REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202506100351
Camila de Fátima Santos1
Orientadores: Alex Oliveira2
Angélica Barboza3
Gabriel Salles4
RESUMO
Objetivo: avaliar as evidências disponíveis na literatura sobre a interferência do cateter nasal de alto fluxo no trabalho respiratório de pacientes pediátricos com exacerbação dos quadros asmáticos.
Métodos: Foram realizadas buscas de artigos científicos publicados nas bases de dados Pubmed, Scielo, Google acadêmico, no período de 2017 a 2024. Incluídos estudos que abordassem o uso do cateter nasal de alto fluxo e seus efeitos no trabalho respiratório em asmáticos.
Resultados: Um total de 8 artigos foram encontrados envolvendo o uso da CNAF em pacientes asmáticos. No geral, a CNAF demonstrou potencial para melhorar a oxigenação e reduzir o esforço respiratório, efeitos observados em 38% dos casos analisados. Cinco estudos compararam este dispositivo com oxigenoterapia convencional e outros três com ventilação não-invasiva. Três estudos (38%) relataram melhorias no componente respiratório com o uso do CNAF, outros três (38%) obtiveram resultados menos favoráveis e em dois (25%) não encontraram diferenças significativas entre as intervenções.
Conclusão: Apesar dos benefícios respiratórios alcançados com o uso da CNAF, os resultados não foram consistentes. Os efeitos podem variar conforme a gravidade e as condições clínicas dos pacientes, além disso, quando comparada a outras intervenções, a terapia não demonstrou superioridade significativa nos estudos analisados.
Palavras chaves: cateter nasal de alto fluxo, asma, efeitos fisiológicos, trabalho respiratório, crianças.
ABSTRACT
Objective: To evaluate the available evidence in the literature regarding the impact of high-flow nasal cannula (HFNC) on the respiratory effort of pediatric patients experiencing asthma exacerbations.
Methods: A literature search was conducted in the databases PubMed, SciELO, and Google Scholar for scientific articles published between 2017 and 2024. Studies were included if they addressed the use of HFNC and its effects on respiratory effort in asthmatic patients.
Results: A total of 8 articles were found that involved the use of HFNC in asthmatic patients. Overall, HFNC showed potential to improve oxygenation and reduce respiratory effort, effects observed in 38% of the analyzed cases. Five studies compared HFNC with conventional oxygen therapy, and three others with non-invasive ventilation. Three studies (38%) reported improvements in respiratory function with HFNC use, another three (38%) showed less favorable results, and the remaining two (25%) found no significant differences between interventions.
Conclusion: Despite the respiratory benefits observed with HFNC, the results were not consistent. The effects may vary depending on the severity and clinical condition of the patients. Furthermore, when compared to other interventions, this therapy did not demonstrate significant superiority in the studies reviewed.
Keywords: high-flow nasal cannula, asthma, physiological effects, respiratory effort, children.
INTRODUÇÃO
A asma é uma doença inflamatória crônica das vias aéreas, que afeta indivíduos suscetíveis e é caracterizada por obstrução intermitente ao fluxo aéreo, tendo reversão espontânea ou com tratamento, bem como hiper responsividade das vias a uma variedade de estímulos. 1 Decorre da interação entre genética, exposição ambiental e outros fatores específicos que desencadeiam os sintomas.2 É a doença crônica mais frequente em crianças e adolescentes1, afetando 1 em cada 12 crianças nascidas, geralmente começa na infância, com quase metade dos bebês sibilando no primeiro ano de vida, e a maioria desenvolvendo asma persistente aos seis anos de idade 3. Nessa faixa etária representa uma das principais causas de absenteísmo escolar, afetando o desenvolvimento social e educacional dessa população4.
Estima-se que aproximadamente 334 milhões de pessoas no mundo sejam afetadas pela asma,5 com cerca de 250.000 óbitos anuais. No Brasil cerca de 20 milhões de pessoas convivem com essa patologia, sendo esta responsável por aproximadamente 350.000 internações por ano, e a terceira principal causa de hospitalização no Sistema único de Saúde (SUS)4, gerando alto custo econômico.
Em pacientes pediátricos, as exacerbações agudas da asma são causa comum de internações hospitalares6. Esses episódios são caracterizados por aumento progressivo de falta de ar, tosse, chiado, aperto no peito ou a combinação de algum desses sintomas, que podem estar acompanhados por diminuição do fluxo expiratório o que requer tratamento urgente.7, pois se trata de uma condição potencialmente fatal8. Comumente ocorre após à exposição a um agente externo e\ou à baixa adesão ao tratamento9.
