STRENGTHENING HUMAN HEALTH THROUGH PRIMARY HEALTH CARE: ACTIONS IMPLEMENTED BY THE FAMILY HEALTH STRATEGY
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10795551
Bárbara Fabrícia Silva Lopes
Girlene da Silva Alves
Jane Daisy de Sousa Almada Resende
Resumo:
A Atenção Primária à Saúde é o primeiro contato dos pacientes com o sistema de saúde e, portanto, é fundamental para garantir o acesso universal aos serviços. No entanto, há décadas persiste um problema: resistência dos homens em buscar assistência em saúde. Este trabalho tem como objetivo descrever as ações realizadas pelos profissionais de saúde para mudar o comportamento dos homens em relação à atenção básica e inseri-los no sistema de saúde no município de Juiz de Fora/MG. Utilizando uma abordagem qualitativa, foram realizadas entrevistas com gerentes das Unidades Básicas de Saúde. Os depoimentos dos usuários do sexo masculino foram selecionados para o tratamento dos dados, esclarecendo a dificuldade que os profissionais das unidades enfrentam para assistir o homem na atenção básica, mostrando algumas estratégias de captação do homem realizadas pelas equipes da atenção primária e abordando questões de saúde sexual e reprodutiva. Foi identificado que as salas de espera são um recurso importante para esclarecer dúvidas e ampliar o acesso à informação. Conclui-se que não basta existir um programa específico, verticalizado e com propostas abrangentes de atendimento à saúde do homem, é necessário compreender os caminhos e os desafios presentes nos locais onde as ações devem ser implementadas.
Palavras-chave: Atenção Primária da Saúde. Saúde do Homem. Estratégias.
Abstract:
Primary Health Care (PHC) is the first contact that patients have with the health system and, therefore, it is essential to ensure universal access to health services. However, a problem has persisted for decades: men’s resistance to seeking health care. In this sense, this work aims to describe the actions and initiatives carried out by health professionals to change the behavior of men in relation to primary care and insert them into the health system in the city of Juiz de Fora/MG. Using a qualitative approach, interviews were conducted with managers of Basic Health Units (UBS) that are representative in relation to men’s health care in the municipality. In addition, the researcher observed all stages of the study. The testimonies of male users were selected for data processing, clarifying the difficulty that health unit professionals face in assisting men in primary care, showing some strategies for attracting men carried out by primary care teams, highlighting the active search for vaccination as a way of incorporating men and addressing issues of sexual and reproductive health, such as vasectomy. It was identified that waiting rooms are an important resource for clarifying doubts and expanding access to information, creating spaces to develop health education in an informal way, encouraging short but productive conversation circles. It is concluded that it is not enough to have a specific, verticalized program with comprehensive proposals for men’s health care, it is necessary to understand the paths and challenges present in the places where the actions really must be implemented.
Keywords: Primary Health Care. Men’s Health. Strategies.
1. INTRODUÇÃO
A Atenção Primária da Saúde (APS) é considerada a porta de entrada do sistema de saúde em diversos países do mundo, sendo ela o primeiro contato que o paciente tem com o sistema de saúde (MENDES, 2015).
Neste sentido, sua importância se deve a diversos fatores. Primeiro, a APS é a principal responsável pelo atendimento das necessidades de saúde da população, garantindo a qualidade e a efetividade do cuidado (SOUSA, 2011) incumbindo-se que ele receba o tratamento adequado em todas as etapas da assistência à saúde (ALMEIDA, 2018).
Cabe ressaltar que, a APS como porta de entrada da assistência de saúde é fundamental para garantir o acesso universal aos serviços de saúde. Neste sentido é importante salientar um problema que persiste há muitas décadas que é a resistência dos homens em buscar assistência em saúde (GOMES, 2011).
Existem várias razões pelas quais eles relutam em procurar essa assistência. Uma das mais comuns é a crença cultural de que a saúde é uma preocupação feminina. Desde a infância, os meninos são ensinados a serem fortes e não demonstrar fraqueza ou vulnerabilidade (LOURO, 1997).
