BETWEEN DIGNIFIED MOTHERHOOD AND OBSTETRIC VIOLENCE: A NURSING VISION
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202411231416
Abelardo Cruz Filho1
Beatriz da Silva Corrêa2
Eliandra Fonseca dos Santos3
Nilsilene Martins da Silva4
Tatiane de Souza Serrão5
Professora: Cleise Maria de Goes Martins6
Professor: Adriano dos Santos Oliveira7
Resumo
O presente artigo contempla a análise literária entre a maternidade digna e a violência obstétrica sob a visão da enfermagem, suas perspectivas, humanização do parto e prevenção da violência obstétrica. Conforme o desenvolvimento do trabalho, tem-se por objetivo apresentar a visão da equipe de enfermagem quanto a maternidade digna e a violência obstétrica, que atinge algumas mulheres na ocasião do parto e pós-parto dentro dos hospitais e maternidades. Para a construção deste artigo utilizou-se fontes bibliografias referentes à violência obstétrica, tais como artigos científicos na base da Scielo e Lilás. Na discussão dos resultados, evidencia-se que a visão da equipe de enfermagem frente à violência obstétrica apresenta conflitos, especialmente, no que diz respeito a utilização do termo “violência obstétrica” que indica intencionalidade, o que provoca desconforto nos profissionais, de outro lado, há quem defenda o termo, visto que caracteriza de fato a situação de violência. Para tanto, se faz necessário, mudanças nas práticas assistenciais às grávidas, promovendo a humanização no parto.
Palavras-chave: Violência; Obstétrica. Enfermagem; Humanização; Prevenção.
1 INTRODUÇÃO
De acordo com Carlos et al (2019), a violência obstétrica é considerada um fenômeno socialmente complexo na área da Saúde da Mulher. Sua prevenção requer mudanças em práticas assistenciais durante o ciclo gravídico-puerperal, a fim de reduzir intervenções médicas desnecessárias, que podem ser prejudiciais à saúde física e emocional das mulheres. Considerando essa complexidade no campo da saúde da mulher, tem-se como proposta deste artigo a análise literária “entre a maternidade digna e a violência obstétrica: uma visão da enfermagem”. Conforme a pesquisa da Fundação Perseu Abramo (2010), nem todas as parturientes têm a oportunidade de se beneficiarem com o parto que idealizaram e nem todos os recém-nascidos são recebidos de forma segura e respeitosa no Brasil e no mundo. Pesquisas relatam que durante um dos momentos mais importantes da vida da mulher brasileira, seu trabalho de parto, 25% delas sofrem violência obstétrica.
Segundo Marrero (2018), o tratamento abusivo durante o trabalho de parto e viola os direitos humanos, sendo capaz de influenciar negativamente os desfechos desses processos e desencorajar as mulheres na procura por cuidados futuros. Essa violação dos direitos, chamada de violência estrutural, torna as mulheres vulneráveis ao sofrimento e até a morte.
A pesquisa proposta tem por objetivo apresentar a visão da equipe de enfermagem quanto a maternidade digna e a violência obstétrica, que atinge algumas mulheres na ocasião do parto e pós-parto dentro dos hospitais e maternidades, a partir do que afirma Santos et al. (2024), visto que os enfermeiros desempenham um papel fundamental na assistência à saúde das gestantes, sendo portanto, os responsáveis por oferecer apoio emocional e físico, criar um ambiente seguro e acolhedor, e realizar a coleta de evidências em casos de violência obstétrica. Além disso, sua atuação na prevenção, identificação e intervenção nos casos de violência é crucial para garantir uma assistência obstétrica respeitosa e centrada na mulher.
Ainda que haja política pública que garanta o atendimento humanizado à mulher durante o processo de parto, essa assistência muitas vezes é negligenciada, pois, conforme Muniz e Barbosa (2012), além das intervenções obstétricas desnecessárias, muitas mulheres relatam vivências de parto dolorosas, com ofensas, humilhação e expressão de preconceitos arraigados em relação à saúde e à sexualidade da mulher. Essa realidade é cotidiana e cruel e revela uma grave violação dos direitos humanos e direitos das mulheres, por isso, se justifica tal pesquisa afim de apresentar a visão da equipe de enfermagem sobre a dignidade materna, na ocasião do parto, e os maus tratos e violência obstétrica que acomete muitas mulheres.
