CUIDADOS DE QUALIDADE: OS MÚLTIPLOS BENEFÍCIOS DO ATENDIMENTO HOME CARE COM ÊNFASE NO PACIENTE ONCOLÓGICO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10537122


Daniele Sakalauska D. Trevisan1


O câncer é a segunda principal causa de morte global, representando uma em cada seis fatalidades, com 9,6 milhões de óbitos registrados em 20182. Cerca de 70% dessas mortes ocorrem em países de baixa e média renda. Aproximadamente 40% poderiam ser prevenidas com medidas de controle de fatores de risco3. A detecção precoce e tratamento correto têm potencial de cura em 30% dos casos, destacando a necessidade de conscientização e acesso a cuidados médicos eficientes4

O tratamento do câncer é complexo e envolve uma abordagem interprofissional e multidimensional5. O uso de ferramentas como estadiamento clínico e painéis genéticos aprimora diagnósticos e prognósticos. Modalidades terapêuticas, como quimioterapia, cirurgias, entre outras, são aplicadas, combinadas conforme a susceptibilidade do tumor6

No Brasil, o Estatuto da Pessoa com Câncer (Lei Nº 14.238, de 19 de novembro de 2021) foi promulgado com a finalidade de garantir acesso justo ao tratamento e resguardar os direitos fundamentais daqueles que lidam com a doença. Essa legislação define diretrizes e metas essenciais para proteger os direitos dos pacientes oncológicos, ao mesmo tempo em que orienta a implementação de políticas públicas direcionadas à prevenção e combate ao câncer7. No cenário global e brasileiro da saúde, destaca-se a importância da educação em saúde nas consultas não apenas para prevenir o câncer, mas também para abordar suas repercussões psicossociais5

Um dos atendimentos que um paciente oncológico pode receber é o home care, ou assistência domiciliar, que pode ser definido como a uma assistência personalizada e humanizada dedicada aos pacientes que necessitam de cuidados especiais e que, por algum motivo, não podem se deslocar para uma unidade de saúde8. Essa modalidade de atendimento surgiu como resposta recente para a necessidade de adaptar o modelo de atenção em saúde, levando vários países a considerá-lo como um ponto estratégico na prestação de cuidados à saúde, expandindo-a tanto no setor público quanto no privado7,9,10. Além disso, no Brasil, essa modalidade se integra à Rede de Atenção à Saúde e traz diversos benefícios e características como11. Para pacientes oncológicos os benefícios de tal atendimento são: 

● Conforto Residencial: Promoção de tratamentos e desospitalização no ambiente mais confortável para o paciente, geralmente em sua própria residência; 

● Assistência Individualizada: Fornecimento de cuidados personalizados, adaptados às necessidades específicas de cada paciente; 

● Humanização do Atendimento: Foco integral no paciente, visando uma atenção dedicada e compassiva por parte dos profissionais de saúde;

● Autonomia e Participação da Família: Capacidade de proporcionar independência ao paciente, envolvendo ativamente a família no processo de tratamento12

● Proximidade com a Rotina e Referências do Paciente: Oportunidade para o paciente manter sua rotina, hábitos e referências, contribuindo positivamente para sua recuperação; 

● Agilidade e Tomadas de Decisão: Respostas rápidas em situações de emergência, agilizando o processo de decisão para melhor atender às necessidades do paciente; 

● Acesso a Serviços Personalizados: Ampliação do acesso a serviços de saúde personalizados e adaptados às condições individuais do paciente;

● Otimização de Leitos Hospitalares: Redução da ocupação de leitos hospitalares, liberando esses recursos para pacientes com necessidades mais complexas; 

● Redução da Carga Horária nos Serviços de Urgência: Diminuição da pressão sobre os serviços de urgência, visto que a assistência domiciliar contribui para a prevenção de crises agudas. 
Além disso, a prestação desse serviço está vinculada à promoção da autonomia do profissional e ao bem-estar do paciente. 

● Autonomia Profissional: Profissionais de saúde capacitados para proporcionar independência aos pacientes, mantendo-os ativos, saudáveis e seguros13

● Redução da Sensação de Isolamento: Operação contínua do profissional de saúde junto ao paciente, 24 horas por dia, minimizando a sensação de isolamento e contribuindo para o bem-estar físico e mental do paciente. 

