DIABULIMIA: MANIFESTAÇÃO DE UM TRANSTORNO ALIMENTAR EM ADOLESCENTES COM DIABETES MELLITUS, UMA REVISÃO DA LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102501241241


Leandro Picanço De Carvalho
Ademilson Garrido Martinez Junior
Antenor Matos De Carvalho Junior
Rodrigo Ruan Costa De Matos
Lane Souza Da Silva
Nilcilene Sampaio Lima
Jocileia Da Silva Bezerra
Lucas Da Silva Alho Mota
Silvia Katrine Silva Esche
Maria Elizete Diniz Dos Santos
Giselle Diniz Dos Santos


RESUMO: A prática de reduzir calorias omitindo a insulina é denominada como diabulimia. Essa prática é conhecida por comprometer o controle metabólico, resultando em subsequentes resultados prejudiciais à saúde. Teve-se como objetivo geral realizar uma revisão sistêmica sobre o tema “diabulimia” com o objetivo de entender efeito da diabulimia no sistema endócrino de adolescentes. Tratou-se de uma revisão da literatura, com a abordagem qualitativa, com materiais disponibilizados nos portais acadêmicos Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS). A coleta dos dados ocorreu no decorrer do segundo semestre ano letivo de 2022, salienta-se que se optou por não se limitar o período de publicação em razão da pequena quantidade de estudos encontrados. Identificou-se que os distúrbios alimentares são comuns em jovens com diabetes, onde a manipulação da insulina é frequentemente usada para controlar o peso corporal. A deterioração do controle metabólico em adolescentes com diabetes tipo 1 tem sido intimamente ligada ao surgimento de distúrbios alimentares. Diabulímicos correm o risco de complicações microvasculares, incluindo insuficiência renal e neuropatia periférica das extremidades; bem como complicações macrovasculares, como ataque cardíaco e acidente vascular cerebral. Para tanto, os estudos demonstraram que comportamentos diabulímicos levam a um aumento de três vezes no risco de morte em comparação com indivíduos não diabéticos. Embora esse distúrbio seja relativamente bem conhecido pelos endocrinologistas que tratam muitos pacientes com diabetes tipo 1, muitas vezes não é reconhecido pelos profissionais de saúde primários ou pelos membros da família do indivíduo. Se a diabulimia for detectada precocemente, intervenções podem ser implementadas para minimizar o risco de morbidade e mortalidade precoces.

Palavras-chave: Diabulimia, Transtornos alimentares, Diabetes, Adolescentes.

1 INTRODUÇÃO

          De acordo com Mendes (2021) a diabulimia é um distúrbio alimentar que afeta pessoas que usam insulina, uma pessoa com diabulimia deliberadamente limita ou evita tomar insulina e se envolve em uma alimentação desordenada para que possa perder peso ou evitar ganhá-lo. Diabetes é uma condição caracterizada pelo armazenamento inadequado e uso de glicose devido a quantidades insuficientes de insulina e bulimia é um distúrbio alimentar onde o paciente come excessivamente e depois induz o vômito para trazer a comida. A diabulimia também conhecida como ED-DMT1 (Eating Disorder-Diabetes Mellitus Type 1) é um dos transtornos alimentares mais perigosos e se refere à prática insalubre de parar ou reduzir a insulina para manipular ou perder peso.

Nip et al. (2019), consideram que mesmo que a diabulimia possa ser fatal e as taxas de prevalência de diabetes sejam altas, há uma falta de pesquisa sobre como apoiar efetivamente as pessoas com a doença. Este estudo poderá fornecer informações necessárias aos profissionais de saúde e orientar o foco para pesquisas futuras. Desse modo, a referida pesquisa tem como contribuição destacar que a diabulimia pode ser lembrada pelos médicos, assim como os problemas comuns observados no diabetes, e os pacientes adolescentes em particular devem ser avaliados em termos de transtornos alimentares e o potencial uso indevido de informações relacionadas à perda de peso e uso de insulina dada durante a educação em diabetes.