Conforme o exposto, os resultados encontrados na pesquisa demostram que, nas considerações da Organização Mundial da Saúde (2014) e em consonância com Bohren et al. (2014), considera-se como violência obstétrica desde demoras na assistência, recusa de internações nos serviços de saúde, cuidado negligente, recusa na administração de analgésicos, maus tratos físicos, verbais e ou psicológicos, desrespeito à privacidade e à liberdade de escolhas, realização de procedimentos coercivos ou não consentidos, detenção de mulheres e seus bebês nas instituições de saúde, entre outros. Segundo Souza e Gubert (2017), a violência obstétrica abrange a não utilização de procedimentos recomendados, assim como a utilização de procedimentos desnecessários, não recomendados e/ou obsoletos e que podem causar dano. Procedimentos não justificados podem gerar consequências e iatrogenias, com efeitos evitáveis sobre a saúde da mulher e a do bebê, como a distócia no parto, hemorragias e hipóxia neonatal, além da insatisfação da mulher e a depressão pós-parto.
2.1 VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E SUAS PERSPECTIVAS
O termo violência deriva-se do latim violentia, que por sua vez deriva do prefixo vis e quer dizer força, vigor, potência ou impulso. Portanto, segundo Saffioti (2015, p. 18), trata-se de qualquer comportamento que vise à ruptura de qualquer forma de integridade da vítima, seja física, psíquica, sexual ou moral, através do uso da força caracteriza-se como violência.
Já o termo “violência obstétrica” surgiu a partir de movimentos feministas que questionaram práticas de assistência ao parto que violavam os direitos humanos das mulheres, conforme Bohren et al (2015). Assim, discussões sobre autonomia, direitos sexuais e reprodutivos e medicina baseada em evidências ganharam espaço nesse contexto da violência obstétrica, conforme Souza (2022).
O termo “violência obstétrica” foi pioneiramente definido na legislação da Venezuela, em 2004, de acordo com a Lei Orgânica da Venezuela como “ações ou omissões da equipe de saúde, no âmbito público ou privado, que resultam na apropriação do corpo da mulher e dos processos reprodutivos pelos profissionais de saúde através de um atendimento desumanizado, abuso da medicalização e patologização dos processos naturais, levando à perda de autonomia e capacidade de decidir livremente sobre o corpo e a sexualidade da mulher, afetando negativamente sua qualidade de vida”.
A violência obstétrica dada por diversas conceituações traz consigo a prática do uso da força e das palavras. No caso da agressão física pela força como toques em excesso, pressão sobre a barriga da grávida, lavagem durante o parto, raspagem dos pelos, amarração da mulher, já quanto a violência psicológica por meio dos xingamentos, ofensas, humilhações, negação de anestesia, impedir o contato entre mãe e filho, impedir a presença de acompanhante, constrangimentos e discriminação por conta da cor, raça, religião, orientação sexual, classe social, quantidade de filhos. Essa violência atinge as gestantes, as parturientes e as puérperas, no ambiente familiar, mas principalmente no ambiente hospitalar das maternidades, chamada de violência obstétrica institucional, promovida pelos profissionais de saúde.
Até o final do século XVIII, o parto era um ritual das mulheres, realizado nas casas das famílias com o acompanhamento de parteiras (Rattner, 2009). No final do século XIX, inicia-se um processo de mudança por meio das tentativas de controle do evento biológico por parte da obstetrícia, que deixa de ser da esfera do feminino e passa a ser compreendido como uma prática médica (Sanfelice et al., 2014).
O parto e o nascimento, que eram vistos como um evento fisiológico e feminino, começam a ser encarados como um evento médico e masculino, incluindo a noção do risco e da patologia como regra, e não mais exceção. Neste modelo tecnocrático, a mulher deixou de ser protagonista, cabendo ao médico a condução do processo (Pasche et al., 2010).
Se por longos anos o parto era algo familiar com a ajuda das parteiras, tratado como uma prática íntima, por muitos anos tornou-se parte dos cuidados da obstetrícia, onde o profissional da saúde passou a cuidar e administrar os partos, principalmente nos ambientes hospitalares, ou seja, saiu do ambiente familiar e passou ao ambiente hospitalar.
A partir do século XX, acelerou-se o processo de hospitalização dos partos (Pasche et al., 2010), chegando ao final do século a quase 90% deles sendo realizados em hospitais (Rattner, 2009). Concomitante a esse fato, ocorreu um aumento do uso de tecnologias com o objetivo de “iniciar, intensificar, regular e monitorar o parto, tudo para torná-lo ‘mais normal’ e obter ganhos para a saúde da mãe e do bebê” (Diniz & Chacham, 2006, p. 80).
