ECOS SAGRADOS: EXPLORANDO AS UNIDADES FRASEOLÓGICAS NO DISCURSO EVANGÉLICO NEOPENTECOSTAL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202504221354


Ana Vitória Dias Lima1
Claudinha Carvalho Pessoa2
Daiane de Paula Lima da Conceição2
Thais da Silva Moraes2
Zuziane Ferreira da Rocha2


RESUMO

Este trabalho visa caracterizar e analisar o uso das unidades fraseológicas no contexto neopentecostal. A partir disso, compreende-se que essas unidades fraseológicas consistem em estruturas compostas por dois ou mais elementos linguísticos, cujo significado deve ser entendido em seu todo. Nesse viés, o referencial teórico adotado para a análise inclui autores renomados na área da fraseologia, como Ortíz Alvarez (2000), Monteiro-Plantin (2014) e Mejri (1997). No aspecto metodológico, a amostra foi obtida por meio de um questionário aplicado a membros de três templos: Assembleia de Deus Prainha, Ministério da Renovação e Igreja Resgate Urgente, durante o mês de julho de 2024. Após a coleta das respostas, foram identificadas e selecionadas as unidades fraseológicas, seguindo o processo de validação proposto por Mejri (2012). Os resultados mostraram exemplos de fraseologismos no material analisado, incluindo expressões como “tá repreendido,” “tá amarrado” e “sal da terra e luz do mundo.” A análise revelou que essas expressões são amplamente utilizadas e reconhecidas dentro da comunidade evangélica em questão. Assim, este estudo, juntamente com outras investigações similares, oferece contribuições valiosas para a compreensão e descrição dos fenômenos fraseológicos.

Palavras-chave: Lexicologia. Fraseologia Neopentecostal. Unidades Fraseológicas.

ABSTRACT

This work aims to characterize and analyze the use of phraseological units in the Neopentecostal context. It is understood that these phraseological units consist of structures composed of two or more linguistic elements, whose meaning must be understood as a whole. In this regard, the theoretical framework adopted for the analysis includes renowned authors in the field of phraseology, such as Ortíz Alvarez (2000), Monteiro-Plantin (2014), and Mejri (1997). Methodologically, the sample was obtained through a questionnaire applied to members of three churches: Assembleia de Deus Prainha, Ministério da Renovação, and Igreja Resgate Urgente, during July 2024. After collecting the responses, phraseological units were identified and selected, following the validation process proposed by Mejri (2012). The results showed …. examples of phraseologisms in the analyzed material, including expressions like “tá repreendido,” “tá amarrado,” and “sal da terra e luz do mundo.” The analysis revealed that these expressions are widely used and recognized within the evangelical community in question. Thus, this study, along with similar investigations, offers valuable contributions to the understanding and description of phraseological phenomena.

Keywords: Lexicology. Neo Pentecostal Phraseology. Phraseological Units.

1. INTRODUÇÃO

Segundo Saussure (1916), a língua pode ser vista como um organismo vivo, uma vez que, assim como este, está em constante mudança e evolução. Além disso, ela se manifesta entre as pessoas como um meio fundamental para a comunicação. Nesse sentido, independentemente de idade, gênero ou classe social, a língua é adaptável e apresenta fenômenos internos e externos que revelam seu caráter dinâmico.

A partir disso, compreende-se que existe um amplo campo de múltiplas abordagens que podem orientar o estudo de uma língua e seus fenômenos, seguindo essa linha de pensamento, a Fraseologia destaca-se como a área dedicada à investigação de um dos fenômenos linguísticos amplamente utilizados em diversos contextos, conhecidos como fraseologismos (Mejri, 2012).

O campo dos estudos fraseológicos tem se expandido, concentrando-se principalmente em itens lexicais que, devido ao uso frequente e a aspectos linguísticos, socioculturais, pragmáticos e interacionais, resultam na cristalização, isto é, em formas fixas nas circunstâncias em que são empregados pelos falantes, como pressuposto por Cowie (1998).

Outrossim, ressalta-se que ao campo da Fraseologia cabe o estudo dos fraseologismos, como, por exemplo, as expressões “Glória a Deus” e “Queima Senhor!”, que surgiram nos dados coletados em três igrejas neopentecostais. Ademais, a partir dessa análise, foi possível observar como esses fraseologismos se consolidaram com significados específicos e como são usados em contextos comunicativos dentro dessas comunidades religiosas.

