SCHIZOPHRENIA AND NEUROBIOLOGICAL CHANGES: UPDATES ON BIOMARKER EVIDENCE – AN INTEGRATIVE REVIEW
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202502281917
Amine Sumaia Soares Carvalho¹; Ana Cláudia Lobo de Souza Nascimento²; Ariane Railda Morelli do Prado³; Beatriz Matheus Duarte⁴; Bruna Ferle⁵; Caio Bruno Magalhães Ferreira⁶; Camila Dionízio⁷;Edis Rodrigues Júnior⁸; Ellen Gabriele Tavares Barboza⁹; Guilherme Lobo Mello Leite e Silva¹⁰; Isabelle Francesquini Matheus Jardim¹¹; Jair Felipe Lima¹²; Luiza Ferreira Gomes¹³; Nathália Benedetti Canhoto Gandolfi¹⁴; Tabata Caroline da Cruz Vieira¹⁵
Graduação em Bacharelado em Medicina Universidade Brasil – Fernandópolis/SP
RESUMO
A esquizofrenia é um transtorno psiquiátrico grave e multifatorial, caracterizado por sintomas psicóticos, déficits cognitivos e alterações emocionais. Avanços na neurociência têm demonstrado que biomarcadores neurobiológicos podem desempenhar um papel fundamental no diagnóstico precoce, prognóstico e personalização do tratamento da doença. Esta revisão integrativa analisa as principais evidências recentes sobre biomarcadores na esquizofrenia, abordando estudos de neuroimagem, genética, epigenética e biomarcadores inflamatórios e neuroquímicos. Os achados apontam para alterações estruturais e funcionais no cérebro, disfunções nos sistemas dopaminérgico, glutamatérgico e gabaérgico, além da presença de um estado inflamatório crônico. Biomarcadores genéticos e epigenéticos também emergem como potenciais preditores de suscetibilidade e resposta ao tratamento. Apesar dos avanços, desafios como a padronização dos biomarcadores, replicabilidade dos achados e necessidade de estudos longitudinais ainda precisam ser superados. O desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas baseadas em biomarcadores, incluindo moduladores muscarínicos e terapias celulares, sugere um futuro promissor para a psiquiatria de precisão na esquizofrenia.
Palavras-chave: Esquizofrenia; Biomarcadores; Neuroimagem; Genética; Epigenética; Neuroinflamação; Neurotransmissores.
ABSTRACT
Schizophrenia is a severe and multifactorial psychiatric disorder characterized by psychotic symptoms, cognitive deficits, and emotional disturbances. Advances in neuroscience have shown that neurobiological biomarkers can play a crucial role in early diagnosis, prognosis, and personalized treatment of the disease. This integrative review analyzes recent evidence on biomarkers in schizophrenia, covering studies on neuroimaging, genetics, epigenetics, and inflammatory and neurochemical biomarkers. Findings indicate structural and functional brain alterations, dysfunctions in the dopaminergic, glutamatergic, and GABAergic systems, as well as a chronic inflammatory state. Genetic and epigenetic biomarkers also emerge as potential predictors of susceptibility and treatment response. Despite advancements, challenges such as biomarker standardization, reproducibility of findings, and the need for longitudinal studies must still be addressed. The development of new biomarker-based therapeutic approaches, including muscarinic modulators and cell-based therapies, suggests a promising future for precision psychiatry in schizophrenia.
Keywords: Schizophrenia; Biomarkers; Neuroimaging; Genetics; Epigenetics; Neuroinflammation; Neurotransmitters.
