DERMATITE ATÓPICA: UMA VISÃO GERAL SOBRE O MANEJO DA DOENÇA NA POPULAÇÃO PEDIÁTRICA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7886624


Cassiana de Moura e Costa¹,
Dalton Luiz de Moura e Costa²


Introdução:

A dermatite atópica (DA), também conhecida como eczema atópico, é uma doença inflamatória crônica, cutânea e recidivante muito comum, cuja prevalência tem aumentado drasticamente nas últimas três décadas. A imunopatogênese da DA é complexa, e pode ter o Sthaphylococcus aureus como um componente importante no curso clínico da doença. Sabe-se que mais da metade dos acometidos pela doença desenvolve asma e inúmeras alergias ao longo da vida. O quadro clinico da DA é caracterizado principalmente por prurido e xerose, além de apresentar estreita associação com sensibilização mediada por IgE, aeroalérgenos e alimentos. A distribuição das lesões varia de acordo com a idade. [1, 2, 3].

Crianças menores de dois anos tendem a ter lesões na região malar e frontal da face, região cervical e couro cabeludo. Erupções em áreas de fralda raramente ocorrem na DA. Já, em indivíduos maiores que dois anos as lesões costumam estar localizadas em áreas flexurais, como as fossas antecubitais e poplíteas, juntamente com a cabeça e pescoço. As lesões agudas da DA iniciam como pápulas eritematosas e exsudatos serosos. As lesões secundárias incluem escoriações e erosões crostosas devido aos arranhões. As lesões subagudas se caracterizam como pápulas e placas eritematosas descamativas. Se o prurido e a erupção cutânea progredirem de maneira descontrolada, desenvolve-se a DA liquenificada crônica, que apresenta marcas cutâneas acentuadas com hiperpigmentação. Evitar gatilhos, hidratação da pele e esteróides tópicos são os primeiros passos para o controle da doença. [1,3].

Nas lesões agudas da DA, as células T auxiliares tipo 2 produzem interleucinas (IL) do tipo IL-4, IL-13 e IL-31, as quais podem potencializar a disfunção de barreira e contribuir para o prurido intermitente dos acometidos. Nas lesões crônicas, há um predomínio das células T-helper tipo 1que são as responsáveis por secretar interferon gama e IL-12. A disfunção de barreira da filagrina na derme também predispõe à DA. A superinfecção da pele, particularmente com Staphylococcus aureus, é comum, e as culturas das lesões afetadas ajudam a guiar a terapia. [1, 2, 3, 4]. 

Objetivos:

O objetivo geral da pesquisa foi estabelecer uma visão geral fisiopatológica, clinica e terapêutica da dermatite atópica na população pediátrica.

Métodos:

A metodologia empregada nesta pesquisa foi uma revisão de literatura narrativa com artigos publicados em bases eletrônicas de pesquisas cientificas. 

Resultados:

A DA é a principal causa de consultas em dermatologia pediátrica em países desenvolvidos. Erupções cutâneas recorrentes e pruriginosas em locais típicos e historia familiar ou pessoal de atopia ajudam a identificar crianças com a doença. Aproximadamente 85% dos casos são diagnosticados antes dos cinco anos de idade e os corticoides tópicos constituem o pilar da terapia da doença. [4, 5].

Um estudo americano, do tipo coorte, o qual incluiu 39.526 indivíduos que procuraram um dermatologista para um diagnóstico primário de dermatite atópica entre 2010 e 2015, concluiu que os medicamentos mais prescritos para o tratamento da doença em ordem decrescente foram: corticosteroides tópicos (60,2%), antibióticos orais (17,3%), antifúngicos (6,7%), anti-histamínicos (6,4%), corticosteroides orais (5,9%), inibidores da Calcineurina (2,3%) e emolientes (1,2%). Homens com idades entre 20 – 59 tiveram as taxas mais altas de esteroides orais prescritos. [6].

O uso de corticosteroides tópicos de maneira adequada reduz os sintomas da DA e melhora abundantemente a qualidade de vida dos afetados. No entanto, muitos responsáveis pelas crianças portadoras da dermatose afirmam que sentem receio em usar esta medicação nos pequenos. Em decorrência disto, a corticofobia leva à baixa adesão entre os usuários da medicação. Apenas 30% dos pacientes com DA seguem orientações médicas. Consequentemente, essa baixa adesão leva ao tratamento insuficiente e à persistência dos sintomas. [5,7]

Um outro estudo americano, do tipo randomizado, avaliou 2418 lactentes em um período de cinco anos e concluiu que tanto os corticosteroides tópicos quanto o creme de pimecrolimus 1% tiveram um rápido inicio de ação no tratamento da DA. Mais de 50% dos pacientes avaliados alcançaram o sucesso do tratamento na terceira semana em ambas as medicações. Porém, os responsáveis pelos lactentes demonstraram excessiva preocupação no uso dos corticosteroides tópicos devido aos seus possíveis efeitos colaterais. [8].

A DA infantil grave está relacionada à presença de dermatite eczematosa recorrente e disseminada que interfere significativamente nas atividades diárias e qualidade de vida da criança afetada e da família. A grande maioria das crianças com DA de longa duração pode ser controlada com o uso adequado de tratamentos tópicos, incluindo terapia de manutenção de longo prazo e tratamentos adjuvantes. No paciente recalcitrante, terapias de segunda linha, como uso de luz ultravioleta de banda estreita e imunossupressores sistêmicos, como Ciclosporina, Azatioprina, Micofenolato de Moefetil e Metotrexato, demonstraram ser seguras e uma boa opção para pacientes que apresentam formas mais graves da doença. [2, 3, 9].

