DIALOGANDO SOBRE O ENSINO DE CIÊNCIAS POR INVESTIGAÇÃO

DIALOGUE ABOUT TEACHING SCIENCE THROUGH RESEARCH

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10864610


Cinara Rodrigues de Almeida1
Rita de Cássia Frenedozo2


RESUMO

O presente artigo objetiva promover uma reflexão sobre as relações entre o ensino de ciências por investigação e conhecimento escolar, olhando para o modo pelo qual essas relações influenciam os processos educativos e o cotidiano da escola, promovendo uma aprendizagem significativa. Este artigo apresenta considerações teóricas sobre o ensino por investigação a partir de uma revisão bibliográfica. Aborda aspectos relacionados às etapas do ensino por investigação, bem como suas características abordando a reconstrução histórica e as tendências atuais no processo de investigação. Após o estudo realizado em diálogo com diferentes autores na área pode-se ter uma visão mais ampla sobre a importância e a influência que o ensino por investigação exerce para uma aprendizagem significativa, principalmente no que diz respeito à construção do conhecimento escolar e a importância de inserir metodologias inovadoras e ativas na prática docente.

Palavras-chave: ensino de ciências por investigação; aprendizagem significativa; metodologias inovadoras.

ABSTRACT

This article aims to promote reflection on the relationships between research-based science teaching and school knowledge, looking at the way in which these relationships influence educational processes and daily school life, promoting meaningful learning. This article presents theoretical considerations about research-based teaching based on a literature review. It addresses aspects related to the stages of teaching through investigation, as well as its characteristics and contemplating historical reconstruction and current trends in the research process. After the study is carried out in dialogue with different authors in the area, it is possible to have a broader view of the importance and influence that teaching through investigation has on meaningful learning, especially with regard to the construction of school knowledge and the importance of inserting innovative and active methodologies in teaching practice.

Keywords: research-based science teaching; meaningful learning; innovative methodologies.

1. INTRODUÇÃO

Este artigo objetiva dialogar sobre o ensino de Ciência por investigação, apresentando inicialmente considerações teóricas a partir de uma revisão bibliográfica. Aborda aspectos relacionados às etapas do ensino por investigação, bem como suas características e ainda aborda a reconstrução histórica e as tendências atuais no processo de investigação.

Quando se fala de ensino de Ciências por investigação, está se falando de abordagens de ensino e aprendizagem diferentes das que têm sido mais frequentemente utilizadas nas escolas e se mostram como tendências educacionais. Mas, o que é ensinar por investigação? E por que ensinar por investigação? 

Segundo Carvalho (2004), a atividade de caráter investigativo é uma abordagem, entre outras, que o professor utiliza para diversificar sua prática na sala de aula. Esta abordagem engloba atividades, que, centradas no aluno, possibilitam o desenvolvimento da autonomia e da capacidade de tomar decisões, de avaliar e de resolver problemas, apropriando-se de conceitos e teorias das Ciências da natureza.

Pode-se considerar a investigação como uma atividade que depende da habilidade não só de construir questões sobre o mundo natural, mas também de buscar respostas para essas questões. Eles são inseridos em processos investigativos, envolvem-se na própria aprendizagem, constroem questões, elaboram hipóteses, analisam evidências, tiram conclusões, comunicam resultados.

Nessa perspectiva, a aprendizagem de procedimentos ultrapassa a mera execução de certo tipo de tarefas, tornando-se uma oportunidade para desenvolver novas compreensões, significados e conhecimentos do conteúdo ensinado (Maués e Lima, 2006).

Assim, atividades de caráter investigativo implica, inicialmente, a proposição de situações problemas, que, então, orientam e acompanham todo o processo de investigação. Nesse contexto o professor desempenha o papel de guia e de orientador das atividades – é ele quem propõe e discute questões, contribui para o planejamento da investigação dos alunos, orienta o levantamento de evidências e explicações teóricas, possibilita a discussão e a argumentação entre os estudantes, introduz conceitos e promove a sistematização do conhecimento. Consequentemente, o professor oportuniza, de forma significativa, a vivência de experiências pelos estudantes, permitindo-lhes, assim, a construção de novos conhecimentos acerca do que está sendo investigado.

