REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10248202121
Anna Luisa Gonçalves Santos1
Karina Luisa Aguiar2
Júlia Souki Diniz3
RESUMO
No Brasil a taxa de parto cesáreo continua crescendo, representando cerca de 55% dos partos. Emerge-se a necessidade de investigar a efetividade de recursos destinados a tratar sequelas de cicatrizes de cesárea e evidenciar a atuação da fisioterapeuta neste contexto. O laser de baixa potência é um recurso usado amplamente no tratamento de distúrbios de cicatrização. A laserterapia emerge como tratamento no deficit de cicatrização e nas sequelas das feridas cirúrgicas de cesareana, mas precisa ser mais explorado. O presente estudo tem como objetivo investigar os efeitos da laserterapia de baixa potência na ferida cirúrgica da cesariana e promover condições que favoreçam a cicatrização nas suas diversas fases. A intervenção foi realizada com equipamento de laser de baixa potência, 660nm, aplicação pontual, 2J/cm2 por ponto, sobre toda área da cicatriz. As puerperas foram avaliadas e receberam 2 sessoes de laser por semana, totalizando 6 sessoes. Ao final foi feita uma reavaliação, aplicando o mesmo questionario inicial e fotografias para comparar os resultados. O laser de baixa potência apresentou melhora estética e funcional da cicatriz, alívio de dor e boa aceitação por parte das puérperas. Pode-se considerar o laser como uma nova ferramenta terapêutica, não farmacológica e ainda ressaltar a importância de serviços de saúde investirem em intervenções para agilizar o processo de tratamento de feridas cirúrgicas após cesariana.
Palavras-chave: Laser de baixa potência, parto cesáreo, cicatriz de cesárea
INTRODUÇÃO:
O período puerperal é marcado por profundas transformações na vida da mulher, visto que ocorre a regressão do ciclo gravídico para o exercício da maternidade (Castioglioni et al., 2020). A gravidez e um evento biológico, entretanto apresenta riscos por expor o corpo feminino a condições fisiológicas avultosas inclusive quando submetidas ao parto cesárea. No Brasil as cesarianas continuam crescendo, representando assim cerca de 55% dos partos (OMS 2022), colocando o Brasil do segundo pais do mundo de maior incidência em partos cesáreos, perdendo apenas para República Dominicana (Ferreira et al., 2023).
Quando realizadas por motivos médicos, as cesarianas podem reduzir a mortalidade e morbidade materna e perinatal. Porém não existem evidências de que fazer cesáreas em mulheres ou bebês que não necessitem dessa cirurgia traga benefícios. Assim como qualquer cirurgia, uma cesárea acarreta riscos imediatos e a longo prazo. Esses riscos podem se estender muitos anos depois de o parto ter ocorrido e afetar a saúde da mulher e do seu filho, podendo também comprometer futuras gestações. Esses riscos são maiores em mulheres com acesso limitado a cuidados obstétricos adequados (MS, 2020). Apesar de serem essenciais para salvar vidas, mudança no contexto da cicatriz que ocorre devido a cirurgia pode causar constrangimento, insatisfação e consequentemente interfere no contexto de vida da puérpera enquanto sociedade.
Uma das opcoes terapeuticas para o tratamento dos ferida cirúrgica da cesariana, seria a radiação do laser. O laser é uma luz com características especiais quanto à coerência e monocromaticidade, que a distingue a luz normal ou de uma lâmpada e infravermelho (ATALAIA-SILVA, ATANASIO, LOURENÇO, 2022). A laser terapia é uma técnica que consiste na indução da cicatrização de feridas por meio da luz monocromática de baixa energia. Segundo Houreld e Abrahamse (2007) e Silva et al., (2007), a fototerapia promove a proliferação de fibroblastos, bem como a síntese de colágeno, ambos processos fundamentais para reparação tecidual, além de possuir efeitos anti-inflamatórios.
Mediante ao exposto, emerge-se a necessidade de investigar a efetividade do tratamento com laser de baixa potência na cicatriz de cesárea e promover condições que favoreçam o processo de cicatrização nas diversas fases. Ressalta-se a importância da atuação da fisioterapia durante o puerpério na área da saúde da mulher. O presente estudo irá contribui para a investigação de uma terapêutica que contribui na prevenção, promoção da saúde.