Outro fator que pode impedir os homens de procurar assistência médica é a falta de tempo. Eles podem sentir que não têm tempo para visitar um médico ou que é difícil conciliar horários de trabalho com compromissos médicos (BRITO, SANTOS, MACIEL, 2010).
Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi descrever ações e iniciativas realizadas pelos profissionais de saúde na tentativa de ressignificar o comportamento do homem diante da atenção básica e inseri-lo no sistema de saúde a partir dessa porta de entrada no município de Juiz de Fora/MG.
2. DESENVOLVIMENTO (REFERENCIAL TEÓRICO)
No Brasil, com a implantação da Política Nacional de Atenção Integral da Saúde do Homem (PNAISH) como uma iniciativa importante para promover ações de saúde que considerem a realidade singular masculina em seus diferentes contextos socioculturais e político-econômicos, teve como principais desafios a resistência do homem em buscar assistência em saúde. Muitos homens ainda acreditam que cuidar da saúde é algo que não faz parte de sua responsabilidade, e acabam negligenciando sintomas e adiando consultas médicas (SILVA, 2022).
Com a PNAISH a saúde masculina passou a ser encarada como um verdadeiro problema de saúde pública após estatísticas apontarem maiores índices de morbimortalidade entre os homens em comparação às mulheres. Os homens, em geral, apresentam uma tendência à adoção de hábitos de vida menos saudáveis, como o consumo de tabaco e álcool, comportamento sexual de risco, estresse e excesso de trabalho, o que afeta significativamente a saúde masculina (SILVA, 2022).
Diante dessa realidade, foram criadas campanhas de conscientização que, embora não exclusivamente direcionadas ao público masculino, mostraram que os sanitaristas já haviam percebido a importância da questão de gênero na saúde pública. Dentre essas campanhas, destacam-se as de prevenção ao alcoolismo e às doenças sexualmente transmissíveis (ALBANO, BASÍLIO, NEVES, 2010)..
É necessário, portanto, fortalecer as políticas públicas de promoção da saúde masculina, incluindo medidas preventivas e de conscientização sobre hábitos saudáveis, além de investimentos em pesquisas e na formação de profissionais especializados em saúde masculina, como forma de reduzir a morbimortalidade entre os homens no Brasil
3. METODOLOGIA DE ESTUDO
Considerando o objeto desta pesquisa, optou-se por realizar um estudo de caso sobre a implementação da PNAISH no município de Juiz de Fora – MG. Para contemplar o objeto proposto, foi escolhida uma abordagem qualitativa, visto que o estudo intenciona investigar processos subjetivos envolvidos no processo saúde doença na perspectiva masculina. O estudo de caso foi escolhido pelo desejo de compreender fenômenos sociais complexos, avaliando a implementação da PNAISH, analisando e caracterizando os motivos que incentivam e/ou dificultam o investimento na saúde do homem.
Ancorada na abordagem qualitativa, foram realizadas entrevistas com gerentes das UBS que possuem representatividade em relação ao cuidado à saúde do homem no município. Com a finalidade de preservar o sigilo dos participantes, eles foram identificados pela letra G, seguida pelos números arábicos consecutivos, em ordem crescente, de acordo com o número de entrevistados (G1 a G33). Por fim, foram buscadas informações também pela observação do pesquisador ao longo de todas as etapas do estudo.
Após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética de Pesquisa da Universidade Federal de Juiz de Fora, sob o parecer nº 5.016.739 de 04 de outubro de 2021, realizou-se o contato telefônico com os gerentes das UBS para agendamento das entrevistas em campo.
