ESTRATÉGIAS DE MANEJO E CUIDADOS ESPECÍFICOS DE UM PACIENTE COM FIBROSE PULMONAR: RELATO DE EXPERIÊNCIA EM UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DE SERGIPE VINCULADO A REDE EBSERH

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10248262208


Paula Akemi Fujishima1
Gilton José Ferreira da Silva2


RESUMO

Objetivo: Descrever e analisar as estratégias de manejo e cuidados específicos adotados para um paciente com fibrose pulmonar internado na Clínica Médica 2 no Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe, vinculado à EBSERH. Relato de experiência: Destaca o caso de um paciente com fibrose pulmonar idiopática avançada, abordando desde a admissão com sintomas graves até o manejo multidisciplinar que incluiu tratamento antifibrótico, fisioterapia respiratória e cuidados paliativos. A intervenção foi focada em minimizar a progressão da doença e melhorar a qualidade de vida, apesar da inevitável progressão para insuficiência respiratória terminal. Considerações finais: O relato enriqueceu o entendimento reforçaram a importância de uma abordagem integral que combina terapias específicas e suporte paliativo, ressaltando a necessidade de uma equipe multidisciplinar bem capacitada para proporcionar cuidado holístico e humanizado a pacientes com doenças pulmonares avançadas.

Palavras-chave: Fibrose Pulmonar, Cuidados Paliativos, Manejo Multidisciplinar.

INTRODUÇÃO

A fibrose pulmonar, uma condição crônica e progressiva, caracteriza-se pelo espessamento e cicatrização do tecido pulmonar, resultando em comprometimento da função respiratória e, eventualmente, insuficiência respiratória. Embora as causas específicas da fibrose pulmonar possam variar, incluindo fatores ambientais, genéticos e doenças autoimunes, a condição frequentemente leva a um prognóstico desfavorável, com uma taxa de mortalidade elevada entre os afetados (RAGHU, 2018).

A patogênese da fibrose pulmonar envolve uma complexa interação entre fatores inflamatórios e processos de reparo tecidual anormais, resultando na deposição excessiva de colágeno e outras proteínas da matriz extracelular. Esse processo leva à perda da elasticidade pulmonar e à formação de áreas de fibrose, que comprometem a troca gasosa eficaz e a ventilação alveolar (WOLTERS, P. J.; COLLARD, H. R.; JOGAN, R. J., 2014).

O manejo da fibrose pulmonar requer uma abordagem multidisciplinar que inclui intervenções farmacológicas, terapias respiratórias, suporte nutricional e, em casos avançados, transplante pulmonar. Tratamentos antifibróticos, como a pirfenidona e o nintedanibe, têm mostrado eficácia em retardar a progressão da doença, embora não revertam a fibrose existente (KING, T. E. et al., 2014; RICHELDI, L. et al., 2014).

Além disso, cuidados paliativos são essenciais para melhorar a qualidade de vida dos pacientes, aliviando sintomas como dispneia e tosse crônica. A educação do paciente e da família sobre a doença e o envolvimento ativo em decisões de cuidado são cruciais para o manejo eficaz da fibrose pulmonar (SWIGRIS, J. J. et al., 2011).

O Brasil, reconhecendo a gravidade da fibrose pulmonar, tem avançado em políticas públicas voltadas para o diagnóstico precoce e o acesso a tratamentos especializados, buscando melhorar os desfechos clínicos e a qualidade de vida dos pacientes (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020).

RELATO DE EXPERIÊNCIA

Este relato descreve o cuidados com um paciente com fibrose pulmonar internado na Clínica Médica 2 de um Hospital Universitário de Sergipe vinculado a rede EBSERH. O paciente, identificado aqui como Sr. J.M.[2], um homem de 58 anos, foi admitido com um quadro de dispneia progressiva, tosse seca persistente e fadiga severa. Ele havia sido diagnosticado com fibrose pulmonar idiopática (FPI) dois anos antes da internação e vinha sendo acompanhado ambulatorialmente com tratamento antifibrótico e suporte respiratório intermitente.

Na história clínica, o Sr. J.M. apresentava histórico de tabagismo, tendo cessado o hábito há cinco anos. Ele também tinha antecedentes de hipertensão arterial sistêmica e dislipidemia, controladas com medicação. Não havia relato de doenças autoimunes ou exposições ocupacionais relevantes que pudessem ter contribuído para o desenvolvimento da fibrose pulmonar. Ao longo dos últimos seis meses antes da internação, o paciente relatou piora significativa da dispneia aos esforços, culminando em dispneia em repouso, além de episódios de hipoxemia, que foram controlados parcialmente com oxigenoterapia domiciliar.

