ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO DO SUICÍDIO: UMA REVISÃO INTEGRATIVA

SUICIDE PREVENTION STRATEGIES: AN INTEGRATIVE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7801565


Eduarda Feitosa Bezerra1
Henrique Jorge Rebouças Júnior2
Paula Almeida Apolinário3
Giovanna Kailany Machado de Oliveira Moura4
Laura Mourão Aragão5
Gabriel dos Santos Medeiros6
Ana Beatriz Vieira Sousa7
Carolina Pedrosa Batista8
Milena Nunes Alves de Sousa9


RESUMO

Introdução: O suicídio é um problema de saúde pública, influenciado por diversos fatores. Dessa forma, vários meios foram desenvolvidos visando a diminuição das taxas deste. Objetivo: Identificar as estratégias à prevenção do suicídio. Metodologia: Foi adotado o método de Revisão Integrativa realizada com buscas nas plataformas do Medical Literature Analysis and Retrieval System Online e seu motor de busca de livre acesso, PUBMED; além da Literatura Latino-Americana e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde e da Biblioteca Virtual em Saúde de Adolescentes, em que foram utilizados Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) em inglês (“Preventive Medicine” AND Suicide AND “Health Strategies”). Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, selecionaram-se 17 artigos que constituíram essa pesquisa. Resultados: O estudo indicou diversas intervenções eficazes para o combate ao suicídio, dividindo-se em sociais, profissionais tecnológicas e governamentais. Conclusão: A aplicabilidade das estratégias citadas culminou na diminuição das taxas de ideação e tentativas de suicídio. Portanto, espera-se que o estudo possa ampliar e apoiar trabalhos que busquem novas alternativas nesse âmbito.

PALAVRAS-CHAVE: Conjunto de Intervenções; Medicina Preventiva; Suicídio

ABSTRACT

Introduction: Suicide is a public health issue being influenced by several factors. In this context, several strategies were developed aimed at reducing autocide rates. Objective: To identify effective strategies in suicide prevention. Methodology: The Integrative Review method was adopted, carried out on search platforms, which are The National Library of Medicine, Virtual Health Library, Virtual Adolescent Health Library and Latin American and Caribbean Literature on Health Sciencesusing descriptors (DeCS) in English “Preventive Medicine AND Suicide AND Health Strategies”, after applying the inclusion and exclusion criteria, seventeen articles were selected that constituted this research. Results: The study indicated several effective interventions to combat suicide, divided into social, technological, governmental and professionals. Conclusion: The applicability of the strategies mentioned culminated in a decrease in the rates of ideation and suicide attempts. Therefore, it is expected that the study can expand and support studies that seek new alternatives in this area.

KEYWORDS: Set of Interventions; Preventive Medicine; Suicide.

1 INTRODUÇÃO

O suicídio, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2022), é considerado uma questão de saúde pública e ocasiona, no mundo, entre 700 mil e 800 mil mortes a cada ano, sendo o número de tentativas cerca de vinte vezes maior. Pesquisas recentes demonstraram que, entre idosos, a ideação suicida e o suicídio eram as intercorrências mentais mais comuns entre idosos brasileiros (MARQUES et al., 2020; SOUSA et al., 2022).

E, após a pandemia de COVID-19, o suicídio subiu notoriamente no ranking de causas de morte em escala mundial, passando de décimo lugar para segundo nos Estados Unidos, por exemplo, especialmente entre adultos jovens. A referida pandemia acentuou determinados fatores de risco para o problema, principalmente em comunidades marginalizadas e em situação de pobreza, as quais não possuem acesso adequado a cuidados de saúde, à estabilidade financeira, à alimentação e à moradia (BLEDSOE; CAPTANIAN; SOMJI, 2021).

É notório que, um dos principais tipos de suicídio, o autocídio é influenciado por diversos fatores, quer sejam sociais, econômicos, religiosos e políticos, variando de acordo com o país e a cultura de cada povo (HAGHPARAST-BIDGOLI et al., 2018). Segundo Grosselli et al. (2021), a partir dos 12 anos de idade, a incidência de pensamentos e de tentativas suicidas crescem exponencialmente, sendo essa forma de autodestruição a terceira causa mais comum de mortes na faixa etária de 15 a 19 anos.