O tratamento tem por objetivo atingir e manter o controle da doença, bem como prevenir riscos futuros, como, exacerbação, instabilidade da doença, efeitos adversos da terapia e perda acelerada da função pulmonar.10. O tratamento baseia-se, sobretudo na terapia medicamentosa, sendo constituída principalmente pelo uso precoce dos corticoides inalatórios que não só melhoram os sintomas, mas também preservam a função pulmonar a longo prazo.11 Como parte do tratamento não medicamentoso, a reabilitação pulmonar vem sendo introduzida como uma terapia complementar para controle da asma, tratando-se de uma abordagem multidisciplinar com intervenções baseadas em evidências que incluem treinamento respiratório, educação do paciente, prática de exercícios e mudança de comportamento, com o intuito de melhorar a condição física e psicológica do paciente.12, 13
Nesse contexto, o acompanhamento fisioterapêutico desempenha um papel fundamental no manejo da asma, seus objetivos são aprimorar o condicionamento cardiopulmonar e da mecânica respiratória, o aumento da força muscular, a redução dos sintomas e uso de medicamentos, a promoção de higiene brônquica quando necessário e consequentemente, a melhora da qualidade de vida.14 Para tanto, diversas intervenções, recursos e dispositivos podem ser utilizados.
Dentre os dispositivos destaca-se o cateter nasal de alto fluxo (CNAF), que é um tipo de suporte respiratório não invasivo que fornece uma mistura de gás de maneira aquecida e umidificada por meio de uma cânula nasal. Trata-se de um equipamento de fácil utilização e é mais bem tolerado por crianças quando comparado ao uso de suporte ventilatório não invasiva com pressão positiva15.
Durante a exacerbação da asma ocorre obstrução e dificuldade respiratória, expressa pelo aumento da frequência cardíaca, frequência respiratória e do trabalho respiratório. Para pacientes que não apresentam melhora com o tratamento farmacológico, o CNAF pode ser uma alternativa eficaz, isso se deve aos seus efeitos fisiológicos, que incluem eliminação do espaço morto anatômico, fornecimento de pressão de distensão positiva, melhora na oxigenação e na mecânica respiratória, redução da broncoconstrição e estímulo da eliminação de secreção através do ar aquecido e umidificado17, que pode contribuir potencialmente para a redução do esforço inspiratório.18,19,20,21.
Dessa forma, a presente revisão de literatura tem por objetivo avaliar as evidências disponíveis na literatura sobre a interferência do cateter nasal de alto fluxo no trabalho respiratório de pacientes pediátricos com exacerbação dos quadros asmáticos.
MÉTODOS
Foram realizadas buscas de artigos científicos publicados no período de 2017 a 2024, indexados nas bases de dados Pubmed, Scielo, Google acadêmico, utilizando os seguintes descritores: high flow nasal catheter, asthma, physiological effects, breathing work, children. Os critérios de inclusão foram estudos que abordassem o uso do cateter nasal de alto fluxo e seus efeitos no trabalho respiratório em asmáticos, os critérios de exclusão foram os artigos que citaram outras intervenções e não se adequassem ao critério de inclusão.
RESULTADOS
Foram encontrados um total de 8 artigos que abordaram pacientes pediátricos com idade variando de 1 a 18 anos, que se encontravam em ambiente hospitalar, nos setores de enfermaria, emergência e UTIP com quadro de asma leve, moderada a grave. Os estudos compararam a utilização do CNAF com oxigenoterapia convencional e ventilação não-invasiva e apresentaram seus efeitos no componente respiratório.
Tabela 1- Extração de dados.
