REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102410280536
Tiago de Almeida Santos Tergilene
Resumo
O artigo analisa criticamente as ideias do liberalismo econômico, destacando seu lugar singular entre os críticos do liberalismo. Keynes propôs um modelo que mantinha o capitalismo, mas com uma intervenção estatal necessária para corrigir as falhas do mercado e prevenir crises econômicas. Ele não se alinhava com o socialismo ou o fascismo, criticando especialmente a especulação e defendendo uma regulação equilibrada, em oposição ao laissez-faire defendido pelo liberalismo clássico. Após a Grande Depressão de 1929, Keynes argumentou que o mercado não poderia se autorregular e que uma intervenção do Estado era crucial para gerar empregos e manter o equilíbrio econômico. Suas ideias influenciaram diretamente as políticas do século XX, especialmente no pós-guerra. O artigo também discute o contraste entre o pensamento keynesiano e o neoliberalismo, que ressurgiu na década de 1970, promovendo a desregulamentação, a privatização e a precarização do trabalho. O estudo conclui que, embora o neoliberalismo tenha oferecido soluções para crises, ele exacerbou as desigualdades sociais e esvazia o papel do Estado, favorecendo o grande capital. O artigo defende que um modelo de intervenção estatal, como o de Keynes, que equilibra a justiça social e o crescimento económico, é uma alternativa válida para lidar com as crises contemporâneas.
Palavras Chaves: Crise; Neoliberalismo econômico; Modelos econômicos.
Abstract
The article critically analyzes the ideas of economic liberalism, highlighting its unique place among the critics of liberalism. Keynes proposed a model that maintained capitalism, but with the necessary state intervention to correct market failures and prevent economic crises. He did not align himself with socialism or fascism, criticizing speculation in particular and advocating balanced regulation, as opposed to the laissez- faire approach advocated by classical liberalism. After the Great Depression of 1929, Keynes argued that the market could not regulate itself and that state intervention was crucial to create jobs and maintain economic equilibrium. His ideas directly influenced 20th century policies, especially in the post-war period. The article also discusses the contrast between Keynesian thinking and neoliberalism, which resurfaced in the 1970s, promoting deregulation, privatization and job insecurity. The study concludes that although neoliberalism has offered solutions to crises, it has exacerbated social inequalities and emptied the role of the state, favoring big business. The article argues that a model of state intervention, like Keynes’, which balances social justice and economic growth, is a valid alternative for dealing with contemporary crises.
Keywords: Crisis; Economic neoliberalism; Economic models.
I Introdução
John Maynard Keynes (1883-1946) ocupa um lugar singular entre os críticos do liberalismo. Suas ideias são únicas em comparação com as que o precederam, não aderindo a correntes como o socialismo ou o nazifascismo, ambas criticadas por ele. Embora admita a importância de conceitos como propriedade privada e livre iniciativa, sua proposta envolve um equilíbrio, destacando a necessidade de intervenção estatal em setores específicos para evitar crises econômicas, ao contrário da defesa absoluta do laissez-faire típico do liberalismo clássico (Johnson, 2003). Keynes não rejeitava o capitalismo, mas separava o sistema econômico segundo das ideias liberais que, ele, tinha sido superada pelos acontecimentos do século XX (Henrique & Gualda, 2009).
Keynes criticou especialmente a figura do especulador e defendeu que o Estado deveria ter papel ativo na economia para evitar os ciclos de crise e expansão descontrolada que o capitalismo desregulado tende a gerar. Ao propor controles e regulamentações, ele confrontava diretamente o liberalismo, que defendia a interferência mínima do Estado nos mercados (Harvey, 2008). As suas concepções, ainda que criticadas por conservadores e defensores do liberalismo, influenciaram diretamente a formulação de políticas econômicas no século XX, notadamente durante o período de retirada pós- Segunda Guerra Mundial (Antunes, 2004).
Ao contrário das teorias neoliberais que emergiram mais tarde, argumentando que ajustes estruturais e liberdade individual levariam à prosperidade (Johnson, 2003), Keynes via com ceticismo a capacidade do mercado de autorregulação. Ele defendeu que o Estado deveria intervir, não para destruir o capitalismo, mas para resgatá-lo de suas crises mais profundas, mantendo o equilíbrio entre o capital privado e o bem-estar social. Sua posição contrastava fortemente com os ajustes neoliberais, que muitas vezes resultaram na precarização do trabalho e na manutenção do poder de poucos (Harvey, 2008).
As contribuições de Keynes introduziram novas formas de pensar a economia, resgatando críticas às teses do liberalismo econômico clássico, cujas ideias, segundo ele, foram atropeladas pelos acontecimentos do século XX. Ao contrário da visão idílica da liberdade individual embasada no aumento da produtividade a qualquer custo, Keynes propunha um modelo mais equilibrado, em que o Estado atua para evitar a concentração extrema de capital e as desigualdades crescentes (Harvey, 2018). Este modelo de intervenção foi visto, em muitos casos, como uma alternativa viável para as economias que precisariam se recuperar de crises, evitando os impactos negativos, como migrações e reassentamentos de trabalhadores empregados pelas crises econômicas (Ritchie, Carpenter & Mojab, 2022). Assim, o presente estudo tem por objetivo em analisar criticamente as limitações e consequências do liberalismo econômico contemporâneo, com ênfase nas desigualdades sociais, precarização do trabalho e concentração de renda.
Além disso, Keynes abordou a importância de políticas públicas específicas, destacando que o papel do Estado não se restringe à economia, mas se estende ao bem- estar social, prevenindo problemas que vão desde a pobreza até às questões ambientais e mudanças climáticas, que não podem ser resolvidas apenas por forças de mercado (Castree, 2006; Rodrigues, 2018; Pintos & Astelarra, 2023). A carência de um consenso sobre o que é o neoliberalismo revela a complexidade do conceito, que se mobiliza para implementar diferentes agendas políticas e econômicas, tanto positivas quanto negativas (Oliveira, 1998; Arrais, 2022). Assim, a obra de Keynes oferece uma resposta a essa mobilização, propondo um arcabouço teórico que equilibra liberdade econômica com justiça social.