Na admissão, o Sr. J.M. apresentava saturação de oxigênio em torno de 88% em ar ambiente, com necessidade de oxigenoterapia contínua para manter níveis adequados de saturação. O exame físico revelou estertores crepitantes bilaterais nas bases pulmonares e baqueteamento digital, sinais característicos de doença pulmonar avançada. A tomografia computadorizada de tórax realizada revelou extensas áreas de reticulação e faveolamento, típicas da FPI em fase avançada, confirmando o diagnóstico inicial.

Durante a internação, foi instituído um plano de manejo multidisciplinar envolvendo a equipe de pneumologia, enfermagem, fisioterapia respiratória, e cuidados paliativos. O tratamento incluiu a continuação do antifibrótico (nintedanibe) para retardar a progressão da doença, associado a corticosteroides para controle de possíveis exacerbações inflamatórias. A fisioterapia respiratória foi intensificada, com exercícios para melhora da ventilação e técnicas para controle da tosse e secreções.

Um dos principais desafios enfrentados foi o manejo da dispneia refratária e a ansiedade relacionada ao medo de sufocamento, comum em pacientes com doenças pulmonares avançadas. A equipe de cuidados paliativos desempenhou um papel crucial, ajustando as doses de opioides para alívio da dispneia e ansiolíticos para controle da ansiedade. Além disso, foi oferecido suporte psicológico tanto para o paciente quanto para sua família, abordando questões relacionadas à progressão da doença e ao prognóstico.

Apesar dos esforços terapêuticos, o Sr. J.M. apresentou piora clínica progressiva, culminando em insuficiência respiratória terminal. Após discussão com a família, foi decidido por uma abordagem de cuidados exclusivamente paliativos, priorizando o conforto e a dignidade do paciente. Ele veio a óbito após três semanas de internação, cercado por seus familiares, em um ambiente de cuidado e respeito.

Este relato destaca a complexidade do manejo de pacientes com fibrose pulmonar avançada e a importância de uma abordagem integrada que inclua tratamentos específicos, suporte sintomático, e cuidados paliativos. A experiência do Sr. J.M. reforça a necessidade de protocolos de cuidado que abordem tanto os aspectos físicos quanto emocionais da doença, visando melhorar a qualidade de vida dos pacientes até o final da vida.

DISCUSSÃO

A experiência relatada no caso do Sr. J.M. ilustra de forma clara e detalhada os desafios enfrentados por pacientes com fibrose pulmonar idiopática (FPI), especialmente na fase avançada da doença. A FPI é uma condição crônica e progressiva caracterizada pela substituição do tecido pulmonar normal por tecido cicatricial, levando à deterioração progressiva da função pulmonar (RICHELDI, L. et al. 2014). O manejo de pacientes com FPI requer uma abordagem multidisciplinar que combine terapias farmacológicas, cuidados paliativos e suporte psicossocial, como demonstrado no caso apresentado.

O tratamento farmacológico com agentes antifibróticos, como a pirfenidona e o nintedanibe, tem se mostrado eficaz na redução da progressão da fibrose em pacientes com FPI, retardando o declínio da função pulmonar (KING, T. E. et al., 2014; RICHELDI, L. et al, 2011). No caso do Sr. J.M., o uso contínuo de nintedanibe refletiu as práticas atuais de manejo de FPI, que visam minimizar a progressão da doença, mesmo em estágios avançados. Embora esses tratamentos sejam eficazes em retardar a progressão, eles não oferecem cura, e o manejo dos sintomas torna-se fundamental, principalmente nos casos em que a doença já avançou consideravelmente.

A implementação de uma abordagem multidisciplinar, como a descrita no relato, é essencial no manejo da FPI, uma vez que a complexidade da doença exige intervenções em múltiplas frentes. A fisioterapia respiratória, por exemplo, desempenha um papel vital na manutenção da capacidade respiratória e na melhora da qualidade de vida dos pacientes (HOLLAND, A. E.; HILL, C. J.; CONRON, M.; et al., 2016). No entanto, conforme a doença progride, a necessidade de cuidados paliativos aumenta, com o foco em aliviar sintomas como a dispneia e proporcionar suporte psicológico tanto para o paciente quanto para seus familiares (SWIGRIS, J. J. et al., 2011).