Nesse ínterim, para a realização desta pesquisa, levando em conta os aspectos dinâmicos da língua, os fraseologismos e o contexto em que eles são produzidos e analisados, foram escolhidas as três igrejas neopentecostais devido às seguintes características: o discurso religioso nesses ambientes é dinâmico, constantemente adaptado às experiências espirituais dos fieis, refletindo a criatividade, a intensidade e a adaptabilidade próprias das práticas e crenças neopentecostais.

Diante do exposto, esta pesquisa tem como objetivo principal realizar um levantamento dos fraseologismos empregados pelos cristãos em igrejas evangélicas, com base na abordagem da escola francesa de Fraseologia, conforme proposta por Mejri (1997, 2009, 2012). De forma específica, o estudo pretende categorizar os fraseologismos identificados e analisar o grau de fixidez e idiomaticidade de cada expressão utilizada na fala dos membros dessas comunidades religiosas.

Sob essa ótica, o estudo organiza-se em: introdução, referencial teórico acerca da Fraseologia, fraseologismos e a doutrina evangélica; posteriormente a metodologia, apresentação dos resultados, considerações finais e referências bibliográficas.

2. REFERENCIAL TEÓRICO 

2.1 FRASEOLOGIA

Bally (1909) conceituava a Fraseologia como uma subárea da Lexicologia e também graças a ele, o campo investigativo ganhou destaque na França, e na Rússia com Polivanov (1931) e Vinogradov (1947). Ademais, é crucial destacar que seu foco está nos fraseologismos, que são construções sintagmáticas com uma forma fixa, consolidada pelo uso frequente e que se inserem no que é conhecido como discurso repetido.

Coseriu (1950) pontua como exemplos de fraseologismos: provérbios, expressões idiomáticas, ditados populares e outras colocações. Contudo, ao buscar o significado de Fraseologia, mesmo que de modo pífio, pode-se encontrar definições que a descrevem como a parte da gramática que se dedica ao estudo das frases fixas nas línguas naturais.

Ortiz-Alvarez (2011) acerca do assunto, conceitua como:

A ciência estuda as combinações de elementos linguísticos de uma determinada língua, relacionados semanticamente e sintaticamente, cujo significado é dado pelo conjunto de seus elementos e não pertencem a uma categoria gramatical específica (Ortiz-Alvarez, 2011, p. 9).

Entretanto, a ideia de vincular ou não os estudos fraseológicos à Lexicologia, considerando-a como uma categoria de palavra, passou a ser amplamente debatida. Esse debate levou a Fraseologia a ser tratada como uma área autônoma em algumas pesquisas.

Essas investigações promoveram a independência dos estudos fraseológicos ao adotar uma perspectiva enunciativa, o que expandiu o campo da fraseologia para um diálogo interdisciplinar com a pragmática. Nesse contexto, os enunciados fraseológicos, termo utilizado por esse autor, são vistos como unidades autônomas dentro da língua, conforme sugerido por Casares (1992).

Monteiro-Plantin (2014) concluiu que a Fraseologia é uma disciplina independente da Lexicologia, pois se relaciona com todos os níveis de análise linguística e se concentra no estudo das combinações de unidades léxicas. Por outro lado, Mejri (1997) não oferece uma definição ou conceito fechado para a Fraseologia, mas considera que ela é uma área dependente da Lexicologia, já que, em sua visão, os fraseologismos estão armazenados no léxico.

Logo, percebe-se que definir os limites da Fraseologia como campo de estudo é uma tarefa extremamente complexa, como demonstrado pela divergência entre diversos autores. Por exemplo, Ortiz-Alvarez (2001) a considera uma ciência, Mejri (2012) a caracteriza através do processo de formação, enquanto Monteiro-Plantin (2014) a vê como uma disciplina independente.

Partindo desse pressuposto, a presente pesquisa adota a perspectiva teórica de Mejri (2012) para examinar a natureza dos fraseologismos, também se defende a posição de que a Fraseologia está vinculada aos estudos do léxico.

