DESENVOLVIMENTO MOTOR EM CRIANÇAS COM SÍNDROME DE DOWN: O PAPEL DA FISIOTERAPIA NA IDENTIFICAÇÃO DE ATRASOS – REVISÃO SISTEMÁTICA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202505062122


André Gonçalves da Silva1
Maria Luíza Pereira de Oliveira Souza1
Christiane Lopes Xavier2


RESUMO

Introdução: A Síndrome de Down caracteriza-se por alterações motoras significativas decorrentes da hipotonia muscular, comprometendo a aquisição de marcos motores fundamentais para o desenvolvimento infantil. Evidências científicas demonstram que a ausência de intervenção adequada compromete não apenas aspectos motores, mas também o desenvolvimento cognitivo e social destas crianças, tornando essencial a identificação precoce de atrasos e a implementação de estratégias terapêuticas apropriadas. Objetivo: Analisar as evidências científicas disponíveis sobre a eficácia das intervenções fisioterapêuticas na identificação e manejo de atrasos no desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down. Metodologia: Revisão sistemática da literatura realizada nas bases de dados BVS, PubMed e Google Scholar, utilizando descritores relacionados ao desenvolvimento motor, fisioterapia e Síndrome de Down. Foram selecionados 10 estudos publicados entre 2019-2024, incluindo ensaios clínicos randomizados, estudos de caso e estudos de coorte, avaliados quanto à qualidade metodológica pela escala PEDro. Resultados: As abordagens fisioterapêuticas mais eficazes incluíram o Método Bobath, treinamento de força muscular, massagem terapêutica, realidade virtual e intervenções parentais supervisionadas. Os estudos demonstraram melhora significativa no controle postural, equilíbrio, coordenação motora e aquisição da marcha independente. A intervenção precoce mostrou-se determinante na redução do atraso para aquisição da marcha, com correlação positiva entre o envolvimento parental e os resultados terapêuticos. Conclusão: A fisioterapia exerce papel fundamental na identificação e intervenção precoce em atrasos no desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down, promovendo ganhos funcionais significativos quando implementada nos primeiros meses de vida e associada ao envolvimento familiar ativo no processo terapêutico.

Palavras-chave: Síndrome de Down; Desenvolvimento Motor; Fisioterapia; Intervenção Precoce; Avaliação Fisioterapêutica.                                                 

ABSTRACT

Introduction: Down syndrome is characterized by significant motor alterations resulting from muscle hypotonia, compromising the acquisition of fundamental motor milestones for child development. Scientific evidence shows that the lack of adequate intervention compromises not only motor aspects, but also the cognitive and social development of these children, making early identification of delays and the implementation of appropriate therapeutic strategies essential. Objective: To analyze the available scientific evidence on the effectiveness of physiotherapy interventions in identifying and managing delays in the motor development of children with Down syndrome. Methodology: Systematic review of the literature carried out in the BVS, PubMed and Google Scholar databases, using descriptors related to motor development, physiotherapy and Down syndrome. Ten studies published between 2019-2024 were selected, including randomized clinical trials, case studies and cohort studies, assessed for methodological quality by the PEDro scale. Results: The most effective physiotherapeutic approaches included the Bobath Method, muscle strength training, therapeutic massage, virtual reality, and supervised parental interventions. The studies demonstrated significant improvements in postural control, balance, motor coordination, and acquisition of independent walking. Early intervention was shown to be decisive in reducing delays in the acquisition of walking, with a positive correlation between parental involvement and therapeutic results. Conclusion: Physiotherapy plays a fundamental role in the identification and early intervention of motor development delays in children with Down Syndrome, promoting significant functional gains when implemented in the first months of life and associated with active family involvement in the therapeutic process.

Keywords: Down Syndrome; Motor Development; Physiotherapy; Early Intervention; Physiotherapy Assessment.

