“ENSINANDO A PREVENIR: EXPERIÊNCIAS DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE SOBRE DENGUE PARA O PÚBLICO INFANTIL”

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202411131808


Amanda Delai Lobo
João Eduardo Talamini
Livia Lepoutre de Aguiar Marques
Nelson Cotovicz
Otávio Augusto Bento
Rômulo Pastre
Ana Paula Modesto


RESUMO

A dengue, transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, apresentou um aumento alarmante de casos no Brasil em 2024, com mais de 4 milhões registrados até maio. A educação em saúde é fundamental para o controle e disseminação de doenças preveníveis como essa. Este artigo relata uma experiência de educação em saúde realizada por estudantes de Medicina da PUC-PR em uma escola privada em Curitiba, Paraná. Foi realizada uma oficina com alunos de seis a sete anos, abordando a profilaxia, os meios de disseminação e os principais sintomas da dengue. A atividade incluiu teatro educativo, demonstração do ciclo de vida do mosquito, brincadeiras interativas, panfletagens e um quiz final. Essas abordagens dinâmicas não apenas engajaram as crianças, mas também facilitaram a compreensão do tema. A participação dos alunos de medicina  ampliou a disseminação das informações sobre prevenção, e além disso, a prática contribuiu para o desenvolvimento das habilidades de comunicação  essenciais para seu crescimento pessoal e profissional.

Palavras-chave: Educação em Saúde. Dengue. Criança. Ensino Fundamental. Estudantes de Medicina. 

INTRODUÇÃO:

A dengue é uma doença viral que está provocando um surto endêmico no Brasil em 2023 e 2024. Tal doença é transmitida pelo mosquito da fêmea, principalmente da espécie Aedes aegypti, o principal vetor na América do Sul, e, em menor proporção, da espécie Aedes albopictus. Os maiores níveis de incidência da dengue predominam ao longo dos trópicos, mas há variação conforme precipitação, temperatura e rápida urbanização não planejada. Existem quatro sorotipos distintos do vírus causador da dengue (DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4). Apesar da obtenção de imunidade vitalícia ao sorotipo adquirido após a infecção, a imunidade cruzada para os outros sorotipos é parcial e infecções subsequentes trazem alto risco para desenvolvimento de dengue grave (HARAPAN, 2020).

No cenário atual, a grande quantidade de casos e óbitos são alarmantes e merecem atenção. Em 2024, do início do ano até Maio, já foram registrados mais de 4,7 milhões de casos prováveis da doença e os óbitos totalizam 2,5 mil, segundo dados do Ministério da Saúde. As regiões do país com maior incidência da doença são Centro-oeste em primeiro lugar, com um coeficiente de incidência de 809,8, e Sudeste, com um coeficiente de incidência de 498,7. O Paraná é responsável por 72.526 casos prováveis de dengue de 2023 e até maio de 2024, sendo o estado do Sul com maior número de casos (PAHO, 2024).

Atualmente, não existe cura para a doença, porém vacinas já foram desenvolvidas. A vacina da dengue disponibilizada pelo SUS, a Qdenga, pode ser tomada apenas por pessoas entre 4 e 60 anos de idade. A vacina age contra os quatro sorotipos da dengue e utiliza a tecnologia do DNA recombinante, em que genes dos diferentes sorotipos do vírus são inseridos no material genético de um vírus atenuado. Ela é recomendada tanto para pessoas que já entraram em contato com o vírus (soropositivo), quanto para quem é soronegativo (SECRETARIA MUNICIPAL DE SAUDE, 2024).

A educação em saúde consiste em práticas que visam a construção e o desenvolvimento de uma consciência crítica pela população envolvendo os problemas de  saúde e a busca pela solução. Essa prática educativa aproxima a sociedade ao seu papel  diante da saúde na comunidade, de modo que a população participe diretamente no controle das doenças como a Dengue. Sendo assim, educação em saúde se baseia na interação entre indivíduos com diferentes níveis de conhecimento (profissional e usuário) de maneira formal ou informal,  podendo adotar metodologias progressistas ou conservadoras e que visam o bem-estar individual e comunitário (SGARBOSSA, 2024).

Esse artigo objetiva relatar a experiência de estudantes do 2º período do curso de graduação de Medicina com o ensino sobre a dengue para crianças de 6 e 7 anos. A atividade realizada com as crianças visava explicar os modos de reprodução do mosquito transmissor, sinais e sintomas, como ocorre a disseminação da doença e as principais profilaxias. 