2.2 FRASEOLOGISMO

Os fraseologismos estão presentes em todas as línguas naturais, mas não são criados ou controlados pelos falantes, aparecendo independentemente das intenções dos interlocutores. Nesse Viés, compreende-se que eles se encaixam nos diferentes níveis do sistema linguístico e podem ter uma estrutura sintagmática que se relaciona a uma única palavra do léxico.

Além disso, esses fraseologismos são frequentemente usados e podem sofrer algumas variações, sem alterar o sentido fixo e estável que possuem. Mejri (2012) define:

[…] associações sintagmáticas recorrentes […] um processo universal próprio das línguas vivas que se inscreve no tempo, se realiza independentemente da vontade dos interlocutores, age como fator sistêmico sobre o funcionamento da língua em todos os níveis (léxico, morfologia, sintaxe, semântica, pragmática, partes do discurso) (Mejri, 2012, p. 38)

Portanto, entende-se que os fraseologismos são o foco da Fraseologia, consistindo em construções polilexicais que podem ser mais ou menos fixas e podem ter ou não um sentido figurado. Além disso, os fraseologismos são frequentemente usados pelos falantes, muitas vezes de forma inconsciente, e seu reconhecimento ocorre devido a características comuns, como polilexicalidade, fixidez, congruência, previsibilidade e idiomaticidade.

Portanto, é essencial examinar com mais profundidade como cada um desses processos contribui para a definição dos fraseologismos, com base nos critérios mencionados. Mejri (2012) apud Salvador (2017) afirma que a polilexicalidade refere-se à presença de dois ou mais componentes linguísticos, o que é fundamental para identificar um fraseologismo, pois ele não pode ser compreendido por uma única unidade fraseológica.

Outrossim, outro elemento fulcral a se destacar é a fixidez, que indica que a estrutura e o significado de um fraseologismo não podem ser alterados, tanto em termos semânticos quanto sintáticos. Outro critério é a congruência, que se refere à incapacidade de certas sequências dentro de um fraseologismo de serem permutadas. Somado a isso, a” frequência e a previsibilidade também são importantes: a frequência diz respeito à repetição de uma estrutura específica, que é reconhecida automaticamente pelos falantes como algo estabilizado na língua; já a previsibilidade envolve a capacidade de antecipar a continuidade de um fraseologismo com base em seu uso frequente (Mejri, 2012).

Por fim, a idiomaticidade é um critério que está associado ao grau de transparência e opacidade dos fraseologismos. Logo, compreende-se que a transparência busca o sentido literal da expressão, enquanto a opacidade refere-se ao sentido mais figurado, que se torna menos claro com o uso frequente da expressão.

A partir disso, entende-se que além de se posicionar sobre se a fraseologia deve ser considerada parte da lexicologia ou uma área independente, é fundamental compreender as características que a definem, pois isso possibilita uma análise mais detalhada desse fenômeno presente em todas as línguas.

2.3 O NEOPENTECOSTALISMO

Castell (2000) afirma que toda identidade é fruto de um processo de construção e devido a isso, a formação das identidades utiliza como base elementos fornecidos pelos contextos em que estão imbricados como sócio histórico, geográfico, biológico e psicológico.

No entanto, todos esses elementos são reinterpretados e reorganizados por indivíduos, grupos sociais e sociedades, que ajustam seus significados de acordo com tendências sociais e projetos culturais moldados pela estrutura social e pela percepção de tempo e espaço.

De acordo com Lima (2010, p. 9), “os grupos sociais se constituem com base em características identitárias e sinais de pertencimento”. Isto é, crenças, valores, aparências e a língua também atuam como indicadores desse pertencimento”. Partindo desse pressuposto, compreende-se que para entender a identidade de uma pessoa, é imprescindível explorar o meio social em que ela está inserida, entender a cultura do lugar em que se encontra e familiarizar-se com a linguagem utilizada por ela.

Nesse viés, é possível compreender tais motivações que geram grupos societários ao longo da historicidade da humanidade, a exemplo do Protestantismo Neopentencostal. Silva (2023) destaca que para os cristãos protestantes pentecostais, a vida deve estar enraizada na fé pentecostal, que envolve a crença de que o poder sobrenatural de Deus pode atuar diretamente na vida das pessoas por meio do Espírito Santo.