1. INTRODUÇÃO

O desenvolvimento motor constitui um processo contínuo e dinâmico que se inicia nos primeiros meses de vida e persiste ao longo da existência humana (Silva, 2022; Moreira, 2019). Este processo envolve a aquisição progressiva de habilidades fundamentais para a independência funcional e interação com o ambiente (Delgado, 2020; Ribeiro & Cardoso, 2024).

Em crianças com Síndrome de Down, o desenvolvimento motor apresenta desafios específicos devido à hipotonia muscular característica, resultando em atrasos na aquisição de habilidades motoras fundamentais. Estas crianças necessitam de acompanhamento especializado, pois a falta de estímulos adequados compromete não apenas o desenvolvimento motor, mas também aspectos cognitivos e sociais (Trindade & Nascimento, 2016).

A fisioterapia desempenha papel crucial na identificação precoce e intervenção em atrasos no desenvolvimento motor destas crianças. Por meio de avaliações específicas e programas de intervenção personalizados, o fisioterapeuta contribui significativamente para a otimização do potencial de desenvolvimento (Ferreira, 2022). A detecção prematura de alterações permite a implementação de estratégias terapêuticas que minimizam os impactos negativos a longo prazo.

Os marcos de desenvolvimento motor como controle cefálico, sentar independente, engatinhar e andar são parâmetros importantes para avaliar o progresso infantil. A ausência destes marcos nas idades apropriadas sinaliza atrasos que necessitam de intervenção especializada. Em crianças com Síndrome de Down, estes marcos são geralmente alcançados mais tardiamente, evidenciando a necessidade de atenção especial (Silva, 2022).

Esta revisão sistemática busca analisar as evidências científicas disponíveis sobre o papel da fisioterapia na identificação e intervenção precoce em atrasos no desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down, abordando as principais técnicas terapêuticas, seus resultados e a importância do envolvimento familiar.

2. METODOLOGIA

2.1 Tipo de Estudo

Revisão sistemática da literatura, metodologia que permite sintetizar as evidências disponíveis sobre intervenções fisioterapêuticas no desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down por meio de procedimentos sistemáticos e explícitos para identificar, selecionar e avaliar criticamente estudos relevantes.

2.2 Caracterização da Área de Estudo

Análise crítica e sistemática de estudos sobre desenvolvimento motor em crianças com Síndrome de Down, avaliando a eficiência da fisioterapia na identificação e intervenção de atrasos motores, com foco na melhoria da qualidade de vida e no suporte para o desenvolvimento infantil.

2.3 Amostra

Este estudo possui natureza bibliográfica, com base na análise de livros, teses, artigos e pesquisas relacionados ao desenvolvimento motor infantil e à contribuição da fisioterapia na detecção e no tratamento de atrasos. O levantamento foi realizado por meio de fontes físicas e online, incluindo Google Acadêmico, SciELO, PubMed e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), para a coleta de informações relevantes, excluindo escritos incompletos. Esta abordagem permite uma interpretação aprofundada das teorias, estabelecendo relações entre o levantamento bibliográfico e as evidências encontradas.

2.4 Critérios de Inclusão e Exclusão

Para a seleção dos estudos, foram adotados critérios específicos que permitiram uma análise direcionada e relevante. Incluíram-se na revisão trabalhos publicados em artigos científicos revisados por pares, disponíveis nas bases de dados selecionadas, que abordavam especificamente o desenvolvimento motor em crianças com Síndrome de Down. Apenas publicações em português e inglês foram consideradas, com recorte temporal limitado aos últimos cinco anos (2019-2024), priorizando estudos que descreviam intervenções fisioterapêuticas aplicadas diretamente a crianças com esta condição. 

Foram excluídos estudos que não contemplavam a temática proposta, aqueles escritos em idiomas inacessíveis aos pesquisadores, duplicatas identificadas nas diferentes bases, publicações anteriores ao período estabelecido, artigos incompletos ou com metodologia inadequadamente descrita, além de revisões da literatura sem análise crítica que não contribuíam significativamente para os objetivos estabelecidos.