II Breve história do pensamento econômico: do liberalismo econômico
Este tópico se propõe analisar as linhas de pensamento econômico dentro da economia clássica, fazendo abordagens acerca das principais correntes do saber da Economia Política do ponto de vista da história do pensamento econômico. Esta análise voltou à compreensão do modo de produção capitalista e as discussões que cerceiam o papel do estado dentro da economia. De forma estrita, a visão de Estado será apresentada nos moldes da ciência econômica conforme as teorias clássica, utilitarista e neoliberal.
II.1 Liberalismo econômico com Adam Smith até a crise de 1929
As primeiras manifestações da ciência relacionadas aos problemas econômicos começaram com uma corrente de pensamento que Adam Smith (1723- 1790) chamou de sistema mercantilista. De acordo com essa corrente, a ideia de geração de riqueza baseava-se no acúmulo de metais e no forte protecionismo entre os países da época. O Estado deveria propor medidas de modo a aumentar o acúmulode metais preciosos. Portanto, quanto maior o número destes em um país, maior o número de meios de circulação. Isso estimularia a produção e o comércio entre os indivíduos, resultando em mais bens comercializados (BRUE, 2006).
Seguindo essa visão, os mercados interno e externo do país seriam controlados diretamente pelo Estado, que eram constituídos, principalmente, pelos monarcas e suas respectivas colônias. Só assim, exercendo esse forte controle e com a políticade importação restrita, poderia manter-se uma balança comercial do país favorável,ou seja, exportar mais do que importar. Portanto, um governo nacional forte era necessário para garantir a regulamentação e unidade nacional, para isso, nacionalismo, protecionismo, colonialismo e comércio interno livre de pedágios e impostos exorbitantes era justificado (BRUE, 2006).
É nesse contexto que nasce o pensamento de Adam Smith (1723-1790), primeiro como uma crítica ao sistema mercantilista, Ele, propõe que a riqueza de umanação não está na posse de metais preciosos, mas em bens úteis para suprir as necessidades humanas, cuja fonte é o comércio interno. Smith afirmou que quanto maior a produtividade, maior a produção excedente. E esse aumento da produtividadedo trabalho depende da divisão social do trabalho.
Em seguida, visando o bem-estar material dos indivíduos num Estado. Smith, propõe que os participantes de uma economia tendem a buscar seus interesses pessoais. Sendo assim, o consumidor vai em busca do menor preço de um bem, de acordo com sua qualidade. O trabalhador vai em busca do melhor salário, de acordo com seu trabalho e o negociante irá buscar sempre o lucro de acordo sua mercadoria. “Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que nós esperamos nosso jantar, mas da sua consideração de seu próprio interesse” (SMITH1877, p. p. 277-278 2006).
Adam Smith escreveu “Uma investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações” (1776), responsável por descrever os primórdios da economia como campo do conhecimento. A idéia central da obra é a origem e a natureza da riqueza nacional e as mudanças na estrutura social, especialmente nas relações de produção, criando um arcabouço que ficaria conhecido como liberalismo econômico.
Em um contexto histórico, Smith defende o capital como aquela parte do estoque aplicado que se espera obter retornos. (SMITH, 2017). Para funcionar, o liberalismo econômico conta com uma alavanca comportamental muito poderosa: a busca do
interesse próprio. Diz-se que essa alavanca implica um mecanismo auto-regulador conhecido como “mão invisível do mercado”, uma metáfora desenvolvida por Adam Smith para se referir à competição econômica e afirmar que ela é o motor do desenvolvimento. Com isso, a posição de Smith se mostra contraria a qualquer intervenção do Estado na economia. A esse respeito Smith (1877, p. p. 277-278 apud BRUE, 2006) afirma:
Mas, embora a exuberância do governo deva, sem dúvida, ter retardado o progresso da Inglaterra em direção a riqueza e ao desenvolvimento, ela não era capaz de parar o país. A produção anual de sua terra e trabalho é, sem dúvida, muito major atualmente do que era na restauração ou na revolução. Portanto, o capital empregado anualmente no cultivo da terra e na manutenção desse trabalho deve ser provavelmente muito maior. No meio de todas as extorsões do governo, esse capital tem sido silenciosa e gradualmente acumulado pelo comedimento e boa conduta dos indivíduos e pelo esforço geral, contínuo e ininterrupto o para melhorar sua própria condição. E esse esforço, protegido pela lei e permitido pela liberdade de exercê-lo de maneira mais vantajosa, que tem mantido o progresso da Inglaterra em direção opulência e ao desenvolvimento em quase todas as épocas anteriores e que se espera que continue no futuro. A Inglaterra, no entanto, nunca foi abençoada com um governo muito parcimonioso e, portanto, a parcimônia tida tem sido a virtude característica de seus habitantes. A major impertinência e imprudência estão, portanto, nos reis e nos ministros, por fingirem zelar pela economia das pessoas e por impedirem a despesa delas, ou pelas pomposas leis ou por proibir a importação dos luxos estrangeiros. Eles mesmos são sempre e, sem exceção, os maiores esbanjadores na sociedade. Deixe-os cuidar bem de sua própria despesa, e eles podem, seguramente, deixar as pessoas privadas cuidarem das suas. Se sua própria extravagancia não arruína o Estado, a de seus súditos nunca o arruinara.
O pensamento na ótica do Estado liberal permaneceu fortalecido desde a sua concepção teórica até a Grande Depressão Econômica de 1929. As ideias defendidas no seio desse modelo de Estado enfrentaram um confronto direto quando lidou com uma grave crise econômica que assolou a economia dos Estados Unidos da América (E.U.A). O paradoxo criado no formato da crise, visto a superprodução do país e a escassez cada vez maior da demanda, associado ao aumento da especulação do mercado financeiro, invariavelmente, forçou o pensamento de um Estado atuante, no sentido estrito de intervenção, isto Marcou a decadência do liberalismo econômico vislumbrado por Adam Smith. Somente com a corrente defendida por Keynes (1936), com a obra A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, colocou-se em questionamento o pensamento liberal. Keynes arguiu suas ideias para inclusão do Estado na condução de grandes investimentos a fim de gerar empregos, em um cenário de alto índice de desemprego.
III A proposta keynesiana de superação da crise: o anacronismo dos dogmas
Com a “Grande Depressão” de 1929, ficou claro que o liberalismo clássico sozinho não poderia garantir o pleno emprego. Isso porque o capitalismo estava passando por uma de suas piores crises. Na época, os estados capitalistas administravam a esfera econômica de acordo com as teorias estabelecidas pelo liberalismo clássico, doutrina econômica que defendia a ideia de que o desenvolvimento econômico de um país estaria vinculado ao princípio da não intervenção estatal na economia (SOUSA, 2022).