Em um segundo momento, o projeto foi apresentado aos prováveis sujeitos do estudo, os gerentes das equipes de ESF, no sentido de esclarecer os objetivos e quaisquer dúvidas que pudessem existir frente à sua participação no processo. Respeitando as normas das Resoluções nº 466, de 12 de dezembro de 2012 (BRASIL, 2013a) e n° 510, de 7 de abril de 2016 (BRASIL, 2016), do Conselho Nacional de Saúde (CNS), sobre pesquisa envolvendo seres humanos, as informações somente passaram a ser coletadas após prévia autorização dos participantes da pesquisa, por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, devidamente aprovado pelo referido Comitê de Ética em Pesquisa, garantindo, assim, o sigilo e o anonimato do depoimento dos participantes, visando proteger sua privacidade. O instrumento usado para coleta de dados junto aos gerentes municipais foi uma entrevista semiestruturada, questionando sobre a situação da implementação e efetivação da PNAISH no município de Juiz de Fora – MG. Ele foi baseado, inicialmente, em um formulário previamente testado, visto que foi elaborado para utilização na coleta de dados do estudo intitulado “Fortalecimento da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH): compromisso versus ação na atenção básica”, no ano de 2013. O próprio responsável pelo documento, sugere que o “estudo se encontra desenhado sob os rigores do método científico e pode servir de base para que outros estudos sejam empreendidos” (BRASIL, 2023b). Posteriormente, os princípios, diretrizes e objetivos propostos na PNAISH foram contemplados nos questionamentos.
Os dados foram coletados no primeiro semestre do ano de 2022. As entrevistas foram gravadas com o intuito de garantir a reprodução fidedigna das falas dos participantes e ficarão de posse do pesquisador por um período de cinco anos. Após esse prazo, serão destruídas.
3.1 Local do Estudo
O município de Juiz de Fora, localizado na Zona da Mata mineira, foi escolhido para realização do estudo, inicialmente, por ter recebido recursos para investimento na PNAISH no ano de 2010 e por ter Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) homologado. A população de Juiz de Fora é atendida por 102 equipes de saúde da família, distribuídas em 58 UBS (BRASIL, 2022).
A cobertura populacional da ESF do município em questão chega a 63%. Para atender os objetivos propostos, os locais de coleta de dados foram as UBS que possuem ESF. O cenário do estudo foi composto por 42 UBS, escolhidas pela localização acessível e, ainda, por possuírem duas ou mais equipes de ESF na sua composição. Eleito o cenário, o presente projeto foi encaminhado à chefia direta do Serviço de Atenção Primária à Saúde do município de Juiz de Fora, para sua apreciação e aprovação, mediante documento formal de permissão.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O método de análise de conteúdo proposto por Bardin (2008) foi selecionado para o tratamento dos depoimentos. O autor afirma que esse método de análise “visa ao conhecimento de variáveis de ordem psicológica, sociológica, histórica etc., por meio de um mecanismo de dedução com base em indicadores reconstruídos a partir de uma amostra de mensagens particulares” (BARDIN, 2018).
Sobre o assunto, Minayo (2008) afirma que essa metodologia de análise parte de uma literatura primária na busca de significados diversos, articulando “[…] a superfície dos textos descrita e analisada com os fatores que determinam suas características: variáveis psicossociais, contexto cultural e processo de produção da mensagem (MINAYO, 2008).
Desde a implantação da PNAISH, com a Portaria nº 1.994, de 27 de agosto de 2009 (BRASIL, 2009a) as unidades de saúde enfrentam obstáculos e/ou apresentam avanços nessa temática. Assim como foi descrito no papel do sistema de saúde, o usuário do sexo masculino também é um dos responsáveis pelo ritmo de implementação dessa política pública. Os depoimentos recebido esclarecem a dificuldade que os profissionais das unidades de saúde enfrentam para assistir o homem na atenção básica:
Percebe-se que, entre os homens, é habitual o desleixo relacionado aos cuidados com a saúde por uma questão cultural, pelo medo de descobrir alguma anormalidade e pela resistência em realizar determinados exames e/ou tratamento (VASCONCELOS, 2019). Conforme relataram Souza et al. (2022), o homem tem vergonha de expor seu próprio corpo e receio em descobrir que está doente por conta do imaginário cultura.
Nesse contexto, Lima et al (2021) complementam afirmando que os homens acreditam ser inabaláveis e, portanto, não admitem adoecer, fato que os afasta das unidades de saúde para prevenção e os aproximam das unidades de urgência, quando não suportam mais a doença já instalada. Corroborando, Pereira et al.(2019) salientam que os homens buscam os serviços de maior complexidade na tentativa de resolver mais rapidamente seus problemas, pois já não suportam a situação em que se encontram.