Com o intuito de aumentar a qualidade da assistência, tem-se medicalizado o parto, utilizando em larga escala procedimentos considerados inadequados e desnecessários, que muitas vezes podem colocar em risco a saúde e a vida da mãe e do bebê, sem avaliação adequada da sua segurança e sem base em evidências (Diniz & Chacham, 2006).
Conforme Leite et al (2024), não há consenso quanto ao termo e à definição mais adequada para expressar os atos relacionados à violência obstétrica. Os termos mais comuns são “violência obstétrica”, “desrespeito e abuso” e “maus-tratos no parto”. Embora esses termos sejam frequentemente usados como sinônimos, no meio científico eles têm definições distintas, compartilhando certos domínios.
As queixas em relação ao desrespeito, gerado pela relação de poder, fazem com que muitas dessas mulheres sejam violentadas verbalmente durante o processo do parto. Frases como “não chora que ano que vem você está aqui de novo”; “na hora de fazer não chorou/ não chamou a mamãe, por que agora está chorando?”; “se gritar, eu paro agora o que eu estou fazendo, não vou te atender”; “se ficar gritando, vai fazer mal pro seu neném, seu neném vai nascer surdo” foram trazidas pela vivência das mulheres na pesquisa Fundação Perseu Abramo (2010).
Outras questões relativas a esses momentos referem-se até mesmo à prática de atividades sexuais, ao alegarem que as mulheres que sentem prazer no momento sexual, porém choram no processo de dar à luz. Dessa maneira, os profissionais têm condenado a mulher, responsabilizando-a pelo processo de uma dor fisiológica, a qual pode, muitas vezes, estar mais relacionada a um abandono realizado pela equipe de saúde. Não se pode deixar de mencionar que, além dessa violência psicológica observada em ambientes hospitalares, algumas sofrem violências físicas durante o trabalho de parto. Todas essas questões geram, nas mulheres, formas de fugir das humilhações a que muitas vezes são submetidas, adequando-se aos padrões que julgam ser aqueles esperados pelo profissional, mantendo-se em silêncio como resposta (Leão et al., 2013).
Apesar das novas metodologias de assistência ao parto, há práticas indevidas de assistência à mulher grávida, o que implica na saúde física e mental destas pacientes. Essa assistência indevida ocorre, muitas vezes, desde o pré-natal até o parto natural ou cesáreo. Todo tipo de maus-tratos e violência obstétrica praticado contra a mulher grávida ou puérpera, torna-se prejuízo para a maternidade desta mulher.
2.2 VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E O OLHAR DA ENFERMAGEM
Essas ações intervencionistas e, muitas vezes, desnecessárias, têm ocasionado a insatisfação das mulheres, que são relegadas a coadjuvantes nos processos de parto e nascimento. O parto passa a integrar um modelo centralizado na figura do médico e que exclui outros profissionais da saúde, como enfermeiras, que por formação estariam habilitadas para atender o parto normal (Sanfelice et al., 2014).
Para Katz et al (2020), outro aspecto de constante conflito é o termo “violência obstétrica”. Muitos profissionais de saúde sentem desconforto com sua utilização, argumentando que a palavra “violência” pressupõe intencionalidade, sendo inadequado para todas as situações abarcadas pela violência obstétrica. Um segundo argumento contra o uso desse termo é a falta de reconhecimento, por parte de alguns profissionais, de que a violência obstétrica é de fato um problema de saúde pública no Brasil. Muitos acreditam que os casos que ganham destaque na mídia são extremos e isolados. Assim, nomear e definir esses atos como violência obstétrica seria algo desproporcional.
No entanto, ainda para Katz et al. (2020), existem profissionais de saúde e pesquisadores que defendem o uso do termo. O principal argumento é que movimentos sociais de mulheres escolheram essa expressão por considerá-la a mais adequada para descrever as situações de violência, abusos ou maus-tratos vivenciados durante a gestação, o parto, o puerpério ou o abortamento. Portanto, apoiar a utilização desse termo é uma forma de dar voz às vítimas. O termo “violência” deixa claro que ocorre uma violação dos direitos humanos e reprodutivos das mulheres. Por sua vez, o termo “obstétrico” evidencia que essa violência acontece durante o ciclo gravídico, incluindo as mulheres em situação de aborto. Além disso, enfatiza que a violência obstétrica é uma combinação de violência de gênero com os maus-tratos nos serviços de saúde.