Autor\Ano | Tipo de estudo | Característica da amostra | Tipos de intervenção | Principais variáveis analisadas | Resultados |
Rogerson et al (2024)22 | Estudo de coorte retrospectivo de centro único. | Crianças de 2 a 18 anos com asma aguda grave tratados com: CNAF: 443 Não tratados com CNAF: 443. | Asma aguda severas tratados com CNAF. Não tratados com CNAF, utilizando máscara de oxigênio. | Comparar os efeitos fisiológicos e os resultados clínicos de crianças asmáticas grave com CNAF versus principalmente máscara de oxigênio. | Grupo CNAF apresentaram melhorias menores de FC, FR, PASS após 24 horas de hospitalização e maior tempo de internação na UTIP e hospitalar. |
Ballestero et al (2018) 23 | Estudo Piloto Prospectivo randomizado de centro único. | Crianças de 1 a 14 anos com exacerbação de asma moderada a grave. GE: N 30. GC: N 32. | Grupo Experimental: tratados com CNAF. GC: Oxigenoterapia convencional. | Avaliar a eficácia do CNAF em crianças asma e insuficiência respiratória moderada no pronto-socorro. | Diminuição de 2 no PS, aumento na SpO2\FIO2, redução na FR, FC e PS em ambos os grupos. |
Benítez et al (2019)09 | Ensaio clínico randomizado controlado aberto. | Pacientes maiores que 2 anos com crise moderada\grave de asma que não responderam à terapia inicial. | G1 (CNAF): N 32 G2 (Controle): N 33 G1: Recebeu terapia com CNAF. G2: Recebeu oxigenoterapia através de máscara facial simples, cânula nasal simples e máscara sem reinalação. | Determinar a eficácia da CNAF em crianças com mais de 2 anos de idade que apresentam crises asmáticas que não respondem ao tratamento inicial. | Sem diferenças significativas na diminuição de mais de 2 pontos no PIS em 2 e em 6 horas. Sem internações na UTIP ou apresentação de complicações. |
Martínez et al (2018)24 | Estudo observacional retrospectivo e analítico. | Crianças de 4 a 15 anos com exacerbação moderado a grave internados na enfermaria pediátrica G1: N 40. G2: N 496. | G1: Pacientes tratados com CNAF. G2: Tratados com oxigenoterapia convencional. | Analisar a o tratamento das exarcebações da asma em crianças utilizando CNAF ou oxigenoterapia. | Grupo CNAF redução na FC, FR e EP nas primeiras horas. Maior tempo de internação, dias de oxigênio, terapia com esteroides, e readmitidos após a alta. |
Baudin et al (2017)25 | Estudo observacional e retrospectivo. | Crianças de 1 a 18 anos com diagnóstico asmático, G. CNAF: N 39. G. oxigenoterapia padrão: N:30. | G CNAF recebeu terapia com alto fluxo. G Oxigenoterapia padrão: tratados com máscara não reinalante e com cânula nasal padrão. | Falha da terapia com o CNAF, valores de gases sanguíneos e a mudança dos parâmetros clínicos FR, FC, razão StO2\FIO2. | Grupo CNAF apresentaram melhora no pH, Pco2, FR, FC e oxigenação. 1 criança falhou no grupo CNAF e 1 paciente foi descontinuado devido pneumotórax. |
Delgado et al (2023)26 | Estudo observacional prospectivo, e longitudinal. | Asmáticos, menores que 18 anos internados na UTI Pediátrica. Grupo CNAF: N-56. Grupo VNI+CNAF: N-14. Grupo VNI: N- 6. Grupo VM: N- 0. | Grupo VNI: tratados com pressão positiva bi- level. Grupo: CNAF+ VNI: a VNI utilizada primeiro em todos os casos. Grupo CNAF: foram tratados com cateter nasal de alto fluxo. | Analisar as terapias aplicadas em crianças internadas na UTIP com asma, também avaliar a utilização de CNAF nesses pacientes e comparar sua evolução e complicação com os que receberam VNI. | Grupo apenas com CNAF O número de dias na UTIP foi menor, redução no PCO2, apresentaram maior razão StO2\FIO2. |
David et al (2024)27 | Ensaio clínico paralelo, randomizado cego. | Pacientes entre 5 a 16 anos com diagnóstico confirmado de asma e que apresentasse m brocoespasm o. Grupo Bilevel: N- 25 Grupo CNAF: N-25. | Grupo Bilevel: pressão positiva em dois níveis e exercícios de reeducação diafragmática. Grupo CNAF recebeu terapia com alto fluxo e exercícios de redução diafragmática. | Avaliar e comparar a eficácia do uso de cânula nasal de alto fluxo e pressão positiva como intervenções de fisioterapia respiratória com exacerbação de asma. | Grupo CNAF teve menos dias de uso de oxigênio, de broncodilatado r, dias de hospitalização e melhora na CVF. Reduções de FC\FR nos grupos não foram significativas. |
Pilar et a l(2017)28 | Estudo observacional retrospectivo. | Crianças de 1 a 14 anos com diagnóstico de asma. Grupo CNAF: N-20. Grupo VNI: N- 22. | Grupo CNAF: Tratados com CNAF. Grupo VNI: utilizaram dois níveis de pressão. Em caso de falha o grupo CNAF seriam mudados para VNI, e os da VNI para VMI. | Avaliar a falha do suporte respiratório inicial havendo necessidade de mudar para um suporte mais alto, além do tempo de utilização do suporte e permanência na UTIP. | Grupo CNAF teve falha de tratamento em 8 crianças, maior tempo na UTIP e a duração de suporte respiratório foi maior no grupo de falha do CNAF. |
Legendas: CNAF: Cateter Nasal de Alto Fluxo; FC: Frequência Cardíaca; FR: Frequência Respiratória; PASS: Pediatric Asthma Severity Score; UTIP: Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica; GE: grupo experimental; GC- grupo controle; DE: Departamento de emergência; OS: Escore Pulmonar; SpO2: Saturação de Oxigênio; FIO2: Fração inspirada de oxigênio; PIS: Pulmonary Index Score; pH: potencial de hidrogênio; pCO2: pressão parcial de dióxido de carbono; VNI: Ventilação Não-Invasiva; VMI: Ventilação Mecânica Invasiva.
