DIABETES MELLITUS TIPO 1 E 2 NA INFÂNCIA E SUA RELAÇÃO COM A FAMÍLIA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202410080737


Kauany Vitória Silva Bernardo1; Luciana Lima Pinheiro2; Maria Cecília Zabot3; Chimene Kuhn Nobre4


RESUMO

O Diabetes Mellitus tipo 1 é uma doença crônica caracterizada pela perda da capacidade do corpo de produzir insulina devido à destruição das células beta do pâncreas. Já a tipo 2 ocorre quando o corpo não aproveita adequadamente a insulina produzida, sendo suas principais causas estando relacionadas ao sobrepeso, sedentarismo, triglicerídeo elevado, hipertensão e hábitos alimentares inadequados. As primeiras descobertas sobre ela ocorreram em 1872 em um papiro e clinicamente em 1812. Com o passar dos anos, as pesquisas sobre a Diabetes Mellitus sofreram impulsos, o que desencadeou busca por tratamentos mais efetivos.  Esse estudo pretende avaliar os impactos da Diabetes Mellitus tipo 1 e 2 tanto na vida da criança como na vida dos pais, no âmbito emocional, econômico e religioso, bem como no convívio diário com familiares e com a sociedade. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, onde foram empregadas fontes secundárias de informação, tal como livros, artigos científicos e revistas médicas, como por exemplo, o Scientific Eletronic Library Online (Scielo) e o Public Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (PubMed). A pesquisa propôs identificar as evidências disponíveis, nessas literaturas, que abordam, na perspectiva de crianças e do adulto, os fatores relevantes para a elaboração de propostas de intervenções adequadas para a Diabetes Mellitus tipo 1 e tipo 2. O conhecimento da situação epidemiológica da Diabetes Mellitus tipo 1 e 2  ao longo dos anos fornece subsídios para o direcionamento de recursos em áreas de risco e às novas estratégias de prevenção e controle da doença em crianças, adolescentes e adultos.

Palavras-chave: Diabetes Mellitus; Criança; Epidemiologia; Família.

ABSTRACT

Type 1 Diabetes Mellitus is a chronic disease characterized by the loss of the body’s ability to produce insulin due to the destruction of beta cells in the pancreas. Type 2 occurs when the body does not use the insulin produced, and its main causes are related to excess weight, a sedentary lifestyle, high triglycerides, hypertension and inadequate eating habits. The first discoveries about it were made in 1872 in a papyrus and clinically in 1812. Over the years, research on Diabetes Mellitus has been boosted, which has triggered the search for more effective treatments. This study aims to evaluate the impacts of type 1 and 2 Diabetes Mellitus on both the child’s life and the parents’ lives, in the emotional, economic and religious spheres, as well as in daily life with family and society. This is a bibliographical research, which used secondary sources of information, such as books, scientific articles and medical journals, such as the Scientific Electronic Library Online (Scielo) and the Public Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (PubMed). The research aimed to identify the evidence available in these literatures that address, from the perspective of children and adults, the relevant factors for the elaboration of proposals for appropriate instructions for type 1 and type 2 Diabetes Mellitus. Knowledge of the epidemiological situation of type 1 and type 2 Diabetes Mellitus over the years provides support for directing resources to risk areas and for new strategies for preventing and controlling the disease in children, adolescents and adults.

Keywords: Diabetes Mellitus; Child; Epidemiology; Family.

1 INTRODUÇÃO

O diabetes mellitus (DM) é uma doença grave, crônica, com uma evolução lenta e progressiva. Ela decorre de uma alta concentração de glicemia no plasma, resultado de um distúrbio no metabolismo pancreático. Por ser uma doença crônica caracterizada pela regulação deficiente da glicose, está se tornando uma epidemia crescente em escala global (Menezes, 2017); (Rachdaoui, 2020).

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 425 milhões de pessoas ao redor do mundo vivem com diabetes, e, nos Estados Unidos, mais de 30 milhões de americanos são afetados pela doença. Entre 1980 e 2014, a prevalência de DM quase duplicou, passando de 4,7% para 8,5%, e estima-se que esse número aumente em mais 50% até 2045 (Rachdaoui, 2020).