Queiroz et al. (2017) afirma que o grande desafio dos profissionais de saúde, tanto enfermeiros quanto médicos, é prestar uma assistência adequada a fim de minimizar o sofrimento das parturientes, proporcionando a elas uma vivência diferenciada no trabalho de parto. Além disso, estimula uma participação ativa tanto da mulher quanto de seu acompanhante, favorecendo um suporte físico e emocional com uso de técnicas para alívio da dor e garantindo um protagonismo durante toda essa vivência, respeitando suas escolhas e posicionamentos.
Na ótica de alguns autores, a obstetrícia baseada em evidências deve ser humanizada, cordial e empática. No entanto, existem profissionais que ignoram que ao gerar pressão psicológica na parturiente alterará a fisiologia do parto, consequentemente, ocasionando a utilização de intervenções que se tornam agressivas ao seu estado. Há ainda, nesse momento, a violação dos direitos humanos básicos das mulheres, assim como a violação obstétrica. (CARVALHO et al, 2012).
O enfermeiro frente a essas violências obstétricas poderá desenvolver condutas assistenciais que reduzam o sofrimento da parturiente, proporcionando conforto para binômios (mãe-bebê), preservando o direito e a integralidade da mesma, apoiando psicologicamente frente a essas situações, conforme Bittencourt et al. (2013), assim sendo, é possível observar que o enfermeiro tem papel fundamental frente a esse contexto, pois o mesmo está relacionado ao processo de acolhimento e humanização.
Dessa forma, as pesquisas mostram que as condutas e procedimentos inadequados provocam sofrimento físico e emocional, e devem ser evitados ao máximo, visto que o Ministério da Saúde, recomenda que a conduta seja de alívio na hora do parto, e busque oferecer um local tranquilo e favorável para o parto bem-sucedido e humanizado, para tanto, a atuação do profissional de enfermagem se faz indispensável.
2.3 HUMANIZAÇÃO E PREVENÇÃO À VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
O processo do parto é considerado um momento de muitas modificações na vida de uma mulher e leva a um sentimento de vulnerabilidade, solidão e medo. O apoio profissional poderia minimizar todos esses acontecimentos, fazendo-a se sentir acolhida e informada das situações que envolvem sua saúde. Porém, essa ausência no processo de informatização e acolhimento tem refletido na má qualidade do serviço de saúde prestado no processo gravídico, levando a situações de abandono. Além disso, questões referentes à inserção de poder entre o profissional e o cliente têm diminuído ainda mais essa interação e têm possibilitado fatos que venham oferecer uma violência, sendo caracterizada como violência institucional (Rohden, 2001; Hotimsky et al., 2002).
Para Ratneer (2009), humanização diz respeito a uma aposta ético-estético-política: ética porque implica a atitude de usuários, gestores e trabalhadores de saúde comprometidos e corresponsáveis; estética porque relativa ao processo de produção de saúde e de subjetividades autônomas protagonistas; política porque se refere à organização social das práticas de atenção e gestão na rede do SUS.
Desde os anos 80, algumas mudanças vêm ocorrendo para a melhora na qualidade da assistência à saúde da mulher. Dois pontos marcantes para essa discussão são a implementação das ‘Boas práticas de atenção ao parto e ao nascimento’ feitas pelas recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 1996 e a implementação da Política de Humanização do Parto e Nascimento (PHPN) em 2000 (Brasil, 2000); e, além disso, a inserção de Rede Cegonha (2011) em boa parte do País, com o objetivo de reorganizar a rede e reafirmar todas essas assistências, favorecendo um processo de atendimento humanizado (Leal et al., 2014).
Santos et al. (2024), enfatiza que a criação de políticas públicas efetivas, a implementação de protocolos de atendimento e a promoção de campanhas de conscientização são medidas que podem contribuir para a prevenção e redução da violência obstétrica. O envolvimento ativo dos enfermeiros nesse processo é fundamental para garantir que as gestantes recebam um atendimento digno, seguro e livre de violações.
De acordo com Tesser et al. (2015) a prevenção quaternária à luz da violência obstétrica, indica dois tipos de ações: ações individuais, familiares e comunitárias realizadas na Atenção Primária à Saúde (APS), associadas ao pré-natal; e ações em maior escala (social, política e institucional).
Corroborando essa ideia, segundo Silva et al. (2014), acredita-se que a humanização deva começar na primeira consulta de pré-natal, pois uma gestante que tenha recebido um bom preparo nesta fase, seja por orientações adequadas, participações em grupos de gestantes e até mesmo manipulação e reflexão de materiais informativos, chegam mais preparadas aos hospitais e detém melhor o conhecimento de seus direitos legais.