1.1 Características de atividades de caráter investigativo

Segundo Carvalho (2004), uma atividade investigativa não pode se reduzir a uma mera observação ou manipulação de dados – ela deve levar ao aluno a refletir, a discutir, a explicar e a relatar seu trabalho aos colegas.

A seguir, a autora apresenta algumas características consideradas importantes nas atividades de caráter investigativo. Tais atividades segundo a autora devem, portanto:

1. conter um problema. O problema é, na sua essência, uma pergunta que se faz sobre a natureza. Não há investigação sem problema. Assim, a primeira preocupação do professor consiste em formular um problema que instigue e oriente o trabalho a ser desenvolvido com os alunos. Além disso, ele precisa ser   considerado problema pelos alunos, o que implica explorar as ideias que estes têm a respeito do assunto, dialogar com elas, confrontá-las com outras, duvidar delas.

2. ser, sempre que possível, generativas, ou seja, devem desencadear debates, discussões, outras atividades experimentais ou não.

3. propiciar o desenvolvimento de argumentos, por meio de coordenação de enunciados teóricos e evidências, bem como considerar a multiplicidade de pontos de vista em disputa ou a serem coordenados.

4. motivar e mobilizar os estudantes, promover o engajamento destes com o tema em investigação. Desafios práticos e resultados inesperados podem auxiliar nessa direção.

5. propiciar a extensão dos resultados encontrados a todos os estudantes da turma. 

A autora afirma que em uma abordagem de ensino baseada na investigação, essas características não precisam aparecer, simultaneamente, em uma única atividade. Desta forma, o ensino de ciências por investigação tem o intuito de conceber, planejar e implementar propostas que agregam práticas da cultura científica e da cultura escolar, sob as mais diversas formas e para diferentes conteúdos (SASSERON, 2015).

Na visão de Carvalho (2018), o ensino por investigação é um ensino de conteúdos programáticos, no qual o educador precisa criar condições nas salas de aula para que seus alunos falem, argumentem, leiam e escrevam sobre esse conteúdo. 

Baptista (2018) descreve que esta metodologia usa processos de investigação científica e conhecimentos científicos, auxiliando e ensinando os educandos a fazer ciência e sobre a ciência. 

Na figura abaixo, proposta por Scarpa; Campos(2018), é descrita as etapas do ensino por investigação.

Figura 1: Etapas do ensino por investigação

Características do ensino por investigação | Download Scientific Diagram

Fonte: Scarpa; Campos (2018)

1.2 O ensino de ciências por investigação: reconstrução Histórica

A abordagem investigativa no ensino de ciências vem sendo muito estudada nas últimas décadas, sendo tratada como algo novo e inovador. No entanto, Baptista (2018) ressalta que essa metodologia começou a afirmar-se desde o século XIX, quando o ensino de Ciências passou a integrar o currículo escolar de vários países. 

Nos Estados Unidos essa metodologia está descrita, atualmente, nos Parâmetros Nacionais de Ensino de Ciências, no National Science Teachers Association e em Projetos como o American Association for the Advancement of Science. Nesse país, ela é chamada de Inquiry e recebeu grande influência do filósofo e pedagogo John Dewey. Segundo Zômpero e Laburú (2011), essa metodologia surgiu nos Estados Unidos como uma crítica à metodologia tradicional defendida por Herbart, filósofo do século XIX.

Segundo os autores, Dewey acreditava ser fundamental proporcionar aos educandos oportunidades de desenvolverem trabalho laboral, pois como cidadãos eles deveriam ter uma postura questionadora, observando o seu meio social e desenvolvendo uma participação ativa dentro da sociedade. 

De acordo com Zômpero e Laburú (2011), Dewey defendia que:

No universo há um conjunto infinito de elementos que se relacionam da maneira mais diversa possível. Tudo existe em função dessas relações. Isso evidentemente ocorre também com as pessoas. Quando a criança chega à escola, ela já vivenciou muitas experiências, por isso, esse agir e reagir amplia-se, e as experiências se reconstroem por meio das reflexões. Na vida cotidiana as experiências são realizadas constantemente. Para o filósofo, experiência e aprendizagem não podem ser separadas (ZÔMPERO e LABURÚ, 2011, p.69).