1 INTRODUÇÃO
A esquizofrenia é um transtorno mental grave e altamente incapacitante, caracterizado por uma ampla gama de sintomas, incluindo delírios, alucinações, desorganização do pensamento, além de déficits cognitivos e alterações emocionais significativas. Sua etiologia é complexa e multifatorial, envolvendo interações entre fatores genéticos, ambientais e neurobiológicos. Apesar dos avanços nas abordagens terapêuticas, a heterogeneidade dos sintomas e das respostas ao tratamento dificulta a obtenção de um prognóstico preciso e de estratégias terapêuticas personalizadas (Javitt, 2023). Nesse contexto, a busca por biomarcadores neurobiológicos tem se intensificado nos últimos anos, pois tais marcadores podem contribuir para um diagnóstico mais precoce, para a estratificação dos pacientes e para o desenvolvimento de intervenções mais eficazes e direcionadas (Lisoway et al., 2021).
Dentre as diversas alterações neurobiológicas associadas à esquizofrenia, a neuroinflamação tem sido amplamente estudada como um possível fator patogênico subjacente. Evidências sugerem que pacientes com esquizofrenia apresentam um estado inflamatório crônico, com elevação de citocinas pró-inflamatórias, como interleucina-6 (IL-6), fator de necrose tumoral alfa (TNF-α) e interleucina-1β (IL-1β) (Mongan et al., 2019). Essa inflamação sistêmica pode contribuir para disfunções na neurotransmissão e para a neurodegeneração observada nesses indivíduos, o que reforça a hipótese de que mediadores inflamatórios possam servir como biomarcadores para diagnóstico, prognóstico e predição de resposta ao tratamento.
Além da neuroinflamação, a disfunção dopaminérgica e o desequilíbrio excitatório/inibitório são mecanismos centrais na fisiopatologia da esquizofrenia. A hiperatividade da via dopaminérgica mesolímbica está fortemente associada aos sintomas positivos da doença, como delírios e alucinações, enquanto a hipoatividade da via dopaminérgica mesocortical contribui para déficits cognitivos e sintomas negativos (Wada et al., 2022). Além disso, alterações nos sistemas glutamatérgico e gabaérgico têm sido implicadas na disfunção neurocognitiva da esquizofrenia, especialmente no que diz respeito ao processamento da informação e à plasticidade sináptica. Estudos recentes indicam que a redução da atividade do glutamato pode prejudicar a comunicação neuronal, enquanto a disfunção do ácido gama-aminobutírico (GABA) compromete o equilíbrio excitatório/inibitório, resultando em disfunções cognitivas e comportamentais (Wada et al., 2022).
No campo da genética e epigenética, avanços significativos foram alcançados na identificação de variantes genéticas associadas à vulnerabilidade à esquizofrenia. Estudos de associação do genoma inteiro (GWAS) demonstraram que diversas variantes de nucleotídeo único (SNVs) estão relacionadas a alterações em genes que regulam o desenvolvimento e a função sináptica, como o DISC1 e o NRG1 (Lisoway et al., 2021). Além disso, fatores epigenéticos, como a metilação do DNA e a regulação por microRNAs, têm sido implicados na modulação da expressão gênica em resposta a influências ambientais, sugerindo que a interação entre predisposição genética e fatores ambientais pode desempenhar um papel crítico na manifestação da doença.
Diante desse cenário, esta revisão integrativa tem como objetivo analisar e sintetizar as evidências mais recentes sobre biomarcadores neurobiológicos associados à esquizofrenia, abordando estudos clínicos, neuroimagem, genética e biomarcadores moleculares. A identificação de biomarcadores confiáveis pode não apenas aprimorar o diagnóstico e a estratificação dos pacientes, mas também auxiliar no desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas, promovendo um tratamento mais personalizado e eficaz.