No contexto em que vivia, a primeira metade do século XX, predominavam na elite intelectual e econômica inglesa as ideias liberais, apesar das guerras e mesmo após a crise de 1929. Fora sob a égide desse ideário que o Império Britânico atingira seu apogeu; o liberalismo justificara e legitimara a busca do lucro, o padrão-ouro, a abertura dos mercados e as conquistas coloniais “civilizatórias”. “Para que intervenção do Estado, se nunca precisamos disso?” Era a pergunta mais difundida e a mais difícil de responder aos interlocutores predispostos a reagir em sentido contrário.
Neste caso, John Maynard Keynes (1883-1946) aparece para romper com as ideias liberais, segundo as quais a premissa básica de compreensão da economia é o nível de consumo e investimento do governo, das empresas e dos consumidores. Com base nesse princípio, a teoria keynesiana afirma que quando as empresas tendem a investir menos, inicia-se todo um processo de retração econômica que abre portas para o estabelecimento de uma crise (SOUSA, 2022). Para evitar uma situação de crise, Keynes defendeu a necessidade de os Estados encontrarem formas de conter os desequilíbrios econômicos. Entre outras medidas, o governo deve remeter grandes somas de capital para investir a fim de aquecer a economia como um todo. Ao mesmo tempo, é crucial que o governo conceda linhas de crédito a baixo custo para salvaguardar o investimento do setor privado.
Ao introduzir tais incentivos, os níveis de emprego aumentarão, garantindo assim que o mercado consumidor realmente apoie o uso de todos esses recursos. Dessa forma, Keynes propôs ideias que mudaram fundamentalmente o papel do Estado na economia, desacreditando a antiga visão do “laissez-faire” liberal (SOUSA, 2022). A partir das visões de participação na economia pelo Estado, Keynes, abriu caminho para um novo precedente. O Estado regulador da economia, regula os salários e os direitos dos trabalhadores, atuando como um órgão que cobra impostos de todos, inclusive dos empresários, e reverte esses impostos em serviços para a população, criando um Estado de bem-estar social (PORFÍRIO, 2022).
III.1 Estado de bem-estar social
À medida que o capitalismo industrial foi estabelecido na Europa e consequente em outros continentes, as pessoas se viram em um cenário de miséria, fome, disseminação de doenças e crescimento exponencial da violência e da desigualdade social. Os operários geralmente trabalhavam mais de 12 horas por dia, sem direito a folgas remuneradas como férias e folgas semanais, além da previdência social e remuneração satisfatória que lhes permitissem levar uma vida digna. Os trabalhadores viviam na miséria, passavam fome e os desempregados levavam uma vida ainda pior (PORFÍRIO, 2022). Quanto ao cenário histórico de surgimento do Estado de Bem-Estar social, Leme (2010, p. 119) afirma:
O quadro histórico de surgimento do Welfare State emergiu basicamente de três grandes fatos, a saber: primeiramente, pela Grande Depressão, uma derrocada das fortes economias baseadas no livre mercado; em segundo, a economia soviética experimentava certo sucesso num modelo centralizado e planificado de controle direto do Estado sobre a economia e a política, engendrando um processo de industrialização relativamente bem-sucedido e, por último, porém não com menor importância, o processo de ascensão de regimes fascistas e nazistas centrados radicalmente contra o liberalismo econômico.
Em meio à crescente onda de reivindicações e formação de sindicatos, e com arcabouço teórico de maior participação do Estado na economia implantado por Keynes, as ideias que defendiam a provisão estatal de bem-estar mínimo para a população em geral começou a ser difundida. A noção de Estado de Bem-Estar Social (Welfare State) teve início na Inglaterra no pós-II Guerra Mundial, quando o partido trabalhista, socialdemocrata, estabeleceu que independente da sua renda, todo cidadão teria o direito de ser protegido pelo Estado. Quanto ao entendimento do termo Estado de Bem-Estar Social, Leme (2010) esclarece:
O Welfare State foi uma forma histórica de reconciliação entre a economia de mercado, isto é, com a afirmação dos princípios da acumulação e da propriedade privada, com a democracia que faltou ao socialismo real, bem como também aos regimes nazifascistas, enfim, autoritários e/ou totalitários. O mercado enquanto agente autorregulador tenderá a proporcionar a desigualdade entre os indivíduos. Porém, as instituições democráticas irão parear todos os indivíduos e, do ponto de vista político todos os indivíduos são considerados cidadãos e, por meio da cidadania, são iguais.
Existem três princípios básicos do estado de bem-estar social, a saber: a seguridade social (Este é um suporte para o trabalhador caso aconteça algum acidente e ele perca temporariamente ou definitivamente sua capacidade de gerar renda), ampliando as oportunidades de emprego e Renda; a garantia do pleno emprego, que vai gerar o que se chama de demanda efetiva; e por fim Ampliando as políticas sociais, ou seja, as políticas de redistribuição e compensação, cujo objetivo é minimizar a desigualdade social (LEME, 2010). Dentro desta visão Leme (2010, apud OLIVEIRA, 1998) esclarece:
O Welfare State pode ser entendido dentro de uma perspectiva de esfera pública donde, a partir de regras universais e pactuadas de diversas formas, passou-se a ser encarado como um pressuposto fundamental ao financiamento da acumulação do capital por um lado e, por outro, do financiamento da reprodução da força de trabalho, atingindo-se com isso, globalmente, toda a população por meio dos gastos sociais.
A partir do pensar e do implantar do bem-estar social dos cidadãos, os governos começaram a criar medidas para o Estado oferecer serviços para a sociedade. Para isso, foi necessário implantar uma estruturada previdência social e um organizado sistema de assistência médica. Desde então, o Estado passou a oferecer serviços prestativos aos cidadãos, como a institucionalização de seguros contra a velhice, a invalidez, doenças e maternidade. Posteriormente, implantaram-se políticas públicas, tais como, o seguro- desemprego e serviços assistenciais.