A OMS relata que o DM foi a causa direta de 1,6 milhão de mortes, tornando-se a sétima principal causa de óbito em 2016. Pessoas com DM correm alto risco de desenvolver comorbidades crônicas e complicações secundárias, como neuropatia, retinopatia, nefropatia e doenças cardiovasculares, resultando em um impacto econômico substancial de US$ 327 bilhões, conforme estimado pela American Diabetes Association (Rachdaoui, 2020).

As células β das ilhotas pancreáticas são as principais responsáveis pela produção de insulina no organismo. Sua interação com as outras células endócrinas presentes nas ilhotas de Langerhans é fundamental para regular as respostas metabólicas em todo o corpo. O comprometimento ou a perda dessas células é uma característica marcante do diabetes mellitus, um grupo de condições como o Diabetes Tipo 1 (DM1), Diabetes Tipo 2 (DM2) e Diabetes MODY (Maturity Onset Diabetes of the Young). Embora suas causas sejam variadas, todas compartilham a característica comum da hiperglicemia (Cha, et al., 2023).

A classificação do tipo 2 (DM2), era considerada uma doença clássica para a população adulta, porém a cada dia vem se tornando uma condição mais comum em jovens e crianças, pois sua causa está intimamente ligada aos hábitos de vida. Dessa forma, a porcentagem de crianças, no Brasil, que desenvolvem a doença no período entre 5 e 9 anos de idade, é de 13,2%, sendo que 28,1% já estavam acima do peso, segundo dados do Ministério da Saúde (Fonseca; Fonseca, 2022).

O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é uma doença crônica importante caracterizada pela ausência de secreção endógena de insulina devido à destruição das células β do pâncreas (normalmente pela perda dessas células). Embora seja confirmado que o DM1 envolve processos autoimunes que atacam as células β e causam disfunção dessas células, a etiologia exata e os mecanismos subjacentes ainda não estão completamente compreendidos. O DM1 costuma surgir durante a infância ou adolescência, mas pode manifestar-se em qualquer faixa etária (Ilonen, et al., 2019).

Diante de todos esses dados, percebe-se a importância das atualizações sobre os respectivos temas, que segundo a Organização Mundial de Saúde, abordam a terceira maior causa de mortes no mundo (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2019), além de estar entre as principais causas de diminuição da expectativa de vida, o que se agrava com o acelerado envelhecimento populacional no Brasil.

Parte da incapacidade causada pela diabetes é atribuída às suas complicações microvasculares – nefropatia, retinopatia, neuropatia e amputações de membros inferiores – e macrovasculares – doença coronariana, acidente vascular cerebral e doença vascular periférica – presentes entre 30 e 50% das pessoas com essa enfermidade (Neves, et al., 2023).

Entre as complicações microvasculares, as mais prevalentes são a retinopatia, neuropatia e nefropatia, enquanto acidente vascular cerebral, doença coronária e doença vascular periférica são as com maior ocorrência entre as macrovasculares (Litwak, et al., 2013).

Através deste projeto, visa-se abordar as mais diversas influências que os aspectos diabéticos abrangem no cotidiano de crianças de até 10 anos de idade, e como estes aspectos corroboram numa relação familiar que varia entre relações incomuns e comuns, sempre relevando fatores como adaptação tanto da criança, quanto das famílias à vida que os DM 1 e 2 acarretam.

2 MATERIAL E MÉTODOS

Nessa pesquisa serão empregadas fontes de informações secundárias, tal como livros, artigos científicos e revistas médicas, como: Scientific Eletronic Library Online (Scielo), Public Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (PubMed) e Scientific Electronic Library Online (SciELO) correspondendo, dessa maneira, às características de uma pesquisa bibliográfica.

Os artigos e publicações científicas selecionados deverão situar-se de acordo com o tema proposto, podendo estar relacionado aos seguintes tópicos: Diabetes mellitus, diabetes na infância, os impactos do diagnóstico e as causas da Diabetes mellitus tipo 1 sendo esses autores secundários e o principal Diabetes mellitus tipo 1 na infância e sua relação com a família. Somado a isso, as palavras e frases também serão utilizadas na língua inglesa: “childhood diabetes”, “impacts of the diagnosis” e “causes of type 1 diabetes mellitus”, para obtenção de estudos publicados em revistas e/ou periódicos internacionais.

