EFETIVIDADE DO MINDFULNESS NA PERCEPÇÃO DO TEMPO EM PESSOAS SAUDÁVEIS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA

EFFECTIVENESS OF MINDFULNESS ON TIME PERCEPTION IN HEALTHY PEOPLE: A SYSTEMATIC REVIEW

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202410121610


Angelina Ketllen Cachoeira de Sousa1; Renato Mendes dos Santos1; Vitor de Assis Cunha1; Beatriz Gonçalves Guimarães3; Douglas Soares de Oliveira 3; José Wheslley Rodrigues de Lucena3; Rikelmy Santos Sales 1; Maria Isabel de Vasconcelos Mavignier Neta2; PhD Victor Hugo do Vale Bastos1


RESUMO

A meditação do tipo mindfulness tem apresentado resultados bastante promissores na modulação da consciência experiencial do momento presente. Estes resultados têm despertado o interesse por pesquisas sobre esta técnica na experiência ou consciência sobre a passagem do tempo (time perception). No entanto, há carências de estudos que examinem sistematicamente seus efeitos em pessoas saudáveis. O objetivo desta revisão sistemática é sintetizar os estudos que avaliaram a eficácia do mindfulness na percepção do tempo em pessoas saudáveis. Uma busca no banco dados PubMed, Web of Science , Embase e LILACs foi realizada no período de 2013 a 2024, utilizando-se as seguintes palavras chaves: meditation, mindfulness, time perception, Underestimation and overestimation of subjective time. Foram encontrados 239 estudos, dos quais 10 se enquadram nos critérios de elegibilidade. As limitações deste estudo abrangem uma série de aspectos incluindo a escassez de dados disponíveis para certas categorias de resultados, sugerindo uma lacuna significativa na pesquisa existente.  Em relação à percepção temporal, não foi encontrada uma homogeneidade de resultados que expresse a relação da atenção plena com a superestimação, subestimação ou a estabilização do tempo.

Palavras chave: Mindfulness, atenção plena, percepcão temporal, subestimação, superestimação.

ABSTRACT

Mindfulness meditation has shown very promising results in modulating experiential awareness of the present moment. These results have sparked interest in research into this technique in the experience or awareness of the passage of time (time perception). However, there is a lack of studies that systematically examine its effects in healthy people. The objective of this systematic review is to summarize the studies that evaluated the effectiveness of mindfulness in the perception of time in healthy people. A search in the PubMed, Web of Science, Embase and LILACs databases was carried out from 2013 to 2024, using the following key words: meditation, mindfulness, time perception, Underestimation and overestimation of subjective time. 239 studies were found, of which 10 met the eligibility criteria. Limitations of this study encompass a number of aspects including the paucity of data available for certain categories of outcomes, suggesting a significant gap in existing research.  Regarding temporal perception, no homogeneity of results was found that expresses the relationship between mindfulness and overestimation, underestimation or stabilization of time.

Keywords: Mindfulness, full attention, temporal perception, underestimation, overestimation.

Introdução

O Mindfulness ou atenção plena é uma prática de meditação que se concentra no momento presente, sem julgamentos e distrações [1]. Nessa prática os indivíduos devem focar sua atenção em um objeto escolhido (uma atenção direcionada), geralmente na sensação da respiração. O treinamento de atenção plena tem dois objetivos principais. A primeira é acessar um profundo estado de calma. A segunda é focar a atenção e a consciência no que está acontecendo em seu corpo e mente, ou seja, no momento presente. Mindfulness, portanto, muda a relação com o tempo ao focar a atenção do indivíduo no momento presente, ao incentivá-lo a viver no agora [7]. Essa  intervenção  tem sido cada vez mais estudada em relação aos seus efeitos positivos na saúde mental e física, incluindo o estresse, ansiedade, depressão, dor crônica e pressão arterial, os benefícios da prática em mindfulness apontam que fazer uso dessa intervenção com regularidade tende a diminuir a vulnerabilidade a reações cognitivas e emocionais que levam ao estresse e outros problemas psicológicos [2].