2 ALTERAÇÕES NEUROBIOLÓGICAS NA ESQUIZOFRENIA: EVIDÊNCIAS ATUAIS
A esquizofrenia é um transtorno altamente complexo, cujos mecanismos neurobiológicos subjacentes envolvem uma série de alterações estruturais, funcionais e bioquímicas no cérebro. Estudos recentes utilizando técnicas avançadas de neuroimagem, genética e análise molecular revelaram padrões específicos de disfunção em pacientes com a doença, fornecendo um suporte robusto para a identificação de biomarcadores diagnósticos e prognósticos. Essas evidências apontam para um modelo multifatorial, em que mudanças na estrutura cerebral, polimorfismos genéticos, mecanismos epigenéticos e processos neuroinflamatórios desempenham papéis críticos na fisiopatologia da esquizofrenia. A seguir, serão detalhados os principais achados da literatura sobre as alterações neurobiológicas associadas à esquizofrenia.
2.1. Alterações Estruturais e Funcionais no Cérebro
A neuroimagem estrutural e funcional tem sido fundamental para entender os padrões de disfunção cerebral na esquizofrenia. Estudos utilizando ressonância magnética (RM), tomografia por emissão de pósitrons (PET) e ressonância magnética funcional (fMRI) demonstram consistentemente reduções volumétricas em diversas regiões do cérebro de pacientes esquizofrênicos, particularmente no hipocampo, córtex pré-frontal e amígdala (Javitt, 2023). Essas estruturas estão diretamente envolvidas na regulação da memória, cognição e processamento emocional, processos frequentemente prejudicados na esquizofrenia.
Os estudos pós-mortem também corroboram essas descobertas. Rajkowska et al. (1998) identificaram uma redução significativa do tamanho dos corpos celulares dos neurônios no córtex pré-frontal, sugerindo um processo neurodegenerativo ou um déficit no desenvolvimento dessa região. Essa redução volumétrica está associada a déficits na função executiva e na tomada de decisão, sintomas comuns em pacientes com esquizofrenia.
Outro aspecto crítico é a hiperatividade do sistema dopaminérgico, particularmente na via mesolímbica, que está associada ao surgimento dos sintomas positivos, como delírios e alucinações. Em contrapartida, a hipoatividade da via dopaminérgica mesocortical pode explicar os déficits cognitivos e sintomas negativos da esquizofrenia (Wada et al., 2022). Além disso, a redução da conectividade funcional entre o córtex pré-frontal e outras áreas subcorticais, como o tálamo e o estriado, pode comprometer a filtragem de informações sensoriais e cognitivas, contribuindo para os sintomas psicóticos e desorganização do pensamento observados na doença (Rund et al., 2004).
2.2. Biomarcadores Genéticos e Epigenéticos
A predisposição genética desempenha um papel significativo no desenvolvimento da esquizofrenia. Estudos de associação ampla do genoma (Genome-Wide Association Studies – GWAS) identificaram polimorfismos genéticos relacionados ao transtorno, incluindo variações em genes como DISC1, NRG1, COMT e GRIN2A, que regulam funções críticas como neurodesenvolvimento, plasticidade sináptica e neurotransmissão (Brainstorm Consortium, 2018). A presença de variantes genéticas nessas regiões pode aumentar a vulnerabilidade ao desenvolvimento da esquizofrenia, especialmente quando combinada com fatores ambientais adversos.
Além das influências genéticas, os mecanismos epigenéticos, como a metilação do DNA e a regulação por microRNAs (miRNAs), têm sido explorados como potenciais biomarcadores. Evidências indicam que alterações epigenéticas podem modular a expressão de genes-chave envolvidos na esquizofrenia em resposta a fatores ambientais, como estresse precoce, infecções durante a gestação e exposição a toxinas (Smoller et al., 2019). A descoberta de padrões epigenéticos específicos pode abrir caminhos para novas abordagens terapêuticas, focadas na reversão dessas modificações para modular a progressão da doença.
2.3. Biomarcadores Inflamatórios e Neuroquímicos
A hipótese inflamatória da esquizofrenia tem ganhado cada vez mais suporte na literatura científica. Estudos indicam que pacientes com esquizofrenia apresentam níveis elevados de citocinas pró-inflamatórias, como interleucina-6 (IL-6), fator de necrose tumoral alfa (TNF-α) e interleucina-1β (IL-1β), tanto no sangue periférico quanto no líquido cefalorraquidiano (Mongan et al., 2019). Essa resposta inflamatória exacerbada pode levar a disfunções na neurotransmissão e à neurodegeneração, contribuindo para a gravidade dos sintomas clínicos.