Portanto, a contribuição social do estudo poderá fomentar o trabalho médico com adolescentes, especialmente pacientes adolescentes do sexo feminino que apresentam níveis elevados de HbA1C, história de cetoacidose ou hospitalizações frequentes por causa de irregularidades no tratamento, e aqueles que perdem peso ou não conseguem ganhar peso, independentemente da quantidade que comem, devem ser cuidadosamente avaliados e monitorados em termos de diabulimia e distúrbios alimentares.

Em se tratando da presente pesquisa, o estudo foi projetado para responder à seguinte questão: Quais são os efeitos da diabulimia no sistema endócrino? Tem-se como objetivo geral realizar uma revisão sistêmica sobre o tema “diabulimia” com o objetivo de entender efeito da diabulimia no sistema endócrino de adolescentes. Quanto aos objetivos específicos, buscou-se destacar a incidência e causa da diabulimia; discorrer sobre as consequências da diabulimia; apontar as consequências endócrinas da diabulimia.

Tratou-se de uma revisão da literatura, com a abordagem qualitativa, com materiais disponibilizados nos portais acadêmicos Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS). Fez-se uso de uma ficha de coleta de dados de revisão bibliográfica, a qual ocorreu no decorrer do segundo semestre ano letivo de 2022, salienta-se que se optou por não se limitar o período de publicação em razão da pequena quantidade de estudos encontrados.

Ademais, o artigo se encontra dividido em tópicos, primeiramente é apresentada a introdução da pesquisa, responsável por destacar a questão problema, objetivos da pesquisa, relevância e processos metodológicos. O segundo tópico trata do desenvolvimento teórico, para subsidiar os apontamentos relacionados a diabulimia, bem como seu efeito no sistema endócrino. O terceiro tópico traz em seu corpo as considerações finais, na qual se apresentam os apontamentos correspondentes aos objetivos e questão problema, bem como é apresentada qual a contribuição do trabalho para a sociedade e para a ciência.

2 CONTEXTUALIZAÇÃO DA DIABULIMIA

O termo que combina as palavras diabetes e bulimia entrou em uso por volta do início e meados dos anos 2000. Mas a questão em si tem sido observada por profissionais de diabetes há décadas, na verdade, o estimado especialista em comportamento em diabetes Dr. William Polonsky escreveu um dos artigos mais importantes sobre o tema em 1994, o artigo “Insulin omission in women with IDDM”, o qual teve como objetivo descrever a extensão da omissão intencional de insulina em uma população ambulatorial de mulheres com diabetes mellitus insulino-dependente (IDDM) e examinar sua relação com transtornos alimentares, atitudes em relação ao diabetes, outros fatores psicossociais, complicações a longo prazo e controle glicêmico (COLEMAN; CASWELL, 2020).

De acordo com Chelvanayagam e James (2018) atualmente, a diabulimia não é reconhecida como um diagnóstico formal, porém nos últimos anos ganhou destaque na imprensa e foi reconhecida nas comunidades médica e psiquiátrica. Por exemplo, em 2017, houve um documentário da BBC sobre a condição, intitulado “Diabulimia: The World’s Most Dangerous Eating Disorder”. Além disso, em 2019, pesquisadores do Kings College London receberam 1,25 milhão para investigar a Diabulimia nos próximos 5 anos.

Dluzniak-Golaska et al. (2019) comentam que a diabulimia, que é referida como “o distúrbio alimentar mais perigoso do mundo” por Torjesen, é conhecida como um distúrbio alimentar específico para indivíduos com diabetes. É classificado como o grupo de “abuso de drogas para garantir transtorno alimentar indefinido/perda de peso” na quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5).

A diabulimia é caracterizada pela limitação ou omissão do uso de insulina por pacientes com DM tipo 1, principalmente na adolescência, com o objetivo de controle de peso. Essa condição é acompanhada por episódios de compulsão alimentar e transtorno dimórfico corporal. Sintomas como sede excessiva, polidipsia, polaciúria e fraqueza são observadas no período inicial, achados irreversíveis como neuropatia, retinopatia, nefropatia e osteoporose, que ocorrem em diabéticos mal controlados, são observados em longo prazo. Os níveis de glicose no sangue aumentam com a limitação ou omissão do uso de insulina e a perda de calorias ocorre rapidamente com glicosúria (STAITE; ZAREMBA; MACDONALD, et al. 2018).

