DISLIPIDEMIA NA INFÂNCIA: UMA REVISÃO SOBRE A ANÁLISE DE SUA PREVALÊNCIA NO BRASIL

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.10373879


Profº Dra. Nilviane Pires¹
Maria Cristina Costa Lopes²


RESUMO

No Brasil, são praticamente escassos, os dados populacionais de alterações de lipídeos plasmáticos, informação essa considerada crucial para a promoção de políticas públicas de saúde, que visem prevenir e reduzir fatores de risco cardiovasculares. Desta forma, este estudo pretende responder esta indagação, através de uma pesquisa bibliográfica, tendo como principal objetivo analisar a prevalência dos casos de dislipidemia em pacientes pediátricos no Brasil, com o propósito de identificar a quantidade de casos, destacando aspectos importantes relacionados a prevenção e tratamento. Foi realizada, uma revisão integrativa da literatura nas bases de dados BVS, Scielo e PubMed. Essa revisão pode mostrar em seus resultados, que as meninas correspondem ao gênero que apresentou as maiores prevalências de sobrepeso/obesidade em pacientes pediátricos no Brasil (n=06/66,6%), sendo elas escolares (n=08/66,6%), na idade de 01 a 17 anos (n=08/88,8%), residentes da zona urbana (n=02/22,2%), principalmente na Região Nordeste (Rio Grande do Norte, Bahia, Recife, Ceará) – (n=04/44,4%), seguido do Suldeste (Espírito santo, São Paulo) (n=02/22,2%), Norte (Amazonas) – (n=01/11,1%) e Sul (Rio Grande do Sul) – (n=01/11,1%). Portanto, foi evidenciado por meio desse estudo, a necessidade de educação em saúde no ambiente familiar e escolar, resultando em ações de educação alimentar e nutricional, bem como programas e políticas de promoção da saúde, voltados para este público, a fim de prevenir tais alterações, uma vez que podem permanecer até a vida adulta.

Palavras-chave: Doenças cardiovasculares. Nordeste. Hipercolesterolemia.

1 INTRODUÇÃO

Para o bom funcionamento do corpo é necessária a ingestão diária de alimentos considerados saudáveis, com alto teor de vitaminas e minerais, incluindo verduras, frutas e legumes. Em contrapartida, o consumo desenfreado por alimentos industrializados hipercalóricos, especialmente por crianças e adolescentes, tem sido uma ação potencialmente prejudicial, estando diretamente relacionado ao desenvolvimento de Doenças Crônicas Não-Transmissíveis (DCNT). 1, 2

Várias pesquisas tem demonstrado que a alteração do perfil lipídico no público infantil, não somente no Brasil mais em todo o mundo, vem tornando-se uma realidade alarmante. Segundo especialistas, a preocupação em torno desse assunto gira em torno das decorrências do excesso de peso, que consequentemente está associado à maiores probabilidades de doenças coronarianas, sendo a dislipidemia um dos principais fatores de risco. 3

Na pediatria, a dislipidemia tem gerado grandes preocupações. Esse distúrbio metabólico é caracterizado por alterações no perfil lipídico (elevação do colesterol total (CT), LDL-colesterol (LDL-c), triglicerídeos (TG) ou redução do HDL-colesterol (HDLc), tendo como principal consequência o aumento do risco cardiovascular. Ao longo dos anos, as causas de dislipidemia têm sofrido alterações, a etiologia genética que antes era mais prevalente em crianças, por exemplo, atualmente vem sendo substituída pela etiologia secundária, principalmente a associada à obesidade. 4

A prevalência da dislipidemia na infância em diferentes graus, tem sofrido alterações no mundo todo (cerca de 38,5%). No Brasil, essa preponderância está em torno de 28% e 40% entre as crianças e adolescentes, com algumas diferenciações em sua incidência (critério adotado de CT sérico superior a 170 mg/dL). No geral, pesquisas epidemiológicas têm mostrado, que essas variações estão relacionadas as etnias, miscigenação e aspectos genotípicos/fenotípicos de um país de extensão continental. 5, 6

Sabe-se que, metade das crianças com dislipidemia, se tornarão adultos dislipidêmicos, fenômeno esse conhecido como tracking, onde os níveis elevados de colesterol acabam persistindo na idade adulta, aumentando os riscos de agravos coronarianos, entre eles a aterosclerose, doença vascular inflamatória crônica que determina a ocorrência das doenças cardiovasculares, por isso que na última década, cresceu a importância de se estudar esse assunto. 5, 7

No Brasil, são praticamente escassos, os dados populacionais de alterações de lipídeos plasmáticos, informação essa considerada crucial para a promoção de políticas públicas de saúde, que visem prevenir e reduzir fatores de risco cardiovasculares.7 Portanto, a realização desse estudo justifica-se por dois principais motivos (1) diante das inadequadas modificações nos hábitos alimentares infantis, que tem gerado uma alta prevalência de hipercolesterolemia em crianças e adolescentes em vários países, inclusive o Brasil; e (2) a carência de estudos sobre esse tema no Nordeste brasileiro. 

