ESTRATÉGIAS E INTERVENÇÕES DE PREVENÇÃO DE COMPLICAÇÕES DECORRENTES DA RUPTURA PREMATURA DE MEMBRANAS EM GESTAÇÕES DE ALTO RISCO

STRATEGIES AND INTERVENTIONS FOR PREVENTING COMPLICATIONS RESULTING FROM PREMATURE RUPTURE OF MEMBRANES IN HIGHRISK PREGNANCY

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202508281536


Vitória Liz Moreira Palácio1*
Fernando Victor Pereira da Rocha1
Isabela Parezi Morselli1
Karoliny Rodrigues Santini Barretto1
Douglas José Angel2


RESUMO 

Introdução: A ruptura prematura de membranas (RPM), definida como o rompimento espontâneo das membranas fetais antes do início do trabalho de parto e, geralmente, antes de 37 semanas de gestação, é um desafio obstétrico significativo. Esta condição complexa e multifatorial, prevalente especialmente em países em desenvolvimento, é uma das principais causas de prematuridade e morbimortalidade neonatal e materna. Objetivo: Descrever as estratégias e intervenções de prevenção de complicações decorrentes da ruptura prematura de membranas em gestações de alto risco em gestações de alto risco, destacando seus benefícios para a gestante e o feto. Metodologia: Estudo de revisão integrativa da literatura científica. As buscas foram realizadas nas bases de dados PubMed e LILACS (via BVS). A amostra foi composta por 25 pesquisas nacionais e internacionais publicadas na faixa temporal entre 2019 e 2025. Resultados e Discussão: A RPM é uma condição prevalente (2-3%, e até 6,58% em países em desenvolvimento) e um grande fator para o parto prematuro. Fatores de risco incluem infecções (como ITU e cervicovaginites), desnutrição, sangramento vaginal, histórico obstétrico (aborto, parto prematuro), diabetes gestacional mal controlado e exposição à poluição do ar. Intervenções como antibioticoterapia, tocólise e suplementação de vitamina C foram analisadas. Conclusão: O manejo da RPM requer uma abordagem multifacetada. A identificação precoce e a gestão de fatores de risco, especialmente infecções e desequilíbrios metabólicos, são cruciais. A antibioticoterapia é uma intervenção eficaz e recomendada. Embora algumas intervenções mostrem potencial, a complexidade da RPM e a ausência de modelos preditivos universais ainda representam desafios. São necessárias mais pesquisas para otimizar os protocolos de tratamento e preencher as lacunas existentes, visando aprimorar os desfechos maternos e neonatais.

Palavras-chave: Ruptura Prematura de Membranas, Parto Prematuro, Intervenções Terapêuticas Obstétricas.

ABSTRACT

Introduction: Prelabor rupture of membranes (PROM), defined as the spontaneous rupture of fetal membranes before the onset of labor and generally before 37 weeks of gestation, is a significant obstetric challenge. This complex and multifactorial condition, especially prevalent in developing countries, is a leading cause of prematurity and neonatal and maternal morbidity and mortality. The study aims to explore strategies and interventions to prevent PROM complications in high-risk pregnancies, highlighting their benefits for both the pregnant woman and the fetus. Methodology: This was an integrative literature review. Searches were conducted in the PubMed and LILACS (via VHL) databases. The sample consisted of 25 national and international studies published between 2019 and 2025. Results and Discussion: PROM is a prevalent condition (2-3%, and up to 6.58% in developing countries) and a major contributor to preterm birth. Risk factors include infections (such as UTIs and cervicovaginitis), malnutrition, vaginal bleeding, obstetric history (abortion, preterm birth), poorly controlled gestational diabetes, and exposure to air pollution. Interventions such as antibiotic therapy, tocolysis, and vitamin C supplementation were analyzed. Conclusion: PROM management requires a multifaceted approach. Early identification and management of risk factors, especially infections and metabolic imbalances, are crucial. Antibiotic therapy is an effective and recommended intervention. Although some interventions show potential, the complexity of PROM and the absence of universal predictive models still present challenges. Further research is needed to optimize treatment protocols and fill existing gaps, aiming to improve maternal and neonatal outcomes.

Keywords: Prelabor Rupture of Membranes, Premature Birth, Obstetric Therapeutic Interventions.