Em 2017, as diretrizes para o tratamento de transtornos alimentares do Instituto Nacional de Excelência em Saúde e Cuidados (NICE) incluíram pela primeira vez uma seção sobre diabetes. Embora o termo diabulimia não tenha sido reconhecido, foram incluídas orientações sobre a melhor forma de tratar aqueles que restringem a insulina. A inclusão dessas novas diretrizes demonstra que aqueles com DM1 e um transtorno alimentar, especificamente a omissão de insulina, representam um problema único (STAITE; ZAREMBA; MACDONALD et al., 2018).

Staite et al. (2018) destacam que na diabulimia, ocorre principalmente em mulheres com idades entre 15 e 30 anos, comportamentos não saudáveis, como pular refeições, vômitos autoinduzidos, exercícios excessivos e uso de laxantes/diuréticos são experimentados para alcançar o controle de peso. Além disso, pode haver uma tendência a diminuir ou pular as doses de insulina para evitar o ganho/perda de peso, há um aumento da prevalência de transtornos alimentares em adolescentes com diabetes tipo 1, que é estimado em 7,0%. O comportamento de adolescentes com diabulimia, como diminuir ou pular totalmente as doses de insulina, traz complicações do diabetes e muitos outros problemas de saúde.

Segundo Chelvanayagam e James (2018) o mau controle glicêmico pode causar altos níveis de HbA1c, comer menos alimentos do que deveria ser consumido pode causar hipoglicemia e crises de compulsão alimentar pós-jejum e cetonas causadas pelo uso de ácidos graxos como fonte alternativa de energia como resultado de administração incorreta do tratamento com insulina pode causar ataques de cetoacidose diabética. Complicações como retinopatia, neuropatia e nefropatia podem ocorrer devido à diabulimia, que não são prontamente percebidas e podem permanecer sem tratamento por muito tempo. Portanto, é importante em termos de prognóstico que adolescentes com diabetes tipo 1 façam exames de triagem em intervalos regulares, detecção precoce do risco de diabulimia e diagnóstico precoce com consulta psiquiátrica.

2.1 Incidência e causa da diabulimia

Em seu estudo com 163 adolescentes diabéticos tipo 1 com idades entre 11 e 20 anos Kinik et al. (2017) identificaram que 34% dos participantes apresentavam risco de transtorno alimentar, em outro estudo, 21,2% de 2.156 diabéticos tipo 1 com idade média de 17,7 anos foram considerados em risco (MARKOWITZ, 2010). Segundo Cherubini (2018), existe uma prevalência aumentada de transtornos alimentares em adolescentes com diabetes tipo 1, que é estimada em 7,0%.

Chelvanayagam e James (2018) salientam que na literatura existe um consenso de que os transtornos alimentares são mais prevalentes em pessoas com diabetes mellitus tipo 1 (DM1), principalmente no sexo feminino. Os distúrbios alimentares afetam cerca de 20% das mulheres com diabetes e são duas vezes mais prováveis ​​de ocorrer em adolescentes com DM1 do que naquelas sem. Mais comumente, os transtornos alimentares em pessoas com diabetes assumem a forma de comportamentos alimentares perturbados (CAP), como restrição alimentar, compulsão alimentar e vômitos, uso de laxantes e exercícios excessivos, que podem ocorrer com ou sem a presença de uso indevido de insulina.

Além disso, Candler et al. (2018) consideram que existem aspectos do controle do diabetes que podem aumentar o risco de transtornos alimentares, como um maior índice de massa corporal (IMC), preocupações com a forma e peso, dificuldades em lidar com uma condição de longo prazo, e o efeito do diabetes na autoimagem e na interação familiar. Por causa do tratamento com insulina, os adolescentes com DM1 geralmente veem seu peso aumentar substancialmente entre a adolescência e o início da idade adulta. Isso pode exacerbar a insatisfação corporal e levar ao desenvolvimento de CAP. Além disso, as pessoas com DM1 podem se sentir sobrecarregadas pelo foco constante em nutrição e medicação. O surgimento do CAP pode ser uma tentativa de recuperar o controle sobre sua alimentação e peso, levando ao desenvolvimento de um transtorno alimentar.