Nesse sentido, a experiência, quando realizada de forma a se ter uma reflexão, traz consigo uma aprendizagem natural do conhecimento, dando significado a esse conhecimento e à vida. Ao longo do século XX desenvolveu-se a ideia de que o ensino de Ciências envolvesse o componente laboral. Durante a década de 50, a comunidade científica propôs uma solução para os currículos de ciências, os líderes da época acreditavam que a ciência deveria ser ensinada de acordo com o modo como os cientistas a praticavam, preparando os futuros cientistas (BAPTISTA, 2018). Dessa forma ocorria a valorização da ciência pura e das investigações, incentivando o estudante a alcançar por si só o conhecimento. 

Segundo o National Research Council (NRC, 2000), na década de 60 o educador Schwab sugeriu que os professores deveriam apresentar a ciência como investigação e que os educandos deveriam usar a investigação para aprender os conteúdos da ciência. 

2 MATERIAIS E MÉTODOS

Percebe-se que nas pesquisas qualitativas a preocupação está centrada em levantar os elementos que possam contribuir para a compreensão e explicação daquilo que está sendo investigado, neste sentido, “as subjetividades do pesquisador são parte do processo de pesquisa” (FLICK, 2009, p. 22).

Optou-se por fazer uma revisão bibliográfica buscando autores que dialogam sobre o ensino por investigação tão relevante nos dias atuais.

2.1 O ensino por investigação na BNCC

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) de 2017 descreve as competências como a mobilização de conhecimentos, conceitos e procedimentos, habilidades (práticas cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana. Dentre as competências descritas na BNCC, destaca-se a segunda por designar que a educação básica deve:

Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas (BRASIL, 2017, p.9).

Diferentes estudos referentes às tendências educacionais para o ensino de ciências indicam a importância de inserir metodologias inovadoras e ativas na prática docente, como a metodologia do ensino por investigação, que traz a problematização, permitindo aos educandos a resolução de problemas de forma ativa e promovendo a aprendizagem de conceitos, procedimentos e atitudes referentes à ciência (AZEVEDO, 2004; CARVALHO, 2004; BORGES,2010).

3. DISCUSSÃO

A metodologia do ensino de ciências por investigação passou por grandes reformulações durante o século passado até atualmente. As ideias educacionais originais de Dewey foram retomadas além de novas tendências propostas serem desenvolvidas por pesquisadores da área.

Nos dias atuais, o ensino por investigação não tem mais o intuito de formar cientistas, ele apresenta outras finalidades. De acordo com Zômpero e Laburú (2011, p.73), as tendências mostram que essa metodologia tem por objetivo o “desenvolvimento de habilidades cognitivas nos educandos, a realização de procedimentos como elaboração de hipóteses, anotação e análise de dados e o desenvolvimento da capacidade de argumentação”. 

O ensino de ciências por investigação tem o intuito de conceber, planejar e implementar propostas que agregam práticas da cultura científica e da cultura escolar, sob as mais diversas formas e para diferentes conteúdos (SASSERON, 2015).

Na visão de Carvalho (2018), o ensino por investigação é um ensino de conteúdos programáticos, no qual o educador precisa criar condições nas salas de aula para que seus alunos falem, argumentem, leiam e escrevam sobre esse conteúdo. 

Baptista (2018) descreve que esta metodologia usa processos de investigação científica e conhecimentos científicos, auxiliando e ensinando os educandos a fazer ciência e sobre a ciência. 

