DEPRESSÃO PÓS-PARTO: REVISÃO SISTEMÁTICA DOS FATORES DE RISCO E ANÁLISE DAS ESTRATÉGIAS ADOTADAS PARA MITIGAÇÃO DO TRANSTORNO PELA ATENÇÃO PRIMÁRIA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8115119


Jennifer Paliosa1
Maria Paula Moreira Santos1
Roane Sthefane Ferreira de Medeiros1
Eduardo Pereira Paschoal2


Resumo

Introdução: A depressão pós-parto é a caracterização de sofrimento psíquico no período puerperal, que é considerado de grande vulnerabilidade para a mãe e para o bebê. Objetivo: Analisar os possíveis fatores de risco associados ao desenvolvimento da depressão pós-parto e as ações exitosas da atenção primária na mitigação do distúrbio. Método: Trata-se de uma revisão sistemática de caráter descritivo com abordagem qualitativa, em que a coleta de dados se baseia em artigos publicados nas plataformas digitais LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciência da Saúde) e PubMed (Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos) no período entre 2017 e 2022. Resultados: Dentre os estudos analisados, os fatores de risco de maior prevalência são idade materna jovem, falta de apoio familiar/cônjuge, diagnóstico prévio de alguma doença psíquica, outros resultados também foram obtidos. Discussão: Identificou-se associação dos fatores de risco à ocorrência de DPP. Embora a detecção precoce seja essencial, faltam intervenções eficazes para a redução da incidência da doença. Conclusão: Reconhecer os fatores de risco faz com que os métodos de rastreio sejam aplicados de forma mais efetiva no atendimento da Atenção Primária e as pacientes alvo recebam tratamento e acompanhamento adequado.

Palavras chave: Depressão pós-parto; fatores de risco; sintomas; saúde da mulher; puerpério.

Abstract

Introduction: Postpartum depression is characterized by psychological distress during the puerperal period, which is considered a time of great vulnerability for both the mother and the baby. Objective: To analyze the potential risk factors associated with the development of postpartum depression and the successful actions of primary care in mitigating the disorder. Method: This is a descriptive systematic review with a qualitative approach, in which data collection is based on articles published on the digital platforms LILACS (Latin American and Caribbean Literature in Health Sciences) and PubMed (National Library of Medicine of the United States) between 2017 and 2022. Results: Among the analyzed studies, the most prevalent risk factors are young maternal age, lack of family/spouse support, previous diagnosis of mental illness, and other results were also obtained. Discussion: An association between risk factors and the occurrence of PPD was identified. Although early detection is essencial, effective interventions for reducing the incidence of the disease are lacking. Conclusion: Recognizing the risk factors allows screening methods to be applied more effectively in primary care, ensuring that the target patients receive appropriate treatment and follow-up.

Keywords: Postpartum depression; risk factors; symptoms; women’s health; postpartum period.

Introdução

O período pós-parto é considerado de grande vulnerabilidade para a mãe e para o bebê, já que consiste em um momento de adaptação da nova rotina, trazendo sentimentos como insegurança e medo. Porém, é importante atentar para casos em que sentimentos negativos estão exacerbados, pois eles podem indicar depressão pós-parto (DPP)(TEIXEIRA et al., 2021). A DPP é a caracterização de sofrimento psíquico no período de puerpério, compreendendo, na maioria dos casos, o início durante a gestação ou em até 4 semanas após o nascimento do bebê. A variação de sintomas consta desde a perturbação do humor (humor deprimido, triste ou irritado) à psicoses puerperais. Podem ocorrer alterações comportamentais, o que era prazeroso torna-se obsoleto, mudanças no sono e apetite, cansaço, culpa, sentimento de inutilidade e incapacidade(SANTOS et al., 2022).

De modo global, a depressão no período gestacional revela maior prevalência em países menos desenvolvidos(HARTMANN; MENDOZA-SASSI; CESAR, 2017). Quanto à prevalência no Brasil, estudos mostram que 25,8% das mulheres apresentam sintomas associados à depressão pós-parto (SALGADO, 2017). Dentre as mulheres com diagnóstico de DPP, 60% já apresentavam episódios depressivos durante a gestação(FERNANDES; SÁ, 2019).