Afirmando isso, pode parecer que o treinamento de atenção plena oferece uma tecnologia terapêutica barata e de uso geral que tem o potencial de ser aplicada sem a necessidade de clientes ou instrutores entenderem os problemas que estão sendo tratados ou a maneira como a mudança ocorre.  O mindfulness tem a capacidade de ser uma intervenção que combina diferentes componentes da atenção com a psicopatologia alvo; no entanto, a prática pode afetar processos comuns a diferentes patologias [6]. A literatura revisada por Baer (2003) sugere que o procedimento aparentemente simples de ensinar as pessoas a prestar atenção “de uma maneira particular” traz benefícios em uma ampla gama de transtornos [14].

A prática da técnica de atenção plena demonstrou, de fato, melhorar as habilidades de controle da atenção dos indivíduos, com meditadores apresentando melhor desempenho em diferentes tarefas de atenção do que outros participantes que nunca experimentaram [11]. Com isso, o mindfulness pode afetar a percepção temporal, quando os meditadores se concentram em um único objeto (estado interno) enquanto resiste aos distratores (estímulos irrelevantes, memórias ansiosas, humores negativos) [8].

A percepção temporal compreende vários fenômenos subjetivos incluindo a percepção da sequencialidade, simultaneidade e, mais genericamente, da duração de eventos [3]. Algumas evidências têm demonstrado alta amplitude de oscilações gama (25-42 Hz) nas áreas corticais frontal e parietal. Essas modulações na atividade gama sugerem um aumento na atenção seletiva [10]. A questão que precisamos responder é, portanto, a natureza real dos mecanismos (excitação ou atenção) subjacentes aos efeitos da meditação na percepção do tempo.

Embora muito tenha sido dito sobre meditação e tempo, é surpreendente que poucos cientistas especializados tenham examinado sistematicamente os efeitos da atenção plena nos julgamentos do tempo.

A literatura ainda apresenta lacunas sobre a influência do mindfulness e dos exercícios de atenção plena no julgamento de tempo [5]. Esta revisão sistemática tem como objetivo sintetizar os estudos que avaliaram a efetividade do mindfulness na percepção do tempo em pessoas saudáveis. Além disso, a pesquisa busca entender se esses efeitos variam de acordo com o grau de atenção e concentração durante a sessão de meditação, fornecendo insights sobre os mecanismos pelos quais a meditação mindfulness afeta a percepção temporal.

Material e Métodos

O presente estudo trata-se de uma revisão sistemática de literatura que objetiva identificar, selecionar, avaliar e sintetizar as evidências relevantes disponíveis na literatura sobre o tema [12]. Para desenvolver a revisão procedeu-se com as seguintes etapas, 1) elaboração da pergunta de pesquisa; 2) busca na literatura; 3) seleção dos artigos e definição dos critérios de inclusão; 4) extração dos dados; 5) avaliação da qualidade metodológica; 6) síntese dos dados; 7) avaliação da qualidade das evidências [12]. O estudo foi registrado no PROSPERO e aguarda avaliação do mesmo.

A pergunta utilizada para nortear esta pesquisa é “A meditação do tipo mindfulness é efetiva na melhora da percepção do tempo em pessoas saudáveis? ”. Para defini-la se utilizou o anagrama PICOS, que relaciona alguns componentes para uma boa análise, a saber: população; intervenção; comparação; desfecho e o tipo de estudo [12].  Para a População: pessoas saudáveis; na Intervenção: mindfulness; a Comparação: outra terapia/estratégia terapêutica ou grupo controle, o Outcomes (desfecho): percepção do tempo (as variáveis mais utilizadas).