De acordo com as normas descritas no National Research Council:

A investigação é uma atividade multifacetada que envolve fazer observações; fazendo perguntas; examinar livros e outras fontes de informação para ver o que já é conhecido; planejar investigações; revisar o que já é conhecido à luz de evidências experimentais; usando ferramentas para coletar, analisar e interpretar dados; propor respostas, explicações e previsões; e comunicar os resultados. A investigação requer identificação de suposições, uso de pensamento crítico e lógico e consideração de explicações alternativas (NRC, 2000, p.14).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com Sá (2009), não há uma definição operacional para o ensino de ciências por investigação, pois os pesquisadores dessa abordagem reconhecem a existência de uma multiplicidade de sentidos associados a essa metodologia. Portanto, o ensino de ciências por investigação vem com o compromisso de envolver os educandos nas atividades, fazendo-as, ao invés de receberem instruções ou apenas lerem sobre a ciência.

Concluindo, o ensino investigativo contribui nas aulas de ciências para o desenvolvimento social dos educandos. De acordo com o National Science Foundation Inquiry (2005), o ensino por investigação contribui tanto para o desenvolvimento intelectual, mas também para o desenvolvimento social do aluno. Pois a investigação na escola é realizada em um contexto social, no qual os alunos discutem suas ideias uns com os outros, trabalham em colaboração para responder à pergunta e expõem suas ideias para os demais colegas.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, M. C. P. S. Ensino por investigação: problematizando as atividades em sala de aula. In: CARVALHO, A. M. P. (Org.). Ensino de ciências: unindo a pesquisa e a prática. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004. p. 19-33.

BATISTA, R. F. M. O uso de abordagens histórica-investigativa na reelaboração de roteiros da Experimentoteca do CDCC-USP. São Carlos, 2018. Tese (Doutorado em Ciências) – Instituto de Física de São Carlos, Universidade de São Paulo. São Carlos, 2018.

BORGES, R. C. P. Formação de formadores para o ensino de ciências baseado em investigação. 2010. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Educação. Área de Concentração: Ensino de Ciências e Matemática) – Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Educação é a Base. Brasília, MEC/CONSED/UNDIME, 2017. 

CARVALHO, A. M. P., et al. Ensino de Ciências: unindo a pesquisa e a prática. São Paulo: Editora Thompson, 2004.

CARVALHO, A. M. P. O ensino de ciências e a proposição de sequências de ensino investigativas. In: ______ (Org.). Ensino de ciências por investigação: condições para implementação em sala de aula. São Paulo: Cengage Learning, 2013. p. 1-20.

LIMA, M. E. C. C. Aprender Ciências: um mundo de materiais: livro do aluno. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999.

National Research Council Inquiry and the National Science Standards: A guide for teaching and learning. New York, National Academy Press. 2000

National Science Foundation Inquiry. Thoughts, Views, and Strategies for the K-5 Classroom, FOUNDATIONS vol 2.2005

SÁ, E. F.; PAULA, H. F.; LIMA, M. E. C. C.; AGUIAR, O. G. As características das atividades investigativas segundo tutores e coordenadores de um curso de especialização em ensino de Ciências. VI ENPEC, 2007.

SASSERON, L. H. Alfabetização Científica no Ensino Fundamental : Estrutura e Indicadores deste processo em sala de aula. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Educação. Área de Concentração : Ensino de Ciências e Matemática) – Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. São Paulo : s.n., 2008.

SASSERON, L. H.. Interações discursivas e investigação em sala de aula: o papel do professor In: Ensino de Ciências por investigação: condições para implementação em sala de aula. São Paulo: Cengage Learning, 2013. p. 40 – 61

SCARPA, D. L., & CAMPOS, N. F. (2018). Potencialidades do ensino de Biologia por InvestigaçãoEstudos Avançados32(94), 25-41. https://doi.org/10.1590/s0103-40142018.3294.0003

ZÔMPERO, A. F; LABURÚ, C. E. Atividades investigativas no ensino de Ciências: aspectos históricos e diferentes abordagens, Belo Horizonte, v. 13, n. 03, p. 67 – 80, 2011.


1Doutoranda do Programa em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Cruzeiro do Sul. Professora de Biologia da rede Estadual de Minas Gerais. E-mail: cinaraalmeidajf @gmail.com
2Doutora em Geociências e Meio Ambiente pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Professora e Pesquisadora do Programa em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Cruzeiro do Sul. E-mail: ritafrenedozo@yahoo.com.br