INTRODUÇÃO

A saúde materno-infantil tem sido uma prioridade global desde a virada do milênio, com o objetivo de reduzir a mortalidade materna e infantil, conforme estabelecido nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) e mantido nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030. Houve um aumento notável na expectativa de vida global ao nascer e na expectativa de vida saudável até 2019, embora a pandemia de COVID-19 tenha revertido esse progresso, ressaltando a vulnerabilidade dos avanços em saúde1. Nesse contexto, condições como a Ruptura Prematura de Membranas Pré-parto (RPMP) ou Ruptura Prematura de Membranas (RPM) representam um desafio significativo, especialmente em regiões com altas taxas de mortalidade neonatal e materna, como em países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, onde a RPM contribui substancialmente para esses índices2.

A RPM é definida como a ruptura espontânea das membranas fetais antes do início do trabalho de parto e antes de 37 semanas de gestação. Esta condição complexa e multifatorial resulta do enfraquecimento progressivo das membranas, impulsionado por fatores químicos, mecânicos e, notavelmente, infecciosos3, 4. A infecção intrauterina ascendente da vagina é identificada como uma das principais causas de RPM, e fatores de risco como infecção do trato urinário, corrimento vaginal anormal, sangramento vaginal, histórico de aborto, desnutrição, anemia e diabetes gestacional estão significativamente associados à sua ocorrência2, 3. A prevalência global de RPM varia, mas em um estudo abrangente em países subdesenvolvidos, a prevalência combinada foi de 6,58%, indicando a amplitude do problema2.

A RPM complica cerca de 2% a 3% das gestações e é responsável por uma parcela considerável de nascimentos prematuros (25% a 30%), sendo uma das principais causas de morbidade e mortalidade neonatal, além de morbidade infecciosa materna4. O parto prematuro, frequentemente associado à RPM, é a principal causa de morbidade e mortalidade perinatal3. Embora a gravidez possa ser prolongada por um período de latência após a RPM, variando de horas a semanas, aproximadamente 50% a 60% das mulheres dão à luz na primeira semana. O prognóstico do neonato é fortemente influenciado pela idade gestacional no momento do nascimento, mas a exposição fetal à inflamação e infecção intrauterina, bem como complicações obstétricas agudas como descolamento prematuro da placenta ou prolapso do cordão umbilical, pode aumentar a mortalidade e morbidade a curto e longo prazo4.

Diante da complexidade e dos riscos associados à RPM, as equipes médicas enfrentam o desafio de equilibrar os benefícios de prolongar a gravidez para reduzir as consequências da prematuridade com os riscos de infecção intrauterina e complicações agudas. A prevenção primária e secundária do parto prematuro, incluindo a RPM, é desafiadora devido à ausência de modelos preditivos validados e intervenções preventivas universalmente eficazes, embora alguns fatores de risco tenham sido identificados4. No entanto, estratégias como o controle e a prevenção de infecções pré-natais e a atenção à desnutrição são altamente recomendadas para reduzir a incidência da RPM, especialmente em populações de risco2.

Nesse contexto, este estudo tem como objetivo apresentar, por meio de uma pesquisa literária, as principais estratégias e intervenções disponíveis para prevenir as complicações da ruptura prematura de membranas em gestações de alto risco. Serão explorados os benefícios dessas abordagens tanto para a gestante quanto para o feto, visando contribuir para a melhoria dos desfechos perinatais e maternos.

MÉTODO 

Trata-se de um estudo de revisão integrativa que tem como finalidade uma análise ampla da literatura, sintetizando os resultados obtidos em pesquisas a partir de uma questão de pesquisa. Os passos metodológicos da revisão foram: 1) Identificação do tema apresentado em forma de questão; 2) Definição dos critérios de inclusão e exclusão dos estudos; 3) Seleção da amostra; 4) Inclusão dos estudos selecionado; 5) Análise dos resultados com a identificação de similaridades.

Esta revisão adota, portanto, a seguinte pergunta de pesquisa: ”Quais são as estratégias e intervenções para prevenir ruptura prematura de membranas em gestações de alto risco?”. Utilizou-se as bases de dados: PUBMED,Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs). A LILACS foi acessada pelo site da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS). Fez-se o uso dos seguintes descritores “Ruptura Prematura de Membranas Fetais / Rotura Prematura de Membranas Fetales / Fetal Membranes Premature Rupture”, ”prevenção & controle / prevención & control / prevention and control”, foi utilizado na pesquisa booleano “AND” e “OR” para combinar os descritores entre eles.