A partir da definição da problemática, foram delimitados critérios de inclusão e de exclusão e definidas as palavras-chave. Na segunda etapa ocorreu a busca na literatura para localizar e selecionar os estudos relevantes [13]. Para identificar todos os estudos utilizou-se as seguintes bases de dados: PubMed, Web of Science , Embase e LILACs. Foram utilizadas as seguintes palavras chaves em Português: meditação, atenção plena,percepção do tempo, subestimação, superestimação; em Inglês: meditation, mindfulness, time perception, Underestimation and overestimation of subjective time; e emEspanhol: meditacíon, mindfulness, percepción del tiempo, subestimación y sobreestimación del tiempo subjetivo. Esses descritores foram combinados com os operadores booleanos, adaptando-os de acordo com as bases de dados utilizadas.

Na terceira etapa foram selecionados os artigos e definidos os critérios de inclusão e exclusão. Optou-se por incluir artigos primários resultados de ensaio clínico randomizado (ECR) realizados com humanos; publicados entre 2013 e 2024 com o objetivo de analisar tanto publicações mais recentes quanto estudos anteriores, ampliando a compreensão da relação entre os construtos; nos idiomas Inglês, Português e Espanhol, que estejam relacionados a meditação mindfulness, percepção temporal, subestimação e superestimação do tempo. Como critérios de exclusão estão artigos duplicados, os que não respondem à pergunta norteadora, que não tratem de meditação mindfulness, teses, artigos teóricos, artigos de revisão, meta análise, editoriais, comentários sobre artigos, livros e capítulos de livro.

A extração dos dados configura a quarta etapa da RS, e ocorreu após definição dos critérios de inclusão e exclusão supracitados, dois revisores participaram do processo de seleção e extração. Para isso foi utilizado um instrumento ad hoc, disponível na tabela número 1, onde consta a base de dados em que o estudo foi encontrado; autor e ano de publicação; características da amostra; objetivos; desfecho; métodos e resultados.

A quinta etapa corresponde à avaliação descritiva de cada estudo, dois revisores avaliaram a qualidade dos estudos. Os estudos foram categorizados de acordo com o seu objetivo, mediante análise da temática, e agrupados por proximidade temática, em categorias analíticas. Após leitura dos artigos selecionados, as categorias foram elaboradas buscando responder às perguntas desta revisão.

Os dados extraídos foram recolhidos, combinados e resumidos para tirar conclusões lógicas dos resultados dos estudos individuais [16]. A síntese considerou a força da evidência e se o efeito observado é consistente entre os estudos, bem como explicações para a possíveis inconsistências. Após reunir, avaliar a qualidade e extrair os dados, as conclusões foram realizadas por meio de uma abordagem narrativa [16].

Avaliação da qualidade metodológica

Para a avaliação da qualidade metodológica dos estudos, utilizou-se o Assessment of Multiple Systematic Reviews (AMSTAR), um instrumento validado e rigorosamente desenvolvido. O objetivo era minimizar viés de seleção, viés de informação e outros tipos de viés que pudessem influenciar os resultados do presente estudo. Dois revisores realizaram a avaliação dos artigos, e em caso de divergência, um terceiro revisor foi incluído no processo de avaliação. O AMSTAR consiste em 14 itens, os quais foram avaliados individualmente, considerando que são independentes entre si.

Fluxograma do estudo

Fonte: Autora, 2024

Resultados

Os resultados abordaram um total de 10 estudos que investigaram os efeitos da meditação do tipo mindfulness na percepção temporal em diferentes contextos e populações, ao todo 901 indivíduos participaram das amostras (tabela 1). Cada estudo trouxe contribuições valiosas para compreender a relação entre o mindfulness e percepção do tempo, explorando algumas variáveis como sensibilidade ao tempo e diferenças de gênero. Dentre os estudos, um investigou a especificidade do efeito da meditação mindfulness na percepção do tempo, revelando um aumento na percepção temporal e uma redução da ansiedade entre os participantes. Por sua vez, outro abordou como a técnica influencia a estimativa da duração temporal, observando uma tendência à superestimação do tempo após a prática. Além disso, outros pesquisadores exploraram as influências de dimensões psicológicas, como atenção plena e impulsividade, na estimativa de duração e julgamentos de passagem de tempo, ressaltando uma associação entre atenção plena e superestimação das durações.

