DESENVOLVIMENTO NEUROPSICOMOTOR DE CRIANÇAS COM SÍNDROME DE DOWN: BENEFÍCIOS DO TRATAMENTO PRECOCE

NEUROPSYCHOMOTOR DEVELOPMENT OF CHILDREN WITH DOWN SYNDROME: BENEFITS OF EARLY TREATMENT

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.10395715


Layla Gabriela Kamouh Sainça1
Francis Jardim Pfeilsticker2
Juliana Lilis da Silva2
Natália de Fátima Gonçalves Amâncio2


Resumo:

A Síndrome de Down (SD) é uma desordem genética resultante da falha na distribuição cromossômica durante a divisão celular do embrião, afetando aproximadamente 1 em cada 700 nascidos vivos no Brasil. Essa condição está associada a um atraso no desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM), quando comparado ao desenvolvimento típico. Assim, o objetivo do estudo consiste em discutir formas de promover o DNPM, por meio da análise de diversos métodos terapêuticos e dos resultados obtidos por esses tratamentos, a fim de melhorar a qualidade de vida a curto e longo prazo. Trata-se de uma revisão exploratória integrativa de literatura cujas buscas foram realizadas nas bases de dados Google Scholar; Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), Scientif Eletronic Library Online (SciELO), National Library of Medicine (PubMed) e EbscoHost. Os artigos revisados revelam a necessidade de incluir crianças com SD em programas de incluir crianças com síndrome de Down em programas de intervenção precoce para promover o desenvolvimento neuropsicomotor. A revisão evidencia a eficácia da integração da terapia convencional com técnicas neuroevolutivas, resultando em benefícios motores, cognitivos, maior independência funcional e inclusão social.

Palavras-chave: Síndrome de Down, Desenvolvimento infantil, Transtornos cognitivos, Atividade Motora, Modalidades de Fisioterapia.

Abstract:

Down Syndrome (DS) is a genetic disorder resulting from failure in chromosomal distribution during embryo cell division, affecting approximately 1 in every 700 live births in Brazil. This condition is associated with a delay in neuropsychomotor development (NPMD), when compared to typical development. Thus, the objective of the study is to discuss ways to promote NPMD, through the analysis of different therapeutic methods and the results obtained by these treatments, in order to improve quality of life in the short and long term. This is an integrative exploratory literature review whose searches were carried out in the Google Scholar databases; Virtual Health Library (VHL), Scientif Electronic Library Online (SciELO), National Library of Medicine (PubMed) and EbscoHost. The reviewed articles reveal the need to include children with DS in programs to include children with Down syndrome in early intervention programs to promote neuropsychomotor development. The review highlights the effectiveness of integrating conventional therapy with neuroevolutionary techniques, resulting in motor and cognitive benefits, greater functional independence and social inclusion.

Keywords: Down syndrome, Child development, Cognitive disorders, Motor Activity, Physiotherapy Modalities.

1 INTRODUÇÃO

     A Síndrome de Down (SD) é um distúrbio genético caracterizado pela falha na distribuição cromossômica durante a divisão celular do embrião (Coelho, 2016). Estima-se que, em 95% dos indivíduos afetados, essa falha consista na presença de um cromossomo 21 extra, resultante da não disjunção meiótica, motivo pelo qual a etiologia também é referida como “Trissomia do 21”. No entanto, essa condição genética também é manifestada em casos de translocação (4%), em que parte do cromossomo 21 se liga a outro cromossomo, e em mosaicismo somático (1%), quando a mutação ocorre, mas o portador pode ou não desenvolver as alterações físicas causadas por ela (Bertapelli, 2011).

     O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estima que, no Brasil, 1 em cada 700 nascidos vivos apresenta a trissomia 21, totalizando cerca de 300 mil indivíduos com SD. Dentre os fatores de risco para o desenvolvimento dessa condição genética, destaca-se a idade materna, uma vez que mulheres acima de 35 anos apresentam 6 vezes mais chances de gerar um filho com a síndrome, devido ao envelhecimento dos óvulos. Além desta, outras influências são usualmente destacadas, como o tabagismo, etilismo, uso de drogas ou exposição a fatores ambientais, como radiação (Laignier et al.,2021; Mattos; Bellani, 2010).

