CUIDAR E APRENDER: CULTURA XERENTE – PROMOÇÃO DA SAÚDE E EDUCAÇÃO EM COMUNIDADES INDÍGENAS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102501141048


Marco Antonio Lima Gomes1
Kélita Souza Silva2
Ana Paula Pereira Da Silva3
Anny Beatriz Rodrigues e Silva4
Vitória Pereira Miranda5
Léia Virgínia Nascimento Nogueira 6
Caroline lustosa da silva7
Andressa Ramos de Sousa8
Andressa Silva Rodrigues9
Adael Sergio Monteiro10
Marcelo Moraes dos Santos 11


RESUMO- Este artigo apresenta os resultados do Projeto “Cuidar e Aprender: Cultura Xerente”, desenvolvido na Aldeia Porteira, localizada no município de Tocantínia, no estado do Tocantins. O projeto foi idealizado como uma iniciativa voltada à promoção da saúde e à educação comunitária, com foco na valorização cultural e no fortalecimento do protagonismo feminino dentro da comunidade indígena. A proposta surgiu da necessidade de enfrentar e mitigar as barreiras culturais que dificultam o acesso das mulheres indígenas aos serviços de saúde, evidenciando os impactos do preconceito de gênero e da vulnerabilidade social na comunidade. As atividades realizadas no âmbito do projeto incluíram ações educativas e oficinas temáticas que abordaram tópicos como saúde infantil, saúde da mulher e do homem, criando um espaço de diálogo para a troca de saberes entre os conhecimentos tradicionais e a ciência contemporânea. A abordagem metodológica foi fundamentada em pesquisa qualitativa, utilizando técnicas como observação participante, entrevistas semiestruturadas e registros fotográficos para coleta de dados, assegurando o respeito às tradições e valores culturais do povo Xerente.Entre os principais resultados esperados do projeto destacam-se o aumento do conhecimento da comunidade sobre a prevenção de doenças, o fortalecimento das redes de apoio locais e a promoção da equidade de gênero dentro da aldeia. Esses resultados refletem o compromisso em promover mudanças sociais que respeitem as particularidades culturais e favoreçam a autonomia das mulheres indígenas na tomada de decisões relacionadas à saúde. Além disso, o projeto busca criar uma ponte entre os saberes tradicionais e a medicina contemporânea, contribuindo para uma assistência mais inclusiva e eficaz. Dessa forma, o “Cuidar e Aprender: Cultura Xerente” consolida-se como uma iniciativa inovadora e necessária, alinhada às necessidades e demandas da comunidade indígena local.

PALAVRAS-CHAVE: Cultura. Indígena. Saúde. Educação.

1    INTRODUÇÃO

A saúde das populações indígenas no Brasil apresenta desafios significativos, relacionados à vulnerabilidade social, dificuldades no acesso aos serviços e, principalmente, às barreiras culturais e linguísticas (BRASIL, 2018). Esses fatores dificultam a implementação de políticas públicas eficazes, especialmente em comunidades que mantêm costumes e tradições profundamente enraizados.

A comunidade Xerente, localizada em Tocantínia, Tocantins, é marcada por uma organização social baseada em princípios patriarcais, nos quais os homens possuem papel central na tomada de decisões, inclusive sobre o acesso das mulheres aos serviços de saúde (CUNHA, 2019). Esse contexto impõe barreiras ao atendimento médico, impactando diretamente a saúde da mulher, da criança e do homem, e perpetuando ciclos de desinformação e negligência.

Nesse cenário, o Projeto “Cuidar e Aprender: Cultura Xerente” foi desenvolvido como uma proposta para promover ações de educação em saúde que respeitem e valorizem as tradições culturais, incentivando a participação ativa da comunidade. As palestras e oficinas foram planejadas para abordar temas como saúde infantil, saúde da mulher e saúde do homem, promovendo o empoderamento feminino e a conscientização coletiva sobre prevenção e bem-estar.

O artigo descreve o desenvolvimento do projeto, as metodologias aplicadas e os resultados esperados, destacando sua contribuição para a inclusão social e o fortalecimento do diálogo intercultural.

2.  JUSTIFICATIVA

A proposta do projeto surge da necessidade de enfrentar as desigualdades de gênero e as barreiras culturais que limitam o acesso à saúde na comunidade Xerente.

Estudos apontam que mulheres indígenas enfrentam dificuldades no atendimento devido ao controle social exercido pelos homens, o que restringe sua autonomia e capacidade de tomar decisões sobre sua saúde (SANTOS & LIMA, 2020).