Será dada ênfase a artigos publicados entre os anos 2012 e 2024, não sendo negligenciados artigos com grande relevância publicados em anos anteriores. Não serão incluídos estudos incompletos, ou aqueles que não estejam dentro do perfil acima citado, uma vez que estes não contemplam as informações necessárias para abordagem da temática sugerida. Paralelo a isso, realizaremos uma leitura eliminatória dos documentos bibliográficos para selecionarmos, com base no tema proposto e combinações dos descritores, os artigos que irão compor o presente trabalho, como demonstrado na Figura 1.

Figura 1 – Fluxograma representando o processo da coleta de dados realizada para confecção do projeto

Fonte: Autoria própria.

3 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

O diagnóstico de diabetes é realizado por meio de diferentes testes, como glicemia de jejum, glicemia casual, teste oral de tolerância à glicose (TOTG) ou hemoglobina A1c (HbA1c). A hiperglicemia tende a se desenvolver progressivamente, e os distúrbios na glicemia de jejum e pós-prandial apresentam padrões temporais distintos (Harreiter; Roden, 2023).

Os valores limítrofes estabelecidos para esses parâmetros diagnósticos podem não ser totalmente consistentes na identificação de indivíduos com diabetes. Além disso, todos os testes estão sujeitos a variações, portanto, é fundamental realizar uma nova avaliação em caso de resultados ambíguos ou confirmar o resultado com outro teste, a menos que os sintomas clínicos clássicos estejam claramente presentes (Harreiter; Roden, 2023).

A glicose plasmática venosa pode ser medida de forma variável e os seguintes valores são utilizados para diagnóstico: um valor ocasional de glicose plasmática igual ou superior a 200 mg/dl (ou 11,1 mmol/l), glicose plasmática em jejum igual ou superior a 126 mg/dl (ou 7,0 mmol/l) após um período de jejum de 8 a 12 horas, e um valor de glicose plasmática 2 horas após a realização do teste oral de tolerância à glicose (OGTT) igual ou superior a 200 mg/dl (ou 11,1 mmol/l). O OGTT é bem explicado na Figura 2.

Figura 2 – Realização do teste de tolerância à glicose oral oGTT de 75 g, de acordo com as diretrizes da OMS

Fonte: Petersmann et al. (2019)

Como o diabetes mellitus representa um grande ônus socioeconômico para muitos países, os avanços científicos e tecnológicos têm um papel crucial na descoberta de novas opções de tratamento. Isso levou ao desenvolvimento de novas classes terapêuticas, como os análogos do peptídeo inibitório gástrico (GIP), os análogos da amiloide, os miméticos da incretina e os inibidores dos receptores ativados por proliferadores de peroxissomas (PPAR) e da dipeptidil peptidase-4 (DPP4) (Tiwari, 2015).

Dessa forma, a indução da regeneração das células β através da transdiferenciação ou do uso de células-tronco tem demonstrado melhorar diretamente a função e a morfologia dessas células. Recentemente, a terapia genética tem mostrado um grande potencial para o tratamento do diabetes, com muitos estudos clínicos evidenciando sua segurança e eficácia em doenças complexas. Terapias genéticas, tanto virais quanto não virais, têm apresentado resultados promissores. Por exemplo, a terapia genética utilizando vetores virais adeno-associados (AAV) tem mostrado potencial para melhorar o controle glicêmico a longo prazo e para prevenir complicações secundárias do diabetes (Jaén, et al., 2017).

Relativo ao tratamento, primeiramente na diabetes mellitus tipo 1, a insulinoterapia intensiva, seja por múltiplas doses diárias de insulina (MDI) ou por sistema de infusão contínua de insulina (SICI), é essencial desde o início da doença e para todas as idades. As necessidades diárias de insulina para pacientes com DM1 podem ser calculadas com base no peso corporal, geralmente variando entre 0,4 U/kg/dia a 1,0 U/kg/dia (Júnior et al., 2022).

Durante a puberdade, a gravidez ou em casos de infecção, pode ser necessário administrar doses maiores. Normalmente, a dose prandial é dividida em três a quatro bolus pré-prandiais diários, com a insulina humana regular sendo administrada 30 minutos antes das refeições, os análogos rápidos 20 minutos antes, e os análogos ultrarrápidos imediatamente antes das refeições (Júnior et al., 2022). A figura 3 resume as formulações de insulina disponíveis no Brasil.