Para Feitoza et al. (2016) são consideradas estratégias eficazes na luta pelo enfrentamento da violência obstétrica: a inserção da Enfermeira Obstetra; realização de um pré-natal de qualidade e focado na adequada orientação da gestante, inclusive com a elaboração participativa de planos de parto; a prevenção quaternária, envolvendo o cuidado no contexto da APS e a participação social para que sejam atendidas as reivindicações de humanização; e o ativismo, importante ferramenta de troca e denúncia. Percebe-se algumas limitações para realizar um estudo sobre violência obstétrica. Inicialmente, o fato de que há uma escassez na literatura sobre estudos que abordem de maneira direta e objetiva a problemática, sendo urgente a necessidade de que mais pesquisas, em especial os quantitativos, sejam realizadas para que sirvam de subsídios e embasamento nas criações de futuras políticas públicas.
Para Silva et al. (2014), alguns profissionais são decisivos para o alcance dos resultados almejados, como é o caso da atuação da Enfermeira Obstetra, que por ser “profissional legalmente habilitada e capacitada para a assistência ao parto de baixo risco, pode ser capaz de reduzir intervenções desnecessárias durante o trabalho de parto e parto, oferecendo um cuidado mais integral à mulher e sua família”.
Os especialistas em saúde são coadjuvantes dessas experiências e nela desempenham importante papel, colocando seu conhecimento a serviço do bem-estar da mulher e do bebê; ajudando-os no processo de parturição e nascimento de forma segura sempre levando em consideração os princípios da humanização e da medicina baseada em evidências. (BRASIL, 2001)
O papel do (a) enfermeiro (a), no campo da maternidade e num contexto em que ocorre a violência obstétrica, é fundamental e primordial para que as ações de humanização e prevenção desta violência sejam concretizadas. A sensibilidade e o profissionalismo da equipe de enfermagem, por meio das estratégias de prevenção, identificam as possíveis violações, em casos suspeitos de violência obstétrica.
3 METODOLOGIA
A presente artigo utilizou por metodologia a pesquisa e análise bibliográfica de literaturas específicas quanto a violência obstétrica, por meio de artigos científicos das diversas coleções e periódicos científicos como a Scielo e Lilacs, e coleta de dados pesquisados, que resultou nos estudos comparativos e diagnóstico da violência obstétrica na visão da equipe de enfermagem. O critério de inclusão foi de artigos em períodos de 2012 a 2024, onde coletamos de bibliotecas virtuais.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS
Segundo a Organização Mundial da Saúde, violência é a imposição de um grau significativo de dor e sofrimento evitáveis. Nesse sentido, destaca-se a violência obstétrica como um tipo específico de violência contra a mulher. (World Health Organization, 1996)
Para Saffioti, trata-se de qualquer comportamento que vise à ruptura de qualquer forma de integridade da vítima, seja física, psíquica, sexual ou moral, através do uso da força que caracteriza-se como violência. (SAFFIOTI, 2015). Já os autores Tesser, Knobel, Andrezo e Diniz entendem como violência obstétrica a apropriação dos processos reprodutivos das mulheres por profissionais de saúde que se expresse por meio de relações desumanizadoras, de abuso de medicalização e de patologização dos processos naturais, resultando em perda de autonomia e capacidade de decidir livremente sobre seu corpo e sexualidade, impactando negativamente na qualidade de vida das mulheres. (TESSER et al., 2015)
O descaso e o desrespeito com as gestantes na assistência ao parto, tanto no setor público quanto no setor privado de saúde, têm sido cada vez mais divulgados pela imprensa e pelas redes sociais por meio de relatos de mulheres que se sentiram violentadas. (ZANARDO et al., 2017). De acordo com García, Diaz e Acosta (2013), um fator sempre presente entre as gestantes é a falta de informação e o medo de perguntar sobre os processos que irão ser realizados na evolução do trabalho de parto. Essa situação pode levá-las a se conformarem com a exploração de seus corpos por diferentes pessoas, aceitando diversas situações incômodas sem reclamar. (GARCÍA et al., 2013)
De acordo com pesquisas realizadas por Venturini e outros colaboradores, ressaltam que 25% das mulheres entrevistadas relatam ter sofrido algum tipo de violência nos serviços de saúde durante a atenção à parte, tanto públicos quanto privados.
Gráfico 1: Entrevistadas que tiveram filhos naturais na rede pública ou privada que sofreram ou não violência.
Fonte: Pesquisa Mulheres brasileiras e gênero nos espaços públicos, da Fundação Perseu Abramo.
Gráfico 2: Violências sofridas durante o atendimento ao parto
Fonte: Pesquisa Mulheres brasileiras e gênero nos espaços públicos, da Fundação Perseu Abramo.