Outro fator impactante sobre as taxas de suicídio é a influência de gênero. Estudo indica que, na Europa, entre homens a taxa de tentativa é menor, no entanto, a frequência de mortes é maior entre eles. Na China, em contrapartida, as estatísticas numéricas se invertem, com as mulheres representando maior número de óbitos. Essa disparidade entre gênero remete diretamente ao método escolhido, sendo as principais formas: intoxicação, enforcamento, armas de fogo etc (SERRANO; DOLCI, 2021).

Tendo em vista a dimensão ocupada pelo suicídio em escala mundial, uma vez que fenômeno é denominado de “tragédia” pela OMS (2002), sinaliza para a criação e implementação de estratégias preventivas (SOUSA et al., 2022), afinal, a prevenção é a principal forma de combater esse mal (KARLSSON et al., 2018; THAPALIYA et al., 2018).

Serrano e Dolci (2021) dividiram os métodos de combate ao problema em estratégias universais e estratégias seletivas. As intervenções universais compreendem as ações em nível territorial e a grupos específicos, indo desde a restrição de compra e venda de armas de fogo, obrigatoriedade de uso de catalisadores nos automóveis e diminuição do número de comprimidos em determinados medicamentos, até campanhas educativas para professores e alunos e combate ao bullying. Por outro lado, as estratégias seletivas são direcionadas à população mais vulnerável, como toxicodependentes, pessoas com doenças graves, presidiários e moradores de rua, os quais apresentam menos assistência e maior risco.

Ademais, a prevenção ao suicídio também é de responsabilidade tanto da esfera social, envolvendo o apoio parental e das instituições às quais cada pessoa está vinculada, como escola, universidade e local de trabalho, quanto dos profissionais de saúde mental. Sabe-se que ambientes caracterizados por falta de apoio social, qualidade de vida precária, histórico familiar de abuso, estresse acadêmico e bullying, aumentam exponencialmente as chances de ocorrência de ideação e tentativas de suicídio. É notório que as relações familiares, o apoio escolar e a integração social são os principais fatores de proteção contra essa intercorrência e, além disso, é necessário que haja serviços de apoio a essas pessoas, de forma a integrar o cuidado (GROSSELLI et al., 2021; SHOIB et al., 2022).

Com relação aos serviços de apoio, Vitale et al. (2021) destacam que programas como terapia cognitivo-comportamental, terapia comportamental e dialética e terapia de aceitação apresentaram grande eficácia na prevenção de suicídio. Além disso, a adoção desses programas vem se mostrando eficaz, como ocorrido na Suécia, que adotou o “Visão Zero para o suicídio”, o qual conta com nove estratégias para buscar a diminuição das taxas desse óbice social o mais rápido possível, sustentando-se em três pilares: aumento da atuação profissional de médicos e psicólogos, aumento da competência em relação aos cuidados e análise de acidentes críticos.

Outro programa estratégico que apresentou resultados positivos foi o “Youth Aware of Mental Health”, o qual consiste na conscientização e uma triagem realizada por indivíduos treinados para identificar possíveis situações de risco. Estudo randomizado controlado multicêntrico, apresentou uma grande diminuição na ideação e nas tentativas de suicídio em um período de 12 meses a partir da implementação da mencionada intervenção (GROSSELLI et al., 2021).

Dessa forma, tem-se como objetivo identificar as estratégias à prevenção do suicídio, uma vez que esta pesquisa poderá ampliar e apoiar trabalhos que busquem novas alternativas nesse âmbito e de fortalecer os esforços já existentes, a partir da participação da comunidade científica, dos profissionais em saúde mental e da sociedade representada por suas principais e poderosas instituições sociais (GROSSELLI et al., 2021; SHOIB et al., 2022).

2 MÉTODO

O presente estudo configura-se como uma revisão sistemática integrativa da literatura (RIL). Tal método de pesquisa bibliográfica constitui-se na busca de material já elaborado sendo estes, principalmente, artigos científicos, com o intuito de revisar a literatura existente, referente à temática de estudo sendo, dessa forma, fundamental na pesquisa científica (SOUSA, 2016; HERMONT et al., 2021).

Primordialmente, foram identificados os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), de forma a selecionar aqueles considerados mais adequados na construção da pesquisa. Utilizou-se, então, as combinações destes descritores na língua inglesa (“preventive medicine” AND suicide AND “health strategies”).