Desse modo, configura-se então, o problema da pesquisa: qual o estado brasileiro com a maior prevalência de dislipidemia em pacientes na faixa etária pediátrica nos últimos dez anos? 

Desta forma, este estudo pretende responder esta indagação, através de uma pesquisa bibliográfica, tendo como principal objetivo analisar a prevalência dos casos de dislipidemia em pacientes pediátricos no Brasil, com o propósito de identificar a quantidade de casos, destacando aspectos importantes relacionados a prevenção e tratamento.

2 METODOLOGIA 

Foi realizada uma revisão integrativa da literatura sobre a temática da prevalência de dislipidemia em crianças no Estado do Maranhão. A pesquisa foi realizada nas bases de dados BVS, Scielo e PubMed. Essa escolha foi feita com cuidado para que se pudesse ser a mais ampla e diversificada.

Para a busca, foram utilizados os descritores em português e inglês: Dislipidemias, Dyslipidemias AND Crianças, Children AND Adolescentes, Teenagers AND Prevalência, Prevalence, AND Brasil. Essa procura nas bases de dados foi realizada durante os meses de setembro a novembro de 2023, com um limite de recorte temporal de dez anos (2013 a 2023) (Tabela 01).

A aplicação dos critérios de inclusão e exclusão é o que irá assegurar que os dados considerados relevantes para a construção dessa pesquisa de revisão, sejam extraídos em sua totalidade. Para atender aos critérios de inclusão, os artigos deveriam estar disponíveis gratuitamente na íntegra em suporte eletrônico, publicados em periódicos nacionais em português ou inglês, entre os anos de 2008 a 2023, apresentando relação com a temática desenvolvida. 

Os critérios de exclusão foram: dissertações, teses e seus capítulos, livros e seus capítulos, anais de congressos ou conferências, relatórios técnicos e científicos, resumos expandidos ou artigos duplicados, que não contemplassem a temática solicitada, publicados no período anterior a 2008. 

A definição da pergunta norteadora determinou o caminho a ser seguido e a meta a ser alcançada. Por este motivo, esta revisão foi organizada seguindo os seguintes passos: delimitação do problema de pesquisa e a questão norteadora; escolha de bases de busca; pesquisa na literatura e aplicação de critérios de inclusão e exclusão; análise criteriosa dos estudos incluídos, discussão dos resultados e a apresentação da revisão. 

A análise dos dados foi realizada de forma rigorosa para que os artigos selecionados fossem compatíveis com a temática. Na presente revisão, aplicando-se os critérios de inclusão e exclusão, foram encontrados um total de 76 artigos. Posteriormente, foram excluídos os estudos realizados fora do Brasil, assim, alcançou-se o total de 20 artigos. A próxima etapa foi de leitura dos resumos, buscando verificar se o conteúdo do trabalho se enquadrava com o tema. Após a leitura dos resumos e fase de leitura completa restaram 09 artigos.

03 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão (Figura 1), 09 (100%) artigos foram eleitos para esta revisão. Desse total, 1 (11,1%) artigo foi encontrado no Pubmed e 08 (88,8%) na BVS. Portanto, no Quadro 01 foram distribuídas as principais informações extraídas desses materiais, são elas: título, autores, ano, base de dados, local onde a pesquisa foi realizada, objetivos, metodologia utilizada e os principais achados. 

Oito artigos (88,8%) são de cunho transversal, enquanto 01 artigo (11,1%) corresponde a um estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (ERICA), publicados em sua maioria no ano de 2019 (n=03/ 33,3%), realizados principalmente na Região Nordeste (Rio Grande do Norte, Bahia, Recife, Ceará) – (n=04/44,4%), seguido do Suldeste (Espírito santo, São Paulo) (n=02/22,2%), Norte (Amazonas) – (n=01/11,1%) e Sul (Rio Grande do Sul) – (n=01/11,1%).