Alguns fatores podem estar relacionados à incidência do transtorno. escolaridade e a idade são fatores relevantes na análise. Aponta-se 39% de maior prevalência dos sintomas da DPP em mulheres com baixo nível de escolaridade. Mulheres que enfrentam gestações em idade mais jovem (14 à 24 anos) estão passando pela fase de desenvolvimento pessoal e veem-se abrindo mão das suas metas para atenderem às demandas da gestação, deixando-as mais expostas a situações de estresse e preocupação(SANTOS et al., 2022).

Ademais, ausência de parceiro, uso de tabaco e bebidas alcoólicas antes ou durante a gestação, histórico de depressão familiar, experiências traumáticas como violência doméstica, pouco suporte financeiro e social, histórico de aborto, gravidez não planejada, parto cesárea também aparecem como fatores de risco(FERNANDES; SÁ, 2019).

A DPP pode ser uma continuidade do estabelecimento da mesma no período pré-parto, no início gestacional. Demonstrando, assim, a importância de uma assistência pré-natal investigativa, que observe tais mudanças comportamentais e possíveis agravantes, pois a maternidade é um momento de mudanças físicas e sociais da mãe, em que ela muda toda sua rotina, tanto de lazer, trabalho, convívio e estrutura física, hormonal, ansiedade para o parto e outras. O acompanhamento realizado corretamente, aumenta as chances de uma gestação saudável, benéfica para mãe e bebê, com assistência em todas as dimensões (POLES et al., 2018). O diagnóstico precoce geralmente é realizado por meio de escalas de rastreamento, sendo a escala Edinburgh Postnatal Depression Scale (EPDS) a mais utilizada(ALOISE; FERREIRA; LIMA, 2019).

Das redes de atenção à saúde disponíveis no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), o governo federal instituiu na portaria n° 1.459, de 24 de junho de 2011, a Rede Cegonha, que prevê uma assistência qualificada e humanizada à gravidez, abrangendo planejamento familiar, pré-natal, parto, puerpério e desenvolvimento da criança até seus 24 meses, além de saúde da mulher(BRASIL, 2011). Tal portaria teve sua alteração para instituição da Rede de Atenção Materna e Infantil (Rami), portaria GM/MS nº 715, de 4 de abril de 2022, que visa assegurar, além das diretrizes e objetivos já previstos no programa anterior, o amparo em casos de perda gestacional, com atuação de uma equipe multidisciplinar e incentivo à implantação do Método Canguru. Porém, a atenção prematura focada em DPP ainda é pequena, analisando que a maior taxa de hospitalização por causas dessa natureza ocorre no período pós-parto(BRASIL, 2022).

Em relação a essa baixa atenção focada em DPP na atenção primária, estudos mostram que apesar das equipes de saúde promoverem assistência conforme os protocolos instituídos pelo ministério da saúde, preconizados no manual técnico de pré-natal e puerpério, existe uma carência na formação profissional quanto a estratégias para detecção precoce da patologia em questão, associado a ausência no manual sobre como oferecer orientações de forma sistematizada e aplicável na rotina clínica. Além disso, as consultas previstas no período gestacional estão focadas na saúde física, de forma a deixar em segundo plano questões mentais. Por fim, a maioria das gestantes desconhecem os meios de rastreio da DPP e não se sentem confortáveis para conversar sobre a saúde mental (MEIRA et al., 2015).

Dessa forma, este estudo tem como objetivo analisar os possíveis fatores de risco associados ao desenvolvimento da depressão pós-parto e as ações exitosas da atenção primária na mitigação do distúrbio.

Metodologia

O presente estudo trata-se de uma revisão sistemática da literatura de caráter descritivo com abordagem qualitativa, conduzida de acordo com o Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses (PRISMA). A coleta de dados será baseada em artigos da plataforma digital LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciência da Saúde), em razão de sua abrangência expressiva na América Latina, e PubMed (Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos), durante o mês de abril de 2023.

