ETAPAS DE CONSTRUÇÃO DE UM DISPOSITIVO AUXILIAR PARA SEDESTAÇÃO A BEIRA LEITO INFANTIL (DASBELI) 

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.10998868


Ana Lúcia Farias Vidal1 
Izis Gabrielle Cordeiro Ribas
Regina Rocha Corrêa
Paulo Douglas de Oliveira Andrade4 


INTRODUÇÃO 

As complicações decorrentes do imobilismo e uso de sedação continua presente na maioria das unidades de terapia intensiva pediátrica (UTIP) são causadas por condições fisiológicas, gravidade da doença e fatores de risco prévios, os quais levam ao declínio funcional da criança (MORROW, 2021). A mobilização precoce (MP) é uma prática que impacta positivamente no condicionamento cardiorrespiratório, melhorando a capacidade funcional, reduzindo o tempo de internação e a morbimortalidade (MIURA et al., 2020; BORGES et al., 2022). 

A sedestação beira leito é um dos marcos essenciais na mobilidade do paciente crítico, principalmente daqueles que passam a maior parte do tempo em decúbito dorsal no leito. Quando a sedestação é realizada de forma assistida e segura, estimula o estresse com as mudanças gravitacionais, aumentando a atividade diafragmática, bem como de outros músculos abdominais, extensores de tronco e correções posturais (ROCHA et al., 2023).  

Entretanto, a estratégia atual para incluir essa etapa de mobilidade na UTIP geralmente é realizada por mais de um profissional para promover segurança durante a conduta, uma vez que é comum que as crianças estejam com dispositivos invasivos que fazem parte dos cuidados na UTIP, risco de quedas ou em delirium. Sendo assim, dispositivos têm sido criados com o intuito de aumentar a segurança durante a assistência à beira do leito, como o Dispositivo Auxiliar para Sedestação à Beira Leito (DASBEL), sendo de fácil higienização e manuseio (RIBEIRO, 2021). 

Existem vários dispositivos tecnológicos para auxiliar na mobilidade e exercícios na UTIP, como os jogos com realidade virtual, andadores, ciclo ergômetro, estimulação elétrica neuromuscular e dispositivo de assento personalizado. Entretanto, a maioria desses recursos estão associados a altos custos financeiros e não há evidências sobre a necessidade de dispositivos caros para obter melhores resultados com a reabilitação (MORROW, 2021). Portanto, este estudo tem o intuito de padronizar materiais e medidas necessários para construir um dispositivo auxiliar para sedestação a beira leito infantil (DASBELI). 

MÉTODOS 

Para a concepção do protótipo DASBELI (dispositivo auxiliar de sedestação beira leito infantil), adotamos como referência a média das medidas antropométricas gerais e específicas de duas crianças, uma do sexo masculino e outra do sexo feminino, ambas com 6 anos de idade. A escolha da referida idade se deu pela mediana da faixa-etária pré-escolar (2 a 4 anos) e escolar (5 a 10 anos), segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria. Tais crianças são consideradas eutróficas, com altura e peso adequados para a idade (Quadro 1) conforme o Ministério da Sáude (2022). 

Quadro 01. Medidas antropométricas gerais 

Variável Menino Menina 
Estatura (cm) 124 116 
Peso (kg) 25,0 21,4 

Além das medidas antropométricas das crianças modelo, também foram consideradas as medidas de uma cama hospitalar pediátrica do tipo Fowler, com elevação tubular 3 manivelas (Quadro 2).  

Quadro 2. Cama Hospitalar Pediátrica 

Medida Valor (cm) 
Comprimento 166 
Largura 73 
Altura (com colchão) 71 

RESULTADOS E DISCUSSÃO  

A princípio foram realizadas medidas antropométricas específicas (Quadro 3) em ambas as crianças a fim de se definir as medidas ergonômicas do dispositivo.  

Quadro 3: Medidas Antropométricas Específicas  

Medida* Menino Menina Média 
Altura cabeça-assento 58,2 56,5 57,3 
Altura nível dos olhos-assento 47,5 45,8 46,6 
Altura ombro-assento 35,1 32,7 33,9 
Altura cotovelo-assento 15,8 13,4 14,6 
Profundidade nádega-popliteal 32,0 32,9 32,4 
Largura cotovelo a cotovelo 34,6 32,1 33,3 
Comprimento interarticular cotovelo-pulso 19,7 19,7 19,7 

*em centímetros (cm) 

Com base nas medidas acima foi possível desenhar o dispositivo desejado já com as devidas medidas ergonômicas apropriadas (Figura 1). 