No entanto, a partir da década de 1960, as economias dos Estados Unidos e do Reino Unido começaram a declinar. Como a recessão foi exacerbada pela crise do petróleo dos anos 1970, as duas potências deixaram de lado o keynesianismo e adotaram ideias próximas ao neoliberalismo, influenciados pela Escola Austríaca de Ludwig von Mises, e Escola de Chicago com Milton Friedman (PORFÍRIO, 2022).
III.2 Ascensão do Neoliberalismo e a crítica marxista de seus postulados teóricos
Conforme já mencionado, o liberalismo econômico perdeu espaço na política global para o keynesianismo, que defendia a intervenção do Estado para impulsionar a economia. Mas ressurgiu com muita força no final da década de 1970, com o termo neoliberalismo, ou seja, um produto do estágio de desenvolvimento do capitalismo, decorrente de sua crise estrutural. A partir da década de 1970, o mundo começou a vivenciar o declínio do modelo de estado de bem-estar social, que abriu espaço para que as ideias liberais recuperassem gradativamente suas preferências politicamente. Uma das primeiras experiências no mundo a ser considerada neoliberal foi realizada pelo Chile em 1975, sob o governo do ditador Augusto Pinochet influenciado pelas teorias da Escola de Chicago, que sugeriram medidas conducentes à liberalização do mercado e ao enxugamento do Estado. Isso inclui cortes nos gastos públicos, demissões em massa de funcionários públicos e a privatização de empresas estatais.
As eleições de Margaret Thatcher no Reino Unido e Ronald Reagan nos Estados Unidos no início da década de 1980 também demonstraram esse fenômeno (BLUME, 2022). O neoliberalismo defende pouca ou nenhuma intervenção governamental no mercado de trabalho, livre circulação de capitais internacionais, políticas de privatização de empresas estatais, abertura da economia à entrada de empresas multinacionais, além do vislumbre da globalização. Milton Friedman e Friedrick Hayek se tornaram os principais responsáveis pela base teórica do neoliberalismo econômico. Para ambos, a ideia de uma “mão invisível” teorizada por Smith, regulando o mercado em busca de um equilíbrio constante era totalmente aceitável (LEME, 2010). Quanto a isso, Leme (2010, p. 122) ainda destaca:
Tanto para Friedman quanto para Hayek, um dos principais pilares de sustentação do ideário neoliberal seria a noção de liberdade e de mercado. A primeira, por ser uma característica inerente e essencial que deveria ser garantida a todos os indivíduos, e, a segunda, por ser o espaço natural pelas quais as liberdades individuais ocorreriam e tenderiam para o equilíbrio. Para que essas duas características sejam realmente efetivadas o Estado não deveria influenciar nem intervir no jogo de mercado.
Blackburn (1999, p. 144) afirma que o neoliberalismo deve ser compreendido “como uma filosofia econômica com a pretensão de restabelecer níveis de lucratividade que permitam criar condições orientadas a uma explosão global de desenvolvimento”. O neoliberalismo refere-se à retomada de forma intensa do ideário liberal, o qual apregoa a liberdade dos mercados, as liberdades individuais, a autorregulação dos mercados, ou seja, a não interferência do Estado na economia. O projeto neoliberal defende a retração da intervenção do Estado no campo social. Háa valorização da área econômica em detrimento da social. Lowry (1999, p. 170) destaca que:
[…] uma das características centrais do neoliberalismo é fazer do mercadomuma religião. A sacralização do mercado transformou-se numa vitórianideológica do neoliberalismo, talvez a maior delas. A lógica mercantil está sendo aceita como uma lei da natureza, como um dado inquestionável […].
O neoliberalismo vai muito além de um modelo econômico. Blackburn (1999) afirma que constitui um projeto societário na perspectiva do grande capital, o qual a busca preservar a atual estrutura social composta por classes dominantes e por classes dominadas, onde uma classe é autorizada a explorar outra com fins de acumulação de riqueza. Já para Soares, “[…] o ajuste neoliberal não é apenas de natureza econômica: faz parte de uma redefinição global do campo político institucional e das relações sociais”.(SOARES, 2000, p. 12) (grifos do autor).
No projeto neoliberal do capitalismo, as políticas sociais ficam em segundo plano, sendo submetidas à lógica das políticas econômicas. As políticas sociais acabam resumindo-se a ações paliativas, focalizadas, assistencialistas, sem a presença do Estado, ou seja, as responsabilidades deste foram repassadas à família, à solidariedade e ao mercado, numa perspectiva de mercantilização da vida social.
Em visão geral, se percebe que à medida que os mercados domésticos (centro saturam, os neoliberais buscam conquistar novas formas de mercados consumidores (periferias), sempre visando aumentar os lucros e aproveitar mão de obra mais barata do que em seus países de origem. Ou seja, os países com ideais neoliberais pretendem construir um mundo cada vez mais livre e com menos regulamentações. Com isso, é possível aumentar o número de empresas multinacionais e aumentar a circulação de produtos importados dos países centros para os países periferias. Assim, após o avanço do neoliberalismo nos Estados Unidos e Europa, buscou-se a implementação nos países da América do Sul.
III.3 Reflexões sobre o modelo neoliberal brasileiro
A América Latina se configurou como o terceiro cenário a implementar as políticas neoliberais. O Chile liderou essa inserção através do governo do general Pinochet em 1970, colocando em prática à risca o receituário Neoliberal. Isso ocorreu em um cenário onde a entrada destes países se deu pela renegociação das dívidas externas, que obrigaram a pôr em prática um ajuste fiscal com o objetivo de saldar as dívidas com seus países credores (CARINHATO, 2008). Para Leme (2010, p. 130):
A concepção de “Estado mínimo”, requerida como nova forma de atração das Economias Satélites às nações hegemônicas, com algumas redefinições do papel do Estado, nos aspectos institucionais e regulatórios. Configurou-se como algo, a princípio, dialético: isto é, a exigência de um “Estado mínimo, porém forte”, ou seja, um mínimo de intervenção e uma forte atuação reguladora com a formulação de arranjos institucionais (dentre os quais, os de caráter político partidário) que corroborassem com uma nova intensidade do mercado.