Diversos estudos demonstraram que além de o uso de corticosteroides tópicos não serem fáceis de usar em crianças, eles apresentam maior absorção do composto no público infantil devido ao peso reduzido em relação à área de superfície corporal, induzindo assim efeitos colaterais cutâneos e sistêmicos, como por exemplo supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. As alternativas incluem inibidores tópicos de Calcineurina e compostos pertencentes à classe do Tacrolimus, principalmente nas áreas sensíveis, como face e dobras. As diretrizes italianas da DA recomendam terapia proativa com Tacrolimus em uso do medicamento em pelo menos duas vezes na semana, pois foi observado que este esquema reduz o tempo de recaída. [10].   

Em casos de doença não controlada, corticosteroides sistêmicos também podem ser usados, porém não são preferidos devido à relação custo-benefício desfavorável na idade pediátrica. A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) aprovou recentemente o Dupilumabe para uso de crianças entre 6 – 11 anos que não conseguem controlar a doença com terapias tópicas. [11, 12].

O Dupilumabe é um anticorpo monoclonal totalmente humano que inibe a subunidade alfa do receptor IL-4 e IL-13, citocinas muito importantes na via patogênica da DA. Estudos recentes demonstraram que o perfil de citocinas na população pediátrica difere do de adultos, com uma polarização aos eixos TH2 e 17, além da ausência de regulação positiva de TH1. Portanto fica claro a necessidade de atuar o mais precocemente possível na infância com drogas imunomoduladoras, como o Dupilumabe, para prevenir a cronicidade da DA e o desenvolvimento de doenças associadas. [12, 13, 14, 15].

Conclusão:

A DA é uma das dermatopatias infantis mais comuns e afeta a vida de milhares de crianças todos os anos. A maioria dos casos são diagnosticados antes dos cinco anos de idade. O tratamento da DA pode ser realizado de diversas formas e os corticosteroides tópicos ainda constituem o pilar da terapêutica, porém ocorre baixa adesão desta classe medicamentosa devido aos seus possíveis efeitos colaterais. Outras formas de minimizar a atividade da DA é através do uso de emolientes, inibidores da Calcineurina, Tacrolimus, Pimecrolimus e até mesmo através do uso de corticoides sistêmicos. O Dupilumabe é considerado um imunomodulador da doença que pode ser usado para prevenir a cronicidade da DA e prevenir o surgimento de demais doenças dermatológicas. 

Referências:

1. Jihyun K, Eui KB, YM LD. Pathophysiology of atopic dermatitis: Clinical implications. Allergy and Asthma Proceedings. Vol 40, number 2. March 2019. Pp 84 – 92.

2. Mark B. Update on Atopic Dermatitis: Insights into Patogenesis and New Tratment Paradigms. Allergy and Asthma Proceedings. Vol 25, number 5. September 2004. Pp 279 – 282.

3. Peters N, Peters AT. Atopic Dermatitis. Allergy and Asthma Proceedings.Vol 40, number 6. November 2019. Pp 433 – 436.

4. Kwon CW, Beck LA. Allergy and Asthma Proceedings. Vol 39, number 6. November 2018. Pp 411 – 419.

5. Silverberg NB, Kinster CD. Special Considerations for Therapy of Pediatric Atopic Dermatitis. Dermatologic Clinics.2017. Vol 35. Pp 351 – 356.

6. Tiffany A, Maxim E, Cardwell LA. Prescriptions for atopic dermatitis: oral corticosteroides remain commonplace. Journal of Dermatological Treatment. Vol 29. 2018. Pp 239 – 240.

7. Veenje S, Osinga H, Antonescu I, Bos B, Vries TW. Focus froup parenteral opinions regarding treatment with topical corticosteroids on children with atopic dermatitis. Allergologia et Immunopathologia. Vol 49. April  2019. Pp 166 – 171.

8. Lurger T, Poulin Y, Nieto A, Dakovic R. Safety and efficacy of pimecrolimus in atopic dermatitis: a 5-year randomized trial. Pediatrics. Vol 4. April 2015. Pp 597 – 606.

9. Tan AU, Gonzales ME. Management of severe atopic dermatitis in children. Journal of Drugs in Dermatology. 2012.

10. Napolitano M, Fabroccini G, Martora F, Genco L, Notto M. Children atopic dermatitis: Diagnosis, mimics, overlaps and therapeutic implication. Dermatologic therapy. October 2022.

11. Tom WL, Berger TG. Guidelines of care for the management of atopic dermatitis: section 2. Management and treatment of atopic dermatitis with tropical therapies. J. Am Acad Dermatology. 2014. 

12. Bosma AL, Germens LAA. Paternal and maternal use of dupilumab in patients with atopic dermatitis: a case series. Clinical and Experimental Dermatology. Vol 46. August 2021. Pp 1089 – 1092.

13. Esaki H, Brunner PM. Early-onset pediatric atopic dermatitis is TH2 but also TH17 polarized in skin. Allergy and Asthma Proceedings.Vol 138. April 2016. Pp 1639 – 1651.

14. Nguyen CM, Koo J, Cordoro KM. Psychodermatologic effects of atopic dermatitis. Pedriatric Dermatology. Vol 33. 2016. Pp 129 – 135.

15. Kelly KA, Balogh EA, Kaplan SG. Skin disease in children: effects on quality of life, stigmatization, bullying, and suicide risk in pediatric acne, atopic dermatitis, and psoriasis patients. Children (Basel). 2021. Pp 1057.


¹ Estudante de Medicina do Centro Universitário da Fundação Assis Gurgacz (FAG); cassianamouracosta200996@outlook.com, COSTA MC
² Médico pela Universidade Federal do Paraná, COSTA DLM