Um estudo examinou se a prática de mindfulness leva a uma dilatação do agora subjetivo, destacando que os praticantes percebem o presente como mais longo em comparação com não praticantes. Em contraste, outro avaliou os efeitos da meditação na percepção do tempo, encontrando uma subestimação das durações de intervalos com a prática de meditação. Explorando o impacto do sexo biológico na inter-relação entre percepção corporal, espacial e temporal, um estudo identificou uma influência do sexo na consciência do espaço, especialmente entre os praticantes de meditação. Enquanto isso, outra pesquisa comparou praticantes de mindfulness e não meditadores em relação à percepção do tempo, revelando uma relação moderada entre a experiência do tempo e a frequência cardíaca.

Investigando a atividade neural associada a alterações na percepção do tempo e espaço entre praticantes de meditação mindfulness, um estudo identificou padrões lineares e descontinuidades na função temporal. Essas investigações forneceram uma ampla gama de informações sobre os efeitos da meditação na percepção temporal, evidenciando a complexidade dessa relação e a necessidade contínua de pesquisa. Com base nos resultados desses estudos sobre os efeitos do mindfulness na percepção do tempo, algumas conclusões importantes podem ser tiradas: A prática regular parece estar associada a uma alteração na percepção temporal, incluindo uma tendência à superestimação do tempo em alguns casos, como observado por Kramer (2013) [4] e Weiner (2016) [27]. A relação entre mindfulness e percepção temporal é complexa e multifacetada, influenciada por fatores psicológicos, como ansiedade, atenção plena e impulsividade, conforme evidenciado por Weiner (2016) [27].

Existem diferenças de gênero na percepção do tempo entre os praticantes de meditação mindfulness, como observado por Pintimalli (2023) [26], o que sugere que variáveis como sexo biológico podem modular a relação entre mindfulness e percepção temporal. A prática de mindfulness pode levar a uma dilatação do agora subjetivo, conforme indicado por Sauer (2012), o que sugere uma mudança na experiência do tempo presente entre os meditadores em comparação com os não meditadores. Além disso, há evidências de que a prática pode influenciar a atividade neural associada à percepção do tempo, como mostrado por Glicksoh (2019), sugerindo que os efeitos da mindfulness podem ser refletidos em níveis neurobiológicos. Em suma, esses resultados destacam a complexidade da relação entre meditação mindfulness e percepção temporal, sugerindo que a prática ter efeitos significativos na forma como percebemos e julgamos o tempo, com implicações importantes para a compreensão da mente humana e o desenvolvimento de intervenções terapêuticas baseadas na técnica.

Tabela 1: Síntese de resultados

Discussão

Este estudo propõe uma revisão sistemática de pesquisas que abordaram a interação entre percepção do tempo e prática de mindfulness. Após uma análise das relações entre esses dois fenômenos, foram derivadas conclusões a partir dos dados revisados, culminando em uma discussão sobre suas implicações teóricas e sugerindo possíveis direções para investigações futuras. Para direcionamento do estudo, buscou responder a seguinte questão: meditação do tipo mindfulness é efetiva na melhora da percepção do tempo em pessoas saudáveis?. A meditação em Mindfulness, traduzida para o português como atenção plena, é uma intervenção muito eficaz e que tem sua repercussão em muitos segmentos, como por exemplo há evidências que o mindfulness é benéfico no contexto escolar [18], e usado como terapia cognitiva [19] e em diversas áreas da saúde. Nessa conjunção, a técnica vem sendo estudada ao longo dos anos e com isso se observou em muitos estudos que a percepção do tempo do meditador era bem variada, sendo muito cambiantes tornando assim uma lacuna na literatura.

