CANINE CRYPTOCOCCOSIS: CASE REPORT
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10002476
Gabriela Martins Alves dos Santos1
Maria Eduarda Maffei1
Renato Moraes Waldemarin2
Vivian Lindmayer Cisi 3
Resumo
A criptococose é uma doença fúngica transmitida pelo agente Cryptococcus neoformans, encontrado em forma de esporos nos solos e nas fezes de pombos. Na clínica de pequenos animais, essa doença é normalmente descrita na literatura em felinos, e raramente em caninos. O presente trabalho relata um caso de Criptococose em um cão macho da raça Pitbull com 7 meses de vida, apresentando incoordenação motora, entre outros sintomas. O diagnóstico foi feito através de ressonância magnética e PCR-RT por meio de coleta do líquor cefalorraquidiano. No tratamento foi utilizado Fluconazol, sua administração durou 1 ano e 9 meses, atualmente o animal se encontra com quadro clínico estável apesar de sequelas no sistema locomotor.
Palavra Chave: Cryptococcus neoformans, Cryptococcus, Criptococose canina
Canine cryptococcosis: case report
Abstract
Cryptococcosis is a fungal disease transmitted by the agent Cryptococcus neoformans, found in the form of spores in soil and pigeon feces. In small animal clinics, this disease is normally described in the literature in felines, and rarely in canines. The present work reports a case of Cryptococcosis in a 7-month-old male Pitbull dog, presenting motor incoordination, among other symptoms. The diagnosis was made through magnetic resonance imaging and PCR-RT through cerebrospinal fluid collection. In the treatment, Fluconazole was used, its administration lasted 1 year and 9 months, currently the animal is in a stable clinical condition despite sequelae in the locomotor system.
Keyword: Cryptococcus neoformans, Cryptococcus, Canine cryptococcosis
1. INTRODUÇÃO
A criptococose é uma doença micótica que acomete principalmente gatos, porém, os cães também são acometidos. Essa doença é causada pelo Cryptococcus spp, sendo Cryptococcus neoformans var grubii e Cryptococcus neoformans var gattii mais comumente associados com a doença (Nelson & Couto, 2015). Apresentam distribuição mundial, com relatos principalmente na Austrália, Brasil, México e Itália. A doença pode ocorrer naturalmente em uma ampla gama de espécies animais (aves e mamíferos), que podem se tornar mais predispostos a infecção, uma vez que habitam ambientes onde existe o fungo (Malik, 2011). É mais provável que a porta de entrada do organismo seja o trato respiratório e, em alguns animais, pode disseminar-se para outros órgãos (Nelson & Couto, 2015). O solo rico em excretas de aves é um importante fator de transmissão e os pombos assumem o papel de reservatórios no ambiente urbano, uma vez que estes, disseminam o fungo e ao mesmo tempo estão protegidos da infecção devido sua elevada temperatura corporal, o que inibe a replicação do microrganismo (Serna-Espinosa et al. 2021). Cães e gatos doentes podem apresentar alterações respiratórias, neurológicas, oculares e cutâneas, isoladas ou conjuntas (Müller, 2017). C. gattii forma com mais frequência nódulos tumorais únicos ou múltiplos nos pulmões e cérebro, denominados criptococomas (Sorrell TC, 2001).
Cryptococcus spp. podem ser agentes patogênicos primários, no entanto, a preexistência de condições imunossupressoras estão documentadas em aproximadamente 50% das pessoas com criptococose. A evidência sorológica de coinfecção com o vírus da imunodeficiência felina ou vírus da leucemia felina ocorre em alguns gatos com criptococose. Por sua vez, em cães, condições potencialmente imunossupressoras, como a administração de corticosteroides, erliquiose, dirofilariose e neoplasia já foram descritas em pacientes com criptococose (Nelson & Couto, 2015). A síndrome neurológica mais comum em cães pode apresentar-se como uma meningoencefalomielite, em que os sinais apresentados estarão relacionados ao local da lesão. Observa-se principalmente desorientação, diminuição da consciência, dor cervical, espasticidade, andar em círculos, ataxia vestibular, pressão de cabeça, anisocoria, dilatação pupilar, cegueira, surdez, perda de olfato, ataxia progredindo para paresia, paraplegia e convulsões (Müller, 2017). O presente trabalho tem como objetivo relatar um caso de criptococose em cão, macho da raça Pitbull com 7 meses diagnosticado com meningoencefalite granulomatosa causada pelo agente fúngico Cryptococcus sp.
