ENVIRONMENTAL AND SOCIOECONOMIC FACTORS THAT INFLUENCE THE INCIDENCE OF CERVICAL CANCER: A LITERATURE REVIEW
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202508301944
Micaela Bisconsin Sarde¹
Débora Galego de Paula²
Giovanna Cassol de Souza³
Alcione Oliveira dos Santos⁴
RESUMO
Objetivo: Este artigo visa o detalhamento dos fatores tanto ambientais, quanto socioeconômicos, capazes de induzir positivamente ou negativamente o índice de novos casos detectados de Câncer de Colo de Útero. Materiais e Métodos: Foram utilizados critérios de inclusão e exclusão em plataformas de busca científica como PubMed e NIH, obtendo-se um total de 21 artigos para elaboração do artigo. Resultados: Os dados demonstram uma disparidade significativa nas taxas de incidência e mortalidade do câncer cervical entre diferentes regiões do Brasil, com maior concentração de casos nas regiões Sudeste e Nordeste, enquanto a Região Norte apresenta as taxas de incidência mais elevadas. A análise também revela desigualdades étnico-raciais, com taxas de mortalidade mais altas entre mulheres negras e pardas. Além disso, fatores como escolaridade, acesso a serviços de saúde e localização rural impactam diretamente a adesão ao rastreamento. A urbanização, apesar de aumentar a exposição a fatores de risco, também facilita o acesso a cuidados preventivos e tratamentos adequados. Conclusões: O câncer de colo do útero, relacionado principalmente ao HPV, é influenciado por fatores como a ausência de vacinação, falta de rastreamento e desigualdade no acesso a serviços de saúde. Fatores socioeconômicos, tabagismo e uso prolongado de anticoncepcionais aumentam o risco da doença. A conscientização, a educação e políticas públicas eficazes, como a ampliação da vacinação e programas de rastreamento, são essenciais para prevenir e reduzir a mortalidade.
Palavras-chave: “Câncer de Colo Uterino”, “Incidência”, “Fatores socioeconômicos”, “Fatores ambientais” e “Fatores psicossociais”.
ABSTRACT
Objective: This article aims to detail both environmental and socioeconomic factors capable of positively or negatively inducing the rate of new cases of Cervical Cancer detected. Materials and Methods: Inclusion and exclusion criteria were used in scientific search platforms such as PubMed and NIH, obtaining a total of 21 articles for the preparation of the article. Results:
The data demonstrate a significant disparity in the incidence and mortality rates of cervical cancer between different regions of Brazil, with a higher concentration of cases in the Southeast and Northeast regions, while the North region has the highest incidence rates. The analysis also reveals ethnic-racial inequalities, with higher mortality rates among black and brown women. In addition, factors such as education, access to health services, and rural location directly impact adherence to screening. Urbanization, despite increasing exposure to risk factors, also facilitates access to preventive care and appropriate treatments. Conclusions: Cervical cancer, mainly related to HPV, is influenced by factors such as lack of vaccination, lack of screening, and inequality in access to health services. Socioeconomic factors, smoking, and prolonged use of contraceptives increase the risk of the disease. Awareness, education and effective public policies, such as expanded vaccination and screening programs, are essential to prevent and reduce mortality.
Key-words: “Cervical Cancer”, “Incidence”, “Socioeconomic Factors”, “Environmental Factors” and “Psychosocial Factors”.