Além disso, há uma lacuna na assistência à saúde infantil e masculina, refletindo a ausência de informações sobre cuidados preventivos e hábitos saudáveis. A necessidade de sensibilizar a população sobre a importância do cuidado contínuo levou à construção de um projeto que integrasse saberes científicos e tradicionais, promovendo o diálogo intercultural e fortalecendo o papel das lideranças comunitárias.

O projeto também se justifica por sua contribuição ao cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, especialmente no que tange à promoção da saúde e bem-estar (ODS 3) e à igualdade de gênero (ODS 5).

3.  OBJETIVOS

O projeto tem como objetivo geral promover ações de educação em saúde na aldeia Porteira, com foco em saúde infantil, feminina e masculina, de forma culturalmente sensível. A iniciativa busca respeitar os valores e tradições da etnia Xerente, promovendo o protagonismo comunitário na adoção de práticas que melhorem a qualidade de vida da população local. Essa abordagem visa não apenas informar, mas também empoderar a comunidade no cuidado com sua saúde.

Um dos objetivos específicos é identificar as principais demandas de saúde da aldeia. Essa etapa inicial é essencial para compreender as necessidades mais urgentes da comunidade e garantir que as ações educativas sejam direcionadas às áreas de maior relevância. A identificação será feita por meio de diagnósticos situacionais, entrevistas e observação participante, valorizando a escuta ativa e o diálogo com os moradores e lideranças locais.

Além disso, o projeto prevê a realização de palestras educativas sobre temas fundamentais, como cuidados com a saúde infantil, saúde sexual e reprodutiva da mulher e prevenção de doenças em homens. Essas atividades têm o intuito de proporcionar conhecimento prático e acessível, adaptado ao contexto cultural da aldeia. Ao abordar temas relevantes para diferentes públicos, as ações visam alcançar toda a comunidade, promovendo maior engajamento.

Outro aspecto importante do projeto é a criação de espaços de diálogo entre profissionais de saúde e a população indígena. Esses momentos serão fundamentais para fortalecer a confiança mútua e quebrar barreiras culturais que dificultam o acesso aos serviços de saúde. A troca de saberes, integrando conhecimentos tradicionais e científicos, será incentivada, garantindo maior efetividade nas intervenções propostas.

Por fim, a produção de materiais didáticos bilíngues, em português e na língua Akwẽ Xerente, será um diferencial do projeto. Esses recursos facilitarão a compreensão dos temas abordados e poderão ser utilizados como ferramentas permanentes de aprendizado e consulta. Além disso, o impacto das intervenções será avaliado por meio de instrumentos de monitoramento e feedback, permitindo ajustes e a ampliação dos resultados positivos para a comunidade.

4.  METODOLOGIA

A metodologia adotada no projeto foi desenvolvida para garantir uma abordagem sensível às especificidades culturais e sociais da comunidade indígena da Aldeia Porteira, pertencente à etnia Xerente. Para isso, utilizou-se uma combinação de métodos qualitativos e descritivos, com base em técnicas de observação participante, entrevistas semiestruturadas e dinâmicas participativas. Essa estratégia permitiu uma compreensão mais aprofundada das necessidades e desafios enfrentados pela comunidade, bem como a construção de ações educativas adaptadas ao contexto local.

Etapas da Metodologia

A primeira etapa consistiu na realização de visitas à aldeia para estabelecer um contato inicial e construir vínculos de confiança com a comunidade. Essas visitas incluíram encontros com lideranças indígenas, agentes de saúde locais e moradores da aldeia, utilizando a escuta ativa como ferramenta principal. Entrevistas semiestruturadas foram conduzidas para identificar as prioridades e necessidades específicas da comunidade em relação à saúde infantil, saúde da mulher e saúde do homem. Foram registradas as percepções dos participantes sobre barreiras culturais no acesso à saúde e a importância de respeitar os valores tradicionais da etnia Xerente.

Com base nas informações coletadas na etapa de diagnóstico, foi elaborado um plano de ações educativas estruturadas em temas relevantes, incluindo:

  • Saúde Infantil: Nutrição, vacinação, higiene e prevenção de doenças comuns.
  • Saúde da Mulher: Saúde sexual e reprodutiva, cuidados pré-natais, parto e pós- parto.
  • Saúde do Homem: Prevenção de doenças cardiovasculares, câncer de próstata e promoção de hábitos saudáveis.

Materiais educativos, como folhetos e cartilhas bilíngues (em português e na língua indígena Xerente), foram criados em parceria com Maurício da Silva Castro, tradutor e membro da comunidade, para garantir que os conteúdos estivessem culturalmente adequados e acessíveis.