2.5 Procedimento de Coleta de Dados

A pesquisa foi conduzida nas bases de dados eletrônicas Lilacs, PubMed, SciELO e Google Scholar, utilizando descritores indexados em português e inglês, seguindo os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). O operador booleano AND foi empregado para refinar os resultados, com diferentes combinações: “Desenvolvimento motor”; “Fisioterapia”; “Atrasos no desenvolvimento motor”; “Intervenção fisioterapêutica”; “Síndrome de Down”. Em inglês, foram utilizados: “Motor development”; “Physiotherapy”; “Delays in motor development”; “Physiotherapy intervention”; “Down syndrome”.

Para estruturar a pesquisa de forma sistemática e direcionada, aplicou-se a estratégia PICO, que contemplou como pacientes/problema as crianças com Síndrome de Down; como intervenção, a fisioterapia voltada para identificação e tratamento de atrasos motores; como comparação, crianças sem intervenção fisioterapêutica precoce ou que receberam intervenção tardia; e como desfecho esperado, a melhoria no desenvolvimento motor e consequente redução dos atrasos identificados. Esta estruturação permitiu uma busca mais precisa e focada nas questões centrais da pesquisa

A busca nas bases de dados revelou inicialmente 28 estudos na BVS, 83 na PubMed e nenhum estudo na SciELO. Após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, seguida pela análise de títulos e resumos, e recoleta na Google Scholar, foram selecionados 10 estudos para compor a revisão final. A Figura 1 apresenta o fluxograma detalhado do processo de seleção dos estudos.          

Figura 1: Fluxo de seleção dos estudos para a revisão integrativa.

Fonte: Os Autores (2025)

2.6 Aspectos Éticos e Legais

Por se tratar de pesquisa bibliográfica, não foi necessária a utilização de pesquisa de campo ou análise de casos. Entretanto, foram respeitados os preceitos éticos e legais quanto à devida referência aos autores, respeitando os direitos autorais e a propriedade intelectual em todas as citações e análises realizadas.

2.7 Riscos e Benefícios

A metodologia empregada nesta revisão sistemática apresenta potenciais riscos relacionados principalmente a limitações inerentes ao processo de pesquisa bibliográfica, como possíveis vieses na seleção de estudos, limitações metodológicas nos trabalhos incluídos e eventuais lacunas nas evidências disponíveis sobre o tema. Por outro lado, os benefícios esperados são substanciais, incluindo uma análise rigorosa da literatura existente, abordagem abrangente do tema que contempla diferentes intervenções fisioterapêuticas, fornecimento de suporte científico para práticas clínicas baseadas em evidências e potencial contribuição para a melhoria na qualidade de vida das crianças com Síndrome de Down por meio da identificação de estratégias de intervenção mais eficazes.

2.8 Análise de Dados

A análise envolveu a seleção e extração de dados relevantes dos estudos incluídos, avaliação da qualidade metodológica, e identificação de padrões e temas recorrentes. Foi utilizada uma abordagem qualitativa para síntese dos resultados, apresentados em tabelas, com ênfase nas evidências mais robustas e relevantes para a prática clínica.

A qualidade metodológica dos ensaios clínicos randomizados incluídos na revisão foi avaliada utilizando a escala PEDro (Physiotherapy Evidence Database) (Shiwa et al., 2011). Esta escala, composta por 11 critérios (sendo que o primeiro não é pontuado), resultou em uma pontuação máxima de 10 pontos. Estudos com pontuação ≤3 foram classificados como de qualidade “ruim”, 4-5 como “regular”, 6-8 como “boa” e 9-10 como “excelente”. Foi utilizada a versão em português da escala disponível no Anexo A. O Apêndice A apresenta a avaliação metodológica dos ensaios clínicos randomizados incluídos nesta revisão.

3. RESULTADOS

A análise dos estudos selecionados revelou diversas abordagens fisioterapêuticas para o desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down, categorizadas conforme as estratégias de intervenção utilizadas. O Quadro 1 apresenta uma síntese das intervenções fisioterapêuticas, objetivos, metodologias e resultados obtidos nos estudos incluídos nesta revisão.