Quanto às ações e iniciativas realizadas pelos profissionais de saúde na tentativa de ressignificar o comportamento do homem diante da atenção básica e inseri-lo no sistema de saúde a partir dessa porta de entrada, percebe-se a atuação de diferentes agentes nesse processo de contemplação dos diferentes objetivos da PNAISH.
Os recortes dos depoimentos, a seguir, mostram algumas estratégias de captação do homem realizadas pelas equipes da atenção primária:
[…] para promover mudança a gente promove isso nas consultas de demanda, consulta individual. (G10)
[…] a gente consegue captar ele no grupo de hipertenso, diabético né? […] a gente tem o grupo de caminhada, de exercício físico, que a gente vê que a maioria são mulheres, a gente tenta chamar os homens. (G19)
E, assim, nos outros anos, a prefeitura disponibilizou em algumas Unidades a presença do urologista para estar fazendo essa questão da prevenção, mas não são em todas as Unidades, entendeu? (G23)
Pelos discursos, a partir da procura do homem pelas consultas, os profissionais tentam incluí-lo em alguma outra atividade que tenha relação com seu processo saúde e doença, tais como encaminhamento para especialistas e/ou grupos educativos.
Na fala seguinte, o participante destaca a busca ativa para a vacinação como forma de incorporação do homem:
Então assim, aqui na unidade a gente sempre tem o cuidado na questão de vacinação, a gente sempre faz aprazamento, a gente sempre faz busca ativa, né?
Sobre a saúde sexual e reprodutiva, sempre há menção à vasectomia, deixando claro que o maior motivo pela busca da população masculina, no que tange a essa questão, é justamente o encaminhamento para realização do procedimento.
Percebe-se que, apesar do foco na contracepção cirúrgica, diversos depoentes afirmaram que existe a realização dos grupos de direitos sexuais e reprodutivos nas UBSs, com a participação dos homens:
A gente tem uma demanda espontânea bem livre para quem tem assim planejamento familiar, para quem quer participar do direito reprodutivo, é de acordo com o horário que o homem pode às vezes a gente marca sete horas da noite porque ele tá no trabalho a gente tem um pouco dessa preocupação aqui. (G4)
Esse grupo é uma das ações que visam a participação do homem, no sentido de planejar sua vida sexual e reprodutiva, prevenir e controlar as ISTs e discutir sobre as disfunções sexuais masculinas, que também é descrito por Brasil (2009b).
Apesar disso, nenhum discurso mencionou atividades relacionadas à infertilidade masculina e/ou às disfunções sexuais concretamente, conforme recomenda a PNAISH.
Sobre as iniciativas de ampliação do acesso à informação, alguns entrevistados referiram utilizar o recurso das salas de espera para esclarecerem dúvidas e explicarem acerca de algum tema proposto.
Uma das finalidades das salas de espera é criar espaços para desenvolver a educação em saúde de maneira informal, incentivando as rodas de conversa curtas, porém produtivas. Para o homem, que busca agilidade e resolutividade na atenção primária, pode ser uma estratégia acertada que os encoraja a participarem.
Ainda nessa perspectiva, diz-se que a transformação de ações dos profissionais de saúde e comunidade acontece a partir do compartilhamento de informações e saberes populares, o que é favorecido nas práticas político pedagógicas da Educação Popular em Saúde (EPS) (BRASIL, 2017).
É interessante notar que, apesar de os homens terem fácil acesso para participarem das atividades desenvolvidas na atenção primária, especialmente os grupos educativos, essas ações não costumam ser específicas para essa população, mas sim para a comunidade em geral. Assim, a implementação da PNAISH ocorre de forma indireta na maioria das UBSs,
Vasconcelos et al. (2019) complementam dizendo que programas como Hiperdia, distribuição de preservativos, saúde sexual e reprodutiva, planejamento familiar, palestras e atendimento odontológico são destinados para a comunidade em geral, porém, auxiliam na implementação da PNAISH, pois conversam com seus eixos, contribuindo para o cuidado integral à saúde do homem.