Introdução
O câncer de colo do útero (CCU) é um tipo de tumor maligno que se desenvolve na parte inferior do útero, chamada colo uterino, e é a única neoplasia maligna com causa bem estabelecida: infecções persistentes pelo papilomavírus humano (HPV). Quase todos os casos da doença estão diretamente ligados a esse vírus. Pesquisas indicam que as oncoproteínas E6 e E7, associadas ao HPV, exercem funções essenciais na modulação do ambiente imunológico das malignidades relacionadas ao vírus. 1
Esta neoplasia permanece sendo uma preocupação significativa para a saúde pública em nível global. Em 2022, foi o quarto tipo de câncer mais frequente entre as mulheres, registrando 662.301 novos diagnósticos e 348.874 óbitos. A maior parte dos casos ocorre em nações de baixa e média renda.2 No Brasil, Entre 2002 e 2021, o Brasil registrou um total de 133.429 óbitos por câncer do colo do útero. Desses casos, 63.102 (47,3%) ocorreram em mulheres brancas, 10.741 (8,1%) em mulheres negras, 57.584 (43,2%) em mulheres pardas, 635 (0,48%) em mulheres amarelas e 632 (0,47%) em mulheres indígenas.3
A vacina contra o HPV foi incorporada aos programas de imunização em diversos países. No Brasil, o Programa Nacional de Imunização (PNI) passou a incluí-la em seu calendário a partir de 2014.4 Como parte das estratégias de saúde pública para a erradicação global do câncer cervical, espera-se que, até 2030, sejam alcançadas as seguintes metas: 90% de cobertura vacinal contra o HPV para meninas de até 15 anos, 70% de realização adequada de exames de Papanicolau para rastreamento da doença e 90% de mulheres diagnosticadas recebendo tratamento precoce e adequado.5
O crescimento da taxa de mortalidade pela doença está associado ao aumento da longevidade e ao envelhecimento populacional, além de alterações na prevalência e na distribuição de fatores de risco, especialmente aqueles ligados ao desenvolvimento socioeconômico e à influência exercida por agentes ambientais.6
As medidas de prevenção para este tipo de neoplasia são variadas. Contudo, as estratégias de prevenção não são aplicadas de maneira uniforme em todas as regiões, o que pode estar relacionado a diferenças socioeconômicas, geográficas, culturais e à infraestrutura de saúde disponível em cada local, as quais contribuem para discrepâncias significativas nos índices de morbimortalidade do CCU entre os países. Além disso, fatores como idade, etnia, tabagismo, comportamento sexual e estado nutricional também podem influenciar o risco de desenvolvimento da doença, resultando em particularidades regionais na sua ocorrência.7
Este artigo visa explorar as vertentes socioeconômicas e ambientais que geram risco ao desenvolvimento do CCU, de forma a aumentar sua incidência, além de entender as particularidades regionais da incidência do câncer do colo do útero e reconhecer como os fatores de risco associados à doença podem auxiliar na criação de estratégias preventivas mais eficientes e na distribuição apropriada dos recursos de saúde.
Materiais e Métodos
Este estudo consiste em uma revisão bibliográfica de artigos publicados entre 2020 e 2025, ou seja, nos últimos cinco anos, com o objetivo de construir uma base sólida de referência e promover um conhecimento mais abrangente sobre o tema.
Para a realização deste estudo, foram realizadas leituras seriadas dos artigos provenientes das principais plataformas de busca científica, como PubMed (Public Medical Literature Analysis and Retrieval System Online), SciELO (Scientific Eletronic Library Online), NIH (National Library of Medicine), Bireme (Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde), entre outras, a fim de obter os artigos necessários para a elaboração da revisão bibliográfica.
Foram utilizados os seguintes descritores: “Câncer de Colo Uterino”, “Incidência”, “Fatores socioeconômicos”, “Fatores ambientais” e “Fatores psicossociais”. Além disso, foram incluídos os termos em inglês: “Cervical Cancer”, “Incidence”, “Socioeconomic Factors”, “Environmental Factors” and “Psychosocial Factors”, para abranger pesquisas bibliográficas nas línguas inglesa e portuguesa, proporcionando uma maior diversidade de fontes e um aprofundamento mais detalhado sobre o tema.
Serão excluídos os estudos incompletos, que não fornecem as informações essenciais para a discussão do assunto proposto, assim como os artigos repetidos em diferentes bases de dados, aqueles com apenas o resumo publicado, estudos que fogem do tema proposto e que não competem com o período de publicação pré-estabelecido (últimos 5 anos).
Figura 1 – Fluxograma do processo de coleta, inclusão e exclusão de literaturas.

Fonte: Autoria própria.
A partir das buscas com as combinações de tópicos e descritores propostos, será realizada a leitura exploratória dos resumos desses materiais bibliográficos e, posteriormente, a leitura completa do texto desses estudos através de uma análise revisional e descritiva da gama literária disponível. Obteve-se um total de 21 referências para a célebre elaboração deste artigo, os quais exerceram importâncias ínfimas para o desfecho de cada tópico visado.