Segundo o descrito por Coleman (2020) os transtornos alimentares estão relacionados com a dificuldade na regulação das emoções e com a imagem corporal. A maioria dos indivíduos com transtornos alimentares tem preocupações excessivas relacionadas ao peso corporal e à forma corporal, e surge uma imagem corporal perturbada (sobre o excesso de peso apesar do peso corporal normal ou reduzido). Esses pacientes atribuem muita importância ao peso corporal e à forma do corpo e temem ganhar peso. Muitos fatores, incluindo sexo feminino, relação familiar e de amigos, fatores culturais, fatores ambientais, incluindo mídia, e propriedades cognitivas e físicas afetam as características comportamentais envolvidas na ocorrência de transtornos alimentares.

Com isso, salienta-se que os transtornos alimentares em geral são difíceis de diagnosticar porque geralmente são condições secretas. Muitas pessoas com transtorno alimentar não procuram tratamento por conta própria, isso pode ser especialmente verdadeiro para pessoas que têm diabetes tipo 1 e diabulimia, pois as pessoas com diabetes geralmente temem ser criticadas por profissionais de saúde e/ou suas famílias por administrarem mal sua condição e por causa disso, muitas pessoas com diabulimia não são diagnosticadas (STAITE; ZAREMBA; MACDONALD et al., 2018).

Em geral, os profissionais de saúde e familiares podem suspeitar que alguém tenha diabulimia se tiver um A1c de 9,0 ou superior e tiver vários episódios de cetoacidose relacionados ao diabetes ou episódios próximos sem qualquer outra causa explicável, como um local de bomba de insulina com defeito ou acidentalmente usando insulina vencida ou estragada. No entanto, uma vez que pode ser difícil dizer a causa exata dos níveis persistentes de açúcar no sangue, na maioria dos casos, uma pessoa precisa admitir que está retendo insulina para que seu provedor e familiares saibam que tem diabulimia (FRITZEN, 2020).

Em casos graves de diabulimia, Timerman (2021) mencionam que o tratamento exigirá hospitalização para que os profissionais de saúde possam monitorar as dosagens de insulina da pessoa para ter certeza de que não estão restringindo a insulina. Se a pessoa tiver outros comportamentos de transtorno alimentar, como purgação, os profissionais de saúde também podem monitorá-los, esses profissionais solicitarão certos exames, como exames de sangue e urina, para verificar possíveis complicações do diabetes a curto e longo prazo que podem ser causadas por diabulimia e níveis persistentemente elevados de açúcar no sangue.

Ademais, Ribeiro et al. (2021) consideram que a diabulimia e todos os transtornos alimentares são condições complexas. Por esta razão, não há uma única causa de diabulimia, há muitas razões pelas quais a diabulimia pode se desenvolver, e pode ser uma combinação de problemas de saúde físicos, sociais e mentais. Diante da relevância da temática, a presente pesquisa objetiva investigar os fatores que podem contribuir para uma pessoa com diabetes tipo 1 desenvolver diabulimia.

2.2 Consequências da diabulimia

Ribeiro et al. (2021) salientam que o controle inadequado da glicemia pode resultar em crescimento e desenvolvimento lentos em alguns adolescentes. Em um estudo de longo prazo, adolescentes com diabetes tipo 1 que abusaram da insulina para prevenir o ganho de peso tiveram sérias consequências médicas na idade adulta. Alguns sofriam de problemas oculares que variavam da versão embaçada à necessidade de cirurgia a laser e cegueira, insuficiência renal que, para alguns, exigiu diálise, ou úlceras nos pés necessitando de amputação.

De acordo com o estudo de Nip et al. (2019), a sensação dolorosa de danos nos nervos causados ​​por glicose sanguínea descontrolada coincidiu com o pico de perda de peso. A remissão da dor ocorreu quando o peso foi recuperado. A evidência publicada de complicações do diabetes tipo 1 com comportamento alimentar desordenado é impressionante. A taxa de mortalidade por diabetes tipo 1 foi três vezes maior entre aqueles que apresentavam distúrbios alimentares em comparação com aqueles que não apresentavam.