Tabela 2- Comparação dos dispositivos utilizados nos estudos.

Os resultados acima apresentam as intervenções com as quais o cateter nasal de alto fluxo foi comparado, além das respostas obtidas com as intervenções. Cinco desses estudos compararam o uso do CNAF com a oxigenoterapia convencional (63%). Ballestero23 e Baudin25 observaram resultados positivos, com melhora das variáveis respiratórias FR, FC, pH, pCO2, e escore pulmonar no grupo tratado CNAF em relação ao de oxigenoterapia. Em contrapartida, Rogerson22 e Martínez24 relataram melhorias menos expressivas no grupo CNAF, além de um maior tempo de internação hospitalar. Já no estudo de Benitez09 as diferenças entre os dois grupos não foram significativas, impedindo conclusões precisas sobre a superioridade de uma intervenção em relação à outra.
Os outros três estudos compararam o CNAF com ventilação não invasiva (38%). Delgado26 alcançou resultados superiores com CNAF, evidenciados por melhora no pH e na oxigenação. David27 também identificou benefícios, com aumento na capacidade vital forçada, no entanto, não houve diferença significativa na FC e FR entre os grupos. Já Pilar28 verificou que 40% dos pacientes tratados com CNAF apresentaram falha terapêutica, sendo necessária a transição para outro suporte respiratório.
Dessa forma, as evidências apontam que a utilização do CNAF, apresentou em sua maioria resultados semelhantes aos alcançados com outros dispositivos respiratórios, como a VNI e a Oxigenoterapia. Embora amplamente utilizada, a oxigenoterapia fornece apenas oxigênio suplementar, podendo ser associada à nebulização de fármacos como corticoides e broncodilatadores. Já a VNI é considerada uma importante ferramenta não farmacológica no manejo da asma, fisiologicamente promove recrutamento alveolar, melhora trocas gasosas, e auxilia na redução do trabalho respiratório27. Apesar do crescente número de estudos, as evidências disponíveis sobre o papel da VNI em asmáticos são insuficientes29 e seu uso apresenta limitações como desconforto, assincronia e intolerância relacionados às interfaces utilizadas, sobretudo na população pediátrica. Assim, os resultados aqui apresentados sugerem que o CNAF não demonstrou benefícios superiores em comparação à essas intervenções já utilizadas no controle da asma.
Gráfico 1- Resultados sobre a utilização do CNAF.

Com base na análise dos oito artigos avaliados, o Gráfico 1 apresenta uma síntese dos resultados sobre os efeitos do CNAF em pacientes asmáticos. Em três estudos (38%) foram obtidas melhorias clínicas relevantes. Outros três (38%) relataram benefícios menos expressivos. Já em dois (25%) não foram encontradas diferenças significativas nas variáveis respiratórias, quando comparado a outras intervenções.
Gráfico 2- Resultados obtidos nos ensaios clínicos.

