oliveira, et al (2017) cita em seu trabalho um estudo realizado em 2016 cuja prevalência de gastrosquise na América do Sul, de acordo com os dados do Estúdio Colaborativo Latinoamericano de Malformações Congênitas (ECLAMC), era de 2,9:10.000, mais próxima da realidade brasileira.

No período compreendido entre março de 2020 e julho de 2021 foram atendidos nove casos de recém-nascidos com gastrosquise no hospital em que foi realizada a pesquisa, dos quais cinco nasceram na cidade em que este nosocômio está situado e quatro eram provenientes de outros estados, acarretando, desta forma, o aumento do tempo decorrido entre nascimento e intervenção cirúrgica, como pode ser observado nas tabelas 1 e 2.

Observa-se na tabela 1 que a idade da maior parte das mães que tiveram filhos com a anomalia congênita em questão foi de até vinte anos, sendo um total de cinco, contrapondo-se com o restante da amostra, que foi formada por quatro mães, cuja idade no momento do parto era maior que vinte anos.

Corroborando com os dados supracitados, Togneri (2016) afirma que entre os fatores de risco não genéticos para gastrosquise está a idade materna reduzida, menor que vinte anos, além de exposição a drogas ilícitas, tabagismo, etilismo e uso de algumas medicações. 

Assim como para Stallings et al (2019) que relatam que os motivos para o aumento da prevalência de gastrosquise ainda são desconhecidos, entretanto, vários fatores de risco estão associados a este defeito, especialmente a idade materna, já que uma prevalência crescente de gastrosquise entre mães especialmente com menos de 24 anos tem sido consistentemente documentada levando, desta forma, a pouca idade materna ser reconhecida como um dos maiores fatores de risco para esta patologia.

Tabela 1. Dados epidemiológicos das mães de recém-nascidos com gastrosquise atendidos em um hospital de urgência.

(fonte: própria)

Nota-se ainda que a expressa maioria da amostra foi formada por mulheres cuja paridade era de primeiro filho, totalizando 77,8% dos casos, enquanto 22,2% das mulheres enfrentavam seu segundo parto, desta maneira se pode inferir que, neste estudo, a primiparidade está ligada a esta malformação.

Assim como para Zalles-Vidal, et al (2018) os quais afirmam que os principais fatores de risco relacionados à gastrosquise são: primiparidade, idade materna, baixa condição social, utilização de vasoconstritores e de drogas ilícitas, álcool e tabagismo. Relatam ainda que mulheres com menos de 20 anos têm onze vezes mais chance de conceber um feto com gastrosquise, se comparadas a mulheres com mais de vinte anos.

Ainda com relação aos dados apresentados na tabela 1, realça-se que a maior parte das mulheres (66,7%) fez somente até três consultas de pré-natal, ou até mesmo não realizou (11,1%) e que apenas duas mães cumpriram as recomendações do Ministério da Saúde do Brasil, realizando mais de seis consultas durante a gestação.

Tais recomendações encontram-se presentes no Caderno de Atenção Básica número 32 do Ministério da saúde, que preconiza o total de consultas, o qual deverá ser seis, no mínimo, iniciado o mais precocemente no primeiro trimestre, em acompanhamento interposto entre enfermeiro e médico e dispostas, sempre que possível, com frequência mensal, até a 28ª semana, quinzenal da 28ª até a 36ª semana e semanal da 36ª até a 41ª semana (Brasil, 2012).

Ratificando os dados supracitados, observa-se também na tabela 1 que 66,7% das mulheres desconheciam a malformação antes do nascimento, enquanto somente 33,3% já sabiam que seu filho tinha defeito de parede abdominal, sendo que tal patologia pode ser diagnosticada precocemente por meio de exame de imagem simples, ultrassonografia, que apesar de não ser de realização obrigatória pelas recomendações preconizadas pelo Ministério da Saúde, é frequentemente solicitado durante o período de pré-natal.

Uma vez que de acordo com o Caderno de Atenção Básica voltado para assistência no período pré-natal pode-se disponibilizar à gestante a ultrassonografia, com a finalidade de melhorar a estimativa da idade gestacional e contribuir na detecção precoce de malformações fetais. Entretanto, os possíveis benefícios deste exame de rotina durante a gestação sobre outros resultados encontram-se ainda incertos, desta forma, a não realização da ultrassonografia não consiste em omissão e nem diminui a qualidade da assistência pré-natal (Brasil, 2012).

Para Ormaechea (2019) embora haja diversos fatores ligados à gastrosquise, seu diagnóstico pode ser realizado precocemente, a partir da 12ª semana gestacional, através de ultrassonografia morfológica. Este é o método de escolha para detecção e confirmação diagnóstica desta patologia, visto que durante o exame pode se identificar a flutuação das alças intestinais livremente no líquido amniótico, em aspecto de cachos de uva. Também para Oliveira (2017), exames de sangue de rotina contendo níveis anormalmente altos de alfa fetoproteína, conferem casos suspeitos para a patologia em questão.

Constata-se na tabela 1 que apenas três mães referiram infecções durante a gestação atual, sendo estas do trato urinário, enquanto cinco negaram qualquer tipo de infecção enquanto uma delas desconhece tais patologias devido ao fato de não ter realizado consultas pré-natais.