No caso do Sr. J.M., o uso de opioides para o controle da dispneia refratária e ansiolíticos para manejo da ansiedade são condutas amplamente reconhecidas em cuidados paliativos para pacientes com FPI (CURTIS, J. R.; LAMONT, E. B). A decisão de transitar para um cuidado exclusivamente paliativo, priorizando o conforto e a dignidade do paciente, reflete práticas recomendadas em situações onde a intervenção curativa não é mais possível (LANKEN, P. N.; TERESA, M. F.; WEISS, K. J., 2008).

Além dos desafios físicos, a FPI tem um impacto psicológico significativo, tanto no paciente quanto em seus familiares. A ansiedade e o medo do sufocamento são experiências comuns entre os pacientes em estágios avançados da doença (BAJWAH, S. et al., 2012). O suporte psicológico e o acompanhamento contínuo, como foi oferecido ao Sr. J.M. e sua família, são fundamentais para proporcionar um ambiente de cuidado humanizado e acolhedor. Esse suporte ajuda a lidar com o estresse emocional e facilita a tomada de decisões compartilhadas sobre o tratamento (BRAUN, A. T.; HOFFMANN, A. L.; MORRIS, S. A., 2019).

O relato do Sr. J.M. destaca a importância de um manejo integral que não se limita apenas ao tratamento farmacológico, mas também aborda os aspectos paliativos e psicossociais da FPI. Este caso sublinha a necessidade de políticas de saúde pública que promovam o acesso a cuidados de qualidade para pacientes com doenças crônicas complexas, incluindo a capacitação de equipes multidisciplinares e a disponibilização de tratamentos paliativos adequados. Além disso, enfatiza a importância de pesquisas contínuas para desenvolver novas terapias que possam melhorar os resultados para pacientes com FPI.


REFERÊNCIAS

RAGHU, Ganesh et al. Diagnosis of idiopathic pulmonary fibrosis. An official ATS/ERS/JRS/ALAT clinical practice guideline. American journal of respiratory and critical care medicine, v. 198, n. 5, p. e44-e68, 2018.

WOLTERS, P. J.; COLLARD, H. R.; JOGAN, R. J. Biomarkers in the evaluation and management of idiopathic pulmonary fibrosis. American Journal of Respiratory and Critical Care Medicine, v. 190, n. 7, p. 906-916, 2014.

KING, T. E. et al. A phase 3 trial of pirfenidone in patients with idiopathic pulmonary fibrosis. The New England Journal of Medicine, v. 370, n. 22, p. 2083-2092, 2014.

RICHELDI, L. et al. Efficacy of a tyrosine kinase inhibitor in idiopathic pulmonary fibrosis. The New England Journal of Medicine, v. 365, n. 12, p. 1079-1087, 2011.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Diretrizes para o diagnóstico e tratamento da fibrose pulmonar idiopática. Brasília: Ministério da Saúde, 2020.

RICHELDI, L. et al. Efficacy and safety of nintedanib in idiopathic pulmonary fibrosis. The New England Journal of Medicine, v. 370, n. 22, p. 2071-2082, 2014.

KING, T. E. et al. A phase 3 trial of pirfenidone in patients with idiopathic pulmonary fibrosis. The New England Journal of Medicine, v. 370, n. 22, p. 2083-2092, 2014.

SWIGRIS, J. J. et al. Health-related quality of life in patients with idiopathic pulmonary fibrosis: a systematic review. Thorax, v. 66, n. 7, p. 619-624, 2011.

HOLLAND, A. E.; HILL, C. J.; CONRON, M.; et al. Physiotherapy for interstitial lung disease: A randomized controlled trial evaluating exercise tolerance and quality of life. Respiratory Medicine, v. 113, p. 29-35, 2016.

BAJWAH, S. et al. Palliative care in interstitial lung disease: clinical insights and challenges. Journal of Palliative Medicine, v. 15, n. 3, p. 303-310, 2012.

CURTIS, J. R.; LAMONT, E. B. Palliative and end-of-life care for patients with chronic lung disease. American Journal of Respiratory and Critical Care Medicine, v. 177, n. 4, p. 415-420, 2008.

LANKEN, P. N.; TERESA, M. F.; WEISS, K. J. Clinical care of patients with advanced pulmonary diseases. American Journal of Respiratory and Critical Care Medicine, v. 177, n. 5, p. 505-510, 2008.

BRAUN, A. T.; HOFFMANN, A. L.; MORRIS, S. A. The role of palliative care in advanced pulmonary disease. Chest, v. 155, n. 4, p. 854-862, 2019.


1 Hospital Universitário de Sergipe da Universidade Federal de Sergipe, vinculado a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), Aracaju – SE. *E-mail: paula.fujishima@ebserh.gov.br.

2 Universidade Federal de Sergipe (UFS), São Cristóvão – SE.