EFEITOS TÓXICOS DO FORMALDEÍDO E A REGULAMENTAÇÃO APLICADA EM ATIVIDADES OCUPACIONAIS

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.12685926


Ricardo da Silva
Orientadora: Mariana Angélica Silveira Melo


RESUMO

O artigo tem como objetivo apresentar a toxicidade do formaldeído, bem como os limites de exposição regulamentados e os métodos analíticos para monitorar a concentração no ar para avaliar a exposição na forma gasosa, atendendo a Norma Regulamentadora (NR) 9 [2] e a Norma Regulamentadora (NR) 15, Anexo 11 [3]. Para tanto, foi necessário analisar o conteúdo e as recomendações de normas nacionais e internacionais, métodos analíticos publicados pelo National Institute of Occupatinal Safety and Health NIOSH [6], e referências à publicação interministerial entre Ministério do Trabalho e Emprego, Previdência e Saúde, Lista Nacional da Classificação de Agentes Carcinogênicos Humanos – LINACH [10]. Segundo Silbergeld, Ellen K. [8] “A toxicologia pode ser dividida em disciplinas, como toxicologia clínica, forense, investigativa e regulatória; Pode estar presente também do ponto de vista de suas funções, em pesquisa, teste e avaliação de riscos.”

O amplo uso do formaldeído em atividades domésticas, de procedimentos de estética capilar, em ambientes hospitalares e de laboratórios de pesquisa, bem como na indústria promove oportunidades de exposição ocupacional com elevado risco à saúde. O formaldeído é classificado como carcinogênico humano confirmado em publicações brasileiras e internacionais. O governo do Brasil através de uma Portaria incluiu o formaldeído em uma lista de substâncias confirmadas como carcinogênico humano. É fato que o risco é existente, entretanto, há métodos adequados e validados que devem ser aplicados no monitoramento da concentração do formaldeído no ar e no controle das exposições a fim de evitar danos à saúde. A aplicação desses requisitos é de caráter compulsório e requer que seja executado por profissional habilitado e especializado.

PALAVRAS-CHAVE: Formaldeído. Limite de exposição. Métodos de avaliação.

1 INTRODUÇÃO

O objetivo desse artigo é apresentar a toxicidade do formaldeído, sua aplicação em atividades ocupacional, bem como os limites de exposição e a forma de mensurar a concentração no ar interno de ambientes de trabalho.

Certas atividades industriais ou profissões estão associados a grande contato com agentes de alto potencial tóxico. O formaldeído é comum em exposições desde um profissional da beleza, como exemplo o cabeleireiro nos procedimentos de escova progressiva até em processos industriais de maior complexidade envolvendo o uso de soluções de formaldeído como agente biocida e o contato ou inalação em processos de decomposição térmica na presença do oxigênio em máquinas com elevada temperatura.

Segundo Buschinelli, José Tarcísio Penteado (2020, Toxicologia Ocupacional), descreve: “[4] A Toxicologia estuda os efeitos danosos de substancias químicas nos organismos vivos com vistas a prevenção e, em caso de falha, ao tratamento dos afetados. A questão, porem, e que não ha substancias químicas com ou sem efeitos danosos, mas sim doses com potencial nocivo – dose, neste contexto, entendida como aquela interna, ou seja, a quantidade de substancia efetivamente absorvida pelo organismo a ponto de poder afeta-lo.

A Toxicologia Ocupacional e eminentemente preventiva, sendo-lhe fundamental a correta avaliação do risco a que o trabalhador esta exposto. Para isso, o primeiro passo e a informação qualitativa: qual(is) substância(s) está(ão) sendo utilizada(s) ou gerada(s) no processo.”

2       DESENVOLVIMENTO

O formaldeído é um dos mais comuns produtos químicos de uso atual. É o aldeído mais simples, de fórmula molecular H2CO e seu nome químico metanal (União Internacional de Química Pura e Aplicada (em inglês: International Union of Pure and Applied Chemistry, IUPAC). Possui registro no Chemical Abstracts Service (CAS), uma divisão da Chemical American Society, sob o número 50-00-0. A solução aquosa de formaldeído, em regra diluída a 45%, denomina-se formol ou formalina. A massa molar é de 30,03 g/mol, com densidade de 815 kg/m³, ponto de ebulição -19 °C e a classificação como aldeído, sendo também registrado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como composto orgânico volátil (VOC).

Metanol ou outras substâncias são geralmente adicionados às soluções como estabilizadores para reduzir a polimerização intrínseca.

O formaldeído se decompõe a 150 °C em metanol e outros compostos, é altamente reativo com outros produtos químicos. Na luz do sol, é facilmente foto-oxidado em dióxido de carbono.