As ações foram implementadas por meio de oficinas práticas, dinâmicas de grupo e palestras interativas. As oficinas enfatizaram práticas de higiene, prevenção de doenças e autocuidado, promovendo a troca de saberes entre os conhecimentos tradicionais e a ciência contemporânea. A metodologia participativa buscou incentivar o envolvimento ativo da comunidade, promovendo o protagonismo dos indígenas na construção e disseminação do conhecimento.

O impacto das intervenções foi monitorado por meio de questionários aplicados antes e depois das ações educativas, avaliando o conhecimento adquirido pelos participantes. Adicionalmente, foi utilizado um diário de campo para registrar relatos

orais, observações durante as atividades e reflexões das equipes de saúde e educação. Esses dados qualitativos foram analisados de forma detalhada, possibilitando identificar avanços, desafios e oportunidades para futuras intervenções.

O projeto envolveu mulheres, homens e crianças indígenas da Aldeia Porteira, bem como profissionais de saúde, educadores e tradutores. Essa colaboração interdisciplinar garantiu a execução das ações educativas de forma eficiente e respeitosa, fortalecendo as redes de apoio comunitário e promovendo a equidade de gênero e saúde na comunidade.

A abordagem descrita reflete um compromisso com a ética, a inclusão e o respeito à diversidade cultural, alinhando-se às diretrizes de pesquisa com populações vulneráveis e populações indígenas no Brasil.

5.  RESULTADOS ESPERADOS

O projeto tem como principal expectativa ampliar o conhecimento da comunidade sobre saúde preventiva, abrangendo mulheres, homens e crianças da aldeia Porteira. Essa iniciativa busca informar a população sobre práticas de higiene, vacinação, cuidados com a alimentação e prevenção de doenças, promovendo uma conscientização que possa ser incorporada ao cotidiano da comunidade. O objetivo é não apenas transmitir informações, mas também estimular a adoção de hábitos saudáveis, com impacto direto na melhoria da qualidade de vida.

Além disso, o fortalecimento do protagonismo feminino é um dos pilares do projeto. Ao incentivar as mulheres a buscarem atendimento médico e participarem ativamente das decisões relacionadas à saúde, espera-se promover maior autonomia e empoderamento dentro da comunidade. Essa estratégia contribui para romper com padrões culturais que muitas vezes restringem o papel da mulher, incentivando sua participação em processos que impactam diretamente sua saúde e bem-estar.

Outro resultado esperado é a redução das barreiras culturais que dificultam o acesso da população indígena aos serviços de saúde. Essas barreiras podem incluir desde preconceitos e desinformação até desconfiança em relação aos profissionais de saúde e suas práticas. O projeto busca criar um ambiente de diálogo e compreensão mútua, valorizando a cultura local e integrando-a às práticas de saúde contemporâneas, tornando os serviços mais acolhedores e eficazes.

A melhoria na comunicação entre profissionais de saúde e a população indígena é outro aspecto central do projeto. Por meio da sensibilização e capacitação dos profissionais, e da criação de materiais educativos bilíngues e culturalmente adaptados, espera-se facilitar o entendimento e a troca de informações, promovendo um atendimento mais humanizado e eficiente.

Por fim, a produção de materiais educativos adaptados à cultura Xerente se apresenta como um legado do projeto. Esses materiais, além de facilitar o diálogo entre profissionais de saúde e a comunidade, servirão como recursos permanentes de consulta e aprendizado, contribuindo para a sustentabilidade das ações educativas e para a perpetuação do respeito aos valores culturais locais.

6.  DISCUSSÃO

A experiência na aldeia Porteira revelou, de maneira significativa, a importância de estratégias culturalmente sensíveis para a promoção da saúde e o fortalecimento da relação entre comunidades indígenas e profissionais de saúde (GARNER, 2018). A compreensão dos valores, crenças e práticas tradicionais desempenhou um papel central no planejamento e execução das ações, assegurando que elas fossem respeitosas e efetivamente incorporadas pela comunidade. Estudos anteriores destacaram que projetos de saúde e educação, quando alinhados às especificidades culturais e necessidades locais, apresentam maior potencial de aceitação, engajamento e impacto positivo (SOUZA et al., 2020).