A América Latina encontrava-se em um contexto histórico de alto endividamento externo associado a crise fiscal e outros fatores estruturais. Neste contexto, entra em cena o “Consenso de Washington”, um encontro ocorrido em 1989, na capital dos Estados Unidos. Nesse encontro, ficou definido uma série de recomendações e medidas que objetivava o desenvolvimento e à ampliação do neoliberalismo nos países da América Latina. As propostas básicas colocadas no Consenso de Washington foram: a) Disciplina fiscal, em que o Estado deveria cortar gastos e eliminar ou diminuir as suas dívidas, reduzindo custos e funcionários. b) Reforma fiscal e tributária, em que o governo deveria reformular seus sistemas de arrecadação de impostos a fim de que as empresas pagassem menos tributos. c) Privatização de empresas estatais, tanto em áreas comerciais quanto nas áreas de infraestrutura, para garantir o predomínio da iniciativa privada em todos os setores (LEME, 2010).
O Brasil, a partir de Fernando Collor de Mello (1990-1992), experimentou lampejos de liberalismo em seu curto mandato presidencial, inclusive abrindo o mercado para dar acesso a uma tecnologia mais avançada, pois o setor ficou sucateado no período da “Ditadura Militar” que adotou políticas intervencionistas para proteger o mercado interno. Mas somente com Fernando Henrique Cardoso na consolidação do Plano Real implementado por Itamar Franco que se observou o latente ideário neoliberal praticado. Segundo Sauer (2002, p.120) seguindo as recomendações do Consenso de Washington para o Brasil, “As reformas liberalizantes perpassam o governo do Presidente Itamar Franco (1992-1994) e fortalecem-se nos dois mandatos do Presidente Fernando Henrique Cardoso”. Neste sentido, Leme (2010, p. 131) salienta que:
As medidas recomendadas posto em pratica foram: a) a rápida privatização das empresas estatais (federais e estaduais), principalmente as de caráter estratégico (tais como telecomunicações e energia) para compor “caixa” para o pagamento das dívidas externa e interna; b) as reformas constitucionais – sobretudo na área fiscal – para redução dos impostos sobre os capitais privados; c) a desregulamentação dos aspectos econômicos em todas as instâncias; d) a flexibilização dos direitos trabalhistas; e) a redução dos investimentos estatais em políticas públicas básicas, e f) as reformas no aparato burocrático do Estado, a fim de reduzir gastos em geral, incluindo aquelas em recursos humanos.
O ponto central da política econômica do presidente FHC foi o ajuste fiscal, que produziu a falsa ideia, de que o principal problema do país se reduzia ao déficit público, e com isso, por sua vez, haveria uma necessidade de implementar medidas relativas ao equilíbrio orçamentário. Sob esse pretexto de atingir o equilíbrio orçamentário, o presidente Cardoso promoveu a privatização das empresas estatais (de energia, de telefonia, entre outras), além de viabilizar a aprovação das reformas previdenciária e administrativa. Contudo, apesar da utilização desses recursos, antissocial, o déficit público permaneceu elevado.
Os desdobramentos da política econômica patrocinada por FHC, em seu obsessivo propósito de contenção, a qualquer custo do déficit público, tiveram implicações desastrosas sobre as políticas sociais, na medida em que resultaram na redução drástica dos fundos públicos destinados ao financiamento dos serviços sociais direcionados aos segmentos mais pobres (PORTO, 2021). Com o início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2011) manteve-se a política econômica dos últimos anos de Fernando Henrique, com medidas neoliberais, em face mais visível aos acordos internacionais junto ao FMI. No entanto, Lula assumiu um papel fundamental nas políticas sociais vislumbrando as garantias básicas constitucionais.
Segundo Marques e Mendes (2005), a política social do governo Lula estabeleceu-se em três eixos: Fome-Zero (e o Bolsa-Família), Previdência Social e Seguridade Social. Um dos principais ganhos da CF/1988 foi o de garantir a universalização de direitos pela adoção da cidadania como critério de acesso, dessa forma, a proteção social tornava-se direito de qualquer cidadão, e para garantir recursos públicos que financiassem esse direito criou-se o conceito de Seguridade Social, que abarcaria a Previdência, Saúde e Assistência Social, e à qual foram atrelados vários impostos (TRISTÃO, 2011).
Os governos do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011) e da presidente Dilma Rousseff (2011–2016) priorizaram a chamada política neodesenvolvimentista, reunindo a burguesia interna brasileira, com a baixa classe média, o operariado urbano e o campesinato, incorporando a massa de trabalhadores desempregados, subempregados, trabalhadores por conta própria e os em situação de pobreza (Boito; Berringer, 2013). Se opondo ao neoliberalismo ortodoxo, o qual reunia o grande capital financeiro internacional, os grandes proprietários de terra e a alta classe média dos setores público e privado. A principal diferença entre os governos desenvolvimentista e neodesenvolvimentista está no papel do Estado, na promoção de poupança forçada e nos investimentos em infraestrutura econômica (Bresser-Pereira, 2009).
A retomada do neoliberalismo pelo Governo Temer (2016-2018) ocorre mediante o conhecido discurso neoliberal de controle das despesas públicas visando o crescimento do PIB, para justificar o congelamento de gastos públicos e recuos dos direitos sociais. No entanto, o que se percebe é o retorno à política liberal, a ideia de um Estado não intervencionista. Segundo Rossi e Mello (2017) o governo Temer cuidou de alterar partes importante do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017, excluindo termos que comprometiam o governo federal a assegurar a “distribuição de renda”, bem como, o “fortalecimento dos programas sociais” e a
execução de “políticas sociais redistributivas”. Para atender a demanda do capital produtivo o governo temer aprova no Congresso Nacional uma contrarreforma trabalhista visando minar direitos trabalhistas consolidados na CLT. Sobre à reforma trabalhista, Braz (2017, p. 97) esclarece:
[…] rebaixar os custos do trabalho, aumentar a produtividade média dos trabalhadores considerada baixa, flexibilizar ainda mais (lei das terceirizações) as relações de trabalho. Tal flexibilização visa criar formas que permitam aumentar a jornada de trabalho […] ou até mesmo diminuí-la, mas com redução de salários. Em todos os casos, buscando avançar com uma contrarreforma trabalhista que tende a reforçar ainda mais a alta taxa de rotatividade da força de trabalho (uma das maiores do mundo). Antes disso, já vemos o avanço do discurso do “acordo sobre o legislado” que, na prática, vem alterando a legislação trabalhista.