                                 Figura 1: Medidas da DASBELI 

Com as medidas definidas foi possível listar o material necessário para sua construção (Quadro 4). 

Quadro 4. Materiais utilizados. 

Item Material Quantidade 
Vara de Cano PVC para esgoto de 40mm 4,5 metros 
Conexões “T” 
Conexões “joelho” 
Cola para tubo pequena 
EVA 4 mm 40 X 48 1 folha 
Tinta spray 
Papel contact 

O dispositivo foi confeccionado com sucesso e doado para uma UTI pediátrica que atende crianças em pós-operatório de cirurgia cardíaca (Figura 2). Suas medidas e material necessário podem ser usados como referência para qualquer unidade de crianças críticas no mundo. 

 Os benefícios do DASBELI coincidem com os da mobilização precoce na UTIP, envolvendo a prevenção da fraqueza muscular adquirida na UTIP (FAUTIP), da disfunção diafragmática induzida pelo ventilador, do Delirium e da Síndrome Pós-UTIP. Além disso, tais comorbidades aumentam o risco de mortalidade hospitalar, tempo de ventilação mecânica e da hospitalização, elevando os gastos hospitalares (VANHOREBEEK et al., 2020).  

Figura 2: Mobilização de paciente pediátrico com a DASBELI 

Fonte: Arquivo de imagens dos autores 

A implementação da mobilização precoce para prevenir a FAUTIP parte de condutas fisioterapêuticas que estimulem a mobilidade no leito como a da sedestação (PIVA; FERRARI e SCHAAN, 2019). A sedestação à beira do leito é uma etapa fundamental da mobilização precoce, precedendo a saída do paciente do leito, sendo a DASBELI um recurso utilizado frequentemente para posicionamento em sedestação à beira do leito em UTI (STARKE, 2019).                                 

Existem várias diretrizes que ressaltam a importância da reabilitação para amenizar os efeitos inerentes ao imobilismo que acomete pacientes internados em unidades de terapia intensiva. Entretanto, os ensaios clínicos randomizados sobre reabilitação na UTI pouco demonstram resultados positivos, quando avaliam os efeitos funcionais imediatos ou a longo prazo (MAYER et al., 2020). Nesse contexto, a DASBELI servirá como recurso coadjuvante na realização de ensaios clínicos randomizados com o público pediátrico. Assim, com o seu fácil manuseio e utilização poderá auxiliar na criação e execução de protocolos que visem o ganho de força muscular e funcionalidade de crianças com doenças críticas.  

Outrossim, a disfunção muscular presente em pacientes da UTIP deve ser avaliada de forma adequada, sendo os componentes principais a força e potência muscular. No entanto, a maioria dos profissionais mensuram apenas a força, por ser importante para gerar uma força muscular máxima, como por exemplo para executar tarefas como levantar-se de uma cadeira. Já a potência muscular, pouco avaliada, é a velocidade que a força é produzida (MAYER et al., 2020). Nesse sentido, dispositivos que forneçam um suporte dorsal para a criança também podem auxiliar os profissionais a realizarem uma avaliação mais fidedigna. A DASBELI pode servir como suporte mecânico para estabilizar o tronco, enquanto o profissional aplica testes e escalas para avaliar a função muscular. 

A DASBELI pode ser utilizada para evitar que a FMAUTIP afete a função diafragmática devido a mobilização à beira leito e melhor posicionamento. O diafragma é o principal músculo da respiração. Anatomicamente, é uma estrutura em forma de cúpula. Para manter a respiração contínua, rítmica e ininterrupta, as fibras musculares do diafragma devem ser resistentes à fadiga. O diafragma é inervado pelos nervos frênicos que provêm das raízes nervosas em C3-C5, sendo que para haver a respiração é precisar haver estímulos dos centros cerebrais e dos nervos frênicos (TORTORA e DERRICKSON, 2016).  

Mais que um simples dispositivo de baixo custo, a DASBELI deve ser utilizada pela equipe de profissionais da UTIP, devendo ser mostrado a sua importância para o paciente no sentido de ganhos funcionais e assistência fisioterapêutica segura.  