Além disso, deve estar fundamentada na “santificação”, que, segundo a doutrina cristã, significa “separação” — afastar-se do pecado e renunciar a tudo o que desagrada a Deus (Silva, 2023). Ademais, é válido pontuar que o pentecostalismo e o neopentecostalismo são duas vertentes dentro do movimento cristão protestante, mas possuem características distintas em termos de doutrina, práticas e enfoque teológico (Mariano, 2012).

A linguagem também desempenha um papel importante na identificação e permanece fortemente presente na vida dos membros desse corpo religioso, não é à toa que Assen e Gomes (2014, p. 233) afirmam que “quem professa algum tipo de fé ou religião pode ser reconhecido pela forma de falar”.

Para esses autores, a linguagem é um elemento que distingue os cristãos dessa igreja. Eles apontam que “assim como existe um sincretismo religioso, também se desenvolve uma linguagem específica para identificar uma irmandade, os crentes” (Assen e Gomes, 2014, p. 235).

Sob tal ótica, compreende-se que a linguagem cristã evangélica possui características próprias que a identificam como pertencente a esse grupo social e religioso, conforme analisado no material estudado nesta pesquisa.

Nesse ínterim, os fraseologismos empregados pelos evangélicos, especialmente em situações como saudações, expressões de condolências, repreensões, gratificações, e menções a Jesus, são o foco desta análise. A partir deles, foi possível reunir uma amostra específica, seguida pelos procedimentos metodológicos que serão explicados na seção seguinte.

3. METODOLOGIA

3.1 SUJEITOS DA PESQUISA

Os sujeitos da pesquisa são os cristãos neopentecostais, componentes do grupo religioso caracterizado por sua ênfase em experiências espirituais intensas, como a cura divina, o batismo no Espírito Santo e o uso de dons espirituais, como a profecia e a glossolalia (falar em línguas),  segundo Mariano (1999).

Além disso, os neopentecostais valorizam a vivência pessoal e direta com Deus, frequentemente manifestada em cultos vibrantes e emocionantes. Este grupo é conhecido por sua rápida expansão e pela formação de grandes congregações em diversas partes do mundo, incluindo o Brasil (Mariano, 1999).

3.2 LOCUS DA PESQUISA

A pesquisa foi realizada em três igrejas localizadas na região metropolitana de Belém e Ananindeua, no estado do Pará. Esta região é conhecida por sua diversidade cultural e religiosa, com uma presença significativa de comunidades evangélicas. As igrejas escolhidas para o estudo foram a Assembleia de Deus Prainha, a Igreja Evangélica Ministério da Renovação e a Igreja Resgate Urgente.

3.3 ETAPAS METODOLÓGICAS DA PESQUISA

Com o principal objetivo de descrever e analisar o uso de fraseologismos que circulam na fala dos evangélicos neopentecostais, esta pesquisa foi desenvolvida em várias etapas detalhadas que pontuadas, classificam-se em: Delimitação Temática, em que destaca-se o foco do estudo – as unidades fraseológicas no discurso neopentecostal -, escolha das Leituras Bibliográficas para o Aporte Teórico, em que foram selecionadas obras de autores da área da fraseologia, como Ortíz Alvarez (2000), Monteiro-Plantin (2014) e Mejri (1997), dentre outros.

Além disso, a elaboração do Formulário para a Coleta do Corpus foi a etapa seguinte, fundamental para o desenvolvimento de um questionário destinado a coletar os fraseologismos usados pelos cristãos.

A etapa seguinte consistiu na aplicação do questionário que deu-se a partir da utilização do Google Forms para a criação e distribuição do formulário. Nesse viés, compreende-se que o formulário foi aplicado de forma online a partir do link disponibilizado aos membros das igrejas.

O questionário contém cinco perguntas – como explicitado no quadro I – e foi aplicado em julho de 2024, no locus supracitado.