Outra medida neoliberal adotada pelo governo Temer foi o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), um pacote de privatizações, considerado o maior desde o Governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), que foi responsável pela maior onda de desestatização do país. A proposta é transferir para a iniciativa privada 175 ativos públicos em dez setores estratégicos, tais como: ferrovias, rodovias, aeroportos, portos, geração hidrelétrica, distribuição de energia, transmissão de energia, mineração, óleo e gás e outros segmentos. O atual governo do presidente Bolsonaro (2018-2022) vem tentando dar sequência a esse desmonte dos arranjos econômico-institucionais, conduzindo através do ministro da economia Paulo Guedes uma agenda de privatizações, um dos principais legados da agenda neoliberal deixado pelo seu antecessor, Michel Temer.
As justificativas mobilizadas para realizar as privatizações são: a necessidade do ajuste fiscal, ganhos de eficiência na gestão, enfrentamento da influência da política e da corrupção no controle das empresas estatais, dentre outras. Diante do contexto histórico da evolução do capitalismo, Karl Marx apresenta um arcabouço teórico sobre o modo de produção capitalista e como esse se desenvolve com o tempo. Permitindo-nos o entendimento sobre o tratamento teórico do fenômeno das crises no modo de produção capitalista, na ótica da relação de trabalho e toda sua organização social, que é sua face mais destrutiva. “Com a valorização do mundo das coisas aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens” (MARX, 2004, p.80).
IV Teoria marxista: os fundamentos da crise estrutural do capitalismo
Karl Marx (1818-1883) desenvolveu seu método de análise no materialismo histórico e dialético para analisar o modo de produção capitalista embasada na crítica sistêmica (o capitalismo enquanto sistema totalitário) e da luta de classes. Para Marx, a história se desenvolveu a partir da luta entre dominantes e dominados, que é a força motriz da mudança. O confronto entre comerciantes burgueses e a aristocracia feudal deu origem a um novo modelo socioeconômico: o capitalismo.
A luta de classes do capitalismo se dá entre duas classes sociais, Marx acreditava que a burguesia tem os meios para produzir riqueza, enquanto a classe trabalhadora é composta por inúmeros grupos de trabalhadores que não possuem meios próprios de subsistência, e por isso, vendem seus força de trabalho. Nesse modelo econômico, ocorre um rompimento no ciclo de identificação entre produtor e produto, denominado por Marx como alienação (REZENDE, 2022).
IV. 1 Acumulação e movimento do capital
A produção de bens de consumo é inerente à manutenção da vida em sociedade, de forma que este processo circular e acumulativo, pois interrompendo-se algumas das etapas da produção de bens, o Modo de Produção Capitalista (MCP) entra em crise. Desta forma, torna-se vital para existência deste sistema, a garantia de todas as etapas que se configura neste processo, para tal, exige-se que todas as condições de segurança do sistema MCP sejam assegurados (NETTO; BRAZ, 2006).
Sem acumulação de capital, o próprio modo de produção capitalista não pode existir. Desta forma, tem-se que o capital busca se valorizar, ou seja, o capitalista busca o lucro e mais do que isso, busca a maximização desse lucro. Desta forma, uma condição para o aumento de capital é o acréscimo do volume de mais valia, se tornando a mais valia a fonte para a reprodução ampliada na acumulação do capital. No que tange ao conceituo de mais-valia vislumbrado por Marx, tem-se a diferença presente no valor final de um produto acrescido pela mão de obra que é despendida em sua fabricação. Ou seja, a diferença entre o valor produzido pelo trabalhador e a remuneração que ele recebe (MARX, 2001).
Desta forma, fica claro que a acumulação de capital depende da exploração da força de trabalho. Para além da acumulação do capital, existe os movimentos percorrido pelo capital chamado de rotação do capital. Basicamente esse movimento consiste quando o capital monetário (dinheiro) é somado pelo capitalista aos meios de produção e força de trabalho (mais-valia) para a produção de mercadorias (capital produtivo) que é transformada novamente no processo de circulação, em capital monetário, só que dessa vez, acrescido do excedente de produção (mais-valia) (NETTO; BRAZ, 2006). Neste entendimento, Netto e Braz (2006, p. 129) afirmam:
Esses três momentos (dois na circulação, um na produção) do movimento do capital, tomados como processos periódicos, constituem a rotação do capital. A continuidade da produção capitalista, a sua reprodução, depende, naturalmente, da porção D’ que estará na base do novo processo produtivo: quanto maior essa porção considerada a proporção c e v, mais ampliada será a reprodução, mais alargada será a acumulação. Mas é igualmente claro que a continuidade da produção (e, por tanto, a reprodução ampliada e a acumulação) depende(m) do fluxo permanente daqueles três momentos: qualquer interrupção perturba profundamente a dinâmica do capital, qualquer suspensão temporária do movimento do capital abre a via às crises.
Com isso, a estratégia dos detentores do capital se concentra em resolver uma superacumulação de capital que se especializou em apropriar-se de uma mais valia que se quer produziu. Para isso, o caminho é a expansão da massa de mais-valia produzida, de forma que esta consiga, de alguma forma, se adequar ao montante de títulos de apropriação superproduzidos no período, que é aumentar a taxa de mais-valia, ou seja, aumentar a taxa de exploração do trabalho, de todas as formas possíveis (CARCANHOLO, 2011, p.81).
IV.2 Tendência à queda da taxa de lucro
É evidente que no modo de produção capitalista, a produção de mais valia leva a acumulação, que se justifica pela busca e obtenção do lucro. É em função do lucro que age o capitalista (NETTO; BRAZ, 2006).
O aumento da concorrência e outros fatores, como a redução dos preços das mercadorias, tempo e custo de produção; associado ao aumento da produção e a velocidade com que as mercadorias circulam, o processo de produção sofre mudanças estruturais. Estas alterações se relacionam com as várias manifestações do capital na economia capitalista, cuja principal característica é o aprimoramento da tecnologia no processo produtivo. Por outro lado, o aumento do capital constante no processo produtivo
provoca a continuidade da queda da taxa de lucro. No que parecia ser a salvação para o lucro, essencialmente provoca sua própria crise, pois ao mesmo tempo observamos um aumento do capital fixo no processo de produção, observamos também uma redução cada vez maior do capital variável que existe neste ciclo de produção da mercadoria (SILVA, 2015). Quanto à tendência à queda da taxa de lucro, Netto e Braz (2006, p. 153) esclarece:
Em suma: na medida em que cada capitalista procura maximizar seus lucros, a taxa de lucro tende a cair. A concorrência obriga cada capitalista a tomar uma decisão (a de incorporar inovações que reduzam o tempo de trabalho necessário a produção da sua mercadoria) que lhe é individualmente vantajosa, mas que, ao cabo de algum tempo limitada pelos outros, tem como resultado uma queda da taxa de lucro para todos os capitalistas.