Figura 3 – Formulações de insulinas disponíveis no Brasil

Fonte: Júnior et al. (2022)

O tratamento do diabetes tipo 2 (DM2) evoluiu de um foco apenas no controle da glicemia para uma abordagem mais abrangente, que inclui proteção cardiorrenal, manejo da obesidade e ajuste oportuno do controle glicêmico, visando minimizar as complicações a longo prazo (Lyra, et al., 2024).

O controle glicêmico é crucial para prevenir complicações microvasculares e macrovasculares associadas ao diabetes. Estudos clínicos extensivos, como o UKPDS e o ADVANCE, demonstraram que a redução contínua da hemoglobina glicada (HbA1c) para níveis abaixo de 7% é eficaz na prevenção de complicações microvasculares, incluindo retinopatia, doença renal e neuropatia. Já a redução das complicações macrovasculares tende a ocorrer a longo prazo e é mais pronunciada quando o controle glicêmico é implementado precocemente, idealmente no primeiro ano após o diagnóstico (Lyra, et al., 2024). A Figura 4 demonstra o esquema terapêutico escolhido para a terapia medicamentosa da DM2.

Figura 4 – Manejo da terapia antidiabética em diabéticos tipo 2

Fonte: Lyra et al. (2024)

Vale salientar que a mudança do estilo de vida, baseado numa dieta pobre em consumo de açúcar e alimentos com alto teor de carboidrato, além do estabelecimento constante de metas de atividades físicas semanais são fundamentais para que todo o tratamento para a DM tipo 2 ocorra de maneira eficiente. O tratamento não-farmacológico aliado ao farmacológico possui resultados mais promissores que qualquer outra medida terapêutica (Bertoluci, et al., 2020).

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Impacto da Diabetes Mellitus 1 e 2 na Vida da Criança

A taxa de incidência de DM1 está crescendo globalmente, e essa condição é atualmente a terceira doença crônica mais prevalente na infância. Por esse motivo, em 2006, a ONU destacou o diabetes como uma das maiores ameaças à saúde mundial. Acredita-se que esse crescimento esteja relacionado ao estilo de vida contemporâneo (Phillips, et al., 2017).

Quando crianças são diagnosticadas com essa condição, a maioria necessita de hospitalização com tratamento intravenoso para corrigir a cetoacidose diabética e lidar com a desidratação. Além de estabilizar o paciente, é fundamental iniciar a terapia com insulina, acompanhada de uma educação completa sobre os aspectos práticos e teóricos do autocontrole que precisarão adotar, tanto da criança, quanto dos familiares que convivem com ela (Henríquez-Tejo; Cartes-Velásquez, 2018).

Conforme descrito por Streisand e Monaghan (2014), o manejo do diabetes em bebês e crianças em idade pré-escolar é dificultado pelo desenvolvimento típico dessa fase, que inclui um rápido crescimento físico e neurológico, dificuldade em expressar pensamentos e sentimentos, níveis elevados e imprevisíveis de atividade física, hábitos alimentares seletivos, além de desafios comportamentais e medos. Estes fatores influenciam drasticamente nas relações sociais que a criança desenvolve em seu crescimento.

Marks e Wolfsdorf (2020) relatam como uma das principais dificuldades psicossociais da criança, a necessidade de se adequar ao tratamento de forma eficaz e, ao mesmo tempo, lidar com as intempéries que abrangem o desenvolvimento da criança em sua idade pré-escolar e pré-puberdade. Esta pesquisa correlaciona a incidência de sintomas depressivos à má qualidade de vida da criança, que tenta se adequar aos dois âmbitos de forma simultânea (terapêutico e social).

A DM2 tem se mostrado uma grande adversidade ao bem-estar psicossocial dos jovens, uma vez que, juntamente à doença, há a concomitante presença da obesidade, fato este que poderia corroborar para uma relação interpessoal ruim entre crianças com estatura e circunferência abdominal dentro do esperado para a idade e crianças com estatura e circunferência abdominal acima do esperado para a idade (Peña, et al., 2022).

