ERGONOMIA ODONTOLÓGICA: REFLEXOS E PRECEITOS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8346917


Andressa Custódio Erpen1
Kássia Alves Costa2
Caren Cristine da Silva Batista3


Resumo

A importância de cuidados à saúde ocupacional do Cirurgião-Dentista se fundamenta nos aspectos intrínsecos dessa profissão, pelos riscos diretos e indiretos que se apresentam sob a forma de agentes: físicos, químicos, biológicos, psíquicos, mecânicos, entre outros. Segundo, PIETROBON I. (2010): cirurgiões-dentistas estão entre os primeiros profissionais que apresentam incapacidade laborativa temporária ou permanente. Essa incapacidade acontece pelo acúmulo de atendimentos realizados por longos períodos atrelados a má postura durante execução de procedimentos, resultando na alteração morfológica geral da coluna vertebral e outras patologias. Nesse sentido, o estudo contempla as influências que práticas ergonômicas trazem à saúde do dentista, pois minimizam e previnem doenças que acometem a qualidade de vida, bem como recomendações e cuidados à coluna vertebral, a qual tem por função a sustentação, movimentação e equilíbrio do corpo, a fim de se evitar riscos inerentes a ela, visando produtividade com saúde, conforto e qualidade.

Palavras-chave: Ergonomia. Cirurgião-Dentista. Saúde Ocupacional.

Abstract

The importance of occupational health care for Dental Surgeons is based on the intrinsic aspects of this profession, due to the direct and indirect risks that arise in the formo f physical, chemical, biologival, psychic, mechanical agents, among others. According to PIETROBON I. (2010): dental surgeons are among the first professionals to experience temporary or permanent work incapacity. This incapacity occurs due to the accumulation of care performed for long periods linked to poor posture during procedures, resulting in general morphological changes in the spine and other pathologies. In this sense, the study considers the influences that ergonomic practices bring to the dentist’s, health, as they minimize and prevent diseases that affect the quality of life, as well as recommendations and care for the spine, which has the function of supporting, moving and balancing the body, in order to avoid risks inherent to it, aiming at productivity with health, comfort and quality.

Keywords: Ergonomics. Dental Surgeon. Occupational Health.

INTRODUÇÃO

O ambiente de trabalho do Cirurgião-Dentista é bastante insalubre, tanto pelos riscos da contaminação cruzada, como pela postura inadequada adotada em alguns procedimentos que acabam prejudicando a coluna vertebral, parte fundamental de sustentação, movimentação e equilíbrio do corpo, esta possui cinco curvaturas espinhais as quais podem sofrer alterações morfológicas, bem como alterações em seus músculos e tendões gerando curvas adicionais ou exageradas. Os inúmeros movimentos repetitivos aplicados em atendimentos de pacientes também são prejudiciais e se majoram a partir de múltiplas horas trabalhadas, muitas das vezes ininterruptamente e praticamente sem descansos gerando riscos e desencadeando lesões patológicas.

Dessa forma, o estudo expõe a importância dos fatores ergonômicos ao bem estar do Cirurgião-Dentista, ressalta ainda, sobre a saúde ocupacional, prática da ginástica laboral a partir de exercícios e alongamentos, os quais devem ser diários e contínuos de modo a estabelecer um ambiente seguro, saudável e confortável, prevenindo os agravos à coluna vertebral e contribuir para a diminuição de outras doenças relacionadas à profissão.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Ergonomia

A ergonomia odontológica contribui significativamente para a diminuição de doenças relacionadas à profissão, corroborando para a finalidade que se almeja alcançar, que é a produtividade com conforto e qualidade.  O Ministério do trabalho através da Lei 6.514, de 22 de dezembro de 1977 publicou a portaria 3214 de 1978 com 37 Normas Regulamentadoras (NR), como dispositivos complementares ao capitulo V “Da Segurança e da Medicina do trabalho”, disposto no Título II da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), dentre elas há a Norma Regulamentadora 17 que trata exclusivamente sobre: Ergonomia em segurança, saúde e prevenção contra acidentes e doenças de trabalho.