O levantamento bibliográfico foi realizado na Internet nas bases de dados Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) e seu motor de busca de livre acesso, PUBMED, desenvolvidos e mantidos pela Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos; além da Literatura Latino-Americana e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (LILACS) e da Biblioteca Virtual em Saúde de Adolescentes (ADOLEC – Brasil). Tal estudo foi realizado pelos autores no mês de janeiro de 2023.

Na etapa subsequente, além de realizar a pesquisa pelos DeCS, foram aplicados os critérios de inclusão definidos. No PUBMED tais critérios foram: texto completo grátis; publicados nos últimos 5 anos, sendo obtidos, ao final, 91 artigos. Enquanto no MEDLINE e no LILACS, utilizou-se: texto completo; publicados entre 2018 e 2022, verificando-se a existência de, respectivamente, 56 e 1 artigo. Na ADOLEC não foram utilizados critérios de inclusão e foram identificados 2 artigos. Somados, foram obtidos 150 artigos em todas as bases de dados (Figura 1).

Ademais, foi feita uma análise crítica dos estudos, excluindo as produções duplicadas e aquelas que não respondiam à pergunta de pesquisa escolhida, sendo esta: “quais estratégias podem ser utilizadas para a prevenção do suicídio?”, obtendo-se uma amostra final de 17 artigos.

Figura 1: Fluxograma representativo da escolha do material selecionado

Fonte: Dados de pesquisa em base de dados, 2023.

Os dados obtidos foram organizados por meio de quadros no Microsoft Word, configurando os resultados de acordo com as seguintes variáveis: Autores/Ano, título do artigo, idioma e país, periódico, tipo de estudo, bases de dados e principais resultados. Além disso, foram montadas as categorias e subcategorias dos artigos selecionados para basear a pesquisa. Ao final, efetivou-se a discussão, interpretação e síntese da RIL.

3 RESULTADOS

No quadro 1, verificou-se que o tipo de estudo que mais prevaleceu foi a revisão sistemática de literatura, n=6 (35,2%). Dos 17 artigos analisados, n=16 (94,1%) são derivados da língua inglesa e n=7 (41,1%) foram publicados, prevalente-mente, no ano de 2021. Em relação à base de dados, dos artigos estudados, n=9 (52,9%) foram publicados na base de dados PUBMED. No comparativo dos países onde foram realizados os estudos dos artigos selecionados, os Estados Unidos prevaleceram com maior quantidade de publicações da amostra de artigos escolhidos, n=6 (35,2%).

Quadro 1: Caracterização geral dos artigos selecionados para compor a RIL. Patos, 2023.