4.2 Impacto da Diabetes Mellitus 1 e 2 na Vida dos Pais

Os pais continuam a assumir a responsabilidade principal pelo controle do diabetes em crianças pequenas. Muitos programas clínicos de gestão do DM1 não fornecem uma educação personalizada, adaptada às necessidades específicas de crianças pequenas. Considerando esses aspectos únicos de desenvolvimento e manejo, os pais de crianças pequenas têm sido cada vez mais encaminhados para intervenções comportamentais (Monaghan, et al., 2022).

Em uma análise experimental foram expostos dados de uma pesquisa com 597 crianças menores de 7 anos com DM1, revelando que mais da metade dos pais relatou preocupações com hipoglicemia, complicações futuras, frustração com a falta de controle do diabetes e impacto negativo no sono. Esses fatores podem afetar tanto o funcionamento familiar (como bem-estar e conflitos) quanto o estado psicossocial dos pais, incluindo humor, estresse e qualidade de vida (Harrington, et al., 2017).

Analisa-se a presença de fatores que influenciem negativamente na relação dos pais com seus filhos, os quais se baseiam na desinformação, por parte do responsável legal, sobre as medidas e tecnologias utilizadas na terapêutica da DM em crianças. Essa relação finda em trazer certa necessidade de educação formal para os pais (Commissariat, et al., 2019).

4.3 Impacto da Diabetes Mellitus 1 e 2 na Família Como um Todo

Pesquisas indicam que o ajuste dos pais está relacionado aos resultados do DM1 em crianças pequenas e à sua qualidade de vida. Níveis mais elevados de estresse parental foram associados a uma qualidade de vida inferior relacionada ao diabetes, tanto para pais quanto para filhos. A investigação mostrou que fatores protetores infantis, como iniciativa, autocontrole e apego, estavam ligados a um melhor funcionamento dos pais, incluindo menos sintomas de depressão e estresse, e a uma maior qualidade de vida para as crianças (Monaghan, et al., 2022).

Menciona-se que a qualidade do sono em crianças pequenas com DM1 está diretamente conectada ao sono e ao bem-estar dos pais. Dessa forma, o estado psicossocial dos pais vem se tornando um elemento crucial para o bem-estar das crianças com DM1 (Jaser, et al., 2017).

4.3 Impacto da Diabetes Mellitus 1 e 2 na Família Como um Todo

O início precoce do DM1 aumenta o risco de impactos neurocognitivos nas crianças. Um desenvolvimento cerebral mais lento foi relacionado a níveis mais altos de hiperglicemia cumulativa e à variação da glicose em crianças pequenas com DM1. Diferenças na função cognitiva foram observadas entre jovens com DM1 e seus parentes da mesma faixa etária sem diabetes, com o declínio cognitivo sendo associado a níveis elevados de hiperglicemia e ao início precoce do DM1, o que pode dificultar o desenvolvimento dos processos cognitivos (Mauras, et al., 2015) (Kirchhoff, et al., 2017). Este fato contribui indevidamente para as relações sociais que a criança exerceria.

Apesar de a supervisão do manejo do DM1 em seus filhos ser uma tarefa complexa e exigente, muitos pais mostram grande resiliência. Observou-se que a maioria dos pais de crianças pequenas com DM1 adotavam estratégias de enfrentamento positivas, como a criação de um “novo normal” para a família, a participação em soluções criativas para problemas e a identificação de aspectos positivos em meio às dificuldades. Também se descobriu que a capacidade de encontrar benefícios estava associada a uma maior autoeficácia dos pais no manejo do diabetes (Pierce, et al., 2019).

A DM2 se mostrou uma grande adversidade ao bem-estar psicossocial dos jovens, uma vez que, juntamente à doença, há a concomitante presença da obesidade. Esta, por sua vez, através de pesquisas experimentais realizadas por Peña et al. (2022), se mostrou um grande fator preditor para más relações interpessoais em grupos de estudos compostos por crianças da mesma idade, tendo crianças tanto de IMC dentro dos padrões esperados, quanto crianças que apresentam sobrepeso, abordando uma distância social maior entre esses 2 grupos.