Dentre os tantos marcadores da síndrome de Down, as disfunções do controle postural são constantemente descritas, além de dificuldades na coordenação motora e problemas com integração sensorial, obstáculo para a adaptação desses indivíduos ao ambiente. Ademais, o retardo mental, outra característica da SD, influencia diretamente na capacidade e no interesse de assimilar novas habilidades motoras, no controle postural dos movimentos, da coordenação e do equilíbrio (Toble et al., 2013).

     Contudo, a hipotonia, presente em 100% das pessoas com Síndrome de Down, é a causa funcional mais grave para o atraso do desenvolvimento motor (DM), em virtude da insuficiência e retardo no término da mielinização com 2 meses a 6 anos de idade (Lima et al, 2017; Cooley, Graham, 1991[3]). Desde o nascimento, as crianças com SD apresentam, além desta característica citada, o decréscimo no volume das estruturas cerebrais. Já na fase adulta, essas reduções, mais acentuadas na região do hipocampo, córtex pré-frontal e cerebelo, são responsáveis pelo atraso no desenvolvimento cognitivo, afetando a atenção, comunicação verbal, aprendizagem, memória e DM (Daunhauer; Fidler, 2009).

     Nesse sentido, a intervenção fisioterapêutica tem o intuito de estimular e facilitar posturas que promovam o desenvolvimento motor e cognitivo em crianças com SD (Izidoro et al., 2019). Quando realizada de maneira precoce, em pacientes com idade de 0-3 anos que apresentam riscos ou evidências de atraso no desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM), são identificados melhores resultados, visto que este período é definido por grande plasticidade neuronal (Ortiz; Ribeiro, 2013).

      A estimulação é essencial para crianças típicas ou atípicas, uma vez que, estimulada a plasticidade neural, a criança adquire maior capacidade de processamento de informações, ato facilitador do desenvolvimento. O tratamento fisioterapêutico busca atenuar o atraso do DNPM, de acordo com a necessidade de cada paciente, por meio do auxílio à criança e aos pais, com ensinamentos, objetivando melhora e independência do DNPM, e também com brincadeiras lúdicas, cientificamente pensadas, a fim de despertar o interesse e estimular o avanço (Santos; Fiorini, 2021).

A elaboração de uma revisão de literatura sobre essa temática se justifica devido à alta incidência da SD e à urgente necessidade de promover o desenvolvimento cognitivo e motor desde os primeiros anos de vida. Além disso, intervenções bem-sucedidas não apenas melhoram a qualidade de vida a curto prazo, mas também têm um impacto significativo a longo prazo, reduzindo a dependência de serviços especializados e economizando recursos.

Dessa forma, esta revisão de literatura tem o intuito de discutir a importância da intervenção precoce no desenvolvimento neuropsicomotor de crianças com síndrome de Down, analisando os principais métodos terapêuticos e os resultados obtidos com esses tratamentos.

2 METODOLOGIA

O presente estudo consiste em uma revisão exploratória integrativa de literatura. A revisão integrativa foi realizada em seis etapas: 1) identificação do tema e seleção da questão norteadora da pesquisa; 2) estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos e busca na literatura; 3) definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados; 4) categorização dos estudos; 5) avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa e interpretação e 6) apresentação da revisão.

Na etapa inicial, para definição da questão de pesquisa, utilizou-se da estratégia PICO (Acrômio para Patient, Intervention, Comparation e Outcome). Assim, definiu-se a seguinte questão central que orientou o estudo: “Como a intervenção precoce auxilia no desenvolvimento neuropsicomotor em crianças com síndrome de Down, em comparação à intervenção tardia?” Nela, observa-se o P: Crianças com Síndrome de Down; I: Intervenção precoce; C: Intervenção tardia; O: Desenvolvimento neuropsicomotor.

 Para responder a esta pergunta, foi realizada a busca de artigos envolvendo o desfecho pretendido utilizando as terminologias cadastradas nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCs) criados pela Biblioteca Virtual em Saúde desenvolvido a partir do Medical Subject Headings da U.S. National Library of Medcine, que permite o uso da terminologia comum em português, inglês e espanhol. Os descritores utilizados foram: Síndrome de Down, Desenvolvimento infantil, Transtornos cognitivos, Deficiência intelectual, Cognição. Para o cruzamento das palavras chaves utilizou-se os operadores booleanos “and”, “or” “not”.