PERIN I (2008) em seu trabalho intitulado: Ergonomia para os mobiliários de salas clínicas dos Cirurgiões-Dentistas, pela Universidade Federal da Bahia, demonstra resultados satisfatórios da pesquisa no que tange ergonomia odontológica, onde recomenda que o trabalho seja executado com auxiliar (4 a 6 mãos); paciente deitado posicionado com o cabeçote para baixo caso a área de trabalho seja a maxila e cabeçote para cima caso seja trabalhado a mandíbula; operador e auxiliar devem está sentados; mochos de base ampla (com 5 rodas) e costas ereta apoiada no encosto; pernas paralelas e pés firmes ao solo formando um ângulo de 90º; visão completa dos quadrantes; uso de equipamentos corretos de acordo com a técnica adotada; área útil de trabalho de um círculo com um metro de diâmetro (espaço máximo de pega); área total do consultório (não superior à 3 metros de largura); posição ideal no relógio de trabalho; cotovelos juntos ao corpo; distância de 30 centímetros da boca do paciente; refletor à frente do usuário e sugadores de alta potência.

Reflexos

Os reflexos podem ser positivos (ergonomia aplicada à conduta odontológica) ou negativos: riscos (má conduta ergonômica ou até mesmo sua falta).

NARESSI, W. G. et. al. No livro: Ergonomia e Biossegurança em Odontologia, 2013. Dispõe sobre fatores de riscos relevantes a profissão do cirurgião-dentista e eles podem ser: Riscos Físicos: advindos de lesões das curvaturas vertebrais como a Cifose (aumento da curvatura da região torácica, projetando a região dorsal para trás e o tórax para frente formando o que chamamos de corcunda); Lordose (aumento anterior da curvatura lombar, projetando o abdômen e as nádegas para trás) e Escoliose (lateralização da coluna em uma ou mais vértebras, podendo atingir qualquer região vertebral). Riscos Psicológicos: stress, irritabilidade, nervosismo, fadiga crônica, cefaleia, sensações de medo, distração e tensões musculares. Riscos relacionados à Audição: devido os ruídos constantes provenientes dos sons e vibrações das canetas de alta e baixa rotação, compressor e ar condicionado. Riscos Patológicos: acidentes com instrumentos perfurocortantes durante o atendimento e pós-atendimento (descarte) Odontológico, infecções cruzadas, as quais ocorrem com maior freqüência, a partir da transmissão de microrganismos entre pessoas, ambiente e/ou um instrumento/equipamento contaminado. Riscos relacionados à visão: comprometimento na visão devido o esforço necessário para enxergar procedimentos minuciosos de difícil acesso e baixa visibilidade, contaminação com saliva e sangue através dos procedimentos realizados. Riscos por Substâncias Químicas: variados materiais odontológicos podem resultar reações alérgicas. Riscos ao Aparelho Respiratório: inalação de microorganismos em suspensão produzidos pelos aerossóis de equipamentos de alta rotação, tosse, espirros, fala e substancias químicas utilizadas. Riscos por Radiação: feixes do Raio X devido as tomadas radiográficas. Existem ainda, os fatores que resultam na perda motriz como lesões por esforço repetitivo (LER) e distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT); dermatites, alergias e eczemas de contado.

Preceitos

Medidas de engenharia, práticas de trabalho e controles da vigilância sanitária são recursos que visam a redução de acidentes ocupacionais. Nesse intuito a NR6, fala sobre o Equipamento de Proteção Individual (EPI): “todo o dispositivo ou produto, de uso individual utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar a segurança e a saúde no trabalho” (PORTARIA 3214, 1978).

Em relação aos EPI’s que visam a proteção da equipe odontológica e do paciente, MELO (2000) destaca o uso de gorro, de óculos de proteção, de máscaras, de uniformes para procedimentos não-invasivos, de uniformes para procedimentos cirúrgicos, de luvas, de sapatilhas ou sapato próprio para consultório e de campos nos pacientes.