Pesquisadores apontam que além de proporcionar maior qualidade de vida para o paciente, o home care possui outros benefícios, tais como a redução dos custos hospitalares, o aumento da adesão ao tratamento e uma maior satisfação por parte dos pacientes e suas famílias14,15. Outros destacam a redução dos riscos de complicações de saúde relacionados ao ambiente hospitalar e enfatizam o caráter inovador e único do home care, sublinhando sua capacidade de proporcionar um cuidado centrado nas necessidades específicas do paciente no momento presente16,17

No âmbito do home care, os principais beneficiários são pacientes com doenças crônicas e elevada dependência para os cuidados da vida diária e de enfermagem, tais como pacientes oncológicos. Dentro desse modelo, uma variedade de serviços é oferecida, abrangendo áreas como fisioterapia, fonoaudiologia, nutrição e administração de medicamentos via endovenosa ou intramuscular, bem como monitoramento e atendimento médico e de enfermagem18. A diversidade desses serviços destaca a flexibilidade do home care em se adaptar às necessidades específicas de cada paciente, contribuindo para uma abordagem mais personalizada e eficaz no cuidado à saúde19

Os desafios vinculados à prestação deste serviço, estão relacionados à necessidade de aprimorar e propagar os cuidados de saúde. Para garantir o sucesso desse modelo, os sistemas de saúde precisam estar preparados, com uma variedade de profissionais capacitados e infraestrutura adequada para atender às demandas específicas do home care. Além disso, a conscientização pública sobre os benefícios do home care é crucial para sustentar o contínuo crescimento da demanda, consolidando-o como uma opção válida e inovadora. Isso garante que as necessidades dos pacientes sejam atendidas de maneira eficaz, promovendo um cuidado mais personalizado e centrado no paciente20

Outra barreira relacionada a essa modalidade de atendimento, consiste nos casos em que delega-se às famílias a responsabilidade pelo cuidado do paciente, sendo o cuidador informal responsável por atender às diversas demandas associadas ao adoecimento crônico21. O cuidado, que abrange tarefas como higiene, alimentação e mobilidade, pode ser intensivo e prolongado, levando os cuidadores familiares a enfrentar sobrecarga física e mental. Esta sobrecarga resulta do acúmulo de estressores, afetando a saúde, bem-estar e qualidade de vida desses cuidadores22

Diante dessa realidade, é crucial que os profissionais de saúde avaliem a vulnerabilidade dos cuidadores familiares, planejem estratégias e intervenções específicas, e forneçam orientações e treinamento para fortalecer suas habilidades no cuidado domiciliar13, além de reconsiderar o home care como uma estratégia de intervenção em saúde que requer atenção profissional qualificada. Isso se deve à mobilização de competências específicas, principalmente ligadas ao relacionamento interpessoal para atuar com o paciente, familiares e a equipe multiprofissional, bem como à autonomia, responsabilidade e conhecimento técnico e científico próprios do campo. 

Dessa forma, compreende-se que o home care apresenta diversidade de ações e complexidades específicas que demandam experiência profissional e busca constante de qualificação para a atuação no domicílio23. Em síntese, o home care para pacientes oncológicos oferece benefícios notáveis, como a melhoria da qualidade de vida no ambiente familiar, redução de custos hospitalares, promoção da autonomia e maior adesão ao tratamento. Essa abordagem personalizada e centrada no paciente proporciona conforto e cuidados especializados, representando uma opção eficaz e humanizada no enfrentamento do câncer. 