Nessa categoria, a campanha do Novembro Azul também foi destaque nos discursos. Em muitas entrevistas ela foi mencionada como a única ação direcionada especificamente aos homens ao longo de todo ano.
O grande problema de focar as ações no mês de novembro é que o homem se sente desassistido nos demais meses, além de não dar continuidade à assistência e/ou tratamento fora dessa época.
Alguns participantes deixam claro que a campanha Novembro Azul não é capaz de suprir as demandas da comunidade e torna-se necessária a interrupção das atividades direcionadas ao público masculino.
Diante dos relatos, foram selecionadas ações e programas, ditos como presentes na maioria das UBSs, na tentativa de viabilizar contextos pertinentes à saúde do homem e priorizar a atenção básica, ou seja, a ESF como porta de entrada desse usuário ao sistema de saúde integral, hierarquizado e regionalizado. Sendo assim, foram implantados os seguintes programas:
4.1 Pré-natal do parceiro inserido na atenção básica
Nas unidades em que foram conduzidas as entrevistas, o programa de Pré-Natal do Parceiro foi implementado, embora ainda esteja em estágio inicial de desenvolvimento. Os profissionais de saúde têm consciência da existência dessa ferramenta e veem sua importância nesse processo. No entanto, os discursos não mostraram tanta assertividade nessa implantação e implementação:
[…] questão da paternidade, sempre consulta de pré-natal, a gente pede para o parceiro vir junto, tanto para gestante quanto para o parceiro, quando a gente fala que é o pré-natal do parceiro né? (G7)
Essa proposta compreende o envolvimento do homem desde a opção por ser pai até a participação no parto e criação de seus filhos, sob o título de paternidade responsável. A cultura machista distanciou os homens dessas funções e colocou a mulher como a grande responsável por todas essas etapas. No entanto, o Pré-Natal de Parceiro rompe com esses paradigmas. Essa mudança proporciona a criação de fortes vínculos afetivos entre os homens e suas companheiras e seus filhos, sendo biológicos ou não (VASCONCELOS, 2019).
Segundo Herrmann (2016), o Pré-Natal do Parceiro conta com a presença do homem como acompanhante das gestantes nas consultas desse período e deve ser aproveitado para solicitar exames de rotina e testes rápidos, além de realizar a educação em saúde relacionada ao autocuidado e adoção de hábitos de vida saudáveis com o intuito de promover saúde e prevenir doenças nos homens.
4.2 Grupos de direitos reprodutivos
No que tange à garantia dos direitos sexuais e reprodutivos no Brasil, uma das legislações mais importantes é a Lei nº 9.263, de 12 de janeiro de 1996 – Lei de Planejamento Familiar – implementada no Brasil em 1996, o enfoque educativo é um dos elementos fundamentais na qualidade da atenção prestada em saúde sexual e saúde reprodutiva (BRASIL, 1996).
Educar é um processo de construção permanente (BRASIL, 2013c). Nessa perspectiva as equipes da ESF costumam realizar os Grupos de Direitos Reprodutivos com o intuito de incorporar valores e conceitos que remetem à temática. Dentre os entrevistados, a maior parte deles confirmou a realização dessa atividade.
Na tentativa de tornar o cuidado mais abrangente, o termo Planejamento Familiar tem sido, paulatinamente, substituído por Planejamento Reprodutivo. Essa mudança contempla homens, mulheres e adolescentes, com ou sem união estável e tendo ou não o desejo de ter filhos e/ou constituir família (SILVA, 2013).
4.3 Campanha novembro azul
O Novembro Azul é o mês em que os municípios buscam planejar e preparar a ESF para acolherem os homens que buscarem os serviços de saúde. Este surgiu em 2003, em um bar na cidade de Melbourne, na Austrália, idealizado por Travis Garone e Lucas Slattery. O movimento tem como símbolo o bigode (estilo Mário Bros) e foi criado para aproveitar as comemorações do dia mundial de combate ao câncer de próstata, que ocorre em 17 de novembro (MATOS, 2019).