Os custos diretos que envolvem a abordagem de crianças portadora de DM, tanto a tipo 1, quanto a tipo 2, incluem despesas com medicamentos, serviços de consulta e diagnóstico, além de, em menor escala, os custos de hospitalização devido a descompensações. Também há custos associados às principais complicações, com o maior impacto vindo da nefropatia diabética, seguido pela retinopatia, doenças cardiovasculares, neuropatia diabética e, por último, doença vascular periférica (Salas-Zapata, et al., 2018).

Os custos indiretos estão relacionados a mortalidade prematura, incapacidade permanente e incapacidade temporária. Usuários arcam com 51% das despesas totais, considerando que o maior custo seria o uso da bomba de insulina, que, embora elevado, estava ligado a um melhor controle metabólico, reduzindo os custos a longo prazo (Henríquez-Tejo; Cartes-Velásquez, 2018).

Numa pesquisa experimental realizada por Hamdan et al (2024), foram analisadas cerca de 400 crianças, as quais responderam um questionário com vários aspectos a serem avaliados, sendo um deles a avaliação psicológica destas crianças. A análise dos sentimentos psicológicos de bem-estar das crianças que portam a DM, revelou um perfil misto, com níveis moderados de felicidade e sensação de bem-estar, como demonstrado na Figura 5.

Figura 5 – Análise das respostas ao questionário proposto de crianças com diabetes.

Foram analisados 5 tipos de respostas, variando de “Concordo totalmente” e “Discordo totalmente”, dispostos diante de 8 sentimentos possíveis que as crianças podem estar manifestando, como “Eu estou feliz”, “Eu estou bem”, “Eu me sinto exausto por tudo”, “Eu me preocupo muito”, “Eu me sinto triste”, “Eu fico chateado rapidamente”, “Eu não estou com vontade de fazer nada” e “Eu frequentemente acho que fiz algo errado”.
Fonte: Adaptado de Hamdan et al. (2024)

A Figura 5 demonstra uma certa prevalência no âmbito do desgaste emocional proveniente da vida de uma criança portadora de DM. Percebe-se um aumento nos sentimentos de exaustão, além da alta incidência de respostas que direcionam a sintomas de abatimento, desânimo e ansiedade, podendo estes estarem relacionados a sintomas depressivos iniciais decorrentes das más relações sociais associadas à criança com DM.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Diabetes Mellitus tipo 1 (DM1) e tipo 2 (DM2) apresentam desafios significativos para as crianças e suas famílias. O aumento da incidência de DM1, reconhecida pela ONU em 2006 como uma grande ameaça à saúde global, destaca a necessidade de estratégias eficazes. Crianças com DM1 enfrentam complicações complexas, como a cetoacidose diabética, e a adaptação ao tratamento é dificultada pelo desenvolvimento precoce e variabilidade na atividade física. Isso afeta a saúde física, emocional e social das crianças.

O DM2 também apresenta impactos profundos, especialmente com a associação da obesidade, que agrava dificuldades psicossociais e sociais. A pesquisa indica que crianças com DM2 enfrentam mais desafios nas relações interpessoais, agravando o estigma social e a qualidade de vida. Pais de crianças pequenas com DM1 enfrentam estresse e desafios adicionais devido à falta de educação personalizada, o que demonstra a necessidade de suporte e treinamento mais eficazes.

Apesar das adversidades, a resiliência dos pais tem sido crucial. Estratégias de enfrentamento positivas e a adaptação ao “novo normal” mostram a capacidade de adaptação das famílias. Os custos diretos e indiretos do tratamento de diabetes destacam a necessidade de políticas de saúde que abordem tanto os aspectos financeiros quanto o suporte psicossocial. A análise do bem-estar psicológico das crianças com diabetes revela que, com suporte adequado e manejo eficaz, é possível alcançar uma qualidade de vida satisfatória.