Resultados e Discussão
Aspectos Gerais e Epidemiológicos
Embora existam medidas preventivas disponíveis, como a vacina contra o papilomavírus humano, o estigma associado aos cuidados com a saúde reprodutiva e sexual ainda representa um obstáculo para a redução das desigualdades nessa área. A estigmatização da saúde reprodutiva e sexual ocorre quando certos temas, especialmente para mulheres solteiras, são vistos como tabus, incluindo infecções sexualmente transmissíveis, prazer ou desconforto sexual, gravidez e métodos contraceptivos. Porém, esse estigma vai além dessas questões, dificultando o acesso a cuidados médicos para outras condições que não envolvem DSTs ou gestação, como o próprio câncer cervical e aspectos socioeconômicos e ambientais.8
No Brasil, excluindo os casos de câncer de pele não melanoma, o câncer cervical é o terceiro mais comum entre as mulheres. Para 2023, espera-se que haja 17.010 novos casos, o que corresponde a uma taxa de 13,25 casos a cada 100 mil mulheres. As estimativas de incidência para 2023, calculadas para grupos de 100 mil mulheres, são fundamentais para compreender a extensão da doença no país e para planejar ações de saúde direcionadas localmente (Figura 2).9
Figura 2 – Taxa de incidência de CCU por região

Fonte: Boletim Temático da Biblioteca do Ministério da Saúde (2023)
As taxas de incidência e o número estimado de novos casos de câncer são essenciais para avaliar a abrangência da doença em diferentes regiões e para planejar ações de saúde locais.
O maior número estimado de casos novos de câncer cervical ocorre nas Regiões Sudeste e Nordeste, que são as mais populosas do Brasil. No entanto, ao analisar as taxas de incidência (brutas e ajustadas), verificamos que as maiores taxas estão na Região Norte (Tabela 1).10
Tabela 1 – Estimativas das taxas brutas e ajustadas pela população mundial de incidência por 100 mil mulheres e do número de casos novos de câncer do colo do útero. Brasil, Regiões e Unidades da Federação, para cada ano do triênio 2023-2025.
Regiões/UF | Nº de Casos | Taxa Bruta | Taxa Ajustada |
Norte | 1.980 | 20,48 | 16,77 |
Acre | 70 | 15,23 | 15,41 |
Amapá | 100 | 21,86 | 26,73 |
Amazonas | 610 | 27,63 | 31,71 |
Pará | 830 | 18,65 | 19,48 |
Rondônia | 150 | 16,33 | 16,39 |
Roraima | 40 | 10,91 | 13,25 |
Tocantins | 180 | 22,00 | 16,77 |
Nordeste | 5.280 | 17,59 | 13,85 |
Alagoas | 370 | 20,91 | 18,54 |
Bahia | 1.160 | 14,93 | 11,84 |
Ceará | 1.030 | 21,49 | 13,97 |
Maranhão | 800 | 21,71 | 21,13 |
Paraíba | 290 | 13,42 | 10,5 |
Pernambuco | 770 | 15,18 | 12,14 |
Piauí | 360 | 21,19 | 15,23 |
Rio Grande do Norte | 280 | 15,33 | 12,06 |
Sergipe | 220 | 17,71 | 13,85 |
Centro-Oeste | 1.440 | 16,66 | 11,09 |
Distrito Federal | 240 | 14,47 | 11,05 |
Goiás | 660 | 17,74 | 9,12 |
Mato Grosso | 220 | 12,33 | 11,14 |
Mato Grosso do Sul | 320 | 21,71 | 17,73 |
Sudeste | 6.020 | 12,93 | 8,57 |
Espírito Santo | 260 | 12,43 | 9,40 |
Minas Gerais | 1.670 | 15,17 | 7,73 |
Rio de Janeiro | 1.540 | 16,71 | 11,76 |
São Paulo | 2.550 | 10,52 | 7,58 |
Sul | 2.290 | 14,55 | 9,77 |
Paraná | 790 | 13,19 | 9,77 |
Rio Grande do Sul | 620 | 10,42 | 7,11 |
Santa Catarina | 880 | 23,18 | 17,2 |
Brasil | 17.010 | 15,38 | 13,25 |
Fonte: Adaptado de INCA (2023)