2. RELATO DE CASO
Foi atendido em uma clínica veterinária, um cão da raça Pitbull, de 7 meses, pesando 20kg, macho, não castrado, domiciliado e sem histórico de vacinação, com queixa de febre, inapetência e incoordenação motora repentina. Na anamnese a tutora relatou que o animal domiciliado sem acesso à rua, sem contato com domissanitários, mas possível ingestão de planta tóxica em quintal. No exame físico o animal apresentava midríase bilateral, diminuição do reflexo palpebral, febre de 39C°, mucosas congestas, tempo de preenchimento capilar (TPC) 3 segundos. Na auscultação cardíaca e pulmonar não foram constatadas alterações. As hipóteses diagnósticas estabelecidas foram doença viral neurológica, devido a não primovacinação, ou possível intoxicação. Foram solicitados exames complementares, hemograma, perfil bioquímico renal e hepático, e todos se encontraram dentro do valor de referência para a espécie canina. Adicionalmente, foi realizado exame de PCR-RT (reação em cadeia da polimerase em tempo real) de urina e sangue total, para pesquisa de Erliquia, Cinomose, Babesia e Anaplasma, e todos se apresentaram negativos. Foi instituído tratamento para possível intoxicação por planta exótica, mercepton (30 gotas, VO, BID) e tratamento suporte com dipirona (25 mg/kg), prednisolona (1mg/kg) e ondansetrona (0,5 mg/kg) de acordo com a Riboldi (2010).
Após 20 dias o animal retornou com agravamento do quadro clínico e tetraplegia. O animal foi encaminhado para um neurologista, no exame clínico foi constatado head tilt do lado esquerdo e ausência de dor profunda dos membros torácicos e pélvicos, os demais parâmetros se encontravam dentro da normalidade. Foi solicitado ressonância magnética, que constatou meningoencefalite de origem não determinada (infecciosa/inflamatória). O diagnóstico foi confirmado para Cryptococcus sp através do exame de PCR-RT por meio de coleta do líquor cefalorraquidiano.
O tratamento foi instituído de acordo com o Guia Terapêutico Veterinário Bretas (2019), com omeprazol (1mg/kg), silimalon (30mg/kg), fluconazol (5,5 mg/kg), etna (1 comprimido, SID), ômega 3 (40mg/kg). Foi instituído também tratamento fisioterapêutico (eletroterapia, hidroterapia e cinesioterapia) a cada 15 dias. O animal teve uma boa evolução clínica e o tratamento com os fármacos e fisioterapia durou cerca de 1 ano e 9 meses, sendo realizado exames periódicos a cada 6 meses para garantir que não houvesse comprometimento de outros órgãos, como rim e fígado. Após o animal ficar em um quadro estável foi realizado novamente o teste de PCR-RT para o agente Cryptococcus sp o qual deu negativo. Atualmente o animal se encontra curado da criptococose, apenas com sequelas em seu sistema locomotor sem prejudicar o seu bem-estar.
3. DISCUSSÃO
O presente relato se justifica pela baixa ocorrência de criptococose em cães com evidenciação no animal vivo, sendo mais comumente encontrada na espécie felina, de acordo com Castellá (2008). A frequência de infecção por criptococose em cães é menor do que em gatos, isso se dá por alguns motivos como fatores predisponentes, como infecção prévia pelo vírus da leucemia felina (FELV) ou pelo vírus da imunodeficiência felina (FIV). Doenças essas que causam limitações quanto a resposta imunológica desses (Santos, 2017). No presente relato, o fato de não se detectar clinicamente predisposição relacionada a outra enfermidade coincide com dados bibliográficos, pelos quais em não mais de 6% dos casos de criptococose canina é possível identificar fatores imunossupressores, tal como a erliquiose (Larsson et al., 2003).