Realizou-se um levantamento bibliográfico por meio de buscas eletrônicas nas seguintes bases de dados: Google Scholar; Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), Scientif Eletronic Library Online (SciELO), National Library of Medicine (PubMed) e EbscoHost. 

A busca foi realizada nos meses de agosto e setembro de 2023. Como critérios de inclusão, limitou-se a artigos publicados nos últimos seis anos (2018 a 2023), que abordassem o tema pesquisado e que estivessem disponíveis eletronicamente em seu formato integral. Foram excluídos os artigos em que o título e resumo não estivessem relacionados ao tema de pesquisa e pesquisas que não tiverem metodologia bem clara.

Após a etapa de levantamento das publicações, encontraram-se 38 artigos, dos quais foram realizados a leitura do título e resumo das publicações considerando o critério de inclusão e exclusão definidos. Em seguida, realizou a leitura na íntegra das publicações pré-selecionadas, atentando-se novamente aos critérios de inclusão e exclusão, sendo que 9 artigos não foram utilizados devido aos critérios de exclusão. Foram selecionados 29 artigos para análise final e construção da revisão.

Posteriormente a seleção dos artigos, realizou-se um fichamento das obras selecionadas a fim de selecionar a coleta e análise dos dados. Os dados coletados foram disponibilizados em um quadro, possibilitando ao leitor a avaliação da aplicabilidade da revisão integrativa elaborada, de forma a atingir o objetivo desse método.

A Figura 1 demonstra o processo de seleção dos artigos por meio das palavras-chaves de busca e da aplicação dos critérios de inclusão e exclusão citados na metodologia. O fluxograma leva em consideração os critérios elencados pela estratégia PRISMA (Page et al., 2021).

Figura 1 – Processo de seleção de artigos

Fonte: Adaptado do Preferred Reporting Items for Systematic review and Meta-Analyses (PRISMA). Page et al., (2021).

3 RESULTADOS

A tabela 1 sintetiza os principais artigos utilizados na presente revisão de literatura, contendo informações relevantes sobre os mesmos, como os autores do estudo, o ano de publicação, o título e os achados relevantes.

Tabela 1 – Principais métodos terapêuticos utilizados no desenvolvimento neuropsicomotor de crianças

com síndrome de Down, encontrados nas publicações do período de 2018 a 2023.