Além da inflamação, disfunções nos sistemas glutamatérgico e gabaérgico também têm sido amplamente investigadas. O déficit de GABA, um neurotransmissor inibitório fundamental para o equilíbrio da atividade neuronal, tem sido associado a prejuízos na cognição e à disfunção da circuitaria pré-frontal na esquizofrenia (Wada et al., 2022). Já a hipoatividade do sistema glutamatérgico, especialmente na via corticoestriatal, pode levar a déficits na plasticidade sináptica, prejudicando a aprendizagem e a memória. Essa hipótese neuroquímica tem motivado investigações sobre agentes moduladores do glutamato como potenciais alvos terapêuticos para a esquizofrenia (Javitt, 2023).
2.4. Biomarcadores no Líquido Cefalorraquidiano e Plasma
Pesquisas recentes têm explorado a viabilidade de biomarcadores periféricos no diagnóstico e prognóstico da esquizofrenia. Estudos indicam que proteínas e metabólitos específicos no líquido cefalorraquidiano (LCR) e plasma podem refletir disfunções neurobiológicas associadas ao transtorno. Entre os mais promissores estão os níveis reduzidos de neurotrofinas, como o fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF), que está envolvido na plasticidade sináptica e no desenvolvimento neuronal (Lisoway et al., 2021).
Outro aspecto relevante é a influência de hormônios sexuais, como o estradiol, que pode modular a atividade dopaminérgica e a neuroplasticidade em mulheres com esquizofrenia. Estudos indicam que a administração de raloxifeno, um modulador seletivo dos receptores de estrogênio, pode melhorar sintomas cognitivos e negativos da doença, sugerindo seu potencial como biomarcador e intervenção terapêutica (Li et al., 2023).
Além disso, a análise de metabólitos no plasma pode fornecer insights sobre a resposta ao tratamento e a progressão da doença. Alguns estudos demonstram que pacientes que não respondem adequadamente aos antipsicóticos apresentam perfis metabólicos distintos, o que pode permitir uma personalização da abordagem terapêutica baseada em biomarcadores sanguíneos.
As evidências atuais reforçam a ideia de que a esquizofrenia é um transtorno de base neurobiológica complexa, envolvendo alterações estruturais, genéticas, inflamatórias e neuroquímicas. O avanço na identificação de biomarcadores pode proporcionar uma melhor compreensão da fisiopatologia da doença, além de favorecer abordagens terapêuticas mais eficazes e individualizadas. Com a crescente sofisticação das técnicas de neuroimagem, análise genética e biologia molecular, a psiquiatria caminha para uma era de medicina de precisão, onde diagnósticos e tratamentos poderão ser orientados de forma personalizada, de acordo com o perfil neurobiológico de cada paciente.
3 IMPLICAÇÕES CLÍNICAS E FUTURAS DIREÇÕES
A crescente compreensão das bases neurobiológicas da esquizofrenia e a identificação de biomarcadores associados à doença têm o potencial de transformar significativamente sua abordagem clínica. Atualmente, o diagnóstico da esquizofrenia ainda é baseado em critérios clínicos subjetivos, conforme descrito no DSM-5 e na CID-11, sem a utilização de exames laboratoriais ou de neuroimagem que possam auxiliar na confirmação da doença. No entanto, a pesquisa em biomarcadores oferece uma perspectiva promissora para o diagnóstico precoce, a personalização do tratamento e o desenvolvimento de novas intervenções terapêuticas. Nesta seção, discutimos as principais implicações clínicas e direções futuras no campo dos biomarcadores aplicados à esquizofrenia.