O presente artigo apresenta algumas limitações a serem destacadas. As camas hospitalares das UTIP não possuem uma padronização quanto ao seu tamanho, dificultando o fato de estabelecer medidas adequadas para cada cama, em alguns casos sendo necessário mais de uma DASBELI em um mesmo serviço. Além disso, os autores encontraram dificuldade para tornar o apoio dorsal mais confortável pela ausência de um material acolchoado.  

Sugere-se a criação de novos estudos que abordem medidas específicas da DASBELI de acordo com cada faixa etária, como também a validação com juízes após implementação do dispositivo nas UTIP. 

CONCLUSÃO 

A fraqueza muscular adquirida na UTI e a disfunção diafragmática induzida pela ventilação mecânica são grandes favorecedores de internação prolongada na UTI, desmame ventilatório difícil, mortalidade e prejuízo funcional na alta de crianças que internam na UTI pediátrica. A sedestação beira leito realizada de forma segura fornece resultados positivos nos marcos funcionais, corroborando para a prevenção de tais desfechos negativos. Um dispositivo que favoreça tal posicionamento, quer pela segurança, quer pela possibilidade da execução de exercícios, pode potencializar os efeitos da mobilização precoce. Logo, a DASBELI surge como uma ferramenta de fácil manuseio, seguro e importante durante todas as etapas de reabilitação.  

REFERÊNCIAS 

BORGES, Mayara Gabrielle Barbosa et al. Prescrição de mobilização precoce em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca: revisão sistemática. Revista Brasileira de Cirurgia Cardiovascular , v. 37, p. 227-238, 2022. 

Sociedade Brasileira de Pediatria. Calendário Puericultura. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/pdfs/CalendarioPuericultura_Jan2014.pdf. Acesso em: 27 mar.2024.  

Sociedade Brasileira de Pediatria. Manual de Neurologia. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/pdfs/MANUAL-AVAL-NUTR2009.pdf Acesso em: 27 de mar.2024. 

MAYER, Kirby P. et al. A perda e a disfunção aguda do músculo esquelético predizem incapacidade física na alta hospitalar em pacientes com doença crítica. Cuidados Críticos , v. 1-12, 2020. 

Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica. Saúde da criança: crescimento e desenvolvimento, Brasília-DF, 2012. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_crianca_crescimento_desenvolvimento.pdfAcesso em: 27 mar. 2024. 

Ministério da Saúde. Caderneta da Criança Menina. Passaporte da Cidadania, Brasília- DF,  5ª edição. 2022. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes /caderneta_crianca_menina_5.ed.pdf. Acesso em: 27 mar.2024.  

Ministério da Saúde. Caderneta da Criança Menino. Passaporte da Cidadania, Brasília- DF,  5ª edição. 2022. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderneta_crianca_menino_5.ed.pdf. Acesso em: 27 mar.2024. 

MIURA, Shinya et al. Normal baseline function is associated with delayed rehabilitation in critically ill children. Journal of intensive care medicine, v. 35, n. 4, p. 405-410, 2020. 

Morrow BM. Building a culture of early mobilization in the pediatric intensive care unit-a nuts and bolts approach. Transl Pediatr. 2021 Oct;10(10):2845-2857. doi: 10.21037/tp-20-324. PMID: 34765506; PMCID: PMC8578759. 

RIBEIRO, Renato Resende de Freitas et al. Construção de um dispositivo auxiliar para sedestação de crianças à beira leito. 2021. 

ROCHA, Fabiano Oliveira et al. O impacto da sedestação beira leito no desmame ventilatório em pacientes em uso de ventilação mecânica invasiva. Brazilian Journal of Development, v. 9, n. 9, p. 27316-27327, 2023. 

VANHOREBEEK, Ilse; LATRONICO, Nicola; VAN DEN BERGHE, Olá. Fraqueza adquirida na UTI. Medicina intensiva , v. 46, n. 4, pág. 637-653, 2020. Mayer KP, Thompson Bastin ML,  


1Universidade do Estado do Pará (UEPA), Belém-PA 
2Universidade do Estado do Pará (UEPA), Belém-PA 
3Universidade do Estado do Pará (UEPA), Belém-PA 
4 Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém-PA