De acordo com especialistas, tanto a obesidade quanto a dislipidemia dependem diretamente da predisposição genética e dos hábitos de vida, incluindo dieta, gastos calóricos com exercícios físicos, entre outros. É observado mundialmente um aumento significativo na incidência de obesidade em praticamente todos os países, inclusive no Brasil.12

Sendo esse o principal motivo da realização desse estudo, essa revisão pode mostrar em seus resultados, que as meninas correspondem ao gênero que apresentou as maiores prevalências de sobrepeso/obesidade em pacientes pediátricos no Brasil (n=06/66,6%), sendo elas escolares (n=08/66,6%), na idade de 01 a 17 anos (n=08/88,8%), residentes da zona urbana (n=02/22,2%) (Tabela 01). 

Higiano8, Quadros9, Reuter11, Oliosa12, Gomes13, Kaestner14 foram os pesquisadores que em suas análises, constataram que as mulheres apresentaram uma maior predominância no sobrepeso/obesidade, do que os homens, sendo esses achados consistentes com os padrões nacionais em relação ao sexo.

O sexo feminino apresenta uma maior concentração de gordura corporal distribuída no espaço subcutâneo, enquanto os meninos possuem mais gordura na região visceral, justificando assim, as maiores proporções para risco de obesidade/sobrepeso.16

No pertencente as altas prevalências de dislipidemia em escolares, Reuter11 e Kaestner14 alegam que esse fato, está cada vez mais comum em crianças e adolescentes de diferentes regiões do país. 

Sobre isso, Xavier18 e Falkner19 enfatizam que nesta fase da vida, estas condições são constantemente assintomáticas, chegando a passar facilmente despercebido até mesmo pelos profissionais de saúde profissionais; portanto, é essencial que cuidados preventivos e curativos sejam implementados aos adolescentes (promoção de hábitos alimentares saudáveis e práticas regulares de atividades físicas), com o intuito de prevenir doenças não transmissíveis (DNTs).

Nessa mesma conjuntura, Bezerra10 enfatiza a importância de implementações como essas dentro do ambiente escolar., pois de acordo com a literatura, essa seria uma alternativa significativa para o declínio da prevalência de excesso de peso, resistência à insulina e até hipercolesterolemia observada em escolares.

Ambientes saudáveis nas escolas podem influenciar positivamente as menores prevalência de excesso de peso em estudantes. Assim, um ambiente físico favorável com alimentação saudável e também práticas regulares de exercícios físicos, devem ser considerados para permitir o enfrentamento de doenças crónicas não transmissíveis (DCNT) mais eficaz. 10

É interessante ressaltar os achados de Maia7, segundo o pesquisador, muitas crianças da zona rural têm sido comumente afetadas pela dislipidemia, por estarem apresentando o mesmo estilo de vida de crianças da zona urbana, ou seja, maus hábitos alimentares (alto consumo de alimentos industrializados) associados ao sedentarismo, afinal de contas, as mais variadas formas de entretenimentos eletrônicos, fazem com que as crianças se exercitem menos, causando redução dos níveis do HDL-c. Essa situação lastimável, configura-se como um grave problema de saúde coletiva, que poderá resultar em graves repercussões futuras para a vida adulta dessas crianças.

Outro dado relevante foi descrito por Gomes13. O autor ressalta que crianças com peso inadequado ao nascerem, apresentam consideráveis probabilidades de expressarem dislipidemia, obesidade, diabetes tipo 2 e hipertensão, influenciando assim, os casos de morbimortalidade infantil. 

Estudos mostram que as crianças que nascem com baixo peso frequentemente evoluem com aumento de TG e do LDL-c, sendo que adultos nascidos a termo e com baixo peso tendem a ganhar um maior percentual de massa gorda do que aqueles nascidos com peso adequado. 19, 20, 21, 22

No referente as maiores prevalência de dislipidemia na infância ocorrer na região Nordeste, Gomes13 declara que uma grande parcela de óbitos nacionais por doenças cardiovasculares, ocorrem em regiões de baixa e média renda. Assim, no seu estudo, o autor mostra que os aumentos significativos de dislipidemias nas regiões norte e nordeste do país, estão associados ao fato dessas regiões supostamente apresentarem os maiores índices de pobreza no Brasil, sugerindo que as diferenças regionais nas dislipidemias ocorrem através do processo de transição epidemiológica, estando as regiões em diferentes estágios.