Os critérios de inclusão foram artigos disponíveis na íntegra, publicados no idioma português, inglês e espanhol, no período de janeiro de 2019 a junho de 2025. Já os critérios de exclusão foram artigos que estavam indexados repetidamente, publicações não disponíveis na íntegra, incompatibilidade com o tema e que não atendem o objetivo da pesquisa.

Conforme os critérios indicados, inicialmente foram encontrados 992 artigos, sendo 68 na base de dados LILACS; e 924 na base de dados da PubMed.

Após a realização das buscas nas bases de dados, os artigos identificados foram rastreados por seus títulos e resumos para verificar a relevância inicial. A seleção final foi realizada por dois revisores de forma independente, e em caso de divergência, um terceiro revisor foi consultado para diminuir o conflito.

A ilustração 1 mostra o processo de seleção dos estudos conduzidos conforme as diretrizes do Fluxograma PRISMA.

Ilustração 1: Fluxograma PRISMA do método de pesquisa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A ruptura prematura de membranas (RPM), definida como o rompimento espontâneo das membranas fetais antes do início do trabalho de parto e, particularmente, antes de 37 semanas de gestação, representa um dos maiores desafios na prática obstétrica. Compreender as intervenções e seus impactos é fundamental para o manejo eficaz dessa condição. A Tabela 1 demonstra uma visão consolidada das estratégias e abordagens mais relevantes para a RPM e seus principais desfechos.

Tabela 1 – Principais Estratégias e Intervenções para RPM e Seus Desfechos

*RPM – ruptura prematura de membranas
**ITU – Infecção do trato urinário
***DMG – Diabetes Mellitus Gestacional **** HbA1c – Hemoglobina Glicada

A ruptura prematura de membranas (RPM), definida como o vazamento de líquido amniótico antes do início do trabalho de parto e, especialmente, antes de 37 semanas de gestação, representa um dos mais significativos desafios na prática obstétrica contemporânea. Reconhecida como uma condição complexa e multifatorial, a RPM resulta do enfraquecimento progressivo das membranas fetais, sob a influência de fatores químicos, mecânicos e infecciosos4, 13. Globalmente, sua incidência varia, complicando entre 2% e 3% das gestações4. No entanto, em contextos de países em desenvolvimento, essa prevalência pode ser substancialmente maior; uma meta-análise conduzida na Etiópia, por exemplo, revelou uma prevalência combinada alarmante de 6,58%, sublinhando o impacto desproporcional dessa condição em regiões com taxas persistentemente elevadas de mortalidade neonatal e materna2. A RPM é um fator preponderante para nascimentos prematuros, sendo responsável por aproximadamente 25% a 30% desses eventos, e figura como uma das principais causas de morbidade e mortalidade neonatal, além de contribuir significativamente para a morbidade infecciosa materna4.

A despeito da ruptura das membranas, a gestação pode, em alguns casos, prolongar-se por um período de latência, que varia de poucas horas a várias semanas. Contudo, a realidade demonstra que uma parcela considerável de 50% a 60% das mulheres com RPM entrará em trabalho de parto na primeira semana após o evento. Embora o prognóstico neonatal seja primariamente determinado pela idade gestacional no momento do nascimento, a exposição prolongada do feto à inflamação e infecção intrauterina, juntamente com a ocorrência de complicações obstétricas agudas como descolamento prematuro de placenta e prolapso do cordão umbilical, pode agravar significativamente a mortalidade e morbidade a curto e longo prazo4. Em recém-nascidos a termo, observou-se que um período de latência da RPM superior a 16 horas eleva substancialmente o risco de pneumonia de início precoce, sendo pneumonia e sepse as infecções mais comumente identificadas nessas situações23.