METODOLOGIA
Trata-se de uma série de casos, no qual as voluntárias são participantes do projeto de extensão “Efeitos do laser em baixa potência ferida cirúrgica da cesariana”, o qual deve incentivo do PAEX pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG). O projeto recebeu aprovação da Secretaria Municipal de Saúde (SEMUSA) e do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), sob o número CAAE 73020423.6.0000.5112.
A intervenção foi realizada na Unidades Básica de Saúde (UBS) Tietê, localizadas no município de Divinópolis – MG. A partir do aceite da unidade, as puérperas que se enquadraram nos critérios de inclusão foram convidadas a participar do estudo e assinaram o TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido). Foram incluidas mulheres que apresentam queixas de má cicatrização na ferida cirúrgica da cesariana, com idade igual ou superior a 18 anos, em até 1 ano de pós-parto. Foram excluidas mulheres que apresentaram alguma patologia e/ou infecção ou necrose na cicatriz ou na região da cesareana. Foi realizada uma avaliação através de um formulário elaborado pela equipe do projeto, específico para caracterizar, qualificar e quantificar a dor e o desconforto da cicatriz de cesariana. O formulário foi desenvolvido a partir da pesquisa bibliográfica realizada a respeito dos temas.
O formulário era composto por 13 questoes, e as pacientes poderiam responder: Nunca (0), Raramente (1), As vezes (2) Frequentemente (3) e Sempe (4). As questoes do formulario são representadas na tabela 1:
Tabela 1: Índice de dor relacionada à cicatriz de cesárea.
Sente dor ou desconforto quando agacha |
Sente dor ou desconforto quando sentada p/ de pé |
Sente dor ou desconforto quando deitada p/ sentada |
Sente dor ou desconforto quando carrega peso |
Sente dor ou desconforto quando anda |
Sente dor ou desconforto quando tosse |
Se ativa, sente dor ou desconforto ao fazer exercicio |
Sente dor ou desconforto por ficar muito tempo sentada |
Sente dor ou desconforto ao usar vestuario sobre a região |
Sente dor ou desconforto ao tocar a região |
Sente dor ou desconforto ao realizar a higiene da região |
Sente dor ou desconforto espontaneamente ao longo do dia |
Sente dor ou desconforto ao depilar |
Essas dores atrapalham na realização das atividades diarias |
Foi aplicada a Escala Analógica de Dor (EVA), que mede a intensidade da dor de 0 a 10, sendo 0 sem dor e 10 a pior dor. Foram feitos também registros fotograficos. Em seguida, iniciou-se a intervenção com equipamento de laser de baixa potência, 660nm, aplicação pontual, 2J/cm2 em toda região da cicatriz. As puérperas receberam 2 sessoes de laser por semana, totalizando 6 sessoes. Ao final foi feita uma reavaliação, aplicando o mesmo formulário inicial e fotografias para comparar os resultados. Uma pesquisadora ficou responsável por realizar a avaliação e a reavaliação, e outra responsavel por aplicar o laser de baixa potência.
RESULTADOS:
Foram incluídas no estudo 2 participantes. As características de cada participante são especificadas a seguir:
CASO 01: K.S.A.C., 28 anos, de cor parda, submetida à cirurgia de cesariana há 02 meses desde a avaliação, com 38 semanas de gestação, sem relato de intercorrências, com trabalho de parto de 24 horas e recém-nascido pesando 2,9 kg. Classificou a dor pela escala visual analógica (EVA) em 4. Realizou o protocolo proposto sem interrupções. Ao final classificou a dor na mesma escala como zero (0). O Antes e após a intervenção da paciente está representado na figura 1.
Figura 1: Imagem pré e pós-intervenção com o laser de baixa potência da paciente caso 1. Observa-se clareamento da cicatriz, controle do edema e melhora geral do aspecto estético.
CASO 02: N.C.A.P., 34 anos, não quis identificar sua raça, submetida à cirurgia de cesariana há 01 meses desde a avaliação, com 40 semanas de gestação, sem relato de intercorrências, com trabalho de parto de 12 horas e recém-nascido pesando 3,9 kg. Classificou a dor pela escala visual analógica (EVA) em 10. Realizou o protocolo proposto sem interrupções. Ao final classificou a dor na mesma escala como 1. O Antes e após a intervenção da paciente está representado na figura 2.