O gráfico acima apresenta os principais resultados obtidos com o uso da cânula nasal de alto fluxo em asmáticos. Em alguns estudos, foi observado melhora na frequência cardíaca e frequência respiratória (38%), no pH (13%), no Escore Pulmonar (25%), na pCO2 (25%), aumento da oxigenação evidenciada pela melhora da relação StO2\FIO2 (38%). No entanto, os resultados não foram semelhantes em todos os estudos, em dois deles, não foram observadas diferenças significativas com a utilização CNAF (25%), em outro estudo, o uso desse dispositivo apresentou piores desfechos nas variáveis respiratórias FC e FR (13%), adicionalmente, em um outro estudo 40% dos pacientes apresentaram falha terapêutica com o CNAF (13%).
Sob uma perspectiva geral, a CNAF demonstrou potencial para melhorar a oxigenação e reduzir o esforço respiratório nesse grupo de pacientes, efeitos observados em 38% dos casos analisados. Tais efeitos são relevantes durante as exacerbações da asma, em que o broncoespasmo, o edema das vias aéreas e ao aumento da produção de muco, levam à obstrução e dificuldade respiratória, gerando aumento do trabalho respiratório e comprometendo as trocas gasosas, podendo assim, favorecer a melhora clínica desses pacientes.
DISCUSSÃO
O uso do CNAF tem ganhado destaque nos últimos anos devido aos seus efeitos positivos na redução do esforço respiratório e na melhora da oxigenação. Esses efeitos estão relacionados ao fornecimento de alto fluxo de gás que facilita a remoção de CO2 das vias aéreas superiores, contribuindo para a correção da hipercapnia; auxilia na redução do trabalho respiratório pela entrega de fluxo adequado de oxigênio, revertendo o quadro de hipoxemia; o ar aquecido e umidificado melhora a mecânica pulmonar e reduz o consumo energético, além disso, o ar aquecido promove distensão do trato respiratório e otimização do volume residual, gerando pressão positiva.30 Esses efeitos são particularmente relevantes em crianças com condições respiratórias obstrutivas, como na asma, em que a carga sobre os músculos respiratórios pode ser muito alta, levando ao aumento do trabalho respiratório20.
Esses resultados foram evidenciados no estudo piloto prospectivo e randomizado de Ballestero e outros autores (2018)23, que avaliou crianças em exacerbação moderada a grave da asma, comparando o CNAF com oxigenoterapia convencional. O estudo demonstrou benefícios do CNAF, com melhora precoce, nas primeiras duas horas de tratamento, comprovado pela melhora da frequência respiratória, frequência cardíaca, relação Sto2\FIO2 e redução no escore pulmonar.
Da mesma maneira, Martínez e outros autores (2018)24, relataram sua experiência, comparando a utilização do CNAF com oxigenoterapia convencional em pacientes pediátricos em crises de asma moderada a grave, onde o grupo tratado com CNAF apresentou redução do escore pulmonar, na frequência respiratória e cardíaca nas primeiras 3-6 horas de tratamento, com consequente melhora do paciente.
Baudin e outros autores (2017)25 em seu estudo observacional retrospectivo em crianças com estados asmáticos, observaram melhorias clínicas significativa com o uso do CNAF em comparação à oxigenoterapia padrão, incluindo quedas nos valores de FC, FR, além de melhora gasométrica nas primeiras 24 horas.
Já Delgado e outros autores (2023)26, em seu estudo observacional prospectivo e longitudinal, avaliaram três grupos de crianças com asma, CNAF isolado, CNAF associado com VNI e apenas VNI. O grupo tratado apenas com CNAF apresentou aumento na relação StO2\FIO2, redução dos níveis de pCO2 e menor número de dias de hospitalização.
Sendo que, a melhora na oxigenação, redução precoce do trabalho respiratório, e o consequente aumento no conforto do paciente são vitais para evitar complicações, como atelectasia e fadiga respiratória progressiva. Esses benefícios podem contribuir para a prevenção da necessidade de escalonamento para formas mais invasivas de suporte ventilatório, como a ventilação mecânica, considerando que a maioria das crianças asmáticas são intubadas devido a insuficiência respiratória por trabalho respiratório excessivo.
Em contrapartida, Rogerson e outros autores (2024)22 em seu estudo retrospectivo de caso-controle com pacientes em asma aguda grave, compararam o uso do CNAF com máscara facial de oxigênio. Analisaram a mudança nos sintomas nas primeiras 24 horas de hospitalização, verificando que o grupo tratado com CNAF apresentou melhorias menores na FC, FR e escore PASS, além de maior tempo de permanência na UTIP e de internação hospitalar.