A identificação dos fatores de risco e a detecção precoce são cruciais para a prevenção de complicações da RPM. A infecção intrauterina ascendente da vagina tem sido consistentemente reconhecida como uma das principais causas da RPM3. Além disso, uma gama de fatores como infecção do trato urinário, corrimento vaginal anormal, sangramento vaginal, histórico de aborto, desnutrição, anemia e diabetes gestacional estão significativamente associados à sua ocorrência2. Em um estudo retrospectivo abrangente, características maternas como nuliparidade, histórico prévio de parto prematuro, conização cervical e um comprimento cervical reduzido (inferior ou igual a 25 mm no primeiro trimestre de gravidez) foram identificadas como preditores significativos de RPM20. Adicionalmente, o ambiente externo também desempenha um papel, com a exposição pré-natal à poluição do ar – em particular o material particulado durante o sexto e sétimo meses de gestação – associada a um risco aumentado de RPM, especialmente em gestantes com baixo peso19. No contexto de gestantes com diabetes mellitus gestacional (DMG), um controle glicêmico inadequado e o ganho de peso excessivo foram destacados como fatores de risco para RPM, sugerindo que o monitoramento de marcadores como HbA1c, insulina e HOMA-IR pode oferecer uma previsão eficaz do risco de RPM nessa população21. No entanto, a complexidade na determinação de fatores causais definitivos é evidente; um estudo multicêntrico conduzido no Brasil, ao investigar a influência do tabagismo ativo e passivo no parto prematuro espontâneo, observou uma maior incidência em gestantes fumantes, mas a análise multivariada não conseguiu confirmar a causalidade, e o fumo passivo não foi associado a um aumento significativo no risco de parto prematuro ou desfechos neonatais adversos22. Isso sublinha a necessidade de análises aprofundadas e a compreensão de que as relações de causa e efeito na etiologia da prematuridade são frequentemente multifacetadas.

Diante dos riscos, diversas estratégias e intervenções têm sido propostas e estudadas para prevenir as complicações da RPM. Entre elas, a tocolise, que visa inibir as contrações uterinas e prolongar a gestação, permanece como uma prática controversa no manejo da RPM4, 9, 12. Apesar de seu potencial para permitir a administração completa de corticosteroides pré-natais e mitigar os riscos associados à prematuridade, a tocólise pode, paradoxalmente, prolongar a exposição fetal a ambientes intrauterinos inflamados ou infectados, o que pode resultar em desfechos adversos a longo prazo4, 12. Historicamente, ensaios clínicos sobre tocólise na RPM, muitos conduzidos antes da ampla adoção de esteroides e antibióticos, apresentaram resultados inconclusivos quanto à extensão do período gestacional e à melhoria dos resultados neonatais, frequentemente limitados por pequeno tamanho amostral e vieses metodológicos4. Mais recentemente, uma análise de políticas unitárias sobre o uso de tocólise após RPM não demonstrou associação com melhores desfechos obstétricos ou neonatais a curto e longo prazo9. Contudo, é notável que tocolíticos como betamiméticos e bloqueadores dos canais de cálcio (BCCs), em particular a nifedipina, mostraram-se benéficos no prolongamento da gravidez em comparação com placebo em casos de trabalho de parto prematuro. A nifedipina, especificamente, é amplamente utilizada devido ao seu perfil de segurança favorável, facilidade de administração oral e custo acessível, embora sua aplicação direta em contextos de RPM ainda mereça mais estudos aprofundados4. Uma pesquisa recente confirmou que não houve diferença nos resultados de neurodesenvolvimento aos 5,5 anos de idade entre crianças expostas ou não à tocólise pré-natal após RPM, corroborando que seus benefícios para a saúde a longo prazo ainda aguardam comprovação robusta12.

A antibioticoterapia é outra intervenção fundamental e recomendada em casos de RPM pré-termo, com o propósito de estender o período de latência, diminuir o risco de corioamnionite clínica e aprimorar o desfecho neonatal3, 7, 8, 9. A profilaxia antibiótica em cenários de RPM tem sido associada a uma redução significativa da infecção intra-amniótica e a uma melhora global nos desfechos neonatais. No entanto, a determinação do regime antibiótico ideal ainda constitui um desafio, dada a insuficiência de dados conclusivos8. Estudos comparativos de diferentes regimes de profilaxia antibiótica revelam que a cefalosporina de terceira geração ou combinações que cobrem Streptococcus agalactiae e Escherichia coli foram associadas a uma melhor sobrevida neonatal sem morbidade grave em comparação com a amoxicilina, sem evidência de aumento da sepse neonatal por patógenos resistentes10. Outra investigação apontou que a combinação de cefuroxima com roxitromicina prolongou de forma significativa o período de latência e reduziu a sepse precoce por gram-negativos em comparação com ampicilina e roxitromicina8. Em particular, a claritromicina intravenosa demonstrou a capacidade de reduzir a intensidade da resposta inflamatória intra-amniótica, conforme medido pela diminuição dos níveis de interleucina-6 no líquido amniótico, tanto em casos de infecção quanto de inflamação intra-amniótica estéril. Além disso, a claritromicina foi associada a uma redução na carga de DNA de Ureaplasma spp no líquido amniótico7. Similarmente, regimes antibióticos que incluíam azitromicina apresentaram vantagens estatisticamente significativas sobre a eritromicina, resultando em menores taxas de corioamnionite clínica, sepse neonatal e endometrite pósparto6. Esses achados enfatizam a necessidade de que os regimes antibióticos sejam abrangentes em seu espectro microbiológico e eficazes na atuação contra os fatores infecciosos que contribuem para a gravidade da infecção3.