Buscando responder à pergunta norteadora, na análise dos estudos ficou evidente que a concepção presente na literatura de que mindfulness afeta a percepção dos meditadores é corroborada em todos os estudos presentes, e que os autores a partir de inspeção buscaram entender se a percepção temporal a partir da meditação mindfulness, dilata, contrai ou estabiliza o tempo percebido. Nesse quadro, o primeiro estudo a ser visto foi realizado com 31 novos participantes (16 no grupo de meditação e 15 no grupo de relaxamento), a diferença foi que os participantes foram treinados para realizar exercícios de meditação ou relaxamento em função de seu grupo (meditação versus relaxamento) antes de realizar a tarefa temporal, o grupo de meditação e relaxamento mostrou que os exercícios de mindfulness aumentaram a sensibilidade ao tempo e ampliaram o tempo percebido.  Essa melhora no desempenho temporal com exercícios de meditação foi observada principalmente nos participantes que já haviam praticado meditação anteriormente, ou seja, todos os dias por um período de 5 semanas, e nesse caso a percepção do tempo é dilatada[20], concomitantemente o estudo que incluía 38 especialistas em mindfulness e 38 não praticantes, que os critérios de inclusão foram pelo menos 5 anos de prática diária de meditação para o grupo de meditação e nenhuma experiência de meditação para o grupo de controle, foi empregado o Cubo de Necker como paradigma para investigar a dinâmica temporal da consciência, como o agora subjetivo. Concluíram que o presente agora pode ser mais longo para os meditadores do que para os não meditadores, e que a atenção plena pode transmitir esse efeito, corroborando o estudo de S. Droit-Volet [20].

Um estudo foi realizado com um total de 60 participantes, divididos em dois grupos de igual tamanho: um grupo de controle e um grupo experimental. Ambos os grupos seguiram um protocolo semelhante, com a única diferença sendo o tipo de atividade realizada durante o experimento. O grupo experimental realizou exercícios de mindfulness body-scan, enquanto o grupo de controle ouviu poemas. Ambas as atividades tiveram a mesma duração de 30 minutos e foram realizadas enquanto os participantes estavam deitados com os olhos fechados. Os resultados revelaram que, durante os exercícios de atenção plena, houve uma subestimação da passagem do tempo em comparação com o grupo de controle, especialmente em intervalos de vários segundos (entre 16 e 50 segundos). Diante desses resultados, o estudo foi refinado, reduzindo a amostra para 42 participantes, dos quais 20 eram meditadores experientes e 22 eram controles. Não houve diferenças significativas de idade entre os dois grupos. Ambos os grupos, controle e experimental, participaram de uma sessão adicional de meditação mindfulness, durante a qual ouviram uma gravação de áudio através de fones de ouvido. Os resultados indicaram que uma pontuação mais alta em atenção plena estava associada a uma percepção de que o tempo passava mais rapidamente [23].

O estudo foi realizado em duas fases distintas, cada uma com o objetivo de explorar os efeitos dos exercícios de mindfulness na percepção temporal de estudantes universitários de psicologia. Na primeira fase, uma amostra inicial de trinta participantes (composta por 15 mulheres e 15 homens) foi recrutada. Todos os participantes não tinham experiência prévia em práticas de meditação, incluindo ioga, garantindo uma base uniforme para a pesquisa. Durante esta fase inicial, os participantes foram submetidos a um exercício de mindfulness com duração de 30 minutos. Dentro desse período, eles foram instruídos a realizar julgamentos prospectivos de tempo, estimando o intervalo temporal entre dois bipes ocorridos nos últimos 15 minutos do exercício. Para fins de comparação, duas condições de controle foram implementadas: uma envolvendo uma tarefa que demandava atenção e outra que não. Na segunda fase do estudo, uma nova amostra de 90 alunos de graduação em psicologia, também sem histórico de práticas meditativas, foi recrutada. Os mesmos procedimentos e tarefas temporais da fase anterior foram aplicados nesta etapa subsequente da pesquisa. Os resultados revelaram consistentemente um fenômeno de encurtamento nas estimativas de tempo em ambas as fases do estudo. Esses achados corroboram estudos anteriores e evidenciam a influência significativa dos exercícios de mindfulness na percepção do tempo, conforme documentado na literatura científica [24].