3.1. Uso de Biomarcadores para Diagnóstico Precoce e Personalização do Tratamento
Um dos avanços mais promissores na psiquiatria translacional é o uso de biomarcadores para auxiliar no diagnóstico precoce da esquizofrenia. Evidências sugerem que alterações estruturais cerebrais e desequilíbrios neuroquímicos podem preceder a manifestação dos primeiros sintomas clínicos, permitindo a identificação de indivíduos em risco antes do primeiro episódio psicótico. Técnicas como neuroimagem funcional (fMRI, PET) e análise genética (GWAS, sequenciamento epigenético) têm sido exploradas para essa finalidade, visando melhorar a precisão diagnóstica e reduzir o tempo entre o surgimento dos sintomas e o início da intervenção.
Além do diagnóstico, os biomarcadores também podem ser fundamentais na estratificação dos pacientes, possibilitando a personalização do tratamento. Estudos indicam que perfis neurobiológicos distintos podem estar associados a diferentes respostas aos antipsicóticos, o que poderia viabilizar uma abordagem farmacogenômica na psiquiatria. Por exemplo, níveis alterados de glutamato e GABA podem indicar maior eficácia de moduladores do sistema glutamatérgico, enquanto alterações em genes dopaminérgicos podem sugerir uma melhor resposta a antipsicóticos específicos (Lariijani et al., 2021).
3.2. Possibilidades de Desenvolvimento de Novas Intervenções Terapêuticas Baseadas em Biomarcadores
A descoberta de biomarcadores tem impulsionado a busca por novos alvos terapêuticos na esquizofrenia, indo além dos tradicionais antagonistas dopaminérgicos. Nos últimos anos, diversas estratégias inovadoras têm sido exploradas, incluindo moduladores muscarínicos, terapias baseadas em células-tronco e abordagens epigenéticas.
Um exemplo promissor é o desenvolvimento de fármacos que atuam fora da via dopaminérgica. Koblan et al. (2020) relataram um ensaio clínico bem-sucedido com um medicamento inovador que não atua nos receptores D2 da dopamina, reduzindo os sintomas psicóticos sem os efeitos colaterais típicos dos antipsicóticos convencionais, como sintomas extrapiramidais e sedação excessiva. Essa nova classe de medicamentos pode representar um marco no tratamento da esquizofrenia, especialmente para pacientes resistentes aos tratamentos convencionais.
Outro avanço relevante foi descrito por Kaul et al. (2024), que investigaram um agonista muscarínico (KarXT – xanomeline-trospium) em um estudo de fase 3 nos Estados Unidos. Essa abordagem terapêutica se baseia na modulação colinérgica, visando restaurar o equilíbrio excitatório/inibitório no cérebro. Os resultados demonstraram uma redução significativa nos sintomas psicóticos, destacando o potencial de terapias que vão além do paradigma dopaminérgico tradicional.
Além disso, pesquisas com células-tronco têm explorado sua aplicação na esquizofrenia, tanto como modelos de estudo quanto como possíveis intervenções terapêuticas. Lariijani et al. (2021) destacaram que células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs) podem ser utilizadas para criar modelos personalizados de células cerebrais, permitindo a investigação de assinaturas biológicas individuais da doença. Essas tecnologias podem ajudar na descoberta de novos alvos terapêuticos e no desenvolvimento de terapias regenerativas para restaurar circuitos neurais comprometidos.
3.3. Limitações dos Estudos Atuais e Necessidade de Mais Pesquisas Longitudinais e Multicêntricas
Apesar dos avanços no campo dos biomarcadores, ainda existem desafios significativos que limitam sua aplicação clínica. Muitos dos estudos atuais apresentam amostras reduzidas, heterogeneidade metodológica e dificuldades na replicação dos achados, tornando necessária a realização de pesquisas de maior escala e rigor metodológico.