O formaldeído tem uma variedade de usos em muitas indústrias, tem aplicações como esterilizante e é usado como conservante em produtos de consumo, como alimentos, cosméticos e agentes limpeza doméstica.

Um dos usos mais comuns é em uréia-formaldeído e melamina-resinas de formaldeído. Espuma de uréia-formaldeído é usada para isolar edifícios; pode continuar a emitir formaldeído após a instalação ou constituindo uma fonte de emissão persistente.

Existem várias fontes ambientais internas que podem resultar em exposição humana, incluindo cigarros e produtos de tabaco, móveis contendo resinas à base de formaldeído, materiais de construção contendo resinas de uréia-formaldeído, adesivos contendo formaldeído usados para dar acabamento em superfícies de plástico e carpete, tapetes, tintas e desinfetantes.

As áreas internas de especial importância são hospitais e laboratórios onde o formaldeído é usado como esterilizante e agente preservação em espaços de convivência, como escolas, creches e casas ou apartamentos onde pode haver emissões descontroladas de formaldeído oriundas do fumo do tabaco, materiais de construção e móveis.

As emissões de formaldeído de processos industriais variam amplamente de acordo com os tipos de indústria. Uma quantidade considerável de formaldeído vem das emissões de escapamento de veículos motorizados, mas este varia muito de acordo com o país e o tipo de combustível.

O formaldeído é prontamente absorvido nas vias respiratória e no trato gastro-intestinal. Os aumentos nas concentrações sanguíneas de formaldeído não foram detectado em ratos ou seres humanos expostos ao formaldeído por via inalatória, por causa da rápida metabolização. Os metabólitos do formaldeído são incorporados e são eliminadas no ar expirado e na urina.

O formaldeído é usado como desinfetante para matar vírus, bactérias, fungos e parasitas, mas só é eficaz em níveis relativamente altos de concentrações.

O formaldeído tem um odor pungente detectável pelo olfato em concentrações relativamente prejudiciais, e seus vapores e soluções são irritantes para a pele e os olhos em seres humanos. Os efeitos comuns da exposição ao formaldeído estão relacionados a vários sintomas causados por irritação da mucosa dos olhos e das vias respiratórias superiores.

Existem alguns relatos de casos de sintomas semelhantes aos da asma causados pelo formaldeído. A sensibilização da pele é induzida apenas pela pele em contato direto com soluções de formaldeído em concentrações superiores a 20 g/litro (2%).

Há diversas evidências e registros em base de dados toxicológicos para seres humanos indicando que o formaldeído é classificado como ou possui alto potencial carcinogênico.

O formaldeído pode afetar o organismo humano através das rotas de exposição inalação, contato com a pele e com olhos. Possui afinidade em afetar os olhos e o sistema respiratório. A concentração imediatamente perigosa para vida e para saúde (IPVS) é de 20 ppm. A (Tabela 1) apresenta os limites de exposição ocupacional utilizados em diversos países no mundo para o formaldeído, alguns utilizando a concentração média pondera outros com limite valor teto ou limite para exposições de curta duração de até 15 minutos. No Brasil há limite de exposição ocupacional, valor teto, que não pode ser ultrapassado ao longo da jornada de trabalho, determinado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, na Norma Regulamentadora (NR) 15, quadro 1 do anexo 11, com concentração máxima permitida de 1,6 ppm.

 Tabela 1. Limites de Exposição Ocupacional para o Formaldeído disponível no mundo.

OrganizaçãoPadrão
Mine Safety and Health Administration (MSHA) STANDARDConcentração máxima permitida no ar: 2 ppm (3 mg/m³)
Limite de Exposição Ocupacional na ARGENTINA, BULGARIA, COLÔMBIA, JORDÂNIA, SINGAPURA, VIETNAM, (Utilizam Valores Limites (TLV) da American Conference of Governmental Industrial Hygienists (ACGIH)Concentração média ponderada no tempo: 0,1 ppm Limite para Curto Tempo de Exposição: 0,3 ppm Classificado como carcinogênico humano, Sensibilizante, Irritante do trato respiratório superior e olhos
República ÁrabeConcentração média ponderada no tempo: 2 ppm (3 mg/m³)
AUSTRÁLIAConcentração média ponderada no tempo: 1 ppm (1.2 mg/m3); Limite para Curto Tempo de Exposição: 2 ppm (2.5 mg/m³), Classificado como carcinogênico humano
BÉLGIUCALimite para Curto Tempo de Exposição: 0.3 ppm (0.38 mg/m³)
DINAMARCAConcentração máxima permitida no ar: 0.3 ppm (0.4 mg/m³), Classificado como carcinogênico humano
FINLÂNDIAConcentração média ponderada no tempo: 0.3 ppm (0.37 mg/m³), Concentração máxima permitida no ar: 1 ppm (1.2 mg/m³)
FRANÇAConcentração média ponderada no tempo: 0.5 ppm, Classificado como carcinogênico humano
ALEMANHÃConcentração média ponderada no tempo: 0.3 ppm (0.37 mg/m³)
HUNGRIAConcentração média ponderada no tempo: 0.6 mg/m³, Limite para Curto Tempo de Exposição: 0.6 mg/m³, Afeta a pele
ISLÂNDIAConcentração média ponderada no tempo: 0.3 ppm (0.4 mg/m³), Limite para Curto Tempo de Exposição: 1 ppm (1.2 mg/m³), Sensibilizante