Quadro I – Questionário Aplicado

PerguntasContextualização
1.Como você saúda um irmão ou convidado?Durante os cultos ou eventos sociais na igreja, como os membros se cumprimentam? Quais são as frases ou expressões comuns utilizadas para receber tanto os frequentadores assíduos quanto os visitantes pela primeira vez?
2. Como você costuma “repreender” algum comportamento ou fala que não concorda?Quando surgem comportamentos ou discursos que não estão alinhados com os ensinamentos ou valores da igreja, como os membros lidam com essas situações?
3. Como o cristão presta condolências (eufemizando a morte)?Nos momentos de luto e perda, como os cristãos expressam suas condolências? Quais são as expressões ou fraseologismos comuns usados para consolar os enlutados, ao mesmo tempo que evitam mencionar a morte de forma direta?
4. Que expressões de contentamento/gratificação os cristãos costumam utilizar?Em situações de celebração, agradecimento ou reconhecimento, quais são as expressões de alegria e gratificação mais frequentemente usadas pelos cristãos? Como essas expressões refletem a cultura e os valores da comunidade evangélica?
5. Que expressões podem ser utilizadas para se referir a figura de Jesus? O próprio texto bíblico refere-se a Cristo de diversas formas, a exemplo: pão da vida. Que outras formas você costuma utilizar ou conhece?

Fonte: Autores (2024).

Os dados coletados foram analisados seguindo o processo de validação das propriedades fraseológicas proposto por Mejri (2012). Sob esse viés, os resultados identificaram a presença de 45 unidades Fraseológicas amplamente utilizadas e reconhecidas nas comunidades estudadas, como “tá queimado” e “Foi pra glória”.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta seção, são apresentados os resultados da pesquisa, que contou com a participação de 55 colaboradores, os quais mencionaram um total de 266 fraseologismos em suas respostas. As unidades identificadas se distribuem da seguinte maneira: 54 ocorrências fraseológicas relacionados a saudações, 54 associados a repreensões, 53 referentes a expressões de condolências, 53 ligados à manifestação de contentamento e 52 utilizados para se referir à figura de Jesus Cristo.

O Quadro II ilustra as ocorrências encontradas na amostra selecionada para indicar as saudações. Para maior entendimento, os fraseologismos estão numerados na primeira coluna. Na segunda, o fraseologismo mencionado com a indicação da frequência entre parênteses e seu contexto de uso na terceira coluna.

Quadro II – Saudações

FraseologismosContexto de uso
01Paz e graça (14)Esse tipo de saudação não é incomum desde os primórdios da igreja primitiva, contudo, o Apóstolo Paulo as ressignificou. Nos seus escritos bíblicos ele cumprimentou seus irmãos com a graça e a paz de Deus Pai e Jesus Cristo, isto era exclusivamente cristão.
02A paz de Cristo (9)Do mesmo modo que o fraseologismos ‘‘a paz do senhor’’, contudo, com uma variação do complemento “do senhor” para “de Cristo”, com o sentido mantido: antes de anunciar alguma atividade entre cristãos neopentecostais.
03A paz do senhor / Paz do Senhor (8)Fraseologismo usado  para as saudações entre os evangélicos antes de liturgias dentro do templo, como antes de louvar ou ministrar uma palavra ou anunciar.
04A Paz do senhor Jesus (19)Do mesmo modo que o fraseologismos ‘‘a paz do senhor’’, contudo, com uma variação ao adicionar o complemento “Jesus”. Seu sentido não é comprometido, apesar da mudança.
05A paz seja convosco (2)Fraseologismo usado no fim de saudações, com um teor de despedida após a ministração da mensagem.
06A paz (2)Com a retirada do senhor, porém, mantém o equilíbrio semântico.

Fonte: Autores (2024).

O Quadro II apresenta as ocorrências coletadas para o contexto de saudação entre o grupo amostral estudado. Sendo seis fraseologismos de diferentes frequências, sendo A paz do Senhor Jesus o mais produtivo com 19 ocorrências. 

Nessa perspectiva, observou-se a presença de três unidades que são registradas separadamente, sendo elas: A paz, a paz de Cristo e a paz do senhor, sendo no primeiro caso, a simplificação do fraseologismo, porém, é possível ainda projetar qual seja o seu complemento, justificando assim o critério da previsibilidade fraseológica. 