Como critérios para busca, foram usados os operadores booleanos OR e AND e dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e Medical Subject Headings (Mesh): (depressão pós-parto OR postpartum depression) AND (atenção primária à saúde OR primary health care) AND (fator de risco OR risk factor). De maneira semelhante, em ambas bases de dados, as buscas foram delimitadas por idioma português e inglês, período entre os anos de 2017 a 2022, textos completos e com acesso aberto. Ainda, como critérios de inclusão, foram selecionados somente estudos primários e com temática voltada à patologia em questão, à saúde física e psicológica da mulher, aos fatores de risco e relacionados ao período pré-natal, gestacional e puerpério. Por fim, a pergunta formulada para este estudo surgiu a partir do emprego da estratégia PICO, sendo: P – paciente (mulheres que tiveram filhos recentemente); I – intervenção (fatores de risco para depressão pós-parto); C – comparação (intervenção padrão); O – outcomes (mitigação da DPP através da atenção primária à saúde).

Não houve critério de inclusão considerando o aspecto regional, visto que o objetivo do estudo é analisar e descrever de forma ampla as características da vulnerabilidade no período puerperal, levando em consideração a relevância temática em todas as regiões. Dentre os estudos selecionados, a maioria utilizou a Escala de Depressão Pós-parto de Edinburgh (EPDS) para o diagnóstico da patologia.

Resultados

Conforme a metodologia adotada, foram encontrados 329 artigos nas bases de dados, sendo 44 artigos na LILACS e 285 na PubMed, na primeira busca. Após a utilização dos filtros, ano de publicação, língua e exclusão de duplicatas, 86 artigos foram eleitos para leitura preliminar de título e resumo, e, conforme nova seleção, 41 artigos foram excluídos por não apresentarem correlação com a temática ou estarem incompletos. Por fim, 19 artigos foram selecionados após leitura na íntegra do texto completo, consoante à Figura 1.

Figura 1. Fluxograma de seleção de artigos para o estudo

Fonte: Elaborado pelas autoras, 2023.

            Dos fatores de risco identificados, os que apresentaram maior prevalência foram idade materna jovem (ADEYEMO et al., 2020; AMIT et al., 2021; LEAHY- WARREN et al., 2020; MOKWENA, KEBOGILE E PERPETUA, 2022; OZTORA et al., 2019; ROUMIEH et al., 2019; SILVA et al., 2022), falta de apoio familiar/cônjuge (ADEYEMO et al., 2020; DELL’OSBEL, GREGOLETTO, CREMONESE, 2019; GEBREGZIABHER et al., 2020; JOSHI et al., 2019; LEAHY-WARREN et al., 2020; MOKWENA, KEBOGILE, PERPETUA, 2022; OGBO et al., 2019), diagnóstico prévio de alguma doença psíquica (AMIT et al., 2021; DA SILVA et al., 2020; JOHANSEN et al., 2019; LEAHY-WARREN et al., 2020; ROUMIEH et al., 2019; ROYSTED-SOLAS et al., 2022; SILVA et al., 2022), e com menor frequência, foram associados, violência por parceiro íntimo, seja física ou psicológica (ADEYEMO et al., 2020; BITEW et at., 2019; OGBO et al., 2019; XAYYABOUAPHA et al., 2022), renda familiar baixa (ADEYEMO et al., 2020; GEBREGZIABHER et al., 2020; OZTORA et al., 2019), seguidos por outros fatores como eventos estressantes, gravidez não planejada, como pode ser analisado na Tabela 1.

Tabela 1. Relação dos fatores de risco e possíveis iniciativas para mitigação da Depressão Pós-Parto.