No entanto, a deficiência de insulina leva à ocorrência de um quadro de cetoacidose, permitindo que os ácidos graxos livres do organismo sejam transferidos para o plasma, o descumprimento da lista de dietas e a insatisfação com o peso corporal levam à limitação ou omissão do uso de insulina. Embora a insulina seja essencial para uma pessoa com diabetes, alguém com diabulimia pode ver a ingestão de insulina de forma negativa, eles podem tentar diminuir seus níveis de glicose de outras maneiras, como por meio de exercícios ou purgação. Assim, a diabulimia é causada quando um indivíduo com diabetes reduz ou interrompe completamente a ingestão de insulina de que necessita apenas como forma de perder peso, visto que um efeito colateral comum de tomar insulina é o ganho de peso, assim, alguém com diabulimia pode pensar que deve evitar tomar insulina para não ficar “gordo” (SILVA, 2020).

Dito isso, Timerman (2021) salienta que com esse tipo de pensamento pode fazer com que alguém restrinja drasticamente sua dieta ou evite completamente tomar insulina, contudo, esta forma de redução de peso é extremamente perigosa para a saúde porque faz com que os níveis de açúcar no sangue aumentem, causando uma carga extra para os rins, fazendo-os trabalhar mais em um esforço para remover o excesso de glicose do corpo através da micção. Tomar doses menores do que o necessário de insulina ou nenhuma insulina pode levar a graves consequências para a saúde, como cetoacidose relacionada ao diabetes (CAD) e complicações do diabetes.

No entanto, Ribeiro et al. (2021) mencionam que a falta de insulina e níveis persistentemente elevados de açúcar no sangue (hiperglicemia) pode levar a problemas de saúde perigosos e até a morte, visto que a insulina é um hormônio essencial que o pâncreas produz e o corpo precisa para usar os alimentos que se ingere como energia. Ele faz isso retirando a glicose (uma forma de energia que é principalmente dos carboidratos) da corrente sanguínea e a movendo para as células de todo o corpo. As células usam a glicose como energia e armazenam qualquer excesso no fígado, músculos e tecido adiposo, assim, as células e o corpo precisam de energia para sobreviver.

Quando se tem diabetes tipo 1 e não tem insulina suficiente, o corpo começa a quebrar gordura e músculo para obter energia porque não consegue acessar a glicose. A glicose então permanece na corrente sanguínea, causando alto nível de açúcar no sangue, não importa o quanto se coma, o corpo e células estão essencialmente morrendo de fome porque não podem usar a energia dos alimentos que são ingeridas e isso leva a uma diminuição no peso corporal total. No entanto, este tipo de perda de peso é muito perigoso e tem graves consequências para a saúde (FRITZEN, 2020).

Nessa direção, destaca-se que se a falta de insulina for persistente, pode levar à desidratação grave, que também causa perda de peso na forma de perda de água. Esta é também uma forma perigosa de perda de peso, pois a falta de insulina e o açúcar elevado no sangue que ela causa podem levar a várias complicações a curto e longo prazo e podem até causar a morte, por esta razão, destaca-se que os transtornos alimentares estão relacionados com a dificuldade na regulação das emoções e com a imagem corporal. A maioria dos indivíduos com transtornos alimentares tem preocupações excessivas relacionadas ao peso corporal e à forma corporal, e surge uma imagem corporal perturbada (sobre o excesso de peso apesar do peso corporal normal ou reduzido) (STAITE; ZAREMBA; MACDONALD et al., 2018).

2.3 Consequências endócrinas da diabulimia

O estado de deficiência de insulina leva à perda de peso, pois o corpo é forçado a quebrar os ácidos graxos para manter o músculo normal e outras funções dos tecidos. Essa quebra de ácidos graxos leva ao acúmulo desregulado de cetonas (um subproduto ácido da quebra de ácidos graxos) na corrente sanguínea. Se mantidos por um período relativamente curto (mesmo que alguns dias), altos níveis de cetona podem levar a um estado altamente crítico conhecido como cetoacidose diabética, a qual pode ser letal (MISRA; OLIVER, 2015).