EstudoTítuloAchados principais
Junqueira et al., 2023Avaliação e intervenção responsiva e integrativa na criança com distúrbio alimentar pediátrico com Trissomia do 21: Relato de casoIntervenção fonoaudiológica: melhora da habilidade motora intraoral. Terapia Ocupacional: uso das mãos de maneira mais funcional.
Soltani et al., 2023Psychometric properties of inhibitory control measures among youth with Down syndromeMelhor viabilidade para tarefas analógicas em vez de avaliações computadorizadas do controle inibitório.
Cardoso et al., 2023A influência do estímulo precoce para aquisição dos marcos do desenvolvimento motor em crianças com Síndrome de DownCrianças com SD capazes atingir os marcos sem grandes intervalos quando comparadas a crianças típicas, quando inseridas na estimulação precoce desde os primeiros meses de vida.
Santos et al., 2022A influência do método Bobath no tratamento de crianças com Síndrome de Down: uma revisão sistemáticaProgresso significativo em aquisições motoras por crianças submetidas ao método.
Lima et al., 2022Benefícios da dança como recurso terapêutico em uma criança com Síndrome de DownMelhoria na marcha, na coordenação motora fina, equilíbrio, comunicação verbal, confiança, socialização, consciência e desenvoltura corporal.
Boato et al., 2022The Use of Virtual and Computational Technologies in the Psychomotor and Cognitive Development of Children with Down Syndrome: A Systematic Literature ReviewEstimulam a motricidade global, o equilíbrio, o esquema corporal e a organização espacial, além do aprendizado de conceitos matemáticos. Contribuem para a relação ensino-aprendizagem e estimulam as funções e o DNPM e cognitivo de crianças com SD.
Souza et al., 2022Estimulação precoce no desenvolvimento neuropsicomotor em crianças com Síndrome de Down de 0 a 6 anosA fisioterapia é fundamental para que crianças com SD adquiram autonomia e qualidade de vida.
Pino-Ramos et al., 2021Eficacia de la marcha en cinta rodante sobre el desarrollo motor de niños con parálisis cerebral y síndrome de DownEficácia para promover o desenvolvimento da marcha e do equilíbrio em crianças de 0-12 anos com SD
Fredes, Astudillo, Lizama, 2021Late start of early intervention in children with Down syndromeIntervenção tardia está relacionada a hospitalizações precoces e internações prolongadas.
Freitas, Sofiatti, Vieira, 2021A importância da fisioterapia na inclusão de portadores de Síndrome de DownFisioterapia precoce proporciona mais independência funcional, maior predisposição a inclusão no meio social, educacional e mercado de trabalho, resultando em uma vida mais ativa, inclusiva e com maior qualidade.
Santos, Fiorini, 2021Importância da estimulação precoce em fisioterapia para crianças com Síndrome de DownDiminuição do atraso no DNPM, amplificando sua interação, habilidades, fluidez e agudeza no espaço-ambiente assim como os estímulos sonoros, visuais e táteis, ofertando independência funcional, segurança e maior qualidade de vida.
Guimarães, Guimarães, 2021Estimulação precoce em crianças com Síndrome de Down: revisão bibliográficaEstimulação iniciada nos primeiros meses de vida promove melhor DNPM.
Stefanes et al., 2021A Hipoterapia E Sua Atuação No Desenvolvimento Biopsicossocial De Crianças Com Síndrome De DownMelhoria da postura, equilíbrio, mobilidade e função, além de possuir efeitos positivos nas interações sociais e emocionais, culminando na melhora da qualidade de vida e autoestima dos praticantes.
Marques, Costa, 2021Intervenções fisioterapêuticas para o desenvolvimento neuropsicomotor em crianças portadores da síndrome de Down: revisão sistemática da literaturaProporciona ao paciente um ganho de controle postural, uma melhora da coordenação motora global, melhora da força muscular respiratória, evolução do equilíbrio estático e dinâmico, melhora do tônus muscular, aprendizado sensorial e cognitivo, influenciando o DNPM das crianças com SD.
Silva, Beazussi, 2021A importância da fisioterapia na intervenção precoce de crianças com Síndrome de Down: revisão integrativaAvanço coordenação motora, organização no espaço e tempo, além da descoberta do corpo e a relação do corpo com o objeto, o que é essencial para a relação sujeito-meio.
Gomes et al., 2020Benefícios da musicalização em crianças com Síndrome de Down sob a ótica da terapia ocupacional: uma revisão da literaturaFavorecimento da socialização, autoestima e desenvolvimento do senso musical. Potencializa a percepção e acuidade auditiva.
Amaral, Corrêa, Aita, 2019Perfil de independência no autocuidado da criança com Síndrome de Down e com cardiopatia congênitaDesempenho funcional nas atividades de autocuidado das crianças estudadas é inferior ao de crianças com desenvolvimento típico
 Ramos, Muller, 2019Marcos motores e sociais de crianças com Síndrome de Down na estimulação precoceContribui para a aquisição das habilidades motoras e de socialização da criança com SD, minimizando o impacto negativo do atraso motor por meio da estimulação constante
Santana, Cavalcante, 2018Conceito neuroevolutivo em pacientes com síndrome de Down: revisão integrativaO conceito neuroevolutivo nos pacientes com SD possui grande relevância para a melhora do DNPM, obtendo mais qualidade de vida e adaptando os seus ambientes quando necessário.
Araújo et al., 2018Efeitos da fisioterapia aquática na função motora de indivíduos com paralisia cerebral: ensaio clínico randomizadoFisioterapia aquática eficaz no desenvolvimento do equilíbrio estático e dinâmico por meio da melhora do controle do tronco.

Fonte: autoria própria, 2023.

4 DISCUSSÃO

     Os artigos utilizados nesta revisão de literatura evidenciam a importância da intervenção fisioterapêutica precoce para o DNPM de crianças com síndrome de Down. Segundo Santos e Fiorini (2021), a criança com SD pode começar a ser estimulada a partir do seu 15º (décimo quinto) dia de vida, em seu desenvolvimento motor, físico, fonoaudiólogo, dentre outros. Por isso, é de suma importância a utilização de diferentes recursos a fim do desenvolvimento integral dessa criança.