Dessa forma, as pesquisas mostram que as condutas e procedimentos inadequados provocam sofrimento físico e emocional, e devem ser evitados ao máximo, visto que o Ministério da Saúde, recomenda que a conduta seja de alívio na hora do parto, e busque oferecer um local tranquilo e favorável para o parto bem-sucedido e humanizado, para tanto, a atuação do profissional de enfermagem se faz indispensável.
O Brasil não goza de legislação federal que regulamente a VO, em contramão a outros diplomas federais e estaduais. Por não ser propriamente tipo penal, sua punição ocorre através de outras tipificações penais ou ainda na esfera cível, sendo enquadrada como erro médico (Diniz et al, 2015; Leme et al, 2020). No país, dada a relevância do tema, estão em trâmite
O papel do profissional de enfermagem, no campo da maternidade e num contexto em que ocorre a violência obstétrica, é fundamental para que as ações de humanização e prevenção desta violência sejam concretizadas. A sensibilidade e o profissionalismo da equipe de enfermagem, por meio das estratégias de prevenção, identificam as possíveis violações, em casos suspeitos de violência obstétrica. Para Silva et al. (2014), alguns profissionais são decisivos para o alcance dos resultados almejados, como é o caso da atuação da Enfermeira Obstetra, que por ser “profissional legalmente habilitada e capacitada para a assistência ao parto de baixo risco, pode ser capaz de reduzir intervenções desnecessárias durante o trabalho de parto e parto, oferecendo um cuidado mais integral à mulher e sua família”.
O conhecimento é a chave para enfrentamento à VO, devendo esta ser plenamente discutida e reconhecida. É preciso que a informação chegue de forma clara à sociedade e que as mulheres saibam o que configura a violência obstétrica, e mais importante que isso, que elas tenham discernimento de como agir diante de situações de abuso dos seus direitos, rompendo os direitos de gênero, poder, hierarquia e desigualdade social, inerentes a vida em sociedade. (AZEVEDO et al., 2023)
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A assistência e o cuidado em saúde para as mulheres grávidas se dão na devida receptividade, na informação e orientação correta e no suporte emocional adequado, principalmente em situações delicadas como o cuidado às grávidas em situação de risco. Todavia, a violência obstétrica é uma realidade em nossa sociedade. O que muito assusta as mulheres durante a gravidez, principalmente, na chegada às maternidades.
A violência obstétrica tornou-se um problema social de alta complexidade, visto que o tratamento abusivo que muitas mulheres sofrem vão desde a recepção até a alta hospitalar, principalmente durante o trabalho de parto e o parto propriamente dito.
As ocorrências mais citadas, de violência obstétrica, nos estudos analisados contêm a violência física, verbal, psicológica, sexual, a negligência, discriminação, abusos verbais, proibição da presença do acompanhante, violação da privacidade, não administração de analgésicos, impedimento do contato com o bebê, realização de cesariana sem consentimento, recusa em não realizar o parto cesáreo.
Há muitas perspectivas acerca da prática da humanização no atendimento às mulheres grávidas, o que exige um trabalho multiprofissional que atenda às recomendações da Organização Mundial da Saúde e o Ministério da Saúde, para que haja a prevenção e bom acompanhamento das grávidas desde o acolhimento até a alta da maternidade.
A humanização do atendimento, como lei, obriga a todos o seu cumprimento, a fim de que todas as grávidas sejam bem atendidas desde o pré-natal, no parto e no pós-parto, por isso, a atuação do profissional de enfermagem se faz indispensável neste cenário, compreendendo e atuando de forma correta e padronizada, conforme suas atribuições de enfermagem, praticando a humanização e a prevenção à violência obstétrica.
Contudo, é relevante ressaltar a importância das informações e orientações que são dadas às mulheres durante todo o pré-natal, para que haja a compreensão sobre os impactos fisiológicos que todo parto tem, seja parto normal ou parto cesáreo, pois isso, ajudará nos procedimentos e na melhor condução do parto e pós-parto. No entanto, se faz necessária a capacitação contínua dos profissionais de saúde para que executem suas tarefas de forma adequada e humana, através da educação continuada para a equipe multidisciplinar.
REFERÊNCIAS
BOHREN, M. A.; VOGEL, J. P.; HUNTER, E. C.; LUTSIV, O.; MAKH, S. K.; SOUZA, J. P.; AGUIAR, C.; SARAIVA, C. F.; DINIZ, A. L.; TUNCALP, O; JAVADI, D.; OLADAPO. O. T.; KHOSLA, R.; HINDIN, M. J.; GULMEZOGLU, A. M. The mistreatment of women during childbirth in health facilities globally: a mixed-methods systematic review. PLoS Med 2015; 12(6):e1001847.