Para evitar os Riscos e acidentes odontológicos pensou-se em precauções padrões, lançado pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO) no Manual de Boas Práticas em Biossegurança para Ambientes Odontológicos, 2020.  Através do uso de EPI completo; lavagem das mãos antes e após procedimentos; manipulação cuidadosa de perfurocortantes; processo de descontaminação (desinfecção das superfícies, instrumentais e esterilização); limpeza; controle de infecção em: mangueiras, sugadores, cuspideira, bancadas, piso e instrumentos; cuidados durante procedimentos que sangram; manutenção dos equipamentos mecânicos ou manuais; proteção durante tomadas radiográficas para operador e paciente (aventais de chumbo, óculos Plumbíferos, protetores de gônadas e tireóide) e imunização por vacinações.

METODOLOGIA

PRODANOV (2013, p. 14) conceitua a metodologia como a “disciplina que visa estudar, compreender e avaliar os métodos dispostos para a realização de uma pesquisa científica”. Neste estudo a metodologia é caracterizada como pesquisa bibliográfica descritiva. Segundo MONT’ALVÃO (1998), “o pesquisador procura conhecer e interpretar a realidade, sem nela interferir para modificá-la, se interessa em descobrir e observar fenômenos e procura descrevê-los, classificá-los e interpretá-los”. A natureza metodológica é qualitativa, expressa no levantamento bibliográfico reunido no compilado apresentado nesse trabalho.   

DISCUSSÃO

Os problemas posturais dos cirurgiões dentistas são motivos de muitas queixas por parte dessa classe. Em relação à organização do trabalho e a saúde do trabalhador, o método estático e altamente repetitivo exige do dentista uma contração dos mesmos grupos musculares e a utilização das mesmas posturas possibilitando uma intensa carga física, cognitiva e psíquica.

FERREIRA (2009) alerta ainda, que os cirurgiões dentistas na busca da perfeição odontológica se distanciam dos princípios ergonômicos e, por isso, adotam posições desconfortáveis, não realizam alongamentos e pausas, e adquirem uma série de distúrbios que podem acarretar o afastamento pré-maturo da carreira profissional.

Para JESUS et al.(2010):  “a dor osteomuscular é inerente ao cirurgião-dentista, porém é possível diminuí-la ou mesmo prevenir seus efeitos através da mudança de hábitos durante o trabalho clínico”.

Ademais, a busca por saúde ocupacional à prevenção de dor e manutenção adequada da postura deve ser rotineira, de caráter contínuo e preventivo, através de exercícios físicos e alongamentos antes e depois dos atendimentos, principalmente por profissionais que trabalham sentados.

A cada 90 minutos de atendimento, o cirurgião-dentista precisa suspender os atendimentos para a realização de um intervalo de dez minutos. (Art. 8º, §1º, Lei 3999 de 1961). Dessa forma é possível aplicar a ginástica laboral compensando os esforços e sobrecargas gerados durante os atendimentos odontológicos.

Segundo, OLIVEIRA (2006): “Ginástica Laboral compreende exercícios específicos de alongamento, de fortalecimento muscular, de coordenação motora e de relaxamento, […], tendo como objetivo principal prevenir e diminuir os casos de LER/DORT”.

Essas manobras de exercícios devem ser planejadas e executadas pelo cirurgião-dentista objetivando o alongamento da musculatura, alívio da fadiga, diminuição do stress e as diversas disfunções osteomusculares. Essas recomendações auxiliam que o profissional trabalhe ao longo do dia com maior disposição e redução das dores, promovendo melhoria na qualidade de vida geral e seu bem-estar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As atribuições do Cirurgião-Dentista e o vasto campo de sua atuação explicitam que existem limites a serem respeitados dentro dessa profissão. O consultório Odontológico é um dos ambientes mais perigosos que existem, tanto pelo potencial de risco lesivo como pelo potencial de contaminação, fazendo-se necessário mantê-lo limpo, desinfetado e alto nível de atenção nos cuidados relacionados à postura e posicionamento durante a execução do trabalho, bem como, atenção às demais funções do corpo humano.