Evidentemente Marx denomina a Lei Tendencial da Queda da Taxa do Lucro como expressão da redução do trabalho vivo na produção capitalista. Segundo Silva (2015, p. 20). “Essa taxa decrescente de lucro apresenta-se de maneira diferente em diversos países, pois, apesar de ser uma lei universal, ela está atrelada ao estágio do desenvolvimento da produção capitalista local”.
Marx demonstra claramente o caráter cíclico das crises capitalistas inerente o processo de acumulação de capital. Nesse sentido, a atual crise que o capitalismo contemporâneo atravessa só pode ser consequência do desdobramento dialético das contradições que se desenvolveram nas suas fases históricas. Na fase atual do capitalismo contemporâneo, desencadeou-se a atual crise estrutural no processo de acumulação de capital, resultado de sua própria saída da sua última crise estrutural. (CARCANHOLO, 2011, p.73)
IV.3 A crise estrutural do capitalismo e suas contradições
Historicamente, o modo de produção capitalista é marcado por sucessões de crises econômicas. Segundo Netto e Braz (2006, p. 157) “em pouco mais de um século, como se constata, a dinâmica capitalista revelou-se profundamente instável, com períodos de expansão e crescimento da produção sendo bruscamente coartadas por depressões, caracterizadas por falências, quebradeiras e, no que toca aos trabalhadores, desemprego e miséria”
Para Silva (2015, p.22). “Um grande atributo da economia capitalista é o seu contínuo conflito, que, por um lado, é posto pela dependência na produção do excedente, e, por outro, pelos limites existentes na produção deste excesso. Com isso, a produção capitalista cria seu próprio fim”. As crises capitalistas são resultado da própria dinâmica contraditória do modo de produção capitalista. Marx entendia que as crises desempenhavam papel importante na compreensão do capitalismo. Quanto a isso, Antunes (2005, p.23) esclarece:
[…] é possível encontrar em Marx uma teoria coerente sobre as crises do capital, uma teoria dialética que parta da análise das possibilidades mais formais e abstratas da crise até sua conversão em realidade. Este processo só pode ser demonstrado junto com a demonstração do processo global de desenvolvimento do capital. O conceito de crise do capital é indissociável do conceito de capital […].
A última crise estrutural do capitalismo remonta ao final da década de 1960. Que sendo ela, como qualquer outra crise no capitalismo, consistiu na superprodução (superacumulação) de capital que fizeram as margens de lucro caírem, e consequentemente redução da taxa de lucro, que nada mais é do que a consequência de o valor-capital ter sido produzido em excesso (CARCANHOLO, 2011, p.73).
A lógica de crescimento do capital fictício não significa apenas função do capital total, pois de acordo com sua própria estrutura, não está diretamente envolvido no processo de produção de valor. Portanto, seu Crescimento significa uma expansão do direito de posse em um valor, que ainda não foram produzidos nas mesmas proporções. Quando a multidão crescente de capital é especializada na mera apropriação de valor, valor este que não é produzido na mesma medida, ocorre a disfuncionalidade do capital fictício que é prevalente no modo de produção capitalista. A dialética desse capital fictício, em termos de sua função e disfunção do capital total, permiti-nos de alguma forma entender capitalismo contemporâneo (CARCANHOLO, 2011, p.73).
As crises evidenciam as contradições inerentes ao modo de produção capitalista ao mostrar que esse modo de produção é constituído e motivado por contradições e só se desenvolve à medida que essas contradições se reproduzem e se expandem (NETTO; BRAZ, 2006). Quanto a contradição fundamental do modo de produção capitalista, Netto e Braz (2006, p. 165) ainda afirma:
Eis a contradição fundamental do MCP: a produção torna-se socializada; mais: essa socialização é progressivamente aprofundada, envolvendo o conjunto das atividades econômicas em escala mundial; a apropriação, porém, permanece privada: o conjunto dos produtores diretos (os trabalhadores) cria um enorme excedente que é apropriado pelos donos dos meios de produção (os capitalistas).
Fica evidente assim, que por mais socializada que passou a ser a produção, o fato principal, que é a apropriação do excedente, permaneceu intocado.
IV.4 As narrativas das crises capitalistas na ótica neoliberal e marxista
A natureza das crises econômicas é reflexo de um modelo econômico já saturado, visto que, sua acumulação encontrou barreiras para manter a proporção de lucro. Isto quer dizer, que o próprio MCP irá buscar meios de se manter e romper com essas barreiras. Diante da crise estrutural, os ideólogos buscam no ideário neoliberal a resposta às crises do sistema, visto a irrefutável contradição entre o Capital acumulado no passado e a manutenção da lucratividade no presente.
A lógica da crise estrutural do capitalismo deixa evidente que, para que o modo de produção capitalista continue a garantir o lucro para o capital, torna-se indispensável encontrar mecanismos que se contrapunham à tendência crescente da queda da taxa de lucro. Quanto à continuidade do capitalismo, por meio de medidas de cunho neoliberais, Gois (2017, p. 7) afirma:
O neoliberalismo, como nova estratégia hegemônica, implica necessariamente em redução de políticas sociais, aumento da desigualdade social, novas formas de flexibilização do trabalho, entre outras medidas que permitem a superexploração do trabalho como um todo. Não podemos deixar de mencionar que a conjuntura de implementação das medidas neoliberais está inserida no contexto da “reestruturação produtiva do capital”, onde se passa a descobrir ambiente efetivo para ideias difundidas a partir da crise mundial dos anos 1970. As desregulamentações das políticas sociais e das relações de trabalho tornam-se a “questão do dia” para serem efetivadas com muito mais rigor.