Aspectos Étnicos
Um dos aspectos sociais que têm exercido grande influência é a iniquidade étnico-racial. Entre 2002 e 2021, foram registradas 133.429 mortes por câncer cervical no Brasil. Desses casos, 63.102 (47,3%) ocorreram entre mulheres brancas, 10.741 (8,1%) entre mulheres negras, 57.584 (43,2%) entre mulheres pardas, 635 (0,48%) entre mulheres amarelas e 632 (0,47%) entre mulheres indígenas. No total, a soma das mortes entre mulheres pardas e negras correspondeu a 68.325 (51,2%) dos óbitos. Já a mortalidade entre mulheres negras e brancas representou 98,50% do total de registros no período analisado.11
Tabela 2 – Taxa de mortalidade por câncer cervical ajustada por idade (por 100.000 mulheres), por raça e por ano no Brasil, entre 2002 a 2021
Ano | Branco | Preto | Amarelo | Indígena | Total |
2002 | 7.96 | 8.04 | 3.50 | 4.19 | 8.41 |
2003 | 7.66 | 8.09 | 3.55 | 6.59 | 8.37 |
2004 | 7.65 | 8.27 | 5.74 | 9.39 | 8.44 |
2005 | 7.26 | 8.41 | 6.10 | 7.23 | 8.36 |
2006 | 6.78 | 8.64 | 3.14 | 10.89 | 8.13 |
2007 | 6.68 | 8.58 | 2.93 | 10.72 | 8.03 |
2008 | 6.78 | 8.35 | 3.12 | 10.93 | 7.95 |
2009 | 6.78 | 8.37 | 2.88 | 11.08 | 7.98 |
2010 | 6.53 | 8.05 | 3.16 | 7.16 | 7.63 |
2011 | 6.23 | 8.22 | 2.53 | 7.20 | 7.55 |
2012 | 6.25 | 8.28 | 1.66 | 9.41 | 7.47 |
2013 | 5.96 | 8.15 | 2.27 | 13.75 | 7.30 |
2014 | 5.85 | 7.89 | 1.13 | 10.70 | 7.12 |
2015 | 5.99 | 7.93 | 1.33 | 13.27 | 7.20 |
2016 | 5.81 | 7.78 | 1.93 | 11.71 | 7.05 |
2017 | 6.21 | 7.82 | 1.90 | 18.73 | 7.29 |
2018 | 6.13 | 7.77 | 1.42 | 15.03 | 7.19 |
2019 | 5.87 | 7.46 | 1.34 | 15.81 | 6.94 |
2020 | 5.72 | 7.12 | 1.31 | 13.37 | 6.68 |
2021 | 5.64 | 6.65 | 1.23 | 12.61 | 6.40 |
Fonte: Adaptado de Luiz, et al. (2024)
Conforme demonstrado na Tabela 2, em 2002 a taxa de mortalidade entre mulheres negras foi 1,0% superior à das mulheres brancas. Já em 2021, essa diferença aumentou para 17,8%, evidenciando o crescimento da desigualdade racial. No caso das mulheres indígenas, as variações nas taxas ao longo do período analisado estão relacionadas ao número reduzido de casos e à menor representatividade desse grupo na população geral. Em 2002, a mortalidade entre indígenas foi 47,3% inferior à das mulheres brancas, enquanto em 2021 essa taxa passou a ser 123,5% maior.
Embora a literatura científica internacional destaque a raça como um fator de risco significativo, a maioria das pesquisas realizadas no Brasil tem se concentrado principalmente em questões ligadas à pobreza, sem dar a devida atenção às desigualdades raciais na área da saúde.
Aspectos Referentes à Escolaridade
De acordo com Adzigbli e seu grupo (2025), a escolaridade é um fator considerável. Seu estudo baseado na associação de fatores demográficos e socioeconômicos em mulheres triadas para CCU constatou que mulheres com maior nível de escolaridade apresentaram maiores taxas de realização de exames preventivos. Apenas 3,11% das mulheres sem educação passaram pela triagem, enquanto esse percentual foi de 22,04% entre aquelas com ensino superior. Já em relação ao estado civil, as taxas de triagem se mostraram semelhantes, variando de 5,11% entre mulheres que vivem em união estável a 7,87% entre aquelas que nunca tiveram um relacionamento formal.