A análise da qualidade metodológica dos ensaios clínicos randomizados incluídos nesta revisão, avaliada pela escala PEDro, revelou escores variando de 5 a 8 pontos, classificando os estudos entre qualidade metodológica regular e boa. O estudo de Harbourne et al. (2021) obteve a pontuação mais alta (8/10), atendendo a critérios importantes como randomização, alocação secreta, cegamento dos avaliadores e análise de intenção de tratar. Os estudos de Lu et al. (2019), Valentini et al. (2020) e Lucas et al. (2024) alcançaram pontuação de 5/10, classificados como de qualidade regular, enquanto Álvarez-Gonzalo et al. (2021) apresentou pontuação 6/10, sendo classificado como de boa qualidade. Entre os critérios menos atendidos nos estudos analisados estão o cegamento dos sujeitos e dos terapeutas, limitação comum em intervenções fisioterapêuticas. O Apêndice A apresenta detalhadamente a avaliação metodológica dos ensaios clínicos randomizados incluídos nesta revisão.

O treinamento de força muscular demonstrou benefícios para o desenvolvimento da força e estabilidade corporal em crianças com Síndrome de Down. De acordo com Reis (2020), exercícios de força, especialmente aqueles que combinam resistência e treinamento de equilíbrio, podem melhorar significativamente o controle postural e a marcha nesta população. Os benefícios adicionais observados incluem redução de gordura corporal, aumento de massa muscular e menor risco de desenvolvimento de doenças crônicas.

O estudo de Balensiefer et al. (2023) implementou um protocolo de treinamento funcional realizado duas vezes por semana, com duração de uma hora, totalizando 16 sessões. Os resultados demonstraram melhora significativa no desempenho em traves de equilíbrio (p=0,019) e saltos laterais (p<0,001), evidenciando a eficácia desta abordagem no aprimoramento das habilidades motoras em indivíduos com Síndrome de Down.

Quadro 2. Intervenções fisioterapêuticas utilizadas no desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down.

Fonte: Os Autores (2025)

A utilização de realidade virtual como recurso terapêutico mostrou resultados promissores no desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down. Barros et al. (2020) aplicaram um protocolo utilizando o console Nintendo Wii em vinte sessões de intervenção, com frequência de duas vezes por semana e duração de 50 minutos cada. Os resultados evidenciaram melhora concomitante do desenvolvimento motor, motricidade fina e global, força muscular expiratória, velocidade, tempo de reação e controle direcional no equilíbrio corporal posterior.

O Método Bobath demonstrou eficácia na melhoria do controle postural e equilíbrio em crianças com Síndrome de Down. Rodrigues e Silva (2024) reportaram avanços significativos no controle postural e estabilidade durante atividades funcionais em um estudo de caso utilizando esta abordagem terapêutica.

Corrado et al. (2022) realizaram um estudo retrospectivo com 86 crianças com Síndrome de Down para avaliar o impacto da fisioterapia precoce baseada no Conceito Bobath na aquisição da marcha independente. Os resultados indicaram que a idade média para início da marcha foi de 26 meses (DP=9,66), sendo que a intervenção fisioterapêutica precoce foi capaz de reduzir significativamente o atraso nesta aquisição, principalmente quando implementada nos primeiros meses de vida.

A massagem terapêutica, investigada por Lu et al. (2019) em um ensaio clínico randomizado controlado, demonstrou benefícios significativos para crianças com atraso no desenvolvimento. O protocolo de intervenção consistiu em 20 minutos de massagem duas vezes por semana durante 12 semanas, associada à reabilitação de rotina. Os resultados evidenciaram maior melhoria no escore motor total, escore motor grosso e comportamento de sensibilidade sensorial em comparação ao grupo controle.

A intervenção START-Play, avaliada por Harbourne et al. (2021) em um ensaio clínico randomizado multicêntrico com 112 bebês com atraso motor, demonstrou efeitos positivos na cognição, motricidade fina e resolução de problemas. O protocolo incluiu sessões de fisioterapia duas vezes por semana durante 12 semanas, com atividades específicas para promover movimento ativo, exploração e resolução de problemas. Os resultados mostraram benefícios significativos, especialmente em bebês com atrasos motores mais significativos.