Em 15 julho é comemorado do Dia Nacional do Homem e agosto é o mês destinado à prevenção da mortalidade masculina por causas externas, porém somente a campanha Novembro Azul, mês mundial de combate ao câncer de próstata, está habituada a ser destaque nas UBSs (COSTA, 2020). Em todas as entrevistas houve menção ao Novembro Azul. Na maior parte das UBSs, essa campanha é realizada pelas equipes de saúde. Ao serem questionados sobre as ações que têm sido realizadas pelo município e/ou UBS para consolidar as propostas da PNAISH, uma parcela considerável dos entrevistados comentou somente sobre a campanha do Novembro Azul.
4.4 Adequação do horário de funcionamento
Para garantir a procura do homem pelos serviços de saúde é necessário reorganizar as ações de saúde por meio de propostas inclusivas, com o objetivo de tornar o nível de atenção primária também um espaço favorável ao público masculino. Um dos aspectos evidenciados nos discursos diz respeito à coincidência do horário das atividades laborais e de funcionamento das UBSs.
Os profissionais acreditam que o horário de funcionamento das UBS é um impasse para a incorporação de ações e serviços destinados ao público masculino, visto que eles optam pelo trabalho em detrimento do cuidado com a saúde. O homem prioriza o trabalho e, se for necessário, deixa o cuidado com sua saúde em segundo plano.
Hoje em dia há um número reduzido de UBSs que funcionam 24 horas, nos finais de semana ou com o horário estendido, cenário que impede as pessoas que trabalham de maneira formal a frequentarem sempre que preciso, com receio de afetarem a segurança do emprego (LIMA ET AL., 2021).
Consoante, Nobre e Freitas (2021) declaram que o homem ainda se considera o provedor e o responsável pela renda da família e, por isso, deixa de frequentar as unidades de saúde que funcionam em horário comercial.
Vale ressaltar que O Programa Saúde na Hora, lançado pelo Ministério da Saúde pela Portaria nº 930, de 15 de maio de 2019, propõe a ampliação do horário de atendimento das UBSs, estendendo para além do horário comercial (BRASIL, 2019). No entanto, o programa é facultativo aos municípios e muitos ainda não aderiram.
4.5 Meios de comunicação entre ESF e público masculino
Os homens precisam estar informados sobre os serviços oferecidos pelas UBS, horários de funcionamento, realização de atividades específicas e parcerias com os movimentos sociais e populares. Os gestores entrevistados reconhecem a essencialidade da comunicação:
A comunicação é muito importante, quanto mais comunicação, melhor, quanto mais falar da saúde do homem, que ele não procura e tem que procurar antes de apresentar doença […]. (G1)
Nota-se que a ESF conta com a atuação de parcerias encontradas em todos os bairros, tais como escolas, igrejas, Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e comércio local.
Tais locais, dependendo do perfil da comunidade, se tornam grandes parceiros para repasse e troca de informações entre unidades de saúde e usuários. O ACS foi considerado pela maioria dos entrevistados como peça fundamental para a comunicação da ESF.
O ACS funciona como uma ponte entre a equipe de ESF e a comunidade, sendo o grande responsável pelo repasse das condições de saúde da população e, portanto, do planejamento e implementação de ações estratégicas (MENDONÇA ET AL., 2021).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Atenção Primária à Saúde (APS) é fundamental para garantir serviços de saúde de qualidade, efetivos e acessíveis à população. No entanto, é preciso ir além da simples existência de programas abrangentes e entender os desafios enfrentados nos locais onde as ações são implementadas, respeitando o princípio da descentralização.
Este estudo realizado no município de Juiz de Fora revelou a necessidade de repensar as estratégias de implantação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH) e gerar resultados mais mensuráveis.
É importante ressaltar que as políticas e sistemas de saúde ainda não estão plenamente preparados para atender as necessidades específicas da população masculina no município de Juiz de Fora. Para corrigir essa lacuna, é necessário aprimorar os programas e capacitar os profissionais em estratégias de saúde domiciliar, a fim de proporcionar tratamento igualitário a todos os usuários, independentemente do gênero.
REFERÊNCIAS
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