A omissão de insulina (OI) é um comportamento praticado por pessoas com DM1, o que se sugere que pode ser um método de perda de peso. Os sintomas de curto prazo da OI são os da hiperglicemia: glicemia excessivamente alta (>11%), aumento dos níveis de cetona, sede, micção frequente, fadiga e déficits cognitivos, como falta de concentração (RUTH-SAHD et al., 2009). Quanto mais longa e frequente a OI e quanto mais tempo persistir o estado hiperglicêmico, mais graves serão os sintomas: perda de peso, desidratação grave e aumento da hemoglobina glicosilada (HbA1c).

Ademais, a HbA1c se refere à concentração média de glicose no plasma durante um período de três meses e, portanto, é um bom indicador dos níveis de glicose no sangue nesse período. A OI persistente, portanto, leva a períodos prolongados de hiperglicemia e aumento da HbA1c, o que pode levar ao aumento do desenvolvimento de uma série de complicações vasculares e aumento do risco de mortalidade (GOEBEL-FABBRI et al., 2008).

As taxas de prevalência de OI variam amplamente dependendo da metodologia utilizada, mas estudos de Deiana et al. (2016), usando o Diabetes Eating Problem Survey-Revised (DEPS-R) um questionário considerado um dos métodos psicometricamente mais robustos atualmente disponíveis na avaliação da insulina manipulação, relataram prevalência de até 60,2% em uma amostra de indivíduos com DM1 com idade entre 13 e 55 anos.

As taxas de OI entre crianças e adolescentes com DM1 são atualmente pouco claras, talvez em parte porque os jovens costumam relutar em revelar problemas com suas equipes de diabetes No entanto, o uso de OI como controle de peso foi relatado em 2% das meninas pré-adolescentes e 11–15% em meninas adolescentes (CANDLER et al., 2018). Além disso, Kinik et al. (2017) identificaram caso de jovens com DM1, meninas em particular, onde sugeriram que OI persistente com o objetivo de perda de peso é um comportamento prevalente entre crianças e adolescentes, bem como adultos.

Vários fatores de risco de OI explorados por Kinik et al. (2017) também são vistos como tendo maior prevalência entre os jovens, sugerindo que crianças e jovens com DM1, juntamente com um ou mais desses fatores de risco, correm um risco significativo de se envolver em OI como um método de perda de peso.

2.3.1 Complicações associadas à OI prolongada

A omissão de insulina causa hiperglicemia, que pode levar a várias complicações vasculares associadas ao aumento da morbidade e mortalidade (GOEBEL-FABBRI et al., 2008). Compreender os fatores de risco associados ao desenvolvimento do comportamento é, portanto, crucial para reduzir a probabilidade de desenvolver as complicações abaixo.

2.3.2 Retinopatia

A hiperglicemia prolongada pode levar à formação de microaneurismas na retina, que podem causar visão ocluída e, eventualmente, levar à cegueira (DONAGHUE et al., 2018). Isso está associado a uma redução significativa na qualidade de vida e aumento da mortalidade. Nielsen (2002) descobriu que a retinopatia levou, em média, apenas 3,4 anos para se desenvolver em pacientes que praticaram OI, em comparação com 11,5 anos naqueles com DM1, mas sem OI.

2.3.3 Neuropatia

Em 1988 Ziegler et al. (1988), identificaram que a hiperglicemia persistente pode levar a danos nos nervos, o que reduz o fluxo vascular e pode resultar em amputação. Casos de neuropatia também são encontrados desproporcionalmente naqueles que omitem a insulina (DONAGHUE et al., 2018).

2.3.4 Nefropatia

Longos períodos de hiperglicemia podem resultar em danos estruturais aos rins, causando função reduzida e eventual insuficiência renal (DONAGHUE et al., 2018). A nefropatia diabética é geralmente aceita como a principal causa de mortalidade entre pacientes com DM1, com taxas de incidência ao longo da vida de aproximadamente 50% (MARSHALL, 2019). Isso é particularmente significativo, dadas evidências longitudinais recentes que ilustram uma taxa de mortalidade por nefropatia de 32,8% (ANG et al., 2014).