Outra coisa é o argumento neoliberal para justificar o desaparelhamento do Estado, ou seja, o dogma do estado-mínimo. Nesse contexto, defende-se a ineficiência do Estado em administrar suas empresas e que estas, somente atrapalha o bom andamento das leis do mercado, que melhor seria gerido pela “mão invisível (LEITE, 2021). Saad Filho (2015) considera que a ideologia neoliberal é consideravelmente fragmentada para oferecer uma representação coerente da sociedade. Assim, acaba fornecendo um discurso populista que se baseia em noções pouco definidas de liberdade individual, concorrência e democracia, o qual busca justificar um conjunto de políticas estatais fragilmente articuladas, mas que possam favorecer de forma sistêmica o capital em geral e, particularmente, as finanças. Pontua ainda que a estrutura do neoliberalismo é limitada por cinco contradições explicadas por distintas vertentes da literatura marxista, a saber:
1) a reestruturação neoliberal da produção introduz políticas que se apoiam mutuamente e que desmantelam cumulativamente os sistemas de produção estabelecidos anteriormente; 2) O controle financeiro sobre os recursos econômicos e as principais fontes de capital permite às finanças drenar capitais da produção; ao mesmo tempo, o neoliberalismo favorece sistematicamente os grandes capitais em detrimento dos pequenos capitais e dos trabalhadores; 3) As políticas neoliberais são, de forma enganosa, justificadas ideologicamente pelos imperativos da confiança dos mercados e da competitividade; 4) As políticas neoliberais não se autocorrigem. Em vez de levar a uma mudança de rumo, a impossibilidade de implementação ou a incapacidade de alcançar os objetivos declarados normalmente leva ao aprofundamento e alargamento das reformas, com a desculpa de garantir a implementação e a promessa de sucesso iminente desta vez; 5) Neoliberalismo é incompatível com a democracia econômica e ele esvazia a democracia política (SAAD Filho, 2015, p. 67-8).
Com base em todo o exposto, compreende-se que, diante da contribuição crítica da teoria marxista, as contradições e crises permanentes do capitalismo levam à necessidade cada vez maior de encontrar meios de valorização do capital (real e fictício), sendo o processo de privatização de empresas estatais um dos meios encontrados pelo próprio capital. Partindo do reconhecimento que a privatização consiste no processo de concessão ou venda de empresas estatais.
A argumentação central gira em torno da contradição entre o capital acumulado e a manutenção de lucros, o que leva à adoção de medidas neoliberais como resposta a crises estruturais do sistema. O texto se fundamenta na crítica marxista e no ideário neoliberal para explorar as razões pelas quais o adota estratégias como a privatização e a desregulamentação para sob
Um ponto positivo do texto é a destaque às ideias de Saad Filho, que explora as cinco contradições do neoliberalismo, incluindo a reestruturação produtiva, o favorecimento ao grande capital, a justificativa ideológica das políticas neoliberais e a incompatibilidade com a democracia econômica. Essas contradições são apresentadas de forma clara, o que contribui para uma melhor compreensão das consequências e limitações das políticas neoliberais.
No entanto, seria interessante explorar mais detalhadamente o impacto dessas contradições sobre as camadas sociais mais vulneráveis e como elas se manifestam na prática. Embora o texto mencione o aumento da desigualdade social e a superexploração do trabalho, poderia aprofundar as consequências dessas políticas em termos de precarização do trabalho, redução de direitos sociais e ampliação da concentração de riqueza.
Outro aspecto que merece atenção é a justificativa neoliberal para o desmonte do Estado, por meio do argumento do “estado mínimo”. Esta crítica aqui é pertinente, mas faltam exemplos práticos que mostram como essa ideologia foi aplicada em diferentes contextos, especialmente em países em desenvolvimento, e as consequências concretas disso na gestão de serviços públicos essenciais, como saúde e educação.
Por fim, a conclusão sobre o processo de privatização de empresas estatais como um dos mecanismos de valorização do capital é consistente com a linha argumentativa do texto. No entanto, seria interessante incluir uma análise mais aprofundada sobre os impactos no longo prazo das privatizações e o papel do Estado na mediação das desigualdades geradas por essas medidas, especialmente no contexto brasileiro. Assim, o texto ampliaria sua crítica ao neoliberalismo e aos mecanismos que este utiliza para perpetuar a lógica de acumulação do capital em detrimento do bem-estar social.
V Algumas Considerações
o objetivo de analisar criticamente as limitações e consequências do liberalismo econômico contemporâneo, com ênfase nas desigualdades sociais, precarização do trabalho e concentração de renda. Através de uma análise pautada na teoria keynesiana e na crítica marxista, o estudo destacou a importância de um equilíbrio entre a liberdade econômica e a intervenção estatal como forma de evitar as crises cíclicas.
Os principais resultados da pesquisa indicam que, apesar do liberalismo econômico clássico ter influenciado profundamente o desenvolvimento do capitalismo, suas falhas ficaram evidentes, especialmente na crise de 1929. Keynes, ao defender a intervenção estatal, propôs uma solução que não eliminava o capitalismo, mas buscava resgatá-lo de suas crises mais graves. O estudo também mostrou como, no contexto contemporâneo, o neoliberalismo emerge como uma resposta às crises capitalistas, buscando reestruturar o sistema por meio da flexibilização do trabalho, privatização de serviços e desregulamentação do mercado. No entanto, as políticas neoliberais, apesar de prometerem eficiência e crescimento, resultam frequentemente em maiores desigualdades sociais e precarização do trabalho, conforme evidenciado por Saad Filho (2015) e outros autores desenvolvidos.
Portanto, a pesquisa conclui que, embora o neoliberalismo tenha oferecido uma resposta às crises do sistema capitalista, sua implementação acentuada contradições sociais e econômicas. Ao esvaziar o papel do Estado, principalmente no que se refere às políticas sociais, o neoliberalismo tende a favorecer o grande capital em detrimento das classes trabalhadoras e da democracia econômica. A crítica marxista evidencia que, sem uma intervenção adequada do Estado, a tendência à concentração de riqueza e à queda da taxa de lucro no capitalismo é reforçada, exacerbando as desigualdades e tornando o sistema insustentável a longo prazo.
A pesquisa sugere que a adoção de medidas neoliberais, como a privatização de empresas estatais, deve ser avaliada com cautela, pois, embora sejam vistas como formas de valorização do capital, podem gerar consequências adversas em termos de equidade social e desenvolvimento sustentável. Assim, um modelo de desenvolvimento mais equilibrado, como o defendido por Keynes, que alia crescimento econômico e justiça social, continua sendo uma alternativa válida para o enfrentamento das crises contemporâneas.
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