Uma das principais limitações é a falta de padronização nos biomarcadores, o que dificulta sua validação para uso clínico. Diferentes estudos utilizam metodologias variadas para análise de neuroimagem, genética e biomarcadores sanguíneos, levando a resultados inconsistentes. Para que um biomarcador seja clinicamente útil, ele precisa ser reproduzível e ter alta sensibilidade e especificidade no diagnóstico da esquizofrenia.
Além disso, pesquisas longitudinais e multicêntricas são essenciais para avaliar a estabilidade dos biomarcadores ao longo do tempo e sua relação com a progressão da doença. Estudos que acompanhem pacientes desde o primeiro episódio psicótico até fases mais avançadas podem fornecer informações valiosas sobre a utilidade preditiva desses marcadores.
Outro desafio relevante é a influência de fatores ambientais e comportamentais nos biomarcadores neurobiológicos. Elementos como uso de substâncias, dieta, nível de atividade física e estresse podem modular a expressão de genes e proteínas associadas à esquizofrenia, o que exige uma análise mais aprofundada sobre como esses fatores interagem com os mecanismos patológicos da doença.
3.4. Perspectivas Futuras
Diante dessas limitações, futuras pesquisas devem focar na integração de múltiplos biomarcadores para aprimorar a precisão diagnóstica e prognóstica. A combinação de dados de neuroimagem, genética, epigenética e metabolômica pode fornecer uma visão mais completa dos mecanismos biológicos subjacentes à esquizofrenia. Modelos computacionais baseados em inteligência artificial também podem contribuir para a identificação de padrões complexos nesses dados, permitindo uma estratificação mais precisa dos pacientes e facilitando o desenvolvimento de abordagens terapêuticas personalizadas.
Além disso, a medicina de precisão emerge como um conceito fundamental para a psiquiatria moderna. Com o avanço das pesquisas em biomarcadores, espera-se que no futuro os tratamentos para esquizofrenia sejam cada vez mais individualizados, levando em consideração o perfil neurobiológico e genético de cada paciente.
Outro aspecto promissor é o desenvolvimento de novas terapias neuroprotetoras, que possam atuar precocemente na doença para minimizar a progressão dos déficits cognitivos e estruturais. A utilização de moduladores de neuroinflamação, terapias genéticas e intervenções baseadas em células-tronco são estratégias que podem revolucionar o manejo da esquizofrenia nas próximas décadas.
A identificação e validação de biomarcadores na esquizofrenia representam um dos desafios mais importantes da neurociência e da psiquiatria moderna. A possibilidade de utilizar esses marcadores para diagnóstico precoce, personalização do tratamento e desenvolvimento de novas terapias abre um caminho promissor para a medicina de precisão na esquizofrenia. No entanto, para que esses avanços se concretizem, é fundamental que futuras pesquisas superem as limitações metodológicas atuais e adotem uma abordagem integrativa e multidisciplinar. A consolidação de biomarcadores confiáveis pode não apenas transformar a prática clínica, mas também melhorar a qualidade de vida dos pacientes ao permitir intervenções mais eficazes e personalizadas.
4 CONCLUSÃO
A esquizofrenia é um transtorno mental complexo e heterogêneo, cuja fisiopatologia envolve uma ampla gama de alterações neurobiológicas. Ao longo das últimas décadas, pesquisas têm demonstrado que os biomarcadores podem desempenhar um papel fundamental na compreensão e manejo da doença. Estudos de neuroimagem revelaram alterações estruturais e funcionais significativas, como a redução volumétrica do hipocampo e do córtex pré-frontal, além da hiperatividade dopaminérgica na via mesolímbica. No âmbito genético e epigenético, polimorfismos específicos e mecanismos de regulação da expressão gênica, como metilação do DNA e microRNAs, sugerem que a predisposição à esquizofrenia pode ser influenciada por interações entre fatores ambientais e genéticos.