Ás precauções padrões e a utilização dos métodos e princípios ergonômicos melhoram a qualidade de vida, eficiência e produtividade do Cirurgião-Dentista. Enfim, a ergonomia é uma ferramenta primordial para que haja saúde, bem estar e segurança. Todavia ela precisa ser constante, ou seja, atuar rotineiramente no consultório odontológico, pois só assim será possível a proteção contra microorganismos, redução de riscos, patologias e lesões ocupacionais.

REFERÊNCIAS

1. BRASIL. Ministério do Trabalho. Portaria nº 3214 de 1978. Disponível em: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=181059. Acesso em 29 de agosto de 2023. 

 2. ______. Planalto. Altera o salário-mínimo dos médicos e cirurgiões dentistas.  Lei 3.999 de 15 de dezembro de 1961. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l3999.htm. Acesso em 22 de agosto de 2023.

3. _______. Planalto. Segurança e Medicina do Trabalho. Lei 6.514, de 22 de dezembro de 1977. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6514.htm. Acesso em 22 de agosto de 2023.

4. CFO. Conselho Federal de Odontologia. Manual de Boas Práticas em Biossegurança para Ambientes Odontológicos. Apoio científico: ILAPEO, 2020. Disponível em: https://website.cfo.org.br/wp-content/uploads/2020/04/cfo-lanc%CC%A7a-Manual-de-Boas-Pra%CC%81ticas-em-Biosseguranc%CC%A7a-para-Ambientes-Odontologicos.pdf. Acesso em 25 de agosto de 2023.

5. FERREIRA, N. F. Princípios ergonômicos e o cirurgião dentista: uma avaliação do acadêmico e do profissional. Araçatuba, 2009, 88 f.Tese. (Programa de Pós-Graduação em Odontologia Preventiva e Social da Faculdade de Odontologia de Araçatuba como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor). Universidade Estadual Paulista, São Paulo.

6. JESUS, L. F. et al. Distúrbios Osteomusculares em Cirurgiões-Dentistas: uma revisão de literatura. Revista UNIANDRADE, n.1, v.11, 2010.

7. MELO, NSFO. Biossegurança em Práticas Odontológicas. In: COSTA, Marco Antonio Ferreira da; COSTA, Maria de Fátima Barrozo da; MELO, Norma Suely Falcão de Oliveira. Biossegurança: ambientes hospitalares e odontológicos. São Paulo: Santos, 2000.

8. MONT’ALVÃO C. e RANGEL M. Uma Visão Crítica Sobre As Metodologias Utilizadas nas Pesquisas de Ergonomia do Ambiente Construído – A Constelação de Atributos. In: Congresso Internacional de Ergonomia e Usabilidades de Interfaces Humano –Tecnologia: Produto, informações, ambiente construído e transporte– ERGODESIGN. Juiz de Fora – MG. UFJF. 2013.

9. NARESSI, W. G. ET AL. Ergonomia e Biossegurança em Odontologia. São Paulo: Ed. Artes médicas ltda, 2013.

10. OLIVEIRA JRGO. A prática da ginástica laboral. 3ª ed. Rio de Janeiro: Sprint, 2006.

11. PERIN I. P. Ergonomia para os mobiliários de salas clínicas dos Cirurgiões-Dentistas. Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2008.

12. PIETROBON, L. I; FILHO G. I. R. II. Doenças de caráter ocupacional em cirurgiões-dentistas – um estudo de caso sobre cifoescoliose. RFO UPF vol.15 nº.2 Passo Fundo Mai./Ago. 2010.

13. PRODANOV, Cleber Cristiano. Metodologia do Trabalho Científico: métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico. 2. ed. Novo Hamburgo: Feevale, 2013.


1Discente do Curso Superior de Odontologia do Centro Universitário São Lucas Campus 1 e-mail: andressa_c_erpen@hotmail.com;

2Discente do Curso Superior de Odontologia do Centro Universitário São Lucas Campus 1 e-mail: denteacademica@gmail.com;

3Docente do Superior de Odontologia do Centro Universitário São Lucas Campus 1 e-mail: caren.batista@saolucas.edu.br.