2Fonte: https://www.paho.org/pt/topicos/cancer 
3Fonte: Teixeira, L. A.; Araújo Neto, L. A. Breast cancer in Brazil: medicine and public health in the 20th century. Saúde Soc. 2020;29(3):e180753. 
4Fonte: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files/media/document/deteccao-precoce-do-cancer.pdf
5Fonte: Oliveira, I. P.; Cardoso, A. C. A.; Faria, A. L. M.; Lima, L. B.; Reis, F. T. B.; Volta, A. R. Importância da avaliação multidimensional na dor oncológica. In: Anais do I CAMEGA. Suplemento 3, Volume 7, da RESU – Revista Educação em Saúde, 2019. Disponível em: http://periodicos.unievangelica.edu.br/index.php/educacaoemsaude/article/view/4283/3011.
6Fonte: Oliveira, P. F.; Oliveira, P. P.; Silveira, E. A.; Fonseca, D. F.; Schlosser, T. C.; Martins, Q. C. Instrumento para consulta de enfermagem domiciliar com paciente oncológico: construção e validação. Acta Paul Enferm. 2022;35:eAPE02587.
7Fonte: Brasil. Lei Nº 14.238, de 19 de novembro de 2021. Institui o Estatuto da Pessoa com Câncer e dá outras providências. Brasília (DF): Diário Oficial da União de 22 de novembro de 2021. Disponível em: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=22/11/2021&jornal=515&pagina=1&totalArquivos=325 
8Fonte: Santos, A. A. da S.; Silva, J. P. M. da; Santos, M. I. F. Assistência em Enfermagem aos pacientes em Home Care: Uma revisão de literatura sobre a importância do profissional de enfermagem no cuidado domiciliar. Revista JRG de Estudos Acadêmicos , Brasil, São Paulo, v. 6, n. 13, p. 2249–2259, 2023. https://doi.org/10.55892/jrg.v6i13.834.
9Fonte: Rajão, F. L.; Martins, M. Atenção Domiciliar no Brasil: estudo exploratório sobre a consolidação e uso de serviços no Sistema Único de Saúde. Ciência & Saúde Coletiva [online]. v. 25, n. 5, pp. 1863-1877. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/1413-81232020255.34692019>. ISSN 1678-4561. 
10Fonte: Braga, P. P.; Sena, R. R.; Seixas, C. T.; Castro, E. A. B.; Andrade, A. M.; Silva, Y. C. Oferta e demanda na atenção domiciliar em saúde. Cien Saude Colet. 21(3):903-912, 2016. 
11Fonte: https://www.familiarhomecare.com.br/home-care-o-que-e-como-funciona-e-quais-sao-os-beneficios-1
12Fonte: Lacerda, M. R.. Cuidado domiciliar: em busca da autonomia do indivíduo e da família – na perspectiva da área pública. Ciência & Saúde Coletiva, 15(5), 2621–2626, 2010. https://doi.org/10.1590/S1413-81232010000500036. 
13Fonte: Cunha, L. S.; Amorim, M. E.; Guimarães, M. A. R.; Teles, G. A. M.; Silva, L. G. Home Care: Desafios e Papel da Equipe de Enfermagem na Assistência Personalizada aos Pacientes. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, 9(6), 1309–1317, 2023. https://doi.org/10.51891/rease.v9i6.10188
14Fonte: Hazenberg, A.; Kerstjens, H. A. M.; Prins, S. C. L.; et al. Initiation of home mechanical ventilation at home: a randomised controlled trial of efficacy, feasibility and costs. Respir Med 2014;108:1387–95. doi:10.1016/j.rmed.2014.07.008.
15Fonte: Jones, C. D.; Levy, C. R. Improved communication in home health care could reduce Hospital readmission rates. JAMA Intern Med 2019;179:1151–2. doi:10.1001/jamainternmed.2019.2727. 
16Fonte: Andrade, A. M.; Silva, K. L.; Seixas, C. T.; Braga, P. P. Atuação do enfermeiro na atenção domiciliar: Uma revisão integrativa da literatura. Rev Bras Enferm, 70(1), 210– 219, 2017. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0214.
17Fonte: Fogaça, R. Gestão de Recursos e Logística em Home Care: A Operacionalização dos Insumos sob a Ótica de Gestores de Empresas Privadas do Ramo. Ciências Sociais Aplicadas, Edição 121, 2023. 10.5281/zenodo.7844038.
18Fonte: https://pebmed.com.br/home-care-conceito-mitos-e-desafios/ 
19Fonte: Fernandes, S. N.; Duarte, F. Auditoria interna como ferramenta de melhoria da qualidade em um home care. Revista ACRED, 6(12), 39–53, 2016. 
20Fonte: Santos, A. A. da S.; Silva, J. P. M. da; Santos, M. I. F. Assistência em Enfermagem aos pacientes em Home Care: Uma revisão de literatura sobre a importância do profissional de enfermagem no cuidado domiciliar. Revista JRG de Estudos Acadêmicos , Brasil, São Paulo, v. 6, n. 13, p. 2249–2259, 2023. https://doi.org/10.55892/jrg.v6i13.834.
21Fonte: Coppetti, L. de C.; Girardon-Perlini, N. M. O.; Andolhe, R.; Dalmolin, A.; Dapper, S. N.; Machado, L. G. Habilidade de Cuidado e Sobrecarga do Cuidador Familiar de Pacientes em Tratamento de Câncer. Texto & Contexto – Enfermagem , 29 , e20180451, 2020. https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-2018-0451 
22Fonte: Bellato, R.; Araújo, L. F. S.; Dolina. J. V.; Musquim, C. A.; Corrêa, G. H. L. S. A experiência da família no cuidado em situação crônica. Rev Esc Enferm USP. 50(Spe):81-8, 2016. Disponível em: https://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420160000300012 
23Fonte: Andrade, A. M.; Silva, K. L.; Seixas, C. T.; Braga, P. P. Nursing practice in home care: an integrative literature review. Rev Bras Enferm. 70(1):199-208, 2017. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0214 


1Daniele Sakalauska D. Trevisan, graduada em Enfermagem e Saúde Comunitária e da Família, Pós-graduação em Terapia Intensiva e MBA em Serviços de Saúde com ênfase em Administração. Iniciou sua carreira na área administrativa de saúde pública de 2009 a 2012 e, posteriormente, dedicou-se de 2012 a 2023 ao único cancer center do Brasil – A.C Camargo Cancer Center, ascendendo de Enfermeira a Supervisora de Operações. Com +11 anos de experiência, seu foco abrange uma profunda expertise em temas oncológicos e saúde familiar. Durante oito anos, concentrou-se na gestão de pessoas e processos, especializando-se na melhoria da desospitalização, cuidados personalizados e redução do risco de infecção hospitalar. Destaca-se pela abordagem humanizada na gestão de processos e pessoas voltadas à saúde.* Outras publicações: https://proceedings.science/qualihosp-2019/trabalhos/implementacao-da-supervisao-de-operacoes-em-um-canc er-center-como-estrategia-de?lang=pt-br