(continua)

AutorAnoFatores de risco e intervenções
Adeyemo et al.2020Idade jovem, falta de apoio no cuidado com o bebê e de si, falta de finanças, violência doméstica, não amamentação, presença de blues pós-parto, multiparidade foram indicados como fatores de risco. A necessidade de instituir métodos simples de triagem, assim como a importância de instituir sistemas sociais que ofereçam apoio às mulheres gestantes e puérperas como forma de iniciativas para redução
Amit et al.2021A prevalência de DPP na coorte analisada foi de 13,4%. Tabagismo, IMC mais alto e menor quantil de índice de privação aumentaram o risco para DPP. A previsão de risco usando dados de EHR pode fornecer uma ferramenta quantitativa e objetiva complementar para a triagem, permitindo uma identificação mais precoce (pré-gravidez) e mais precisa de mulheres em risco, intervenções oportunas e resultados potencialmente melhores para a mãe e a criança
Bitew et al.2019Daquelas mulheres com sintomas depressivos pré-natais elevados, 138 (38,8%) persistiram no período pós-natal. Em mulheres com sintomas depressivos pré-natais baixos, 136 (15,4%) desenvolveram novos sintomas depressivos elevados (casos incidentes) durante o período pós-natal. A prevalência de sintomas depressivos pós-parto foi de 22,1% (combinando casos incidentes e persistentes), indicando que sintomatologia pré-natal seja fator de risco para desenvolver DPP
Da Silva et al.2020Depressão e ansiedade pré-natal, principalmente no segundo trimestre como fator de risco para DPP, de importância a identificação precoce e abordagem de equipe multidisciplinar para enfrentamento e instituição de tratamento individualizado
Dell’Osbel, Gregoletto, Cremonese2019Correlacionou a DPP a não ter apoio de cônjuge, ou seja, ao estado civil, e histórico de aborto. Não houve registro de iniciativas de redução da depressão pós-parto, apenas a necessidade de identificação precoce
Deng et al. 2021A incidência de DPP foi menor em parturientes com analgesia neuroaxial do que naquelas sem
Gebregziabher et al.2020Ocupação da mãe, situação econômica, não ter apoio do parceiro, gravidez não planejada, doença física materna após o parto, local onde a mãe reside foram apontados como fatores de risco. A principal intervenção apontada é a realização de triagem ativa para DPP nas unidades de saúde como parte dos cuidados pós-parto
Hameed et al.2022  A deficiência de ferro é apontada como um fator de risco. É importante acompanhar o consumo alimentar das mães durante a gestação e no período puerperal. Além disso, as gestantes precisam ser instruídas a procurarem atendimento especializado assim que perceberem modificações significativas de humor
Johansen et al.2020Diagnóstico prévio de transtorno psiquiátrico (depressão, ansiedade, transtorno bipolar, TOC, TEPT, transtorno alimentar) como fator de risco. Apresentou como necessidade pesquisa de diagnósticos prévios e acompanhamento cuidadoso durante o período perinatal
Koric et al.2021A síndrome clínica dos ovários policísticos foi associada a uma razão de prevalência ajustada 1,76 maior para humor deprimido pós-parto ou anedonia após levar em consideração idade, índice de massa corporal pré-gravidez, raça/etnia, educação e estado civil
Leahy-Warren et al.2020A prevalência de depressão pós-parto foi de 37,9%. Em análises univariadas, história de depressão, idade de 20-34 anos, sem apoio social formal, menos apoio social informal, menor apego materno geral e menor suporte social funcional geral foram significativamente associados a um maior nível de sintomas depressivos
Mokwena, Kebogile, e Perpetua Modjadji2022Como fatores de risco são apontados a idade jovem da mãe, falta de apoio do parceiro, gravidez não planejada, não ter rede de apoio, alcoolismo do cônjuge e ocorrência de eventos estressantes no período. A necessidade de triagem de rotina para diagnosticar precocemente e usar intervenções bem direcionadas para o público que está sendo tratado, considerando, inclusive, o cenário que essas mulheres estão inseridas, sendo zona urbana ou rural, são apontadas como iniciativas para redução
Ogbo et al.2019Falta de apoio do parceiro, violência física ou psicológica provocada pelo parceiro e história materna de abuso na infância favorecem a ocorrência de DPP. O estudo aponta que a triagem antecipada e o encaminhamento correto se os sinais e sintomas forem percebidos são meios para redução da problemática
Öztora et al.2019Como fatores de risco instituiu que mães mais jovens, problemas econômicos (menor renda, parceiro desempregado), não amamentação e criança com problemas de saúde, têm maior chance de DPP. Identificação precoce e treinamento e informação aos pais, para as alterações emocionais no pós-parto, assim como a equipe de atendimento foram as conclusões do estudo para diminuição
Roumieh et al.2019Idade jovem da mãe, menor escolaridade, algum problema de saúde mental, atendimento pré-natal inadequado e exposição a estressores da vida foram associados como fatores de risco para DPP. Como iniciativa de mitigação, foram indicados cuidados pré-natais adequados e assistenciais
Røysted-Solås et al.2022Foi associado aos seguintes fatores de risco: história anterior de doença mental, alta idade materna, excesso de peso, hipertensão e óbito neonatal. Uma em cada cinco mulheres relatou pensamentos de automutilação. Como iniciativas, elencou a necessidade de diagnóstico utilizando o EPDS e encaminhamento para especialistas
Silva et al. 2022Paridade (≥2) foi associada a transtornos mentais comuns, enquanto baixa escolaridade foi associada a sintomas depressivos no pós-parto. Mulheres com transtorno mental comum durante a gravidez tiveram 5,6 vezes mais chance de desenvolver sintomas depressivos pós-parto
Tanuma-Takahashi et al. 2022O estudo não apresenta fatores de risco. O seu objetivo é informar que a triagem para DPP, realizada por meio da Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo, é melhor aplicada no segundo trimestre. Sendo um corte de 4/5 sinal de alerta e, quando ≥ 5, é necessário acompanhamento mais elaborado
Xayabouapha et al. 2022A prevalência de sintomas depressivos pós-parto entre as participantes foi de 21,3%. Os fatores associados foram ter pelo menos 2–3 filhos vivos, problemas de saúde mental durante a gravidez, conflitos com familiares, a experiência de violência por parceiro íntimo e receber apoio social moderado
Fonte: Elaborada pelas autoras, 2023.