A população do Nordeste apresenta preocupantes indicadores de habitação, educação, ocupação, saneamento básico, renda e acesso aos serviços públicos de saúde, sendo esses fatores determinantes de desfechos cardiovasculares explicando assim, pelo menos em parte, as altas prevalências de dislipidemia, pressão arterial e até hiperglicemia nesse estado.13

Higiano8 observou em sua pesquisa, que com base nos critérios para crianças e adolescentes, recomendados pela Sociedade Brasileira de Cardiologia, o Brasil apresenta uma alta prevalência de dislipidemias. Esse aumento também pode ser observado em variadas regiões do mundo, como o Japão por exemplo, que apresentou em 10 anos, uma média do IMC por idade, aumentada em 0,32Kg/m2. nos meninos e 0,24Kg/m2 nas meninas.

Para Alcântara23 o Índice de massa corporal (IMC) é constituído como uma importante variável, afinal de contas, a obesidade tem sido evidenciada como um significante fator de risco para a dislipidemia e os problemas cardiometabólicos. Nesse caso, o autor sugere que adolescentes obesos apresentam elevados valores de TG, Colesterol Total (CT), LDL-c, valores reduzidos de HDL-c e uma maior resistência à insulina.

Os resultados distribuídos na Tabela 03 demostram o perfil clínico do público infanto-juvenil que compuseram esta pesquisa. analisando-o é possível compreender que 55,5% (n=05) da população estudada apresentava Hipercolesterolemia Familiar (HF), doença hereditária autossômica dominante, que afeta o metabolismo das lipoproteínas, especialmente por defeito do gene LDLR que codifica o receptor de LDL. 24

O seu diagnóstico é estabelecido por critérios clínicos-laboratoriais devendo sempre ser hipótese diagnóstica em pacientes que apresentem níveis de colesterol da lipoproteína de baixa densidade (LDLc) <190mg/dL; ou ainda pode ser confirmado por testes genéticos que determinam a mutação. 25,26

Os dados de Oliosa12 indicam que quanto maior for o excesso de gordura na infância, maiores serão as probabilidades dessa criança ter o colesterol acima do valor de referência (170 mg/dL). Segundo Reuter11, os fatores que colaboram para os altos índices de dislipidemia são: sobrepeso/obesidade e comportamento sedentário. Entretanto, existem outros fatores que contribuem diretamente para a ocorrência de alterações nas concentrações de lipídios no sangue.

As dislipidemias, em conjunto com a diabetes e o excesso de peso, são consideradas fatores de risco primários para o desenvolvimento de doenças caronarianas. Outros fatores secundários, também podem ser levados em consideração, como: gênero, idade e a falta de atividade física. Infelizmente muitas crianças e adolescentes apresentam pelo menos um fator de risco biológico para o desenvolvimento dessas patologias. 27, 28, 29

Fatores de risco cardiovascular na infância como a dislipidemia podem contribuir para a doença aterosclerótica na infância e adolescência, bem como na idade adulta. 13 O Não-HDLc apresenta uma maior sensibilidade do que o LDLc na previsão de riscos cardiovasculares na infância, sendo ele também um melhor preditor desses tipos de doenças em adultos, e isso decorre do fato que as frações de lipoproteínas LDLc e HDLc possuem efeitos opostos na deposição de colesterol no espaço subintimal das artérias, geração assim, placas ateroscleróticas. 30,31

De acordo com Quadros9 e Oliosa12 fatores biológicos, demográficos, comportamentais e socioeconômicos, estiveram associados aos fatores de risco cardiovascular presentes em seu estudo. Contudo, somente os indicadores antropométricos de obesidade foram simultaneamente associados elevada taxa de dislipidemia, hiperglicemia e pressão arterial. Desse modo, os seus resultados sugerem que a obesidade é um significante fator de risco para doenças cardiovasculares na população pediátrica. 

04 CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Os resultados do presente estudo indicaram que a idade e o sexo foram fatores preponderantes na associação com a dislipidemia. Pontuou também uma alta prevalência de crianças e adolescentes que apresentam dois ou mais indicadores para o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares. 

Portanto, foi evidenciado por meio desse estudo, a necessidade de educação em saúde no ambiente familiar e escolar, resultando em ações de educação alimentar e nutricional, bem como programas e políticas de promoção da saúde, voltados para este público, a fim de prevenir tais alterações, uma vez que podem permanecer até a vida adulta.