BOHREN, M.; HUNTER, E. C.; MUNTHER-KAAS, H. M.; SOUZA, J. P.; VOGEL, J. P.; GUMEZOGLU, A. M. 2014. Facilitators and barriers to facility-based delivery in lowand middle-income countries: A systematic review of qualitative evidence. Reprod Health. Disponível em: https://reproductive-healthjournal.biomedcentral.com/articles/10.1186/1742-4755-11-71. Acesso em: 15 Set 2024.
BRASIL. Ministério da Saúde. Política de Humanização do Parto e Nascimento (PHPN). Portaria nº 569, de 1º de junho de 2000.
BRASIL, Ministério da Saúde. Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher. Brasília, DF, 2001. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v17n3/ 14. Acesso em: 24 Set 2024.
BITTENCOURT, F. et al. Concepção de gestantes sobre o parto cesariano. Cogitare Enfermagem, v. 18, n.3, p.515 – 20, 2013.
CARLOS, G. A.; MATOZINHOS, F. P.; CARMO, J. M.; MANZO, B. F.; DUARTE, E. D.; SOUZA, K. V. Profile of the participants of an advanced course in obstetric nursing. Rev Min Enferm. 2019; 23:e-1153.
CARVALHO, V.F. et al. Como os trabalhadores de um centro obstétrico justificam a utilização de práticas prejudiciais ao parto normal. Rev Esc Enferm USP, v.46, n.1, p.3037, 2012.
DINIZ, S. G.; CHACHAM, A. S. (2006). O “corte por cima” e o “corte por baixo”: o abuso de cesáreas e episiotomias em São Paulo. Questões de saúde reprodutiva, 1(1), 8091.
FEITOZA, S. R.; DAMASCENO, A. K. de C.; RODRIGUES, F. A. C. R.; BARBOSA, R. C. M. B. C.; FEITOZA, A. R. F.; BEZERRA, L. D. A.; AMORIM, M. L. S.; COELHO, T. S. C. Violência Obstétrica: uma revisão da produção científica obstetrícia. 2016. RETEP – Rev. Tendên. da Enferm. Profis., 2017; 9(2): 2196-2203.
Fundação Perseu Abramo. Pesquisa mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado. 2010. Disponível em: http://novo.fpabramo.org.br/content/violencia-no-parto-nahora-de-fazer-nao-gritou. Acesso em: 16 Set 2024.
HOTIMSKY, S. N.; RATTNER, D.; VENANCIO, S. I.; BÓGUS, C. M; MIRANDA, M. M. O parto como eu vejo… ou como eu o desejo? Expectativas de gestantes, usuárias do SUS, acerca do parto e da assistência obstétrica. Cad. Saúde Pública, out. 2002; 18(5):1303-1311.
KATZ, L.; AMORIM, M. M.; GIORDANO, J. C.; BASTOS, M. H.; BRILHANTE, A. V. M. Quem tem medo da violência obstétrica? Rev Bras Saude Materno Infant 2020; 20(2):623626.
LEAL, M. C.; PEREIRA, A. P. E.; DOMINGUES, R. M. S. M.; FILHA, M. M. T.; DIAS, M. A. B.; NAKAMURA, P. M. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad. Saúde Pública, 2014; 30(Sup 1):S17-S47.
LEÃO, M; R.; RIESCO, M. L. G.; SCNECK, C. A.; ANGELO, M. Reflexões sobre o excesso de cesarianas no Brasil e a autonomia das mulheres. Ciência & Saúde Coletiva, ago. 2013; 18(8):2395- 2400.
LEITE, T. H.; MARQUES, E. S.; CORRÊA, R. G.; LEAL, M. C.; OLEGÁRIO, B. C. D.; COSTA, R. M.; MESENBURG, M. A. Epidemiologia da violência obstétrica: uma revisão narrativa do contexto brasileiro. Cien Saude Colet 2024; 29:e12222023.
MARRERO L; BRUGGEMANN, O. M. Institutional violence during the parturition process in Brazil: integrative review. Rev Bras Enferm. 2018;71(3):1152–61.
MUNIZ. B.; BARBOSA, R. (2012). Problematizando o atendimento ao parto: cuidado ou violência?. In Memorias Convención Internacional de Salud Pública, Cuba Salud 2012. Habana: Ministerio de Salud Pública de Cuba.