Um estudo com 40 graduandos da Universidade de Kent, objetivou analisar as diferenças individuais no julgamento da passagem do tempo, para isso os grupos controle e o experimental, foram apresentados a dois estímulos de duração de tempo, um longo (1600 ms), e um curto (400 ms). Posteriormente foram apresentados outros estímulos para que os participantes os classificassem como longos ou curtos. O grupo experimental ficou mais propenso a classificar mais estímulos como longos após as intervenções mindfulness, enquanto que o grupo controle que recebeu intervenção neutra (audiobook), não apresentou alterações pós intervenção. Com isso concluiu-se que as intervenções promoveram maior superestimação do tempo, do que estímulos neutros como ouvir um áudio livro [25].

Outro estudo foi realizado com 280 participantes homens e mulheres entre 21 e 73 anos de idade, alguns possuíam alguma experiência em outros tipos de meditação. As pessoas praticam uma técnica de meditação do Lugar de Pré-Existência (PPEt) por meio de um áudio gravado. O objetivo da pesquisa foi examinar a relação entre percepção temporal, espacial e corporal, bem como os impactos da meditação e do sexo biológico nesses processos. Por meio da escala visual analógica (EVA) avaliou-se o nível de relaxamento; O Subjective Time, Self, Space inventário (STSS) foi utilizado; e para avaliar a percepção espacial e temporal, escalas Likert de 7 pontos; outra escala likert de 10 pontos foi usada para mensurar a percepção da velocidade da passagem, e intensidade do tempo, também se utilizou de autorrelato para avaliar essas duas dimensões; por fim solicitou-se que expressassem através de percentuais o quanto presente e passado e futuro caracterizavam sua experiência atual, as três partes somadas deveriam representar 100%. Mediante análise estatística, a pesquisa concluiu que os homens apresentaram diminuição da consciência espacial em função da experiência em meditação, enquanto as mulheres mostraram um padrão oposto. A velocidade e a intensidade da experiência do tempo correlacionam-se com a consciência do corpo e do espaço. O relaxamento e a experiência subjetiva da intensidade do tempo foram fortemente correlacionados [26].

Outra pesquisa visou explorar as influências dos aspectos psicológicos como bem-estar emocional, atenção plena, impulsividade e ruminação na estimativa de duração e julgamentos de passagem de tempo. A amostra foi de 117 indivíduos saudáveis ​​com idades entre 17 e 56 anos, 59% da amostra foi composta por mulheres. Os seguintes instrumentos foram aplicados: atenção plena (FFMQ), impulsividade (BIS-11), ruminação (RRS) e depressão (BDI-sf). Quatro tarefas de estimativa verbais, seguidas de um julgamento subjetivo da passagem do tempo, foram administradas. Após as tarefas de estimativa, quatro tarefas de produção foram administradas. Os resultados sugerem que a percepção da duração e a sensação da passagem do tempo são aspectos diferentes entre si, e foram influenciadas tanto por eventos externos quanto por traços de personalidade. Níveis elevados de atenção plena foram associados à superestimação e à sensação de passagem mais rápida do tempo. Os participantes mais atentos mostraram uma superestimação aumentada das durações, mas sentiram uma passagem de tempo mais rápida, o que levou à conclusão de que duração e percepção da velocidade da passagem do tempo são dimensões diferentes [27].

Outro estudo foi realizado com uma amostra de pessoas saudáveis, com idade entre 21 e 50 anos. Foram 22 praticantes regulares e experientes em mindfulness, pareados por sexo, idade e escolaridade com 22 participantes controle sem experiência em qualquer tipo de meditação. O objetivo do estudo foi comparar o papel dos sinais corporais e capacidades de atenção a estímulos internos e externos para estimativa de tempo. Os resultados evidenciam que o tempo subjetivo pode resultar ou ser mediado pela integração de todos os sinais corporais dos quais só podemos avaliar uma seleção; observou-se uma relação moderada entre frequência cardíaca e experiência do tempo, mas não foi encontrada diferença entre os meditadores e o controle. Não se pode concluir que as medidas psicofisiológicas empregadas no estudo sejam indicadores suficientes do tempo subjetivo [28].