Divergindo dos dados encontrados na presente pesquisa, Osmundo Junior (2019) afirma que apesar da etiopatogenia ainda incerta da gastrosquise, nos dias atuais, considera-se o papel do microambiente materno-fetal na formação desta patologia, onde se pode incluir doenças maternas, hábitos nutricionais, de tabagismo e etilismo e infecções urinárias e sexualmente transmissíveis, por exemplo.

Da mesma maneira, Given, et al (2017) avaliaram, através de um estudo de caso-controle, utilizando registros de um sistema de farmacovigilância europeu, a exposição materna a medicamentos, bem como a infecções durante o período gestacional e perceberam que estes fatores estão implicados na gênese da gastrosquise.

Dos nove recém-nascidos com gastrosquise, três não sofreram intervenção cirúrgica neste hospital, dois deles devido ao fato de vir a óbito antes do procedimento e um deles por ter sido transferido para outro serviço que dispunha de equipe multidisciplinar no momento, para melhor manejo do caso. Dos seis que passaram por cirurgia, em cinco foi realizado apenas o fechamento primário da parede abdominal, todavia, em um dos casos foi necessário o uso de silo para o auxílio da introdução das alças intestinais na cavidade abdominal para posterior fechamento da parede, como se pode perceber na tabela 2.

Para Alves, et al (2016) conforme o grau de desproporção entre vísceras herniadas e cavidade abdominal,a correção cirúrgica pode se dar em um único tempo, através da sutura primária da parede abdominal ou de modo estadiado com o uso do silo, inicialmente, para conter e proteger as vísceras.

Tabela 2. Desfecho clínico de recém nascidos que receberam intervenção cirúrgica em um hospital de urgência.

(fonte: própria)

Segundo Baht, Moront & Bhandari (2020) o momento ideal para o fechamento da parede abdominal na gastrosquise ainda é discutível, porém estes referem que existe o consenso de que a redução realizada de forma precoce é melhor. Ainda para estes autores, a reintrodução das alças intestinais na cavidade abdominal através da colocação de silo tem a vantagem teórica de atingir a redução da pressão intra-abdominal no momento do fechamento definitivo da parede, permitindo uma melhor perfusão esplâncnica, que resultaria em um retorno mais rápido da função intestinal.

Entretanto, para Hawkins, et al (2020), através de um estudo multicêntrico, observacional e retrospectivo envolvendo 866 neonatos com gastrosquise que comparou recém-nascidos submetidos a fechamento imediato com os que tiveram um silo colocado por ≤5 dias, observaram que não houve diferenças significativas entre os dois grupos no que concerne a mortalidade, tempo para tolerância de alimentação enteral completa, duração da NPT ou mesmo tempo de internação hospitalar.

Pode-se inferir ainda na tabela 2 que, dos cinco que passaram por intervenção com fechamento primário, três foram a óbito, enquanto dois receberam alta do hospital. Já o paciente que necessitou do uso de silo precisou ser transferido para acompanhamento diário com equipe especializada.

Quanto ao tempo decorrido entre o nascimento e a realização do procedimento, nota-se na tabela 2 que naqueles pacientes com intervenção no dia do nascimento o desfecho foi semelhante, visto que 50% dos pacientes teve alta enquanto os outros 50% foi a óbito. Já aqueles que passaram por procedimento cirúrgico no dia seguinte ao parto obtiveram alta hospitalar, contudo, dos que se submeteram à cirurgia somente após 48h de vida, um foi a óbito, enquanto o outro necessitou de transferência pós-operatória também para acompanhamento diário com equipe especializada.

De acordo com Araújo, et al (2020) a conduta cirúrgica na gastrosquise tem como objetivo o fechamento primário do defeito o mais precoce possível, objetivando preservar a circulação mesentérica, através da técnicas convencionais com ou sem aumento da falha aponeurótica. Todavia, se tais técnicas não poderem ser realizadas, devido condições críticas fetais, ou se há dilatação, com consequente aumento do volume das alças intestinais as tornando desproporcionais ao tamanho da cavidade abdominal, torna-se necessário que este fechamento seja realizado em dois tempos, com confecção de silo natural ou artificial.

4. Considerações finais

Este estudo parece demonstrar que há um desfecho melhor entre aqueles pacientes os quais as genitoras realizaram adequadamente o pré-natal, podendo desta forma, ter o diagnóstico precoce da gastrosquise e, consequentemente, planejar o parto com segurança e com a possível presença de equipe multidisciplinar, com a finalidade de realizar o mais rápido possível a correção cirúrgica deste defeito, já que os melhores desfechos se mostraram presentes quando o paciente sofreu intervenção cirúrgica precoce.

Referências

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1Docente do Curso Superior de Medicina do Instituto de Educação Superior Vale do Parnaíba, Medica do Hospital Estadual Dirceu Arcoverde. https://orcid.org/0000-0003-1071-1108, e-mail: ana.araripe@iesvap.edu.br ;
2Docente do Curso Superior de Medicina da Universidade Federal do Delta do Parnaíba. https://orcid.org/0000-0002-1562-5121. e-mail: favorito@gmail.com
3Docente do Curso Superior de Medicina do Instituto de Educação Superior Vale do Parnaíba. Doutora em Saúde Pública (UNISAL). e-mail: vanessa.aragao@iesvap.edu.br