Autores (Ano)TítuloIdioma e PaísPeriódicoTipo de EstudoBase de dados
Berrouiguet et al. (2019).Combining mobile-health (mHealth) and artificial intelligence (AI) methods to avoid suicide attempts: the Smartcrises study protocol.Inglês/ Espanha e FrançaBMC PsychiatryEnsaio clínico controladoMEDLINE
Bledsoe et al. (2021).Special Report from the CDC: Strengthening social connections to prevent suicide and adverse childhood experiences (ACEs): Actions and opportunities during the COVID-19 pandemic.Inglês/ EUAJournal of safety researchEstudo EtiológicoPUBMED
Brenna et al. (2021).Innovations in suicide assessment and prevention during pandemics.Inglês/ CanadáPublic Health Research & PracticeRevisão Sistemática de literaturaPUBMED
Cerulli et al. (2019).Public Health Law Strategies for Suicide Prevention Using the Socioecological Model.Inglês/ EUAJ Law Med EthicsEstudo observacionalMEDLINE
Conejero et al. (2020).Épidémie de COVID-19 et prise en charge des conduites suicidaires : challenge et perspectives.Francês/ FrançaEncephaleEstudo prognósticoMEDLINE
Dorol-Beauroy-Esustache et al. (2021).Systematic review of risk and protective factors for suicidal and self-harm behavoirs among children and adolescents involved with children and adolescents involved with cyberbullyingInglês/ EUAPreventive MedicineRevisão Sistemática de LiteraturaPUBMED
Forte et al. (2021)The Role of New Technologies to Prevent Suicide in Adolescence: A Systematic Review of the Literature.Inglês/ SuíçaMedicina (Kaunas)Revisão Sistemática de LiteraturaADOLEC
Grosselli et al. (2021)Dos and Don’ts in Designing School-Based Awaness Programs for Suicide PreventionInglês/ CanadáCrisis: The Journal of Crisis Intervention and Suicide PreventionPesquisa DelphiPUBMED
Grummitt et al. (2022.)Selective personality-targeted prevention of suicidal ideation in young adolescents: post hoc analysis of data collected in a cluster randomised controlled trial.Inglês/ AustráliaThe Medical Journal of AustraliaEstudo randomizadoADOLEC
Jo et al. (2019).Effects of a Province-Based Strategy to Prevent Suicide Using Charcoal Burning: A Preliminary Time Series AnalysisInglês/ Coréia do SulPsychiatry investigationEstudo observacionalPUBMED
Malakouti et al. (2020).Effectiveness of self-help mobile telephone applications (apps) for suicide prevention: A systematic review.Inglês/ IrãMed J Islam Repub IranRevisão sistemática de literaturaPUBMED
Martinengo et al. (2019).Suicide prevention and depression apps’ suicide risk assessment and management: a systematic assessment of adherence to clinical guidelines.Inglês/ CingapuraBMC MedGuia de prática clínicaMEDLINE
Sal et al. (2019).Assessment and Management of Patients at Risk for Suicide: Synopsis of the 2019 U.S. Department of Veterans Affairs and U.S. Department of Defense Clinical Practice Guidelines.Inglês/ EUAAnn Intern MedGuia de prática clínicaMEDLINE
Serrano et al. (2021).Suicide prevention and suicidal behavior.Inglês/ MéxicoGaceta Médica de MexicoRevisão sistemática de literaturaPUBMED
Shoib et al. (2022).Facebook and Suicidal Behaviour: User Experiences of Suicide Notes, Live-Streaming, Grieving and Preventive Strategies-A Scoping ReviewInglês/ SuiçaInternational Journal of Environmental Research and Public HealthRevisão de EscopoPUBMED
Steele et al. (2018)Understanding Suicide Across the Lifespan: A United States Perspective of Suicide Risk Factors, Assessment & ManagementInglês/ EUAJ Forensic SciRevisão sistemática de literaturaMEDLINE
Vitale et al. (2021).Effectiveness of Complementary and Integrative Approaches in Promoting Engagement and Overall Wellness Toward Suicide Prevention in Veterans.Inglês/ EUAJournal of alternative and complementary medicineFatores de RiscoPUBMED

De acordo com a categorização do quadro 2, constatou-se que os estudos que evidenciaram intervenções profissionais e tecnológicas foram os principais, com 41,1% (n=7), cada.

Quadro 2: Categorização dos estudos selecionados na pesquisa. Patos, 2023

CategoriasAutores (Ano)n%
Intervenções sociaisBledsoe, Captanian e Somji (2021)
Brenna et al. (2021)
Conejero et al.(2020)
Serrano e Dolci(2021)
Vitale et al. (2021)
529,4
Intervenções profissionaisBerrouiguet et al., (2018)
Conejero et al. (2020)
Dorol-Beauroy-Esustache et al. (2021)
Forte et al. (2021)
Grosselli et al. (2021)
Grummitt et al. (2022)
Vitale et al. (2021)
7 41,1
Intervenções TecnológicasBerrouiguet et al. (2018)
Brenna et al. (2021)
Conejero et al. (2020)
Forte et al. (2021)
Malakouti et al. (2020)
Martinengo et al. (2019)
Shoib et al. (2022)
7 41,1
Intervenções GovernamentaisCerulli et al. (2019)
Conejero et al. (2020)
Jo, Yun e Lee (2019)
Serrano e Dolci (2021). 
Steele et al. (2018)
529,4

4 DISCUSSÃO

Os artigos selecionados no presente estudo compilam as diversas formas de prevenção ao suicídio, indo desde estratégias governamentais até intervenções sociais e profissionais, buscando integrar e potencializar o cuidado. Entre as principais estratégias de prevenção, tem-se: telepsiquiatria, aplicativos de apoio, terapias comportamentais e artísticas, medidas governamentais, apoio familiar, programas sociais etc.