As palestras realizadas no contexto do projeto foram mais do que momentos de transferência de conhecimento; elas se configuraram como espaços de diálogo aberto e horizontal, onde as mulheres, homens e líderes comunitários puderam compartilhar suas percepções, levantar dúvidas e sugerir melhorias nas práticas propostas. Essa troca de saberes, além de enriquecer o conteúdo apresentado, contribuiu para reforçar os laços de confiança entre a comunidade e os profissionais de saúde.

A abordagem colaborativa implementada foi essencial para garantir não apenas a aceitação das intervenções, mas também sua continuidade a longo prazo. Ao fortalecer a autonomia e o protagonismo da comunidade, o projeto buscou promover uma visão mais inclusiva e equitativa da saúde, incorporando elementos tradicionais ao mesmo tempo em que apresentava alternativas baseadas na ciência contemporânea. Essa metodologia destaca a relevância de unir ciência, cultura e sensibilidade social como pilares para a sustentabilidade das ações de promoção de saúde em contextos indígenas.

7.  CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Projeto “Cuidar e Aprender: Cultura Xerente” demonstrou de forma expressiva a relevância de ações educativas em saúde como uma poderosa ferramenta para a promoção da equidade e inclusão social em comunidades indígenas. As intervenções planejadas e executadas com sensibilidade cultural contribuíram significativamente para a redução das barreiras culturais que muitas vezes dificultam o acesso aos serviços de saúde. Além disso, essas ações foram essenciais para fortalecer a autonomia feminina, incentivando as mulheres da aldeia Porteira a assumirem um papel ativo em relação à sua saúde e bem-estar.

Outro impacto importante foi a ampliação do conhecimento comunitário sobre cuidados preventivos. A abordagem pedagógica utilizada nas palestras, oficinas práticas e materiais bilíngues possibilitou que as informações fossem acessíveis e culturalmente relevantes, promovendo a adoção de práticas de saúde mais seguras e

eficazes. Esse aprendizado não apenas beneficia diretamente a comunidade local, mas também tem o potencial de influenciar gerações futuras, consolidando uma base sólida para a melhoria contínua das condições de saúde.

A replicação dessa iniciativa em outras aldeias pode representar um marco para o desenvolvimento de políticas públicas de saúde mais inclusivas e eficazes. Ao servir como modelo de respeito à diversidade cultural e de promoção do diálogo entre os saberes tradicionais e científicos, o projeto “Cuidar e Aprender: Cultura Xerente” reforça a importância de estratégias que valorizem as especificidades de cada grupo. A implementação dessa metodologia em escala mais ampla pode fortalecer a integração entre comunidades indígenas e o sistema de saúde, promovendo uma sociedade mais justa, equitativa e plural.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. Brasília: Ministério da Saúde, 2018.

CUNHA, M. C. Cultura e Saúde Indígena no Brasil: Desafios e Perspectivas. São Paulo: Edusp, 2019.

GARNER, H. Educação Intercultural e Saúde em Comunidades Tradicionais. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2018.

MINAYO, M. C. S. O Desafio do Conhecimento: Pesquisa Qualitativa em Saúde. 14. ed. São Paulo: Hucitec, 2014.

SANTOS, A. L.; LIMA, R. F. Barreiras culturais no acesso à saúde: estudo de caso em comunidades indígenas. Revista Brasileira de Saúde Pública, v. 42, n. 3, p. 245-258, 2020.

SOUZA, P. A. et al. Promoção da saúde e práticas culturais: perspectivas para a saúde indígena. Revista de Saúde Coletiva, v. 25, n. 2, p. 302-318, 2020.


1 Professor do Centro Universitário UNITOP marcogllima@hotmail.com

2 Acadêmica de Enfermagem Centro Universitário UNITOP kelitasouza14@gmail.com

3 Acadêmica de Enfermagem Centro Universitário UNITOP aninha.paulasilva28@gmail.com

4 Acadêmica de Enfermagem Centro Universitário UNITOP annybrodrigues21@gmail.com

5 Acadêmica de Enfermagem Centro Universitário UNITOP mirandavitoria051@gmail.com

6 Acadêmica de Enfermagem Centro Universitário UNITOP
leiavirginia93@gmail.com

7 Acadêmica de Enfermagem Centro Universitário UNITOP Carolinelustosadasilva9@gmail.com

8 Acadêmica de Enfermagem Centro Universitário UNITOP andressaramosdesousa44465@gmail.com

9 Acadêmica de Enfermagem Centro Universitário UNITOP andressa125488@gmail.com

10 Acadêmico de Enfermagem Centro Universitário UNITOP adaelsergiom@gmail.com

11 Acadêmico de Fonoaudiologia UNIFATECIE
marcelomoraes0055@gmail.com