Discussão

Perante os resultados dos artigos selecionados, há a identificação de fatores de risco comuns entre as pesquisas. Verificou-se grande associação entre fatores de saúde e demográficos como idade materna, renda familiar, rede de apoio, índice de violência, transtornos relacionados à saúde mental.

A idade materna mais jovem foi mencionada como fator de risco por Adeyemo et al., (2020); Amit et al., (2021); Mokwena, Kebogile e Perpetua, (2022); Oztora et al., (2019) e Roumieh et al., (2019). Silva et al. (2022), demonstra em seu estudo que mães com idade menor ou igual a 19 anos tiveram maior incidência (13,6%) de transtornos mentais comuns na gravidez. Outro apontamento foi que mulheres com faixas etárias de 20 a 29 anos e 30 a 34 tiveram um nível significativamente maior de sintomas depressivos em comparação com mulheres de 35 a 39 anos (LEAHY-WARREN et al., 2020). Em contrapartida a essas informações, Roysted-solås et al. (2022), constataram, em seu estudo, que as mães de 30 a 39 anos tiveram o dobro do risco de escore EPDS 9 ou mais comparado com aquelas de 20 a 29 anos, tanto para mães primíparas quanto para mães multíparas.

A renda mensal familiar teve relação significativa, bem como ter filhos não saudáveis e não poder amamentar regularmente (OZTORA, et al., 2019). Roumieh et el. (2019), indicam a associação de fatores demográficos como a menor idade ao casar e gestar, menor escolaridade, fatores relacionados à gravidez como atendimento pré-natal inadequado, exposição a estressores, problema de saúde mental e recém-nascido com problemas de saúde, à DPP.

O estudo realizado por Adeyemo et al. (2020), correlacionou preditores psicossociais e obstétricos como elementos facilitadores para DPP como ter tristeza pós-parto relatado em mais de 50% das entrevistadas, não conseguir ajuda para cuidar do bebê e de si, em cerca de 38,1%, falta de finanças em aproximadamente 30,4%, sofrer violência e ter parceiro que não apoia como preditores para DPP, implicando que essas que sofreram violência de seus parceiros tinham mais chances comparado com as que não sofreram. Outros fatores como multiparidade, não amamentar exclusivamente o bebê também apareceram, mas ao realizar uma retrospectiva não foram declarados como os principais fatores do estudo.