RELATO DA EXPERIÊNCIA

A atividade de educação em saúde foi realizada no Colégio Marista Santa Maria, no município de Curitiba, Paraná, no mês de maio de 2024, como requisito da disciplina de Habilidades Profissionais, da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Nessa disciplina, os estudantes de Medicina do 2º período aprendem sobre a História do Sistema de Saúde Brasileiro até a consolidação do SUS, sua inserção na formação médica, Atributos da Atenção Primária à Saúde, Princípios do SUS com exemplos práticos, Controle Social, Equidade em saúde e Determinantes sociais de Saúde, Biossegurança, Redes de Atenção e Estratificação de Risco, Equipamentos das Redes de Atenção no Paraná e Educação em saúde, além de conhecer os cenários do sistema de saúde (Atenção Primária e Secretaria de Saúde). Através do conhecimento dos conceitos e cenários de prática anteriormente citados, pretende-se viabilizar a introdução ao contato e reflexão sobre o papel do profissional diante do cenário do Sistema de Saúde vigente e suas possibilidades de gerenciamento de cuidado e assistência aos pacientes. Ao longo do semestre, torna-se necessária a elaboração de um projeto ara realizar o planejamento para a construção de uma ação educativa com a temática a ser discutida com seu professor a partir de demandas que apareçam no cenário prático e construir algum material a ser trabalhado com a população em questão, sendo que este grupo optou pela realização de uma oficina sobre medidas para a identificação do mosquito da dengue, prevenção contra a proliferação do mosquito e a identificação básica de sintomas.

Participaram vinte alunos, entre seis e sete anos, da turma do colégio. Foram adotados alguns modelos de educação não-formal, aparecendo como uma abordagem alternativa às aulas convencionais. Isso porque as ações deste relato foram desenvolvidas uma apresentação de um teatro, a exposição de ovos, larva, pupa e mosquito adulto in vitro, atividade lúdica para colorir possíveis locais da proliferação do mosquito e também uma maquete de uma cidade com locais onde o aedes aegypti coloca ovos para multiplicação do mesmo, apresentou-se folders com informações importantes sobre a doença, como se prevenir é o que deve ser feito quando estiver apresentando sintomas,  além disso, um quiz para que as crianças soubessem diferenciar o mosquito de outros insetos. As atividades foram realizadas na sala de aula desvinculando a aprendizagem de requisitos formais, como as aulas expositivas, podem ser enriquecidas pela promoção de atividades dinâmicas utilizando recursos pedagógicos atrativos e envolventes (Quadra; D’ávila, 2016). Assim, atividades lúdicas desenvolvidas dessa maneira colaboram para a compreensão de regras, percepção de aptidões e promoção da convivência social (Rodrigues, 2018).

A primeira etapa da atividade, realizada em sala de aula, consistiu em um teatro, apresentado pelos estudantes de Medicina, encenando uma atividade rotineira de uma jovem menina, brincando na sala de casa, o mosquito da dengue apareceu e a picou, depois de dois dias ela começou a apresentar sintomas, sua mãe a levou para o médico que apresentou, de forma simples, quais sintomas uma pessoa com dengue geralmente apresenta. Teve por objetivo apresentar às crianças que todos estão suscetíveis à dengue e quais os sintomas apresentados quando uma pessoa é inoculada pelo vírus da dengue. Nesse momento, foi percebido que muitas crianças não acreditavam que era algo que poderia acontecer dentro de qualquer ambiente, até mesmo dentro da própria casa. Sendo assim, o olhar atento dos educadores, relacionando vivência dos alunos estimulando o interesse das crianças e considerando suas particularidades, foi essencial para o planejamento pedagógico da atividade.

A seguinte abordagem utilizada para instruir as crianças foi a demonstração, na qual foram apresentados um exemplar de larva e um de pupa do mosquito Aedes aegypti, incubados em potes de plástico com algodão no interior e selados externamente por um recipiente plástico (Figura 1). Todo o material foi cedido pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Curitiba. A demonstração foi supervisionada meticulosamente pelos apresentadores, e o material foi exibido a cada criança individualmente, o que facilitou consideravelmente a visualização. Além da demonstração física, foi realizada uma explicação detalhada sobre o desenvolvimento e a reprodução da espécie Aedes aegypti, contribuindo significativamente para a compreensão da importância da prevenção.

Figura 1 – Apresentação de larvas e papas do mosquito Aedes aegypti para as crianças. 

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Fonte: Elaborada pelo autor.

O terceiro método foi o ativo, o qual as crianças receberam panfletos (figura 2) que explicavam como manter os locais livres de criadouros de mosquitos, evitando assim o aumento deles. Além disso, receberam desenhos para colorir que reforçaram as informações dos panfletos, destacando os locais que devem ser mantidos limpos. Ao colorir, as crianças fixaram melhor as informações. A estratégia de usar essa abordagem logo após a apresentação das larvas foi muito oportuna, pois as crianças estavam atentas e compreenderam bem como evitar a proliferação de novos mosquitos.

Figura 2 – Distribuição dos panfletos que explicavam sobre o criadouro de mosquito para as crianças. 

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   Fonte: Elaborada pelo autor.

O método também utilizado durante a prática foi de visualização concreta. Nesta atividade, mostramos para as crianças uma maquete de 100cmX50cm onde era representada uma cidade com diversas casas, e nelas continham locais com água parada e logo ao lado um mosquito e uma larva crescendo (Figura 3). Assim, os alunos conseguiam ver na prática como é fácil de deixar locais de crescimento para o Aedes aegypti nascer.

Figura 3 – Integrantes do grupo apresentado a maquete para as crianças. 

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Fonte: Elaborada pelo autor.