Organização Mundial da Saúde. Boas práticas de atenção ao parto e ao nascimento. p. 03. 1996.
Organização Mundial da Saúde (OMS). Prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus-tratos durante o parto em instituições de saúde. Genebra: Departamento de Saúde Reprodutiva e Pesquisa/OMS; 2014.
PASCHE, D. F.; VILELA, M. E. A.; MARTINS, C. P. (2010). Humanização da atenção ao parto e nascimento no Brasil: pressuposto para uma nova ética na gestão e no cuidado. Revista Tempus Actas Saúde Coletiva, 4(4), 105-117. http:// dx.doi.org/10.18569/tempus. v4i4.838.
QUEIROZ, T. C.; FÓFANO, G. A.; ANDRADE, F. M.; OLIVEIRA, M. A. C. A.; FONTES, L. B. A.; COSTA, J. A.; CRUZ, C. E. S. G; XAVIER, R. F.; PEREIRA, R. G.; FARNETANO, B. S. Violência obstétrica e suas perspectivas na relação de gênero. Revista Científica Fagoc Saúde – Volume II – 2017.
RATTNER, D. (2009). Humanização na atenção a nascimentos e partos: breve referencial teórico. Interface – Comunicação, Saúde, Educação, 13(1), 595-602. http://dx.doi.org/10.1590/ S1414-32832009000500011.
ROHDEN, F. Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher.1. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2001. Acesso em: 18 Set 2024.
SAFFIOTI, Heleieth Iara Bongiovani. Gênero, patriarcado e violência. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2015. Coleção Brasil Urgente.
SANFELICE.; C.; ABBUD, F.; PREGNOLATTO, O.; SILVA, M.; SHIMO, A. (2014). Do parto institucionalizado ao parto domiciliar. Revista Rene, 15(2), 362-370. doi: 10.15253/2175- 6783.2014000200022.
SANTOS, J. H. C.; ROSA, A. G.; SANTOS, D. G.; OLIVEIRA, L. D.; FERREIRA. S. C. A percepção do enfermeiro frente à prevenção e aos impactos referentes à violência obstétrica. Brazilian Journal of Implantology and Health Sciences Volume 6, Issue 4 (2024).
SILVA, MG, Marcelino MC.; RODRIGUES, LSP.; TORO, RC.; SHIMO, AKK. Violência obstétrica na visão de enfermeiras obstetras. Rev Rene. 2014 Jul-Ago; 15(4): 720-8.
SOUZA, L. V. ‘Não tem jeito. Vocês vão precisar ouvir’. Violência obstétrica no Brasil: construção do termo, seu enfrentamento e mudanças na assistência obstétrica (1970-2015) [tese]. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2022.
SOUZA, K. J.; RATTNER, D.; GUBERT, M. B. Institutional violence and quality of service in obstetrics are associated with postpartum depression. Rev Saúde Pública 2017.
TESSER, CD.; KNOBEL, R.; ANDREZZO, HFA.; DINIZ, SD. Violência obstétrica e prevenção quaternária: o que é e o que fazer. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2015; 10(35): 1-12.
VENEZUELA RB. Ley orgánica sobre el derecho de las mujeres a una vida libre de violência (Ley 25.929). Caracas: UNFPA; 2004.
AZEVEDO, R. A. F; DOMINGUES, F. S; GONZAGA V. A. S; RENNÓ, G. M. Estratégias de prevenção e redução da violência obstétrica no brasil: Uma revisão integrativa. Research Society and Development, v 12, n. 11, e80121143730, 2023.
1Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto CEUNI FAMETRO Campus Unidade Leste e-mail: abelardo.spo@gmail.com
2Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto CEUNI FAMETRO Campus Unidade Leste e-mail: b.bia.silvacorrea@gmail.com
3Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto CEUNI FAMETRO Campus Unidade Leste. Email: eliandrafonseca22@gmail.com
4Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto CEUNI FAMETRO Campus Unidade Leste e-mail: martinsnilsilene@gmail.com
5Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto CEUNI FAMETRO Campus Unidade Leste e-mail: tatianesouzaserrao@gmail.com
6Docente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto CEUNI FAMETRO Campus Unidade Leste. Instituição de formação graduação: Universidade Federal do Amazonas. Especialização: 1. Enfermagem Obstétrica (UFAM) 2. Gestão de políticas de saúde informadas por evidências (Sírio Libanês) 3. Mestrado enfermagem em saúde pública (UEA).
7Docente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto CEUNI FAMETRO Campus Unidade Leste. Instituição de formação: Universidade do Vale do Sapucaí. Email: Adriano.oliveira@fametro.edu.br