O ambiente também é um fator predisponente, cães com acesso a ambientes abertos podem ter maior exposição por conta de fezes de aves, como por exemplo pombos. A levedura entra no organismo pelo sistema respiratório, onde infecta tecidos nasal, paranasal ou pulmonar, antes de se disseminar para o organismo, mas com preferência pelo sistema nervoso central, porém, na literatura há muitos relatos de cães com criptococose na forma cutânea e poucos relatos na forma de meningoencefalite (BIRCHARD et al, 2008). Os sintomas neurológicos são variáveis, incluindo convulsões, depressão, desorientação, andar em círculos, ataxia, quedas, paresia de membros pélvicos, paraplegia, anisocoria, midríase e cegueira (JERICÓ, et al; 2015).
De acordo com a literatura científica, normalmente a progressão da doença é lenta, no presente caso, a progressão dos sinais neurológicos foram de 20 dias, para paresia de membros torácicos e pélvicos, ausência de dor profunda e head tilt. Foi diagnosticado a meningoencefalite granulomatosa pelo agente Cryptococus através da ressonância magnética e da análise do liquor cefalorraquidiano. Segundo Jericó, et al (2015), para diagnóstico preciso de doenças inflamatórias do SNC, utiliza-se a análise do líquido cefalorraquidiano (LCR), imagens de ressonância magnética (RM), e testes sorológicos para as causas infecciosas. Após o diagnóstico foram instituídos tratamentos terapêutico de acordo com o que foi encontrado na literatura((MÜLLER,2017) , O tratamento durou cerca de 1 ano e 9 meses, um ponto importante para o sucesso da evolução clínica do animal, visto que foi um tratamento feito corretamente e com acompanhamento do animal mensalmente com exames complementares para se certificar de que não comprometesse outros órgãos, como rim e fígado. Os medicamentos cetoconazol, itraconazol ou fluconazol são usados como um agente único, em cães ou gatos com a doença sem risco de morte. O cetoconazol comumente resulta em inapetência, vômitos, diarreia, perda de peso e aumento de enzimas hepáticas em alguns cães e gatos. Em cães, o uso de cetoconazol por longo prazo pode suprimir a produção de testosterona e de cortisol e tem sido associado com a catarata. Devido a estes problemas, o cetoconazol é utilizado com menos frequência do que o itraconazol e fluconazol. O fluconazol deve ser considerado para uso em cães ou gatos com infecção ocular ou do SNC (Nelson & Couto,2015) e foi o tratamento de eleição estabelecido no presente caso. O Fluconazol, foi utilizado na dose de 5,5mg/kg, de acordo com JAHAM, et al (2000). Ressalta-se que, caso ocorram sinais clínicos de toxicidade pelo uso desse fármaco (inapetência;erupções cutâneas) ou se for detectado aumento da atividade da alanina aminotransferase, o tratamento deve ser interrompido e, em seguida, reiniciado com 50% da dose original após o término dos sinaisde toxicidade (Nelson & Couto, 2015). No presente relato, tais efeitos colaterais não foram observados.
De uma forma geral, o tratamento deve ser continuado por pelo menos 1 a 2 meses após a resolução prévia da doença clínica. No presente caso, o tratamento durou 1 ano e 9 meses. Após o animal ficar em um quadro estável foi realizado novamente o exame de PCR-RT por coleta de líquor o qual deu negativo.
4. CONCLUSÃO
Casos como o descrito é raramente diagnosticado em cães, e os sinais clínicos inespecíficos e semelhantes a outras doenças dificultam o diagnóstico. O conhecimento sobre o quadro clínico juntamente com os exames complementares e diagnósticos mais precisos contribuem para uma maior chance de cura. A realização da biologia molecular foi fundamental para comprovação deste caso, a fim de descartar outras enfermidades que possuem a mesma sintomatologia e poder instituir uma conduta terapêutica eficaz. Sendo assim, foi vista a importância de relatar este caso para divulgação e conhecimento sobre a forma de meningoencefalite granulomatosa.
REFERÊNCIAS
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1Discentes do curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio -Salto/SP
2Médico Veterinário do Pronto Atendimento Renova Saúde Animal – Porto Feliz/SP
3Docente do curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio -Salto/SP