Quadro III – Repreensões

FraseologismosContexto de uso
01Tá repreendido (6)Usado como repreensão de algo negativo. 
02tá repreendido em nome de Jesus (8)Usado como defesa, haja vista que o nome de Jesus é narrado como elemento de defesa diante das entidades espirituais nos textos bíblicos e repreensão de algo negativo. 
03Sangue de Jesus (13)O sangue de Jesus é apresentado como elemento santo e de purificação no contexto da religião e devido a isso, acredita-se ser poderoso diante das adversidades.
04Tá amarrado (7)Possui o mesmo teor que a expressão ‘‘ta repreendido’’ ou ‘‘tá queimado’’: repreensão de algo negativo que será destruído pelo poder de Deus.
05Tá queimado / Queima Senhor/ Queima (10)Usado como repreensão, assim como os demais, porém, contém um teor de castigo remetendo ao fogo do inferno. A nível de exemplo: ‘‘Tal problema será lançado no fogo pelo senhor Deus e assim, será destruído.’’ 
06Sangue de Jesus tem poder (11)O sangue de Jesus é apresentado como elemento santo e de purificação no contexto da religião e devido a isso, acredita-se ser poderoso diante das adversidades.

Fonte: Autores (2024).

No quadro III, apresentam-se os fraseologismos que remetem ao contexto de repreensão, como apresentado no questionário aplicado: ‘‘Quando surgem comportamentos ou discursos que não estão alinhados com os ensinamentos ou valores da igreja’’. 

Na análise captada, foi observada a presença de seis ocorrências distintas, sendo ‘‘Sangue de Jesus’’ com 13 ocorrências, a de maior frequência, seguida de variações da mesma, como ‘‘Sangue de Jesus tem poder’’ com 11 ocorrências.

Quadro IV – Condolências

FraseologismosContexto de uso
01Descansa no senhor (10)De forma eufemizada para tratar da morte de alguém, diz-se que a pessoa descansa no Senhor.
02Dorme no seio de Abraão (6)Da mesma forma que o fraseologismo anterior, dormir no seio de Abraão é uma atenuação do falecimento, remetendo ao texto bíblico de Lucas 16:22, para dizer que o falecido está em descanso eterno ao lado de Deus.
03Descansa no braço do pai (1)De forma abrandada para tratar da morte de alguém, diz-se que a pessoa descansa no conforto de Deus pai.
04Foi pra glória / partiu para a glória (17)Fraseologismo usado para enfatizar que a glória, isto é, os céus, é o lugar ‘‘melhor’’ cujo o falecido encontra-se.
05Dorme em Cristo (2)O verbo “descansar” é usado como mecanismo de atenuação ao dirigir-se ao ente querido.
06Deus tomou pra si / Deus levou pra si (5)Faz menção a pessoa que é selecionada por Deus, de forma singular, na sua vida terrena, para ter um cuidado especial na terra e na sua vida pós-morte, no descanso eterno.
07Morreu em Cristo (12)Usado nas condolências aos entes queridos, reforçando que a pessoa morreu na terra, mas permanece vivo com Cristo.  

Fonte: Autores (2024).

O quadro IV apresentou sete ocorrências distintas de fraseologismos que remetem a condolências. Sendo ‘‘Foi pra glória’’ o de maior frequência, contabilizando dezessete ocorrências, seguida de ‘‘Morreu em Cristo’’  com doze ocorrências e ‘‘Descansa no Senhor’’ com dez. Todos os fraseologismos visam abrandar o tratamento dado aos familiares de quem perdeu um ente querido.

Quadro V – Contentamento/felicitações

FraseologismosContexto de uso
01Oh glória / eita, glória (11)Usadas como expressões de exaltação e alegria, geralmente durante momentos de louvor e adoração. Refletem uma resposta emocional a sentimentos de gratidão e espiritualidade.
02Glória a Deus (23)Uma forma de reconhecer e honrar a divindade, frequentemente utilizada após orações, testemunhos ou momentos de bênção, reafirmando a centralidade de Deus na vida do fiel.
03Amém (5)Significa “assim seja” e é frequentemente usado para concordar com orações ou declarações feitas durante os cultos. Representa um sinal de fé e aceitação da vontade de Deus.
04Louvado seja o nome do Senhor (6)Usada para glorificar a Deus, geralmente em momentos de adoração coletiva, enfatizando a reverência e a devoção dos fiéis.
05Recebe a bênção (3)Expressão encorajadora utilizada por líderes e pastores, incentivando a congregação a aceitar e crer nas bênçãos que Deus tem para eles, promovendo um sentido de expectativa e fé.
06Aleluia (5)Uma expressão tradicional de louvor e júbilo, usada em cultos, especialmente durante cânticos e momentos de celebração, simbolizando a alegria e a gratidão a Deus..