No contexto social, a conscientização é a estratégia mais poderosa, na qual, através da educação de jovens e adultos, busca-se um aumento do acolhimento e a diminuição dos preconceitos com relação às pessoas com tendência suicida, tendo em vista que o ciclo social é uma das principais formas de defesa (STEELE et al., 2018; GROSSELLI et al., 2021). Além disso, as Organizações Não Governamentais (ONG`s) possuem um papel de extrema importância nessa batalha, onde iniciativas como “After School Matters”, em que são oferecidos estágios e outras programações extracurriculares para crianças e adolescentes e “Broomfield Youth for Youth”, que promoveu várias campanhas, acolhem e educam jovens e adultos acerca da prevenção ao autocídio (BLEDSOE; CAPTANIAN; SOMJI, 2021).

Pesquisa realizada no âmbito da adolescência, no período dos 12 aos 18 anos, mostrou que existe uma importante relação entre bullying, notoriamente cyberbullying, e desfechos negativos. Evidenciou-se que a ideação suicida foi mais frequente quando o estresse a que esses jovens são submetidos foi associado a alta motivação de vingança. Emoções negativas, solidão e psico-sofrimento lógico também foram identificados como mediadores da relação entre ideação suicida e cyberbullying (DOROL-BEAUROY-ESUSTACHE et al., 2021).

Segundo Grosseli et al. (2021), a alfabetização em saúde mental e o apoio à busca por tratamento são duas das principais estratégias na batalha contra o suicídio. Além dessas, sabe-se que o fortalecimento das conexões sociais e a aprendizagem emocional e social também são muito importantes, especialmente em contextos em que ainda persistem preconceitos com relação a arbitrariedade dessa fatalidade e baixo acolhimento dessas pessoas (CERULLI et al., 2019, SERRANO; DOLCI, 2021).

Cabe também discutir a necessidade de adaptações das estratégias convencionais já existentes, como a Terapia Cognitivo-Compotamental (TCC), que deve estar voltada ao público a ser abordado. Com base nisso, de acordo com Stanley et al. (2009), foi desenvolvida a Terapia Cognitivo-Comportamental-Prevenção do Suicídio (TCC-SP). Essa abordagem concentra-se no desenvolvimento de habilidades, sejam elas comportamentais, cognitivas ou interativas, com o intuito de auxiliar adolescentes a buscarem meios mais eficazes de enfrentamento, ao serem expostos a problemas e estressores capazes de desencadear crises suicidas. Outro exemplo importante de uma derivação da TCC, baseado nas ideias de Grummitt et al. (2022), é o programa Preventure, desenvolvido na Austrália, o qual usa componentes da terapia cognitivo-comportamental eficazes na prevenção do suicídio. O programa, de acordo com os estudos de Conrod et al. (2016), tem a capacidade de reduzir a sintomatologia da depressão, da psicopatologia externalizante e da ansiedade em um período de até três anos.

Em se tratando, ainda, de métodos não convencionais para a prevenção do suicídio, um dos referenciais que merecem destaque é o modelo psicológico “estresse-diátese”. Este é utilizado na explicação de como atributos genéticos ou biológicos interagem com fatores estressores do ambiente para ocasionar distúrbios como o comportamento suicida. Intervenções baseadas nesse tipo de abordagem permitem a execução de ações mais efetivas e precisas, que podem ser de três tipos: a) intervenções seletivas, voltadas a grupos de alto risco, b) intervenção universal, destinada à população em geral c) intervenções recomendadas, para grupos de risco aumentado. Essas formas de prevenção mostram-se eficazes no seu papel, desde que sejam abordadas em uma perspectiva ampla, não limitada à visão da saúde pública (SERRANO; DOLCI, 2021). 

Partindo para a abordagem métodos preventivos tradicionais, a terapia farmacológica é uma opção para aqueles que procuram ajuda. Estudos mostram que pacientes com ideação suicida e depressão maior possivelmente são beneficiados por infusões de cetamina. Consoante para Wilkinson et al. (2018), os benefícios dessa escolha farmacológica começam em até um dia após a infusão e prolongam-se por, no mínimo, uma semana.  Ademais, o lítio tem potencial para minimizar o risco de suicídio entre indivíduos com transtorno bipolar ou depressão unipolar (SALL et al., 2019).