REFERÊNCIAS

BERTOLUCI MC, et al. Portuguese-Brazilian evidence-based guideline on the management of hyperglycemia in type 2 diabetes mellitus. Diabetol Metab Syndr (2020) 12:45. Doi: 10.1186/s13098-020-00551-1. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32489427/. Acesso em: 8 set. 2024

CHA J, et al. Pancreatic β-cell senescence in diabetes: mechanisms, markers and therapies. Frontiers in endocrinology vol. 14 1212716. 31 Aug. 2023, doi:10.3389/fendo.2023.1212716. 2023. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37720527/. Acesso em: 8 set. 2024

COMMISSARIAT PV, et al. “I’m essentially his pancreas”: Parent perceptions of diabetes burden and opportunities to reduce burden in the care of children <8 years old with type 1 diabetes. Pediatric diabetes vol. 21,2 (2020): 377-383. doi:10.1111/pedi.12956. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31808586/. Acesso em: 8 set. 2024

HAMDAN S, et al. Determinants of self-care among Jordanian children with type 1 diabetes mellitus. The Journal of the Egyptian Public Health Association vol. 99,1 19. 20 Aug. 2024, doi:10.1186/s42506-024-00166-8. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/39160425/. Acesso em: 8 set. 2024

HARREITER J, RODEN M. Diabetes mellitus – Definition, Klassifikation, Diagnose, Screening und Prävention (Update 2023) [Diabetes mellitus: definition, classification, diagnosis, screening and prevention (Update 2023)]. Wiener klinische Wochenschrift vol. 135,Suppl 1 (2023): 7-17. doi:10.1007/s00508-022-02122-y. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37101021/. Acesso em: 8 set. 2024

HARRINGTON KR, et al. Management and Family Burdens Endorsed by Parents of Youth <7 Years Old With Type 1 Diabetes. Journal of diabetes science and technology vol. 11,5 (2017): 980-987. doi:10.1177/1932296817721938. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/28770627/. Acesso em: 8 set. 2024

HENRÍQUEZ-TEJO R, CARTES-VELÁSQUEZ R. Impacto psicosocial de la diabetes mellitus tipo 1 en niños, adolescentes y sus familias. Revisión de la literatura [Psychosocial impact of type 1 diabetes mellitus in children, adolescents and their families. Literature review]. Revista chilena de pediatria vol. 89,3 (2018): 391-398. doi:10.4067/S0370-41062018005000507. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29999147/. Acesso em: 8 set. 2024

ILONEN J, et al. The heterogeneous pathogenesis of type 1 diabetes mellitus. Nat Rev Endocrinol. 2019 Nov;15(11):635-650. doi: 10.1038/s41574-019-0254-y. Epub 2019 Sep 18. PMID: 31534209. 2019. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31534209/. Acesso em: 8 set. 2024

JAÉN ML, et al. Long-term efficacy and safety of insulin and glucokinase gene therapy for diabetes: 8-Year Follow-Up in Dogs. Mol Ther Methods Clin Dev 2017;6:1–7. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5466581/. Acesso em: 8 set. 2024

JASER SS, et al. Sleep in children with type 1 diabetes and their parents in the T1D Exchange. Sleep medicine vol. 39 (2017): 108-115. doi:10.1016/j.sleep.2017.07.005. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29157581/. Acesso em: 8 set. 2024

KIRCHHOFF BA, et al. A longitudinal investigation of cognitive function in children and adolescents with type 1 diabetes mellitus. Pediatric diabetes vol. 18,6 (2017): 443-449. doi:10.1111/pedi.12414. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27444539/. Acesso em: 8 set. 2024

LITWAK L, et al. Prevalence of diabetes complications in people with type 2 diabetes mellitus and its association with baseline characteristics in the multinational A1chieve study. Diabetology & metabolic syndrome vol. 5,1 57. 24 Oct. 2013, doi:10.1186/1758-5996-5-57. 2013. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/24228724/. Acesso em: 8 set. 2024

LYRA R, et al. Manejo da terapia antidiabética no DM2. Diretriz Oficial da Sociedade Brasileira de Diabetes (2024). DOI: 00.00000/00000000.0000-0, ISBN: 000-00-0000-000-0. Disponível em: https://diretriz.diabetes.org.br/manejo-da-terapia-antidiabetica-no-dm2/. Acesso em: 8 set. 2024

MARKS B, WOLFSDORF JI. Monitoring of Pediatric Type 1 Diabetes. Frontiers in endocrinology vol. 11 128. 17 Mar. 2020, doi:10.3389/fendo.2020.00128. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7089921/. Acesso em: 8 set. 2024