A intervenção cognitivo-motora domiciliar, investigada por Valentini et al. (2020) em um ensaio clínico randomizado com 176 bebês, evidenciou que os grupos de intervenção apresentaram escores motores significativamente mais altos em comparação aos grupos controle. O programa de intervenção foi adaptado a diferentes contextos (creche, casa ou abrigo) e incluiu suporte para cuidadores e pais. Além dos ganhos motores, foram observadas mudanças positivas nos cuidados maternos diários e nas oportunidades domésticas em todos os ambientes.

A importância do envolvimento parental foi destacada em vários estudos. ÁlvarezGonzalo et al. (2021) encontraram correlação significativa entre as atividades realizadas em casa pelos pais e os resultados motores das crianças. O estudo validou a escala PDMS-2 na população espanhola e avaliou a eficácia da fisioterapia baseada no conceito Bobath, com sessões semanais de 30 minutos durante 8 semanas, incluindo orientações para atividades domiciliares. Os resultados demonstraram melhores escores motores no grupo experimental após o tratamento e correlação significativa entre atividades realizadas em casa e resultados motores.

Lucas et al. (2024) realizaram um ensaio clínico randomizado piloto para avaliar os efeitos da fisioterapia ultra-precoce administrada pelos pais desde 34 semanas pós-idade menstrual. Embora não tenham sido encontradas diferenças significativas na escala Alberta Infant Motor Scale (AIMS) às 16 semanas de idade corrigida, os pais do grupo experimental relataram maior percepção positiva sobre a eficácia do tratamento e mudanças observadas, sugerindo benefícios além dos parâmetros objetivos avaliados.

4. DISCUSSÃO

A análise dos estudos incluídos nesta revisão sistemática revela a existência de diversas abordagens fisioterapêuticas eficazes para a identificação e intervenção em atrasos no desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down. A variedade de metodologias e resultados encontrados demonstra a complexidade deste campo e a necessidade de intervenções personalizadas conforme as necessidades individuais de cada criança.

Uma das principais contribuições dos estudos analisados é a evidência da eficácia de intervenções precoces, como demonstrado por Corrado et al. (2022) e Harbourne et al. (2021). Estas pesquisas indicam que quanto mais cedo a fisioterapia é implementada, melhores são os resultados obtidos, corroborando com a afirmação de Ferreira (2022) sobre a importância da atuação precoce do fisioterapeuta para identificar rapidamente desvios no desenvolvimento e intervir antes que padrões patológicos se consolidem.

O envolvimento familiar emerge como um fator determinante para o sucesso das intervenções fisioterapêuticas. Estudos como os de Álvarez-Gonzalo et al. (2021) e Lucas et al. (2024) demonstram que a participação ativa dos pais no processo terapêutico potencializa os resultados, estendendo os benefícios das sessões de fisioterapia para o ambiente doméstico. Esta abordagem alinha-se ao conceito de cuidado centrado na família, considerado fundamental para o desenvolvimento integral de crianças com necessidades especiais.

Quanto às metodologias específicas, observa-se que técnicas tradicionais como o Método Bobath continuam relevantes e eficazes, como evidenciado por Rodrigues e Silva (2024) e Corrado et al. (2022). Simultaneamente, abordagens inovadoras utilizando tecnologia, como a realidade virtual investigada por Barros et al. (2020), demonstram potencial significativo para complementar as intervenções convencionais, tornando as terapias mais atrativas e motivadoras para as crianças.

Os protocolos de treinamento funcional e fortalecimento muscular, estudados por Balensiefer et al. (2023) e Reis (2020), apresentam resultados promissores no aprimoramento do controle postural e equilíbrio, aspectos frequentemente comprometidos em crianças com Síndrome de Down devido à hipotonia característica. Estes achados sugerem que a combinação de exercícios de fortalecimento com atividades funcionais pode ser particularmente benéfica para esta população.