Da mesma forma, Benítez e outros autores (2019)09 em seu ensaio clínico randomizado compararam CNAF com oxigenoterapia convencional, não encontraram diferenças no escore PIS (esforço respiratório, FR, saturação de oxigênio) em 2 horas de tratamento até a alta hospitalar, concluindo que a terapia de alto fluxo no estudo não apresentou benefícios adicionais para esse grupo de pacientes em relação a oxigenoterapia convencional.
David e outros autores ((2024)27 em seu ensaio clínico randomizado, paralelo e cego, compararam a aplicação de pressão positiva de dois níveis ao CNAF como intervenção fisioterapêutica em exacerbações asmáticas. O CNAF demonstrou vantagens em relação a VNI, com redução da necessidade de uso de oxigênio, dias de internação e uso de broncodilatadores, além da melhora da capacidade vital forçada na alta. Entretanto, as diferenças em FR e FC entre os grupos não foram significativas.
Por outro lado, Pilar e outros autores (2017)28 em seu estudo observacional retrospectivo, descreveram sua experiência ao comparar o uso de CNAF com VNI em crianças asmáticas, relataram que 40% das crianças inicialmente tratadas com CNAF precisaram ser transicionadas para outro suporte respiratório, sendo este a VNI, devido a falha terapêutica. Esse grupo teve maior tempo de suporte respiratório e permanência na UTIP. O estudo também identificou possíveis fatores preditivos de sucesso do CNAF, como a FC inferior a 146 bpm, e FR menor que 55 ipm.
A VNI tem papel relevante no manejo das crises asmáticas, estudos recomendam a pressão positiva como suporte fisiológico nessa condição. No entanto, sua utilização pode estar associada a desconforto e intolerância relacionados à interface, tornando seu nível de evidência ainda limitado. Nesse contexto, o CNAF vem ganhando espaço por apresentar melhor tolerância por parte dos pacientes, além de poder contribuir nos períodos de exacerbação por meio de seus mecanismos de ação. Apesar disso, a literatura não define com clareza qual o grau de exacerbação que requer o início da CNAF, tampouco estabelece critérios claros para sua descontinuação.
Diante das informações apresentadas, embora alguns estudos evidenciam efeitos positivos do CNAF sobre o componente respiratório em asmáticos, não é possível afirmar com segurança sua real eficácia, uma vez que, os resultados podem variar conforme o perfil do pacientes e a gravidade da condição. Ademais, ao comparar o uso do CNAF com outras modalidades terapêuticas, ainda não há evidências conclusivas que comprovem a superioridade de uma sobre outra no tratamento respiratório desse perfil de pacientes. Assim como, são necessários mais estudos para determinar critérios para o início da terapia com CNAF e identificar os pacientes com menos probabilidade de resposta, considerando que a falha desse recurso pode retardar o início de outra forma de suporte mais eficaz28, além de estar associada a mortalidade e maior tempo de internação hospitalar17.
CONCLUSÃO
Este estudo avalia os efeitos do cateter nasal de alto fluxo no trabalho respiratório de pacientes asmáticos em exacerbação. Os achados indicam que o CNAF pode ser uma intervenção viável no controle de sintomas respiratórios. Contudo, a efetividade na utilização desse recurso não foi observada de forma consistente em todos os estudos analisados, em algumas investigações não houve diferenças significativas com a utilização do dispositivo, tampouco superioridade em relação a outras intervenções, o que impede a formulação de conclusões quanto à sua eficácia no manejo dessa condição.
Diante disso, torna-se evidente a necessidade de novos estudos que permitam identificar com mais precisão as indicações específicas e os perfis de pacientes nas quais a terapia com alto fluxo seja mais eficaz para alívio do desconforto respiratório em crianças asmáticas.
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1Fisioterapeuta, Aprimoranda do Curso de Aprimoramento em Fisioterapia Hospitalar.
2Doutor em ciências da Saúde, Mestre em Terapia Intensiva, Especialista em Reabilitação Cardio pulmonar, Residência em Fisioterapia Hospitalar, Gestor de Serviço em Saúde.
3Mestre em Ciências da Saúde, Especialização em Fisioterapia Neuro Funcional, Especialização em Cardio Respiratória e Especialização em Insuficiência Respiratória e Cardiovascular em UTI: monitorização e tratamento.
4Mestre em Ciências da Saúde, Especialista em Terapia Intensiva.