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio do levantamento bibliográfico foi possível salientar que embora possa não ser possível prevenir todos os casos de diabulimia, é útil iniciar o tratamento assim que alguém começar a ter sintomas. Além disso, ensinar e incentivar hábitos alimentares saudáveis ​​e atitudes realistas sobre alimentação e imagem corporal podem ajudar a prevenir o desenvolvimento ou agravamento de transtornos alimentares e diabulimia. Também é essencial apoiar o controle do diabetes de alguém e fornecer educação e apoio adequados sobre o diabetes.

O objetivo geral da pesquisa pôde ser alcançado, com isso, é possível afirmar que o comportamento de adolescentes com diabulimia, como diminuir ou pular totalmente as doses de insulina, traz consigo complicações do diabetes e muitos outros problemas de saúde. O mau controle glicêmico pode causar níveis elevados de HbA1c, comer menos alimentos do que deveria pode causar hipoglicemia e ataques de compulsão alimentar pós-jejum e cetonas causadas pelo uso de ácidos graxos como fonte alternativa de energia como resultado da administração incorreta do tratamento com insulina pode causar ataques de cetoacidose diabética.

Além disso, salienta-se que as complicações como retinopatia, neuropatia e nefropatia podem ocorrer devido à diabulimia, que não são prontamente percebidos e podem permanecer sem tratamento por muito tempo. Portanto, é importante em termos de prognóstico que adolescentes com diabetes tipo 1 façam exames de triagem em intervalos regulares, detecção precoce do risco de diabulimia e diagnóstico precoce com consulta psiquiátrica.

Para tanto, esta revisão destaca que a diabulimia, como outros distúrbios alimentares, piora com a o passar do tempo se não for tratada, quanto mais cedo o distúrbio for diagnosticado e tratado, melhor será o resultado. No entanto, as pessoas com diabulimia geralmente não revelam que estão retendo a insulina propositalmente e podem resistir ao tratamento ou se recusar a seguir o plano de tratamento. Dito isso, trata-se de um transtorno alimentar grave e potencialmente fatal se não for tratada, as pessoas com diabetes tendem a ter uma expectativa de vida um pouco mais curta do que as pessoas sem diabetes, mas as pessoas com diabulimia correm o risco de morrer muito mais cedo do que as pessoas com diabetes sozinhas.

A omissão de insulina é um comportamento extremamente complexo e, embora a lista de fatores apresentada neste artigo tenha sido selecionada com base em evidências de pesquisas que sugerem sua associação com o desenvolvimento do comportamento, ela não pretende ser exaustiva. Vários outros fatores foram identificados na literatura como fatores de risco para o desenvolvimento do comportamento.

A importância de expandir esse campo de pesquisa não pode ser subestimada, dadas as complicações perigosas associadas à hiperglicemia prolongada causada por OI, e as pesquisas indicam que é um comportamento que afeta não apenas adultos, mas também crianças e adolescentes. Pesquisas futuras podem considerar as relações comórbidas entre os fatores de risco apresentados neste artigo, para desenvolver uma compreensão mais clara de como e até que ponto cada um desses fatores aumenta o risco de envolvimento em OI entre crianças e adolescentes com DM1.

Além disso, mesmo seja uma condição comum e com risco de vida, faltam pesquisas sobre a Diabulimia, especificamente sobre a melhor forma de prevenir, detectar e tratar a condição. Diante do exposto, a quantidade de estudos relacionados à diabulimia principalmente em adolescentes com diabetes mellitus, ainda se encontra escassa, com isso se faz relevante que seja realizado um levantamento teórico dos estudos na área, a fim de instigar discussões sobre o assunto e fomentar a criação de estratégias para sistematizar o estudo da diabulimia como uma manifestação de transtorno alimentar em adolescentes com diabetes mellitus, isso forneceria aos profissionais de saúde uma maior compreensão da diabulimia e abriria o caminho para pesquisas futuras.

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