MAURAS N, et al. Longitudinal assessment of neuroanatomical and cognitive differences in young children with type 1 diabetes: association with hyperglycemia. Diabetes vol. 64,5 (2015): 1770-9. doi:10.2337/db14-1445. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25488901/. Acesso em: 8 set. 2024

MONAGHAN M, et al. Young Children with Type 1 Diabetes: Recent Advances in Behavioral Research. Current diabetes reports vol. 22,6 (2022): 247-256. doi:10.1007/s11892-022-01465-0. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35435615/. Acesso em: 8 set. 2024

NEVES RG, et al. Complicações por Diabetes Mellitus no Brasil: Estudo de Base Nacional, 2019. Cienc. Saúde Coletiva. 28 (11). Nov 2023. https://doi.org/10.1590/1413-812320232811.11882022. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/WqpZYbn3y6nK5tsFPGcBhJQ/. Acesso em: 8 set. 2024

PEÑA A, et al. Effects of a Diabetes Prevention Program on Type 2 Diabetes Risk Factors and Quality of Life Among Latino Youths With Prediabetes: A Randomized Clinical Trial. JAMA network open vol. 5,9 e2231196. 1 Sep. 2022, doi:10.1001/jamanetworkopen.2022.31196. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36094502/. Acesso em: 8 set. 2024

PETERSMANN A, et al. Definition, Classification and Diagnosis of Diabetes Mellitus. Experimental and clinical endocrinology & diabetes: official journal, German Society of Endocrinology [and] German Diabetes Association vol. 127,S 01 (2019): S1-S7. doi:10.1055/a-1018-9078. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31860923/. Acesso em: 8 set. 2024

PHILLIPS JE, et al. Type 1 diabetes: a disease of developmental origins. Pediatric diabetes vol. 18,6 (2017): 417-421. doi:10.1111/pedi.12425. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27526948/. Acesso em: 8 set. 2024

PIERCE JS, et al. Benefit finding among parents of young children with type 1 diabetes. Pediatric diabetes vol. 20,5 (2019): 652-660. doi:10.1111/pedi.12860. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31006941/. Acesso em: 8 set. 2024

RACHDAOUI N. Insulin: The Friend and the Foe in the Development of Type 2 Diabetes Mellitus. International journal of molecular sciences vol. 21,5 1770. 5 Mar. 2020, doi:10.3390/ijms21051770. 2020. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32150819/. Acesso em: 8 set. 2024

SALAS-ZAPATA L, et al. Costos directos de las hospitalizaciones por diabetes mellitus en el Instituto Mexicano del Seguro Social. Gaceta sanitaria 32 (2018): 209-215. Disponível em: https://scielo.isciii.es/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0213-91112018000300209. Acesso em: 8 set. 2024

SILVA JÚNIOR WS, et al. Insulinoterapia no diabetes mellitus tipo 1 (DM1). Diretriz Oficial da Sociedade Brasileira de Diabetes (2023). DOI: 10.29327/557753.2022-5, ISBN: 978-85-5722-906-8. Disponível em: https://diretriz.diabetes.org.br/insulinoterapia-no-diabetes-mellitus-tipo-1-dm1/#citacao. Acesso em: 8 set. 2024

STREISAND R, MONAGHAN M. Young children with type 1 diabetes: challenges, research, and future directions. Current diabetes reports vol. 14,9 (2014): 520. doi:10.1007/s11892-014-0520-2. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4113115/. Acesso em: 8 set. 2024

TIWARI P. Recent trends in therapeutic approaches for diabetes management: a comprehensive update. J Diabetes Res 2015;1–11. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4530263/. Acesso em: 8 set. 2024


1Acadêmica de Medicina. E-mail: kauanyvitoriabernardo@gmail.com. Artigo apresentado a Centro universitário Aparício Carvalho, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Medicina, Porto Velho/RO, 2024.

2Acadêmico de Medicina. E-mail: Lucianalimapinheiro@hotmail.com. Artigo apresentado a Centro universitário Aparício Carvalho, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Medicina, Porto Velho/RO, 2024.

3Acadêmico de Medicina. E-mail: mariaceciliazabot3@gmail.com. Artigo apresentado a Centro universitário Aparício Carvalho, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Medicina, Porto Velho/RO, 2024.

4Professora orientadora. Professora do curso de Medicina da FIMCA. E-mail: chimenekn@gmail.com