Figura 2: Imagem pré e pós-intervenção com o laser de baixa potência da paciente caso 2. Observa-se controle do edema, afinamento da cicatriz, redução de hipertrofia central e melhora geral do aspecto estético.
Antes e após a intervenção com laser de baixa potência, as participantes responderam o formulário de caracterização da dor e desconforto em relação à cicatriz de cesárea. As respostas coletas estão descritas conforme a figura 3.
Figura 3: Score total (soma das respostas) pré-tratamento (20 pontos) e pós-tratamento (6 pontos) com o laser de baixa potência.
DISCUSSÃO:
A ocorrência das feridas cirúrgicas da cesariana coloca em risco a saúde da mulher, uma vez que a lesão no epitélio é porta de entrada para outras patologias, prejudicando também a saúde do neonato. Por conseguinte, a feridas cirúrgicas da cesariana reduz a além a qualidade de vida dessas mulheres durante o puerpério, pois podem ocasionar dores, desconfortos e distúrbios psíquicos devido as marcas provocadas em seus corpos (Rodrigues et al., 2021).
O laser de baixa potência trouxe resultados positivos na cicatrização da ferida cirúrgica da cesariana em puérperas que seguiram o protocolo de irradiação estabelecido pelo presente estudo, mostrando-se um recurso válido para o alívio da dor e da estética da pele. As puérperas voluntárias do presente estudo, retratavam dor e frustração levando em consideração as respostas dos questionários aplicados. Entretanto, o uso da fototerapia reduziu as dores oriundas da cicatriz de cesárea, visto que o laser provoca a analgesia da região tratada devido aos efeitos pro-inflamatórios e analgésicos.
De maneira análoga, a literatura demonstra que o laser de baixa potência oferece solução para cicatrização das lesões (BATISTA, SANTOS, MELLO, 2020), alívio de dor (CAMARGO et al, 2019), além da melhora do aspecto estético da cicatriz. Diante disso, agrega-se ao uso da laserterapia além da analgesia, a redução do tempo de cicatrização das lesões causadas pelo trauma cirúrgico. De acordo com a análise qualitativa, o laser demonstrou melhora no aspecto estético da cicatriz, afinando e clareando, aproximando à qualidade da pele adjacente à cicatriz. A melhora clínica nas puérperas participantes pode ser justificada pelas particularidades de resposta que a fototerapia de baixa potência induz nos tecidos biológicos, uma vez que a terapia permite alterações no metabolismo celular, assim como em reações bioquímicas, favorecendo a cicatrização das fissuras, reparação tecidual, proliferação de fibroblasto e aumento da produção e remodelação do colágeno (Piva et al. 2011). Entretanto, segundo Santos, Filho e Nicolau (2012), a interação da laserterapia no puerpério depende de vários fatores, como: comprimento de onda, tecido-alvo, quantidade de energia e capacidade de absorção, sendo que no presente estudo os parâmetros utilizados encontram-se descrito na literatura, em baixas doses.
Por conseguinte, foi possível notar formação de tecido cicatricial, pois houve redução das lesões e melhora no aspecto do tecido epitelial da região da ferida cirúrgica da cesariana. Não foi observada surgimento de efeitos colaterais durante a intervenção, corroborando com estudo de Mokmelis et al., (2009). Todavia, é valido destacar que o estudo em questão se limitou à pouca quantidade de voluntárias disponível para realização da intervenção, tornando-se essencial a realização de ensaios clínicos com número maior de participantes. Por fim, apesar dos fatores limitantes, a pesquisa trouxe resultados positivos levando em consideração os objetivos do estudo, pois notou-se melhoras na dor e cicatrização ferida cirúrgica da cesariana das puérperas voluntárias.
CONCLUSÃO:
Este estudo visa identificar os efeitos do laser de baixa potência no tratamento de feridas cirúrgicas de cesariana e os benefícios dessa intervenção. Espera-se encontrar uma nova ferramenta terapêutica não farmacológica que seja de fácil aplicação e baixo custo para o Sistema Único de Saúde, destacando a importância da fisioterapia para melhorar a qualidade de vida dessas mulheres. Acredita-se que os resultados possam ampliar o uso da laserterapia na população-alvo e enfatizar a necessidade de acolhimento das puérperas, além de ressaltar a relevância de estudos na área da fisioterapia na saúde da mulher.
REFERÊNCIAS:
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1,2,3 – Universidade do estado de Minas Gerais (UEMG)
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