Sob esse viés, o estudo de Micaelle Guimarães e João Eduardo Guimarães (2021) retrata a fisioterapia como agente crucial para a prevenção e minimização de comorbidades associadas à SD, destacando sua maior eficácia nos quatro primeiros meses de vida, antes que os padrões anormais de posturas e movimentos se manifestem. Silva e Beazussi (2021) complementam esta análise, por meio da observação de que a fisioterapia deve ser exercida por uma equipe multidisciplinar, visando aumentar a interação do organismo com o ambiente e gerando respostas motoras próximas ao padrão de normalidade.

No entanto, outros estudos discutem formas alternativas de prevenção ao atraso do desenvolvimento com maior variedade de tempo, como uso da esteira de forma controlada e periódica, que se mostra efetivo durante um período maior da infância, atuando no desenvolvimento da marcha e do equilíbrio dinâmico em crianças de 0-12 anos (Pino-Ramos et al., 2022).

     A estimulação, por intermédio de diversos recursos e técnicas, é capaz de gerar diferentes resultados. A técnica Shantala, na fase inicial de desenvolvimento, promove benefícios como melhoria da linguagem, preensão manual e controle postural, enquanto o método Bobath, por sua vez, visa recuperar o controle motor, o tônus muscular e propiciar a independência e autoconfiança (Souza et al., 2022; Santos et al., 2022). Os estudos de Santana e Cavalcante (2018) corroboram os achados acima ao retratarem o potencial desse método para melhorar as etapas do desenvolvimento de forma mais efetiva, explorando toda a musculatura, tanto a deficiente como a eficiente. Assim, considera-se ideal a intervenção acompanhada por técnicas neuroevolutivas, não somente a fisioterapia convencional.

     Em primeira análise, as modalidades de fisioterapia aquática se mostram benéficas no desenvolvimento motor de crianças com SD, influenciando em posturas antigravitacionais e controle tônico nas posturas prona e sentada, o que pode gerar um aumento de até três pontos no escore bruto da Alberta Infant Motor Scale (AIMS), evidência de maior funcionalidade motora (Cardoso et al., 2023). Outras abordagens ainda acrescentam ao estudo benefícios como interação social, melhora da sensibilidade, redução do limiar de dor e diminuição do grau de edema nas extremidades (Freitas; Sofiatti; Vieira, 2021).

Ademais, as intervenções dessa categoria também estimulam as estabilidades laterais dos pacientes com SD. Isso ocorre porque, para vencer a resistência da água e alcançar o objeto almejado, o meio líquido oferta maior tempo de resposta para trabalhar a estabilidade do tronco, desencadeando a ativação de maior número de unidades motoras do músculo (Araújo et al., 2018). De forma consoante, as propriedades específicas da água, como pressão hidrostática, força de flutuação, viscosidade e fluxo turbulento promovem o estímulo do sistema sensório-motor e um feedback sensorial que incentiva o controle neuromuscular e, consequentemente, o equilíbrio postural. Tais avanços implicam diretamente em uma melhora no controle motor, independência funcional, aprendizado sensorial e cognitivo (Marques; Costa, 2021).

Em relação a modalidades de solo, a hipoterapia e equoterapia possuem resultados que se assemelham aos anteriores. Constituem-se como métodos que englobam o indivíduo em sua totalidade, considerando o modelo biopsicossocial. A marcha do cavalo, similar à biomecânica da marcha humana, possui movimentos tridimensionais, que são transmitidos para o paciente em um padrão rítmico, suave e repetitivo, estimulando o sistema propriorreceptivo e aperfeiçoando as reações de equilíbrio estático e dinâmico (Stefanes et al., 2021).

Além disso, atividades cotidianas também são trabalhadas de forma terapêutica a fim de promoverem o DNPM. O incentivo de atividades de autocuidados, como cuidados de higiene, utilização de recipientes como copos e talheres e o ato de se vestir exercitam habilidades motoras grossas e finas, e influenciam, por consequência, a autoestima e autonomia de crianças com SD (Amaral; Corrêa; Aita, 2019). Sob essa mesma perspectiva, Junqueira et al., (2023) relatam como a terapia ocupacional e a intervenção fonoaudiológica, de forma integrada, durante alguns meses de observação, são efetivas na melhoria em diversos aspectos alimentares, incluindo níveis de alerta, atenção, aceitação de variedades de alimentos, percepção e habilidade motora intraoral.