Além disso, a crescente evidência do papel da neuroinflamação na patogênese da esquizofrenia destaca a importância de biomarcadores inflamatórios, como citocinas pró-inflamatórias e proteínas do sistema imunológico, que podem estar correlacionadas à gravidade dos sintomas e à resposta ao tratamento. Alterações neuroquímicas, especialmente nos sistemas dopaminérgico, glutamatérgico e gabaérgico, reforçam a necessidade de uma abordagem multifacetada para entender os mecanismos que sustentam o transtorno. A análise de biomarcadores em líquido cefalorraquidiano e plasma também tem avançado, sugerindo potenciais alvos terapêuticos e estratégias para personalizar o tratamento.
Dado o caráter multifatorial da esquizofrenia, torna-se evidente a necessidade de integrar diferentes tipos de biomarcadores—genéticos, epigenéticos, inflamatórios e neuroquímicos—para uma compreensão mais abrangente da doença. O avanço da medicina de precisão na psiquiatria pode transformar o diagnóstico e o tratamento, permitindo intervenções mais precoces e eficazes. A combinação de neuroimagem, genômica e metabolômica pode fornecer modelos preditivos mais robustos, capazes de estratificar os pacientes de acordo com suas características biológicas específicas e prever suas respostas aos tratamentos disponíveis.
No entanto, apesar dos avanços promissores, desafios significativos ainda precisam ser superados antes que os biomarcadores possam ser incorporados de forma ampla na prática clínica. A falta de padronização nos métodos de avaliação, a variabilidade nos achados entre diferentes estudos e a necessidade de pesquisas longitudinais e multicêntricas são algumas das barreiras que precisam ser enfrentadas. Além disso, fatores ambientais e individuais podem influenciar os perfis biológicos dos pacientes, exigindo abordagens que considerem a variabilidade interindividual na manifestação da doença.
Perspectivas futuras incluem o aprimoramento de tecnologias de análise de biomarcadores, o desenvolvimento de algoritmos baseados em inteligência artificial para integrar grandes volumes de dados biológicos e a implementação de ensaios clínicos que utilizem biomarcadores para guiar decisões terapêuticas. O avanço nesse campo poderá proporcionar não apenas diagnósticos mais precisos, mas também tratamentos mais eficazes e personalizados, melhorando significativamente o prognóstico e a qualidade de vida dos pacientes com esquizofrenia.
Assim, a consolidação do uso de biomarcadores na esquizofrenia representa uma oportunidade inovadora para transformar a psiquiatria, aproximando-a de uma abordagem baseada em evidências neurobiológicas concretas. No entanto, para que essa revolução se concretize, será essencial um esforço conjunto entre pesquisadores, clínicos e instituições de saúde na busca por validação, padronização e aplicação clínica desses marcadores.
REFERÊNCIAS
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1 Graduando em Medicina pela Universidade Privada Maria Serrana
2 Graduanda em Medicina pela UNILAGO União das Faculdades dos Grandes Lagos
3 Graduando em Medicina pela UNILAGO União das Faculdades dos Grandes Lagos
4 Graduando em Medicina pela UNILAGO União das Faculdades dos Grandes Lagos
5 Graduando em Medicina pela Universidade Brasil
6 Graduando em Medicina pela Unesulbahia Faculdades Integradas
7 Graduanda em Medicina pela UNILAGO União das Faculdades dos Grandes Lagos
8 Graduanda em Medicina pela Universidade Brasil
9 Graduanda em Medicina pela União das Faculdades dos Grandes Lagos – UNILAGO
10 Graduanda em Medicina pela Universidade Brasil
11 Graduando em Medicina pela União das Faculdades dos Grandes Lagos – UNILAGO
12 Graduando em Medicina pela Universidade Brasil
13 Graduanda em Medicina pela Bacharelado em Medicina – UFSCar – Universidade Federal de São Carlos
14 Graduanda em Medicina pela União das Faculdades dos Grandes Lagos
15 Graduanda em Medicina pela Universidade Brasil