Fonte: Autores (2024).

O quarto quadro remete a fraseologismos de contentamento, apresentando seis diferentes exemplos utilizados pelo público amostral. Como observado, ‘‘Glória a Deus’’ foi o fraseologismo de maior ocorrência, apresentando vinte e três repetições. Secundariamente, ‘‘Oh glória’’ ou ‘‘eita glória’’, com onze repetições e seus contextos de uso.

Quadro VI – Menções a Jesus

FraseologismosContexto de uso
01Sal da terra (1)Refere-se à influência e ao testemunho que os cristãos devem ter no mundo, enfatizando a importância de viver de maneira que impacte positivamente a sociedade.
02Príncipe da paz (3)Título dado a Jesus, simbolizando sua capacidade de trazer paz espiritual e reconciliação entre Deus e a humanidade, frequentemente mencionado em momentos de oração e reflexão.
03Luz do Mundo (2)Outro título de Jesus, indicando seu papel em trazer clareza espiritual e verdade ao mundo. Usado para incentivar os fieis a serem exemplos de luz em suas comunidades.
04Pai (7)Refere-se a Deus como o Pai, uma relação íntima e pessoal que os crentes têm com Deus, comumente utilizada em orações e adoração.
05Verbo vivo (1)Termo que destaca a natureza divina de Cristo, baseando-se no Evangelho de João, onde se fala da Palavra que se fez carne. Usado em ensinamentos sobre a encarnação e a mensagem de Cristo.
06Meu senhor / senhor (2)Usado para se referir a Jesus com reverência, reconhecendo sua autoridade e soberania na vida do crente, frequentemente usado em orações e louvores.
07Filho do homem (5)Título que Jesus usou para se referir a si mesmo, enfatizando sua humanidade e sua missão redentora. Usado em pregações para discutir a identidade de Cristo.
08Yeshua (11)Nome hebraico de Jesus, utilizado para conectar os crentes às raízes judaicas da fé cristã, muitas vezes em contextos de estudo bíblico e celebrações.
09Como meu único e suficiente salvador (4)Uma afirmação de fé que enfatiza a crença na salvação exclusiva através de Jesus, frequentemente mencionada em momentos de conversão e testemunhos.
10Pão da Vida (5)Referência a Jesus como a fonte de sustento espiritual, baseada em sua própria declaração no Evangelho de João. Usada em ensinamentos sobre dependência espiritual.
11Eterno (4)Refere-se à natureza imutável e eterna de Deus, frequentemente mencionado em louvores e orações, para afirmar a fé na eternidade da vida em Cristo.
12Emanuel (3)Significa “Deus conosco”, um título que enfatiza a presença de Deus entre os humanos, usado em cultos para lembrar a encarnação de Cristo.
13Cristo (3)Um título que significa “o ungido”, usado para reconhecer Jesus como o Messias prometido. Comum em pregações e músicas.
14Grandão da Galiléia (1)Uma expressão coloquial que exalta Jesus, ressaltando sua grandeza e poder, muitas vezes usada para conectar a mensagem cristã de maneira acessível.

Fonte: Autores (2024).

O último quadro apresentou quatorze fraseologismos diferentes que fazem menção a Jesus. Sob tal ótica, observou-se que ‘‘Yeshua’’ foi o de maior frequência, totalizando onze ocorrências, seguido de ‘‘pai’’ com sete ocorrências e filho do homem e pão da vida, empatados com cinco ocorrências, cada. Cada fraseologismo ilustrado utilizado pelo público alvo da pesquisa remete a textos bíblicos que referem-se a figura de Jesus Cristo de forma metafórica, como apresentado em seus contextos de uso.

Além disso, é válido ressaltar a síntese do número de fraseologismos presentes em cada questão, em percentuais, como ilustrado no Gráfico I. Como apresentado, os fraseologismos de menções a Jesus possui um percentual superior quando comparado com as outras questões, com 36,08%. Enquanto que os fraseologismos que remetem a condolências apresentam a segunda maior variante, com 17,53%. Por fim, as questões que remetem a saudações, contentamento e repreensões mostram um percentual semelhante, de 15,46%, cada.