Por outro lado, o uso de meios não farmacológicos, como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), possui evidências para reduzir a ideação e o comportamento suicida, sobretudo em pacientes com histórico de violência autodirigida. Esse tipo de terapia auxilia os pacientes na identificação e na ressignificação de pensamentos problemáticos e de padrões de comportamento, com o intuito de que essa estratégia tenha impacto sobre a experiência emocional do potencial paciente. Além disso, existem também evidências sobre a terapia comportamental dialética (DBT), a qual consiste em uma combinação de elementos da TCC, técnicas de atenção plena e treinamento de habilidades, que atuam no auxílio de pacientes com ideação autocida (SALL et al., 2019).

Nesse contexto, diversas outras técnicas são utilizadas para o controle e diminuição de mortes propositais. Evidências crescentes conferem uma associação entre atividade física e a redução de pensamentos autodestrutivos. Além disso, a terapia com acupuntura é oferecida para tratar sintomas de depressão, ansiedade, falta de sono, dor aguda e crônica associados ao risco de autocídio. Ademais, Musicoterapia, higiene do sono e dieta e nutrição – especialmente a ingestão de maiores quantidades de ácidos graxos poliinsaturados (PUFAs), especificamente PUFAs ômega 3, haja vista que sua baixa ingestão confere maior risco – auxiliam de forma bastante significativa no combate a essa problemática (VITALE et al., 2021).

Na perspectiva das intervenções tecnológicas, programas de conscientização têm o papel de educar jovens a reagirem de forma empática e prestativa ao se depararem com colegas que apresentam tendência suicida. Isso é de enorme importância, haja vista que adolescentes geralmente revelam pensamentos desse tipo apenas para seus amigos. O programa “Teen Mental Health First Aid” é uma plataforma que ensina jovens a reagirem de forma adequada a colegas com problemas de saúde mental, demonstrando-se bastante efetivo por aumentar a qualidade das intenções de apoio a colegas em situações de risco. Esse fato evidencia que estudos futuros devem considerar os efeitos de programas de prevenção mais gerais, a exemplo de programas educativos sobre saúde mental, em tentativas e pensamentos suicidas (GROSSELLI et al., 2021).

Conforme defendido por Pompili e Maurílio (2018), as novas tecnologias não substituiriam as estratégias existentes, e sim seriam complementares a elas. As ferramentas tecnológicas também despontam como modelo não-tradicional de enfrentamento desse problema de saúde pública. Nesse sentido, a telepsiquiatria emerge como instrumento adequado para atingir indivíduos caracterizados pelo baixo envolvimento com unidades de saúde tradicionais. Além disso, a telemedicina já se mostra uma promissora metodologia na identificação de comportamentos suicidas, sendo analisada em diversas oportunidades nas quais demonstrou, em parte significativa, uma boa aceitação por parte dos usuários. Desse modo, é evidente a importância de intervenções que tenham como base essas novas tecnologias (FORTE et al., 2021).

Hodiernamente, as mídias sociais, especialmente o Facebook, despontam como um dos pilares na busca por estratégias de prevenção. Numerosos casos de usuários postando suas intenções publicamente nessa plataforma antes de morrer foram documentados. Expressar intenção suicida por meio de plataformas de mídia social pode ser visto como uma forma não convencional de buscar ajuda, o que incentivou pesquisadores a procurarem maneiras de usar esse meio para prevenir mortes propositais. Esforços no que tange à capacitação de usuários de mídia social, a exemplo da formação de grupos de apoio, e a análise das postagens em Facebook por meio de modelos multitarefa da rede neural artificial são ferramentas possivelmente capazes de prever o risco de suicídio do usuário, sendo o reconhecimento o primeiro passo para prevenção (OPHIR et al., 2020; SHOIB et al., 2022).

Diante disso, dentre as estratégias inovadoras para o suporte de pessoas com ideias suicidas com o uso da tecnologia, a utilização de programas, em smartphones, permite desenvolver uma forma de avaliação que pode rastrear com maior precisão os sintomas e os riscos dos pacientes entre as visitas ambulatoriais de acompanhamento. Avanços na tecnologia de sensores e métodos de inteligência artificial (IA) permitem novas perspectivas para a avaliação ecológica do comportamento. Ingestão de alimentos e distúrbio do sono não são um dos fatores de risco comumente rastreados no monitoramento de risco de suicídio de rotina. Entretanto, essas informações clínicas podem desempenhar um papel salutar na identificação e previsão do risco (BERROUIGUET et al., 2018).