Neste sentido, a violência, seja física ou psicológica, também é apontada como fator de risco em outros estudos (ADEYEMO et al., 2020; BITEW et at., 2019; OGBO et al., 2019; XAYYABOUAPHA et al., 2022), devendo este é um assunto que deve ser abordado e identificado nos encontros pré e pós-natais pela equipe da Atenção Primária, através de uma relação de confiança entre a equipe e paciente, uma vez que há o medo e desconforto em relatar tais situações, desta forma, a importância de uma equipe treinada e preparada para oferecer apoio e diagnosticar de maneira antecipada situações que são propensas à DPP.

Para demonstrar a realidade do cenário nacional, em um estudo brasileiro, realizado na cidade de Cruzeiro do Sul, Acre, os achados para maior prevalência de sintomas depressivos foram em mulheres de famílias com menor índice de riqueza, chefes de família, mais jovens, menor escolaridade (ter menos de 12 anos de estudo aumentou em mais de três vezes as chances de depressão pós-parto), paridade ≥ 2, gestantes com anemia na primeira avaliação, sintomas depressivos prévios (5,6 vezes mais chances de apresentar sintomas depressivos pós-parto) e aquelas que fizeram uso de álcool durante a gravidez (SILVA et al., 2022).

O medo materno de não suprir de maneira eficiente as expectativas quanto a gerar uma nova vida e criar um novo ser humano podem ser relacionadas aos fatores quanto a renda familiar, idade materna precoce. Foi destacada grande preocupação materna quanto a falta de recursos e serem muito jovens, assim como de seus parceiros ao não oferecerem apoio, o que gera angústia e a depender do percurso, sintomas depressivos (DELL’OSBEL; GREGOLETTO; CREMONESE, 2019).

Houve associação de maior probabilidade de sintomas depressivos no período gestacional, podendo ter repercussão negativa na gestação e no pós-parto à mulheres que não tinham parceiros (54%), ou seja, que tinham estado civil solteira, divorciada ou separadas, identificando a falta de apoio, quando ser comparadas as casadas ou em união estável, assim como histórico de aborto (72%), tabagismo antes do período gestacional e hábito de consumo de bebida alcóolica, transtorno alimentar e compulsão alimentar apresentaram 2 vezes mais possibilidade de desenvolvimento dos sintomas depressivos (DELL’OSBEL; GREGOLETTO; CREMONESE, 2019).

Outro fator de risco comum foi a multiparidade. Adeyemo et al. (2020), associou ter mais de 5 filhos à DPP em fatores obstétricos e relacionados à criança. Já Silva et al. (2022), relatou que paridade igual ou maior que 2 estava relacionada a uma maior frequência de transtornos mentais comuns, principalmente DPP. Da mesma forma, Xayabouapha et al. (2022), correlacionou mães que tiveram 2–3 filhos vivos aos sintomas depressivos.

De acordo com Bitew et al. (2019), entre as mulheres que já apresentavam sintomas depressivos no pré-natal, 38,8% da amostra persistiram no período pós-natal, já naquelas com sintomas depressivos pré-natais baixos, apenas 15,4% apresentaram aumento desses sintomas pós-parto. Dessa forma, nesse estudo em questão foi analisado que a DPP está melhor relacionada com casos persistentes, indicando ser um fator de risco. O estudo de Johansen et al. (2020), corroboram com a ideia de que diagnósticos anteriores de doenças psíquicas são indicadores de prevalência de depressão pós-parto. O mesmo evidenciou que mulheres com qualquer histórico anterior de diagnóstico de doença psíquica como Transtornos de Ansiedade, Depressão Maior, Transtorno Bipolar, representou 53,6% dos casos de DPP. Roysted-Solar et al. (2022) também aponta a relação de histórico anterior de doença mental, e de mesmo modo, excesso de peso, hipertensão e morte neonatal.