A integração de aspectos cognitivos e motores, como na intervenção START-Play estudada por Harbourne et al. (2021), destaca a importância de uma visão holística do desenvolvimento infantil. Esta abordagem reconhece a interconexão entre os domínios cognitivo e motor, considerando que o movimento é fundamental para a exploração do ambiente e, consequentemente, para o desenvolvimento cognitivo.

Um aspecto relevante observado em vários estudos é a adaptabilidade das intervenções ao contexto da criança. Valentini et al. (2020) demonstraram que programas adaptados a diferentes ambientes (creche, casa ou abrigo) podem ser efetivos, desde que adequados às necessidades específicas de cada situação. Esta flexibilidade é essencial para a implementação de programas de intervenção em diferentes realidades socioeconômicas e culturais.

Apesar dos resultados promissores, é importante reconhecer as limitações presentes nos estudos analisados. A heterogeneidade metodológica, tamanhos amostrais reduzidos em alguns estudos e variabilidade nos instrumentos de avaliação dificultam a generalização dos resultados. Além disso, a escassez de estudos longitudinais com acompanhamento a longo prazo limita a compreensão sobre a manutenção dos ganhos obtidos com as intervenções ao longo do tempo.

A qualidade metodológica dos ensaios clínicos randomizados, avaliada pela escala PEDro, variou de regular a boa, indicando a necessidade de estudos com maior rigor metodológico. O estudo de Harbourne et al. (2021), com pontuação 8/10, apresentou a metodologia mais robusta, contribuindo para maior confiabilidade em seus resultados sobre a intervenção START-Play. Limitações comuns incluíram a falta de cegamento dos participantes e terapeutas, aspecto desafiador em estudos envolvendo intervenções fisioterapêuticas, mas que pode introduzir vieses nos resultados. Adicionalmente, critérios como acompanhamento adequado e análise de intenção de tratar foram atendidos de forma inconsistente entre os estudos, o que pode comprometer a validade interna dos achados. Estes aspectos metodológicos devem ser considerados na interpretação dos resultados e na aplicação clínica das intervenções analisadas.

Para a prática clínica, os achados desta revisão sugerem que a abordagem ideal para crianças com Síndrome de Down deve ser multifacetada, combinando diferentes técnicas e metodologias conforme as necessidades individuais. A intervenção precoce, o envolvimento familiar e a adaptação ao contexto da criança emergem como princípios fundamentais para maximizar os resultados.

Futuras pesquisas devem focar em estudos longitudinais com amostras maiores, metodologias padronizadas e acompanhamento a longo prazo para avaliar a manutenção dos ganhos desenvolvimentais. A investigação sobre a eficácia de programas de telessaúde e intervenções digitais também representa uma área promissora, especialmente considerando a crescente digitalização dos serviços de saúde e a necessidade de alcançar populações em áreas remotas.  

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta revisão sistemática evidenciou que a fisioterapia desempenha papel fundamental na identificação precoce e intervenção em atrasos no desenvolvimento motor de crianças com Síndrome de Down. Através da análise de estudos relevantes, identificamos abordagens eficazes como treinamento de força, estimulação de equilíbrio, método Bobath, realidade virtual e intervenções parentais supervisionadas, que demonstraram melhorias significativas em aspectos motores e funcionais. Os resultados destacam a importância da intervenção precoce e do envolvimento familiar como fatores determinantes para o desenvolvimento motor adequado, contribuindo para maior independência funcional e qualidade de vida destas crianças. Recomenda-se a implementação de abordagens personalizadas e multifacetadas, bem como estudos longitudinais com metodologias robustas para fortalecer as evidências nesta área.

REFERÊNCIAS 

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APÊNDICE A – ESCALA PEDRO

Avaliação metodológica dos ensaios clínicos randomizados pela escala PEDRro


1 Discentes do Curso de Graduação em Fisioterapia do Centro Universitário Santo Agostinho
2 Docente do Curso de Graduação em Fisioterapia do Centro Universitário Santo Agostinho