Este fator está associado ao fato de que mulheres com maior nível de escolaridade estão mais preparadas para entender os riscos à saúde e têm maior probabilidade de aderir a exames preventivos. A educação desempenha um papel fundamental na mudança de crenças e comportamentos negativos, favorecendo uma melhor aceitação das intervenções voltadas para a conscientização sobre saúde e doença.12
A população rural possui correlação baixa tanto ao nível socioeconômico, quanto ao nível de escolaridade, como é demonstrado pelo estudo realizado por Garg et al (2025), através de uma análise comparativa entre a população urbana e a rural. Na pesquisa foram triadas cerca de 5.430 mulheres com câncer cervical, dentre as quais 580 mulheres faziam parte do grupo “Muito pobre”, 940 do grupo “Pobre”, 1.343 do grupo “Intermediário”, 1.317 pertenciam ao grupo “Rico” e 1.250 do grupo “Muito rico”. A população rural obteve mais mulheres triadas dentro dos grupos de menor nível econômico (“Pobre”e “Muito pobre”), como demonstrado na tabela 3.
Tabela 3 – Análise comparativa percentual entre mulheres provenientes da região urbana e da região rural, de acordo com seu nível socioeconômico.
Nível Econômico | Nº Total de Triadas | População Urbana | População Rural |
Muito Pobre | 580 | 30 (5,1%) | 550 (94,9%) |
Pobre | 940 | 100 (10,6%) | 840 (89,4%) |
Intermediário | 1.343 | 336 (25,1%) | 1007 (74,9%) |
Rico | 1.317 | 555 (42%) | 762 (58%) |
Muito Rico | 1.250 | 849 (67,9%) | 401 (32,1%) |
Fonte: Adaptado de Garg, et al. (2025)
Aspectos Psicossociais
A elevada taxa de mortalidade nesse grupo está associada a uma maior exposição a fatores de risco significativos, como tabagismo, consumo de álcool e drogas, além da obesidade. Além disso, desafios como o diagnóstico tardio, barreiras no acesso a serviços de saúde e tratamento adequado, bem como a baixa adesão a medidas preventivas, como a participação em programas de rastreamento do câncer, também contribuem para o cenário de aumento dos casos.14
Ser mulher, ser solteira, estar fora do trabalho ou da escola, tratamento contínuo, função física prejudicada, sentir dor, sofrimento financeiro e ter mau funcionamento familiar são os fatores associados à incidência de câncer cervical, porém, se destacam como fatores consequentes ao invés de causadores. Este fato é ratificado por Sjödin et al (2025), ao exporem que fatores psicológicos correlacionam-se ao período pós-patológico e não ao pré-patológico, confluindo no fato de que transtornos ansiosos e depressivos surgem como resultado do descobrimento, tratamento e prognóstico do CCU.