Gráfico I – Percentual de Fraseologismos por Questão

Fonte: Autores (2024).

Outro aspecto captado refere-se à congregação dos participantes. Como já mencionado, o público participante da pesquisa é cristão de vertente neopentecostal, contudo, de congregações diversas. Quando analisamos as respostas dessa comunidade em relação ao questionário foi possível observar que as respostas variam devido aos costumes e ritos de cada instituição, como apresentado no Gráfico II, que ilustra os diferentes tipos de congregação.

Gráfico II – Congregações participantes da pesquisa

Fonte: Autores (2024).

Sem dúvidas, a partir do material coletado, foi possível concluir que a relação entre religião e linguagem é um campo rico de estudo que revela como a comunicação verbal e não verbal molda a experiência religiosa. Além disso, a linguagem não é apenas um meio de expressão; ela também desempenha um papel crucial na construção da identidade religiosa e na vivência de práticas espirituais.

A linguagem religiosa também possui um caráter performativo, conforme discutido por Austin (1962). As afirmações feitas em um contexto religioso, como “Deus abençoe” ou “te repreendo em nome de Jesus”, não são apenas enunciados, mas atos que realizam algo no mundo. Essa performatividade é central para a vivência da fé, pois as palavras têm o poder de criar realidades espirituais e sociais.

Outro aspecto importante é a influência da cultura na linguagem religiosa. Como observa Geertz (1973), as práticas religiosas estão intimamente ligadas aos contextos culturais em que estão inseridas. A forma como as comunidades se expressam pode variar amplamente, desde o uso de jargões específicos até adaptações de línguas locais, refletindo a diversidade das experiências religiosas ao redor do mundo.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

A presente pesquisa evidenciou que os fraseologismos exercem papel fundamental na constituição e expressão da identidade linguístico-discursiva dos fiéis neopentecostais. Por meio da análise das expressões coletadas, foi possível constatar que essas unidades fraseológicas não apenas integram o repertório cotidiano dos membros das igrejas estudadas, mas também cumprem funções pragmáticas, ideológicas e performativas no interior das práticas religiosas.

O levantamento das 266 ocorrências revelou que expressões como “Glória a Deus”, “Tá repreendido”, “Foi pra glória” e “Yeshua” são recorrentes e socialmente marcadas, atuando como marcadores de pertencimento, reforço da fé e manutenção das tradições discursivas do grupo. Tais enunciados, segundo a abordagem de Mejri (2012), demonstram alto grau de fixidez, polilexicalidade, previsibilidade e idiomaticidade — critérios que sustentam sua caracterização como unidades fraseológicas.

Além do valor linguístico, os fraseologismos analisados também demonstram forte ancoragem na teologia e na cultura do grupo religioso. Como observado por Austin (1962), essas expressões atuam como atos de fala performativos, ou seja, não apenas dizem algo, mas realizam ações espirituais concretas no contexto da fé. Nesse sentido, a linguagem torna-se um instrumento de ação sagrada, capaz de repreender, abençoar, consolar ou exaltar.

Por fim, a investigação reforça a relevância dos estudos fraseológicos aplicados a contextos específicos, como o religioso, e aponta para a necessidade de aprofundamento contínuo sobre as interfaces entre linguagem, fé e identidade cultural. Assim, espera-se que este trabalho contribua para o enriquecimento do campo da Fraseologia, bem como para o entendimento da linguagem enquanto prática social, cultural e espiritual.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1Autora Principal e Mestranda em Ensino de Língua Portuguesa e suas respectivas literaturas do Programa de Pós-graduação da Universidade do Estado do Pará. Especialista em Letras com ênfase em linguística (FOCUS). ( UEPA ) – vituria7@gmail.com
2Co-autoras e Mestrandas em Ensino de Língua Portuguesa e suas respectivas literaturas do Programa de Pós-graduação da Universidade do Estado do Pará. ( UEPA ) – claudiapessoa346@gmail.com – Daianedepaula325@gmail.com – tmoraes.blm@gmail.com – zuzianerocha2@gmail.com