Além das intervenções farmacológicas, outras abordagens e tecnologias têm sido exploradas para o manejo e prevenção das complicações da RPM. A suplementação de vitamina C, embora com resultados inicialmente conflitantes na literatura, foi indicada por uma meta-análise de 25 estudos como potencialmente eficaz na redução do risco de RPM, especialmente em mulheres que a desenvolveram prematuramente e apresentavam níveis significativamente mais baixos da vitamina13. Para pacientes com histórico de parto prematuro espontâneo, o caproato de 7α-hidroxiprogesterona (17P) demonstrou potencial para atrasar o parto prematuro e mitigar complicações, seja o parto prematuro anterior devido a contrações ou à própria RPM14. No que tange a danos iatrogênicos, como os que ocorrem após cirurgias fetais (ex: coagulação a laser para síndrome da transfusão feto-fetal), a ruptura de membranas é uma complicação frequente15, 16. O uso de um fetoscópio ultrafino tem se mostrado promissor ao aumentar o intervalo entre o procedimento e o parto, elevando a idade gestacional no nascimento e melhorando a sobrevida fetal15. Além disso, pesquisas ex-vivo indicam que patches semirrígidos revestidos com hidroxipropilmetilcelulose (HPMC) podem efetivamente selar defeitos iatrogênicos em membranas fetais sem evidência de toxicidade celular, sugerindo uma solução promissora para o futuro da medicina fetal16. Por outro lado, é crucial abordar práticas que, embora comuns, não possuem respaldo científico. A restrição de atividades, apesar de frequentemente prescrita, não é recomendada rotineiramente para prevenir o parto prematuro em diversos cenários clínicos, incluindo a RPM, pois as evidências atuais não demonstram melhora nos resultados obstétricos e, pelo contrário, apontam para riscos físicos e psicossociais significativos17. Por fim, o uso do partograma foi observado como mais frequente em puérperas que tiveram ruptura prematura de membranas em uma maternidade brasileira18. Embora não seja uma intervenção preventiva direta para a RPM, o partograma se destaca como uma ferramenta valiosa no manejo e monitoramento de gestações que cursam com essa complicação.

Apesar dos avanços e das diversas estratégias exploradas, a prevenção primária e secundária do parto prematuro, incluindo a RPM, permanece um desafio complexo. A identificação de modelos preditivos validados e intervenções preventivas universalmente eficazes ainda é uma lacuna na pesquisa, visto que grande parte das mulheres com RPM não apresenta fatores de risco claramente definidos4. Assim, a pesquisa continua a evoluir, buscando refinar os regimes antibióticos mais eficazes, avaliar a segurança e o benefício a longo prazo dos tocolíticos, e desenvolver novas tecnologias para a selagem de membranas. A ênfase contínua na prevenção e controle de infecções pré-natais, juntamente com a atenção à desnutrição, mantém-se como pilares fundamentais para a redução da incidência e das complicações da RPM2, 24.

É imperativo que os resultados obtidos impulsionem a mobilização de iniciativas de saúde pública. Isso se deve ao fato de que diversos elementos que contribuem para o parto prematuro, assim como a RPM, são passíveis de intervenção e se relacionam com cenários de vulnerabilidade social e barreiras no acesso à assistência em saúde25.

A Tabela 2 faz uma síntese de recomendações primordiais no atendimento às gestantes que apresentem alguma característica de risco à ruptura prematura de membrana e consequente evolução ao parto prematuro.