Mulheres que vivem em áreas rurais apresentam uma menor adesão ao rastreamento do câncer cervical em comparação com aquelas que residem em zonas urbanas. Um dos possíveis motivos para essa diferença é a presença de diversos obstáculos que dificultam o acesso a serviços de triagem e a outras opções de atendimento em saúde. Entre os fatores que contribuem para esse cenário estão a baixa alfabetização em saúde, a falta de informação sobre os serviços disponíveis e as deficiências na infraestrutura local.16
Aspectos Ambientais
A imunização contra o HPV demonstrou ser fundamental na prevenção do câncer cervical, uma das principais causas de mortalidade feminina em nível global. No entanto, os índices de vacinação entre os jovens ainda são baixos. Os adolescentes costumam ter pouca adesão aos serviços de saúde e às iniciativas de promoção do bem-estar, tanto devido às características do desenvolvimento biopsicossocial quanto à percepção equivocada de que, por estarem saudáveis, não necessitam de consultas médicas regulares.17
Estudos apontam que as barreiras de transporte exercem efeito significativo na não adesão ao rastreamento do câncer, aumentando sua incidência. A insegurança no transporte é uma barreira amplamente reconhecida no acesso aos cuidados de saúde, sendo influenciada por diversos fatores. Isso inclui dificuldades com o transporte privado, como a falta de acesso a veículos ou a impossibilidade de arcar com custos de combustível ou estacionamento, problemas relacionados ao transporte público, como questões de infraestrutura ou custo, e/ou o tempo necessário para deslocar-se até as unidades de saúde.18
A urbanização pode influenciar o aumento das taxas de câncer devido a mudanças nos hábitos de vida, como maior sedentarismo, consumo elevado de alimentos ultraprocessados, crescimento do tabagismo e do consumo de álcool, além da maior exposição a poluentes. Entretanto, ela também pode favorecer o combate à doença, oferecendo melhores condições para prevenção, diagnóstico precoce e tratamento.19
Políticas públicas municipais e um planejamento urbano eficiente podem incentivar hábitos mais saudáveis, reduzir a exposição a agentes cancerígenos, como a poluição atmosférica, e ampliar fatores protetores, como a presença de áreas verdes. Cidades bem estruturadas podem melhorar o acesso aos serviços de saúde, facilitando a realização de exames preventivos e o encaminhamento para tratamentos especializados. No entanto, a desigualdade socioeconômica pode representar um obstáculo a esses avanços.20
As crenças culturais desempenham um papel fundamental na forma como as pessoas buscam atendimento médico, influenciando a probabilidade de realizarem exames para detecção do câncer cervical. Não é apenas a limitação do sistema de saúde moderno que leva as mulheres a recorrerem à medicina tradicional, mas uma combinação de fatores, incluindo valores culturais, experiências anteriores, condições financeiras e o ambiente em que vivem. Em áreas urbanas, onde a alfabetização em saúde tende a ser maior e o acesso a serviços de triagem mais amplo, o uso de curandeiros tradicionais pode ser menos frequente em comparação com regiões rurais.21
Considerações Finais
O câncer de colo do útero é uma das neoplasias mais comuns entre mulheres e está diretamente relacionado à infecção pelo papilomavírus humano (HPV), especialmente os tipos oncogênicos. A transmissão ocorre, principalmente, por contato sexual, e a persistência da infecção pode levar a lesões precursoras que evoluem para o câncer. Além disso, a ausência de vacinação contra o HPV e a falta de rastreamento adequado contribuem para a alta incidência da doença.
Fatores socioeconômicos também desempenham um papel crucial, pois mulheres com menor acesso à informação e serviços de saúde têm menos chances de realizar exames preventivos, como o Papanicolau. A desigualdade no acesso ao diagnóstico precoce e ao tratamento adequado resulta em maior mortalidade, especialmente em países em desenvolvimento. O nível educacional e a conscientização sobre a importância da prevenção são determinantes para a adesão às estratégias de rastreamento.
O tabagismo e o uso prolongado de anticoncepcionais orais são fatores de risco adicionais, pois comprometem o sistema imunológico e aumentam a vulnerabilidade às infecções persistentes pelo HPV. Além disso, a multiplicidade de parceiros sexuais sem o uso de preservativo eleva o risco de exposição ao vírus. Comportamentos de risco, aliados à predisposição genética, podem acelerar o desenvolvimento da doença.
Por fim, políticas públicas eficazes são essenciais para reduzir a incidência do câncer de colo do útero, por meio da ampliação da vacinação contra o HPV e do fortalecimento dos programas de rastreamento. Campanhas educativas e a melhora no acesso ao atendimento ginecológico são estratégias fundamentais para prevenir e diagnosticar precocemente a doença, reduzindo sua mortalidade.
Referências
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¹ Discente de Medicina do Centro Universitário Aparício Carvalho, micaelabisconsin@gmail.com
² discente de Medicina do Centro Universitário Aparício Carvalho, deboragalego02@hotmail.com
³ discente de Medicina do Centro Universitário Aparício Carvalho, giovannacassoldesouza@gmail.com
4 docente do Curso de Medicina, Centro Universitário Aparício Carvalho, mestrado e doutorado em Biologia Experimental pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR, alcione.m@hotmail.com, ORCID: 0000-0001-9476-0761.