Além disso, Koric et al. (2021) em estudo com mães de alto risco, apontaram maior incidência de depressão pós-parto em mulheres com clínica de síndrome do ovário policístico pré-gestacional, com associação a uma razão de prevalência 1,76 maior para anedonia ou humor deprimido. Um fator importante constatado ainda nesse artigo citado anteriormente, com implicação clínica, é que quase 20% das mulheres que relataram pelo menos 2 sintomas da síndrome do ovário policístico não tinham o diagnóstico prévio, o qual compromete a associação entre as duas patologias e negligencia a investigação para depressão pós parto, sabendo da relação entre elas e sua maior prevalência para esse grupo.

Outro fator de risco que foi identificado na análise foi a deficiência de ferro. Conforme Hameed et al. (2022), o nível de ferritina em mães com DPP é inferior quando comparado com mães sem o diagnóstico. Segundo o estudo, o estado puerperal influência na alimentação materna, ocorrendo negligência dessa área, fazendo com que as mulheres não mantenham uma alimentação que forneça todos os nutrientes que são necessários. Ademais, também é relacionado a alimentação com fatores sociais, ou seja, a vulnerabilidade social prejudica a nutrição correta. Dessa forma, o puerpério torna-se um período em que há maior chance da deficiência de ferro, que é um fator de risco apontado no estudo analisado.

Quanto às formas para diagnóstico precoce, segundo Tanuma-Takahashi et al. (2022), o rastreio da DPP por meio da pontuação Escala de Depressão Pós-parto de Edimburgo (EDPS), mostra-se vantajosa se realizada no segundo trimestre de gravidez, ou seja, durante o acompanhamento pré-natal. O estudo apresenta que mulheres que pontuam um valor maior ou igual a 5 já devem receber atenção mais direcionada e serem acompanhadas de forma mais específica.

Entretanto, quanto aos achados relacionados a iniciativas para mitigação da depressão pós-parto, não houve resultados satisfatórios, visto que os apontamentos obtidos foram a necessidade de identificação precoce com base nos fatores de risco identificados, porém, sem determinar instrumentos com eficácia. Há uma lacuna quanto ao que deve ser feito de modo a diminuir a incidência de DPP, somente a perspectiva de cuidado após a sua instalação foi relatado, no qual houve indicações de atendimento especializado e acompanhamento (HAMEED et al., 2022; JOHANSEN, et al., 2020; OGBO et al., 2019; ROYSTED-SOLAS et al., 2022).

Com relação às formas de intervenção que podem ser adotadas no atendimento fornecido pela Atenção Primária, a maioria dos estudos analisados relataram a importância do diagnóstico precoce (AMIT et al. 2021; DA SILVA et al. 2020; DELL’OSBEL, GREGOLETTO, CREMONESE, 2019; JOHANSEN et al., 2020; LEAHY-WARREN et al., 2020; MOKWENA, KEBOGILE, PERPETUA, 2022; OGBO et al., 2019; OZTORA et al. 2019; SILVA et al. 2022; TANUMA-TAKAHASHI et al. 2022), já que há uma prevalência maior de depressão pós-parto em mulheres que já apresentavam sintomas depressivos ainda no período de gestação, sendo assim uma continuação da patologia, e por isso, identificável nas consultas pré-natais em alguns casos, através de abordagens multidisciplinares, acompanhamento efetivo e questionários aplicados como a Escala de Depressão Pós-parto de Edimburgo (EPDS).

De maneira diferente, alguns estudos analisados apontaram outras alternativas para auxiliar no diagnóstico, como Bitew et al. (2019) que fizeram uso do Questionário de Saúde do Paciente (PHQ-9), o qual compreende nove questões sobre sintomas depressivos com base nos critérios diagnósticos propostos pelo DSM IV. Outra opção que contribui para o diagnóstico precoce de DPP, foi apontada por Amit et al. (2021), que identificaram a eficiência do uso de registros eletrônicos de saúde, por modelos de aprendizado de máquina, possibilitando assim, a estimativa de risco durante a gravidez e período pós-natal, em conjunto ao EPDS. Por fim, dentre os poucos estudos brasileiros disponíveis, o uso do Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20), reconhecido em 1986 por Mari e Williams, composto por 20 questões, o qual avalia os transtornos mentais comuns (TMC), também foi aplicável e teve bons resultados para rastreamento (SILVA et al., 2022).