Um ensaio clínico randomizado, objetivou investigar por meio de uma tarefa de bio-seção temporal, os efeitos das alterações de atenção promovidos por intervenções mindfulness na percepção do Tempo e nas ondas cerebrais, no estudo foi realizada entrevista clínica com 31 participantes, para avaliar saúde mental, e doenças cerebrais. A atenção plena foi avaliada com o instrumento Freiburg. Em seguida foram divididos aleatoriamente entre grupo experimental (16 participantes) e controle (15 participantes). Os grupos receberam respectivamente um arquivo de áudio de atenção plena de 13 minutos, e um arquivo neutro. Os grupos se submeteram a tarefa de bio-secção temporal, enquanto as potências de suas ondas cerebrais eram calculadas em diferentes bandas, antes e depois da exposição à variável independente. A potência normalizada foi calculada, e apresentou aumento percentual na potência do intervalo de referência para o intervalo de excitação. A investigação concluiu que a atenção plena aumentou os índices de superestimação, e reduziu os bipontos de seção (Bp) [29].

40 voluntários, sendo 20 adultos (35 – 55 anos), e 20 adolescentes (15 – 25 anos) realizaram uma tarefa de discriminação e uma de reprodução de tempo com o objetivo de investigar a percepção de tempo em indivíduos de distintas fases do desenvolvimento. Os adolescentes apresentaram mais respostas acertadas que os adultos na tarefa de discriminação de tempo e reproduziram intervalos temporais menos divergentes dos estímulos-alvo na tarefa de reprodução de tempo. Com isso concluiu-se que adolescentes tendem a apresentaram uma taxa média de erro relativa menor do que a outra faixa etária na percepção do tempo [30].

Limitações

As limitações deste estudo abrangem uma série de aspectos que merecem uma análise detalhada. Primeiramente, destaca-se a escassez de dados disponíveis para certas categorias de resultados, sugerindo uma lacuna significativa na pesquisa existente. Em segundo lugar, é importante ressaltar a prevalência relativamente baixa de estudos na literatura de origem e ainda as discrepâncias amostrais, o que pode comprometer a robustez das conclusões obtidas. Essas limitações destacam a necessidade premente de investigações adicionais e mais abrangentes para elucidar completamente o tema em questão.

Conclusão

Esta revisão abordou os efeitos da meditação mindfulness na percepção do tempo em adultos saudáveis. Observou-se que meditadores experientes tendem a superestimar a passagem do tempo, percebendo-o como mais rápido, enquanto homens, independentemente da prática de meditação, mostraram uma diminuição na percepção temporal. Por outro lado, mulheres, tanto meditadoras quanto não meditadoras, tendem a superestimar o tempo. Em relação aos adolescentes, estes parecem ter uma percepção temporal mais neutra em comparação com os adultos. No entanto, não houve uma conclusão consistente sobre a relação entre atenção plena e a percepção do tempo. Esses resultados apontam para a necessidade de futuras pesquisas para compreender melhor a dinâmica entre meditação mindfulness e percepção temporal.

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1Laboratory of Brain Mapping and Functionality, Federal University of Delta do Parnaíba (UFDPar), Piauí, Parnaíba, Brazil.

2Master in  Biotechnology, Federal University of Delta do Parnaíba (UFDPar), Piauí, Parnaíba, Brazil.

3Biomedicine, Federal University of Delta do Parnaíba (UFDPar), Piauí, Parnaíba, Brazil.

4Graduate Program in Biotechnology, Federal University of Delta do Parnaíba (UFDPar), Piauí, Parnaíba, Brazil