Tabela 2 – Recomendações para a Prática Clínica na Prevenção e Identificação de Risco da Ruptura Prematura de Membranas (RPM) em Gestantes de Alto Risco.

RECOMENDAÇÃOJUSTIFICATIVA
1Controle e Prevenção de Infecções: Enfatizar a prevenção e o controle de infecções pré-natais (ex: Infecção do Trato Urinário, corrimento vaginal anormal).Infecção intrauterina ascendente é a
principal causa de RPM. Infecções
pré-natais estão significativamente
associadas à RPM. 2, 3, 4
2Manejo Nutricional: Abordar a desnutrição materna.Desnutrição é um fator de risco
associado à RPM. 2
3Suplementação de Vitamina C: Considerar a suplementação em gestantes de risco.Mulheres com RPM, especialmente
prematura, têm níveis mais baixos de
Vitamina C; a suplementação parece reduzir o risco.13
4Monitoramento Glicêmico Rigoroso: Realizar monitoramento de HbA1c e insulina em gestantes com Diabetes Mellitus Gestacional (DMG)Controle glicêmico inadequado e ganho de peso são fatores de risco
para RPM em DMG; esses exames predizem o risco.21
5Avaliação de Fatores de Risco Maternos: Investigar histórico de parto prematuro anterior, conização cervical e comprimento cervical curto.São preditores significativos de RPM.20
6Aconselhamento sobre Poluição do Ar: Orientar gestantes sobre a exposição à poluição do ar, especialmente no 6º e 7º mêsExposição pré-natal à poluição do ar
(material particulado) está associada a risco aumentado de RPM. 19
CONCLUSÃO

Este trabalho teve como objetivo principal analisar as principais estratégias e intervenções para o manejo da ruptura prematura de membranas (RPM) em gestantes, com foco em fatores de risco, abordagens terapêuticas e desfechos associados. A revisão da literatura revelou que a RPM, uma condição multifatorial e prevalente, especialmente em regiões em desenvolvimento, é uma das principais causas de prematuridade e morbimortalidade perinatal, exigindo uma compreensão aprofundada de sua etiologia e manejo.

Os resultados demonstram que a etiologia da RPM é complexa, com infecções (especialmente as ascendentes), desnutrição, diabetes gestacional mal controlado e até mesmo a exposição à poluição do ar emergindo como fatores de risco significativos. Contudo, a complexidade da causalidade foi evidenciada pela ausência de confirmação de causalidade do tabagismo para o parto prematuro espontâneo em análise multivariada, apesar de uma incidência inicial maior em gestantes fumantes.

No que tange às intervenções, a antibioticoterapia profilática se destaca como uma estratégia eficaz para prolongar o período de latência, reduzir infecções intra-amnióticas e melhorar os desfechos neonatais, com regimes específicos (como cefalosporinas de terceira geração, azitromicina e claritromicina) mostrando-se mais promissores em termos de eficácia e segurança. Em contraste, a tocólise, embora utilizada para prolongar a gestação, permanece controversa, com evidências limitadas de benefício a longo prazo no neurodesenvolvimento e a necessidade de ponderar os riscos de prolongamento da exposição fetal à inflamação e infecção. Outras abordagens, como a suplementação de vitamina C em casos de deficiência, o uso de 17P em histórico de parto prematuro e as inovações na selagem de membranas pós-cirurgia fetal, também apresentam potencial. Por outro lado, a restrição de atividades foi desaconselhada, dada a ausência de benefícios comprovados e os riscos psicossociais.

Em suma, o manejo da RPM exige uma abordagem multifacetada que inclua a identificação precoce de fatores de risco, a prevenção de infecções, o controle de condições maternas subjacentes e a aplicação criteriosa de intervenções baseadas em evidências. Embora avanços significativos tenham sido alcançados, a ausência de modelos preditivos universalmente validados e a complexidade da etiologia da prematuridade ainda representam desafios. Recomenda-se a continuidade de pesquisas robustas para otimizar os protocolos de tratamento e preencher as lacunas existentes, visando aprimorar os desfechos maternos e neonatais.

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1Acadêmico do Curso de Bacharelado em Medicina. Centro Universitário Uninorte, AC, Brasil.

2Orientador e Docente do Curso de Bacharelado em Medicina do Centro Universitário Uninorte, AC, Brasil.

*Autor correspondente: VitoriaLizPalacio@hotmail.com