Ainda como forma de reduzir os índices de DPP, é apontado o uso da analgesia neuroaxial, visto que, em um dos estudos, identificaram menor probabilidade de desenvolver o transtorno, em 6 semanas, em mulheres que receberam analgesia neuroaxial do que aquelas do grupo controle, observando diminuição da dor intensa no momento do parto e dessa forma, contribuindo para que a experiência do parto pudesse ser mais vivenciada ao retirar o fator estressante dor (DENG et al., 2021).

Por fim, segundo Tanuma-Takahashi et al. (2022), o melhor momento para a realização da triagem por meio da escala EPDS, é no segundo trimestre de gestação. Da Silva et al. (2020), também identificaram a necessidade de triagem no período do segundo trimestre, visto que 49,3% e 29,5% das gestantes tinham mais chances de desenvolver ansiedade e depressão respectivamente, corroborando a ideia de instituir o diagnóstico precoce, e, sendo utilizado o chamado “Cartão Babel de Saúde Mental na Atenção Básica”, na cidade de Olinda, em Pernambuco, que se assemelha ao EPDS, sendo um instrumento validado, que permite triagem de transtornos de humor, transtornos ansiosos, avaliação de risco de suicídio, das funções cognitivas, do uso nocivo de álcool e tabaco.

Conclusão

            O estudo demonstra como a Depressão Pós-Parto afeta de forma negativa, a experiência materna, familiar e de pessoas próximas envolvidas e o estabelecimento do vínculo entre a mãe e a criança. É uma doença diretamente relacionada com alguns fatores como a situação econômica da mãe, a idade que ela engravida (sendo jovens mais vulneráveis), a maternidade solo, diagnóstico prévio de doença psíquica, falta de rede de apoio durante o período puerperal, vivência de violência psíquica e física provocada pelo parceiro e gravidez não planejada.

Ademais, verificou-se a necessidade de promover mais estudos no âmbito nacional voltados ao assunto depressão pós-parto, visto que pouco foi encontrado sobre a realidade brasileira, embora a maioria dos fatores de riscos seja comum quando comparados às diferentes nacionalidades. Além disso, existe uma lacuna em relação à formação dos profissionais da atenção primária, gerando deficiência no diagnóstico precoce, aliado à falta de estratégias ou técnicas com pouca aplicabilidade para abordar a patologia em questão.

Dessa forma, a Atenção Básica precisa fornecer uma equipe profissional especializada para acompanhar as gestantes durante todo o período pré-natal que auxiliem não só na parte física, mas também analisem os aspectos psicológicos. Conhecer os fatores de risco faz a equipe ficar em alerta e proporciona diagnósticos mais precoces e intervenções que sejam eficientes para a realidade vivenciada pela paciente.

 Nosso estudo teve algumas limitações, visto que se trata de uma revisão de literatura e poucos artigos que abordaram a temática foram encontrados. Especialmente para a realidade brasileira, a carência de fontes impossibilitou um comparativo fundamentado entre os estados nacionais, para correlacionar fatores de risco mais incidentes e, a partir disso, promover medidas preventivas e instrumentos para diagnóstico voltados especificamente a eles, os quais sejam aplicáveis para a realidade da atenção primária nacional.

Sendo assim, é importante que sejam realizados novos estudos que insiram e analisem métodos práticos para a redução da DPP e estudos que analisem o cenário nacional, considerando os fatores de risco que mais afetam as famílias brasileiras e como a atenção primária deve atuar frente ao impasse.

REFERÊNCIAS

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1Graduanda de Bacharelado em Medicina, UNNESA

2Mestre em Enfermagem, UERJ, eduardoppaschoal@gmail.com, http://lattes.cnpq.br/7783045078204870