O último método utilizado na nossa apresentação foi o Método de Avaliação Interativa, no qual os alunos participaram de um quiz. Este quiz tinha como objetivo reforçar o aprendizado e avaliar o entendimento das crianças sobre os temas apresentados. Perguntamos como é possível se proteger da dengue, qual é o mosquito da dengue (mostramos quatro fotos, Figura 4, contendo 4 diferentes insetos sendo 1 o da dengue) e quais são os sintomas da dengue. Esta abordagem não apenas engajou os alunos de maneira lúdica, mas também proporcionou um feedback imediato sobre a eficácia da apresentação.

Figura 4 – Fotos apresentadas às crianças  para identificação do Aedes aegypti

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Fonte: Elaborada pelo autor.

DISCUSSÃO

A atividade de educação em saúde descrita neste artigo demonstrou que o teatro, aliado a atividades de perguntas e respostas, desenhos para colorir, maquetes, panfletos e exemplares do mosquito, constitui um conjunto de técnicas educativas lúdicas que promovem uma interação eficaz entre educadores e crianças. Essas estratégias evitaram que as crianças ficassem entediadas, garantindo sua atenção durante toda a atividade educativa e permitindo uma compreensão mais aprofundada do tema abordado. A atividade não apenas permitiu que as crianças ampliassem seus conhecimentos sobre os sintomas da dengue, o mosquito transmissor e as formas de prevenção, mas também forneceu ferramentas para que elas compartilhassem essas informações com seus familiares.

A abordagem educativa adotada não apenas instrumentalizou as crianças no ambiente escolar, mas também mostrou potencial para alcançar seus familiares. Ao entregar os panfletos, foi informado que se tratava de uma atividade a ser realizada em casa com a participação dos pais. Dessa forma, as crianças foram capacitadas a atuar como multiplicadoras ativas desse conhecimento, contribuindo para práticas eficazes de profilaxia e combate ao Aedes aegypti.

A dinâmica das perguntas com premiação possibilitou a manutenção da atenção das crianças durante todo o processo educativo. Esta técnica foi auxiliada pelo uso de imagens para a fixação visual do mosquito e dos locais onde ele pode se proliferar. Além disso, o teatro facilitou a visualização do mosquito e dos sintomas decorrentes de sua picada.

No contexto do projeto de educação em saúde, a atividade realizada contribuiu para o conhecimento pessoal e coletivo dos estudantes, ao aplicar técnicas de ensino adequadas à faixa etária. Desse modo, ao educá-las, foi possível desenvolver habilidades de comunicação que as crianças podem utilizar em interações com seus familiares e em seu cotidiano, uma competência essencial ensinada ao longo da vida escolar. Por fim, ressalta-se que a utilização de diversas técnicas de ensino recomendadas é eficaz para a retenção da atenção e uma maior compreensão do público-alvo, permitindo a absorção e a disseminação de um maior volume de informações.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A experiência relatada destaca a eficácia das abordagens lúdicas e interativas na educação em saúde, especialmente em crianças. A utilização de teatro, maquetes, atividades manuais e quizzes não apenas capturou a atenção dos alunos, mas também facilitou a compreensão e retenção das informações sobre a dengue e a prevenção da doença. Através dessas estratégias, foi possível promover um aprendizado significativo, que ultrapassou o ambiente escolar, envolvendo também as famílias das crianças. Esse resultado evidencia o poder das metodologias ativas na educação, especialmente quando aplicadas a temas de saúde pública.

Além disso, a atividade proporcionou aos estudantes de Medicina uma valiosa oportunidade de aplicar conhecimentos teóricos em um contexto prático e real, reforçando a importância de habilidades de comunicação e pedagogia na formação médica. A experiência contribuiu para o desenvolvimento pessoal e profissional dos estudantes, ao mesmo tempo em que beneficiou a comunidade escolar. Dessa forma, pode-se concluir que iniciativas como esta são fundamentais para a formação de profissionais de saúde mais preparados e conscientes de seu papel social, além de promoverem impactos positivos na saúde pública por meio da educação preventiva.

Referências

  1. HARAPAN, Harapan; MICHIE, Alice; SASMONO, R. Tedjo; IMRIE, Allison. Dengue: A Minireview. Viruses, v. 12, n. 8, p. 829, 2020.
  2. ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Dengue. Disponível em: https://www.paho.org/pt/topicos/dengue. Acesso em: 18 maio 2024.
  3. SECRETARIA DE SAÚDE MUNICIPAL DE CURITIBA. Informe epidemiológico Nº 36/2023-2024. Sem. Epidemiológica 31 a 19.
  4. MARIZ, Fabiana. Vacina de dose única do Butantan contra dengue é eficaz e seguirá para aprovação da Anvisa. Última etapa dos testes clínicos mostrou segurança e alta eficácia entre pessoas de 2 a 60 anos. 31 jan. 2024. Atualizado em: 2 fev. 2024, 16:00.
  5. SGARBOSSA, C. K. et al. Relato de uma experiência de educação em saúde sobre medidas de prevenção a queimaduras e primeiros socorros para crianças. Saberes Plurais Educação na Saúde, v. 8, n. 1, p. e136127–e136127, 29 fev. 2024.