Ademais, o desenvolvimento também pode ser alcançado de forma lúdica e descontraída. Uma das formas de suavizar o atraso do DNPM é pelo exercício da dança, capaz de atenuar o desequilíbrio, fraqueza muscular e a má coordenação. Isso porque a dança exercita o corpo do indivíduo como um todo e a expressão da linguagem individual e coletiva, apresentando-se como um recurso terapêutico que proporciona benefícios físicos, psicológicos e sociais (Lima et al., 2022).

A musicalização, por sua vez, permite à criança um desenvolvimento de autoestima, senso musical e socialização. Além disso, atividades comuns na musicalização envolvem o aprendizado de canções, o brincar coletivo, jogos utilizando membros superiores e inferiores, aprimorando funções mentais e habilidades motoras (Gomes et al., 2020).

Apesar de Soltani et al., (2023), retratarem uma diferença de padrão entre tarefas analógicas e computadorizadas, discutindo tarefas analógicas como mais viáveis e com maior impacto no Quociente de Inteligência (QI) das crianças, outros estudos demonstram que o uso de ferramentas virtuais, de forma lúdica, também exerce um grau de contribuição.

Segundo Boato et al., (2022), o desenvolvimento da comunicação em crianças com SD é marcado por déficits auditivos e visuais, bem como alterações morfológicas e anatômicas. No entanto, o uso de jogos eletrônicos para a estimulação de habilidades motoras e cognitivas apresentou eficácia em abordagens como realidade virtual e jogos específicos para SD, ainda pouco estudados, mas personalizados e adaptados para atender às necessidades individuais de indivíduos com a síndrome. Mediante aplicação correta e profissionalmente instruída, essas tecnologias estimulam a motricidade global, o equilíbrio e a organização espacial, além de acarretar melhor relação ensino-aprendizagem, DNPM e cognitivo.

Paralelamente, a integração familiar durante o processo terapêutico também foi apreciada. A participação dos pais nos grupos de estimulação se mostrou benéfica para fortalecer o vínculo familiar e contribuir para o DNPM de crianças com SD (Ramos; Muller, 2019). As características do grupo familiar também exercem influência sobre o grau de evolução. Famílias de melhores níveis educacionais e socioeconômicos possuem mais recursos para aderir a diferentes formas de terapia de forma conjunta, além de, em maioria, serem melhor instruídas acerca da importância da intervenção precoce. Crianças submetidas a hospitalizações constantes antes dos três meses de vida também apresentam, de forma recorrente, inserção tardia a métodos terapêuticos e, com isso, atraso no DM (Fredes; Astudillo; Lizama, 2021).

5 CONCLUSÃO

Esta revisão de literatura, por meio da comparação entre diferentes métodos terapêuticos e os resultados obtidos por meio desses tratamentos, comprovou a eficácia da integração da terapia convencional com técnicas neuroevolutivas na promoção de diversos benefícios, tais como avanços motores, cognitivos, maior independência funcional e inclusão social. Dessa forma, destaca-se a importância de inserir a criança com síndrome de Down em um plano de intervenção precoce para auxiliar o desenvolvimento neuropsicomotor.

 Findado o estudo, concluiu-se que as modalidades de fisioterapia aquática e equoterapia possuem melhor efetividade para o desenvolvimento motor. Dentre os benefícios dessas atividades, detacaram-se a melhora da funcionalidade motora, da sensibilidade e do equilíbrio estático e dinâmico. Além disso, percebeu-se a essencialidade de atividades lúdicas como jogos analógicos e computadorizados como estímulo ao desenvolvimento cognitivo, quando utilizadas de forma controlada e profissionalmente instruída.

Contudo, apesar da relevância dessas análises, a realização da pesquisa evidenciou a carência de estudos recentes de qualidade sobre o assunto. Diante disso, é preciso que novos trabalhos sejam realizados, a fim de elucidar tratamentos essenciais para a melhoria da qualidade de vida de indivíduos com síndrome de Down.

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[1] Discente do curso de Medicina do Centro Universitário de Patos de Minas –UNIPAM.

[2] Docente do Centro Universitário de Patos de Minas –UNIPAM.

[3] Cooley WC, Graham JM. Down syndrome: An update and review for the primary pediatriacian. Clin Pediat; v.30, p.233-253, 1991.