  Tabela 1. Continuação

OrganizaçãoPadrão
JAPÃOConcentração média ponderada no tempo: 0.1 ppm (0.12 mg/m3), Classificado como carcinogênico humano, Sensibilizante Concentração máxima permitida no ar: 0.2 ppm (0.24 mg/m³)
KORÉAConcentração média ponderada no tempo: 1 ppm (1.5 mg/m3), s Limite para Curto Tempo de Exposição: 2 ppm (3 mg/m³)
MÉXICOConcentração de Pico: 2 ppm (3 mg/m³)
NOVA ZELÂNDIAConcentração máxima permitida no ar: 1 ppm (1.2 mg/m³), Sensibilizante
NOROEGAConcentração média ponderada no tempo: 0.5 ppm (0.6 mg/m³)
PERÚConcentração média ponderada no tempo: 0,3 ppm (0,37 mg/m³)
POLÔNIAConcentração média ponderada no tempo: 0.5 mg/m³, Limite para Curto Tempo de Exposição: 1 mg/m³
RÚSSIALimite para Curto Tempo de Exposição: 0.5 mg/m³, Afeta a pele
SUÉCIAConcentração média ponderada no tempo: 0.5 ppm (0.6 mg/m³), Concentração máxima permitida no ar: 1 ppm (1.2 mg/m³), Classificado como carcinogênico humano, Sensibilizante
SUÍÇAConcentração média ponderada no tempo-semanal 0.3 ppm (0.37 mg/m³), Máxima-semanal 0.6 ppm (0.74 mg/m³), Classificado como carcinogênico humano, Sensibilizante
TAILÂNDIAConcentração média ponderada no tempo: 3 ppm, Limite para Curto Tempo de Exposição: 5 ppm
FILIPINASConcentração média ponderada no tempo: 5 ppm (6 mg/m³)
TURQUIAConcentração média ponderada no tempo: 5 ppm (6 mg/m³)

  Tabela 1. Continuação

OrganizaçãoPadrão
REINO UNIDOConcentração média ponderada no tempo: 2 ppm (2.5 mg/m³)
Estados Unidos da América – Occupational Safety and Health Administration (OSHA)Concentração média ponderada no tempo: 0,75 ppm (0,92 mg/m³) Concentração máxima permitida no ar: 2 ppm (2.5 mg/m³)

  Fonte: Autor, adaptado de Pocket Guide To Chemical Hazard, NIOSH [9]

A Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos (LINACH) foi publicada pela Portaria Interministerial MTE/MS/ MPS nº 09, de 7 de outubro de 2014, pelos Ministérios do Trabalho e Emprego (MTE), Previdência Social (MPS) e da Saúde (MS). A lista tem como objetivo balizar as políticas públicas e de prevenção em âmbito nacional.

Esta listagem é composta por três grupos de agentes considerados cancerígenos:

I – Grupo 1 – carcinogênicos para humanos;

II – Grupo 2 A – provavelmente carcinogênicos para humanos; e

III – Grupo 2 B – possivelmente carcinogênicos para humanos.

A LINACH reúne a tradução da lista de agentes classificados por estudos da Agência de Pesquisas sobre Câncer (IARC) da Organização Mundial de Saúde (OMS), com previsão de atualizações semestrais pelos Ministérios e órgãos responsáveis.

O formaldeído está listado nesse documento como grupo 1, carcinogênicos confirmados para humanos.

A análise química para formaldeído envolve extração direta de amostras sólidas e líquidas durante a absorção e/ou concentração por amostragem ativa (filtração) ou passiva (difusão). Uma variedade de absorventes está disponível. Baixa concentração trações no ar pode ser detectada, após absorção adequada, por meio de cromatografia líquida de alta eficiência.