Por fim, é pertinente salientar que, levando em consideração a popularidade crescente dos aplicativos para smartphones, notadamente entre os adolescentes, e a dificuldade de realizar o encaminhamento de alguns indivíduos para acompanhamento presencial devido ao estigma social, longa distância aos prestadores de serviço, desconfiança na relação terapeuta-paciente, etc., projetar esse tipo de aplicativo e avaliar sua eficácia pode ser uma abordagem inovadora para mitigar o risco de suicídio, principalmente em adolescentes. No entanto, em decorrência do número insuficiente de estudos RCT, foi estabelecido que a melhor forma de usufruir desse mecanismo é usar esses aplicativos em conjunto ao tratamento usual (MARTINENGO et al., 2019; MALAKOUTI et al., 2020).

Em relação à esfera governamental, Serrano e Dolci (2021) afirmam que as intervenções a nível governamental devem contemplar toda a sociedade, tendo como objetivo principal a redução dos vários fatores que levam a ideação suicida, tais como: depressão, desesperança, falta de apoio social, entre outros. Além disso, uma ferramenta muito poderosa é a redução do acesso a métodos letais, tal como ocorrido na Coréia do Sul, onde o governo dificultou o acesso ao carvão vegetal, uma das principais formas de morte proposital no país em determinado período, apresentando uma diminuição de cerca de 0,5% no ano seguinte (JO; YUN; LEE, 2019).

Na perspectiva individual, Conejero et al. (2020) fez uma análise associando a recessão econômica durante o período da pandemia de COVID-19 e o aumento das taxas de ideação e tentativas de autocídio, na qual a perda de empregos, diminuição de comércio e instabilidade econômica gerou uma sensação de ser um “fardo” em vários indivíduos, aumentando, consequentemente, sua suscetibilidade a quadros suicidas. Já em relação à esfera coletiva, sabe-se que a maioria dos países não investe o suficiente na pauta de prevenção, em que a desigualdade econômica, a integração social e a qualidade do sistema de saúde são fatores de risco que afetam diretamente as políticas de prevenção (CONEJERO et al., 2020; SERRANO; DOLCI, 2021).

Além disso, durante a pandemia de COVID-19, fatores como o isolamento, distanciamento físico e o medo, amplamente disseminado durante o período, podem ter impactado diretamente na saúde mental das pessoas, principalmente naquelas já propensas à ansiedade e a doenças psiquiátricas, como idosos e moradores de rua, elevando sua predisposição à ideação e a tentativas de autocídio (CONEJERO et al., 2020; BRENNA et al., 2021). Ainda, fatores de risco diversos influenciam num comportamento suicida (BONFIM et al., 2015), como as crises econômicas (SANTOS et al., 2021).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os achados desta revisão identificaram amplas formas de prevenir o suicídio, destacando as intervenções de cunho social, profissional, tecnológico e governamental. Essas formas de prevenção englobam desde métodos mais tradicionais, como a atuação ativa dos profissionais em saúde mental, a formas inovadoras de se combater o suicídio, a exemplo do uso de redes sociais e aplicativos para esse fim.

Deste modo, os objetivos deste estudo foram alcançados, posto que foram identificadas variadas estratégias de prevenção ao suicídio e, tendo em vista os benefícios das intervenções multifacetadas, recomenda-se o uso de formas alternativas às tradicionais nessa prevenção, destacando a importância de mais estudos com essa perspectiva.

REFERÊNCIAS

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1ORCID: https://orcid.org/0009-0000-4894-4236 /Centro Universitário de Patos, Brasil.
2ORCID: https://orcid.org/0009-0001-9079-5729 /Centro Universitário de Patos, Brasil.
3ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2974-1406 /Centro Universitário de Patos, Brasil.
4ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3021-7481 /Centro Universitário de Patos, Brasil.
5ORCID: https://orcid.org/0009-0001-1681-686X /Centro Universitário de Patos, Brasil.
6ORCID: https://orcid.org/0009-0005-2795-8862 /Centro Universitário de Patos, Brasil.
7ORCID: https://orcid.org/0009-0001-7015-1619 /Centro Universitário de Patos, Brasil.
8ORCID: https://orcid.org/0009-0009-8386-2741 /Centro Universitário de Patos, Brasil.
9ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8327-9147 /Centro Universitário de Patos, Brasil.


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