O método de referência para amostragem e análise da concentração do formaldeído no ar, NIOSH 2016 é o método atualmente mais utilizados pelos laboratórios com capacidade de execução dessa técnica. O método é validado e reconhecido no Brasil e em muitos países. Na (Tabela 2) são apresentadas as características do método aplicado a determinação da concentração do formaldeído no ar.

Tabela 2. Características dos métodos analíticos disponíveis

MétodoMétodo de cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) por captação ativado com sílica gel impregnada com cloridrato 2,4-dinitrofenilhidrazina 
AmostradorTubo de sílica gel (300mg /150mg) impregnado com cloridrato 2,4-dinitrofenilhidrazina 
Vazão e tempo de amostragemCondições AnalíticasInterferênciasTransporte e Armazenamento
De 0,3 a 0,5 L/min para um período de amostragem de 15 min.-Técnica: Cromatografia líquida de alta eficiência com detecção UV. -Coluna: Sílica funcionalizada com octadecilsilano C18 5μm, 25 cm x 4,6 mm. -Detector de diodo UV visível -Matriz: comprimento de onda de 365 nm -Eluente: Metanol / água 65/35 (v / v). -Fluxo: 1,5 ml / min. -Limite de detecção estimado: 2 μg/m³ -Faixa de aplicação: 0,1 a 4 mg/m³ para um volume de 10 litros.O ozônio e outros aldeídos presentes no ambiente podem reagir com 2,4 DNPH, mas estas interferências podem ser resolvidas definindo condições cromatográficas adequadas.Armazenamento a 4 °C. Tempo entre amostragem e extração não deve exceder 2 semanas.

Fonte: Autor, adaptado de Instituto Nacional de Segurança e Higiene do Trabalho – Ministério do Trabalho e Ações Sociais da Espanha. Nota Técnica de Prevenção (NTP) 873 publicada em 2010 [5].

O Instituto Nacional de Segurança e Higiene do Trabalho – Ministério do Trabalho e Ações Sociais da Espanha relata outros cinco métodos na Nota Técnica de Prevenção (NTP) 873 publicada em 2010, entre eles, podem ser consultados o NIOSH 2541, NIOSH 3500, NIOSH 3800, OSHAID205 e OSHA 52.

3       Conclusão

A exposição ao formaldeído pode ocorrer em ambientes fechados ou ainda ao ar livre. A forma gasosa afeta a qualidade do ar em ambientes domésticos e locais de trabalho ofertando risco aos ocupantes.

Formaldeído é um produto tóxico que causa irritação na pele, nos olhos, nariz e garganta, é considerado carcinogênico humano confirmado em publicações nacionais, internacionais e documentos legais publicados por órgãos governamentais do Brasil.

Há métodos analíticos apropriados e validados para monitoramento da concentração do formaldeído no ar. Os métodos estão disponíveis nas páginas de organizações internacionais com acesso gratuito e são de fácil aplicação para um laboratório de ensaios em química analítica que possua capacidade de executar cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC).

4       ReferÊNCIAS
  1. ACGIH. 2021. TLVs and BEIs: Threshold limit values for chemical substances and physical agents biological exposure indices. American Conference of Governmental Industrial Hygienists. Cincinnati, OH.
  2. BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. NR 9: PPRA, Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF. Disponível em: <https://www.gov.br/trabalho-e-previdencia/pt-br/composicao/orgaos-especificos/secretaria-de-trabalho/inspecao/seguranca-e-saude-no-trabalho/ctpp-nrs/norma-regulamentadora-no-9-nr-9>. Acesso em: 16 jul. 2020.
  3. BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. NR 15: PPRA, Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF. Disponível em: https://www.gov.br/trabalho-e-previdencia/pt-br/composicao/orgaos-especificos/secretaria-de-trabalho/inspecao/seguranca-e-saude-no-trabalho/normas-regulamentadoras/nr-15-anexo-11.pdf. Acesso em: 16 jul. 2020.
  4. Buschinelli, José Tarcísio Penteado. Toxicologia Ocupacional. São Paulo: Fundacentro, 2020. 622 pág.
  5. Instituto Nacional de Segurança e Higiene do Trabalho – Ministério do Trabalho e Ações Sociais da Espanha. Nota Técnica de Prevenção (NTP) 873 publicada em 2010.
  6. NATIONAL INSTITUTE FOR O CCUPATIONAL SAFETY AND HEALTH. Formaldehyde Method nº 2016 Manual of Analytical Methods (NMAM), Fourth Edition, 1998, NIOSH, Cincinnatti Oh, USA.

Engenheiro Ambiental / Químico; Engenheiro de Segurança do Trabalho; Mestrando pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) – SP; MBA Gestão Ambiental; Especialista em Química Forense, Metrologia e Qualidade, Higiene Ocupacional, Ergonomia e Acústica e Luminotécnica.