CREMES COSMÉTICOS MANIPULADOS COM VITAMINA C: UMA ANÁLISE QUANTITATIVA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202411251009


Gabriela Uliano de Lima


RESUMO

A farmácia magistral é responsável pela manipulação de medicamentos personalizados, enfrentando desafios específicos na produção de formas semissólidas, como cremes e géis, que exigem rigoroso controle de qualidade. O presente estudo avaliou cremes manipulados em farmácias de Cascavel-PR, com foco na conformidade com as normas de rotulagem estabelecidas pela RDC 67/2007 e na quantidade de vitamina C presente nos produtos, conforme indicado no rótulo. A metodologia empregada para o doseamento foi a descrita por Krambeck (2011). Conclui-se que os cremes manipulados, conforme a legislação vigente para rotulagem, necessitam de algumas adequações para estarem em conformidade com as normas estabelecidas pela RDC nº 67, de 8 de outubro de 2007. A dosagem se apresentou próximo ao estabelecido no rotulo do produto. Condições como armazenamento da Vitamina C ou do produto contendo vitamina C podem ter alterado os resultados. Os resultados obtidos neste estudo evidenciam a importância de práticas adequadas de armazenamento e manipulação na preservação da eficácia de cremes cosméticos contendo vitamina C.

PALAVRAS-CHAVE: Cosméticos, Ácido Ascórbico, Análise Quantitativa

ABSTRACT

The master pharmacy is responsible for handling personalized medicines, facing specific challenges in the production of semi-solid forms, such as creams and gels, which require strict quality control. The present study evaluated creams compounded in pharmacies in Cascavel-PR, focusing on compliance with the labeling standards established by RDC 67/2007 and the amount of vitamin C present in the products, as indicated on the label. The methodology used for dosing was described by Krambeck (2011). It is concluded that the creams manipulated, according to current labeling legislation, require some adjustments to comply with the standards established by RDC nº 67, of October 8, 2007. The dosage was close to that established on the product label. . Conditions such as storage of Vitamin C or the product containing vitamin C may have altered the results. The results obtained in this study highlight the importance of appropriate storage and handling practices in preserving the effectiveness of cosmetic creams containing vitamin C.

KEYWORDS: Cosmetic, Ascorbic Acid, Quantitative Analysis

1. INTRODUÇÃO

A farmácia magistral é um estabelecimento de saúde que se dedica à manipulação de medicamentos individualizados, elaborados com base em prescrições médicas específicas. Seu objetivo é atender às necessidades terapêuticas exclusivas de cada paciente, produzindo medicamentos em pequenas quantidades e com critérios rigorosos de qualidade para garantir a eficácia e segurança do tratamento. Esse setor é especialmente importante para pacientes que necessitam de medicamentos com características não disponíveis nos produtos industrializados, como dosagens personalizadas, ausência de alérgenos ou combinações específicas de ativos (Oliveira e Andrade, 2018).

A legislação brasileira, representada principalmente pela RDC 67/2007 e complementada pela RDC 87/2008, estabelece diretrizes rigorosas para as Boas Práticas de Manipulação em Farmácias. Essas regulamentações abrangem todo o processo, desde a seleção de matérias-primas até a dispensação do produto final, visando assegurar que as preparações magistrais sejam seguras, eficazes e rastreáveis. Tais normativas também exigem análises periódicas para controle de qualidade, incluindo a avaliação de rotulagem e o cumprimento de padrões mínimos de estabilidade e eficácia (CRF-PR, 2012; Santos e Almeida, 2019).

A manipulação de formas farmacêuticas semissólidas, como cremes, pomadas e géis, representa um desafio particular dentro da farmácia magistral. Essas formulações requerem atenção especial na escolha de excipientes e no controle de qualidade, pois aspectos como textura, viscosidade, estabilidade e características organolépticas têm impacto direto na eficácia e aceitação pelo usuário (Lemke et al., 2013). Além disso, a personalização proporcionada pela farmácia magistral permite a incorporação de ativos específicos, como a vitamina C, que é amplamente utilizada em produtos cosméticos devido às suas propriedades antioxidantes e de rejuvenescimento.

A vitamina C, também conhecida como ácido ascórbico, é amplamente reconhecida como um dos ingredientes mais utilizados na dermatologia devido às suas propriedades antioxidantes, clareadoras e estimulantes da síntese de colágeno (ZHANG et al., 2020). Sua capacidade de neutralizar radicais livres e proteger a pele contra danos causados por fatores ambientais faz dela um componente essencial em formulações tópicas voltadas para o rejuvenescimento cutâneo e a uniformização do tom da pele (FERREIRA et al., 2021). Além disso, seu papel como cofator na biossíntese de colágeno a torna uma aliada indispensável no combate à flacidez e ao envelhecimento precoce (ALMEIDA et al., 2022).

Apesar desses benefícios, a vitamina C enfrenta o desafio de sua instabilidade química, o que prejudica sua eficácia em formulações tópicas. Quando exposta ao ar, luz ou calor, ela pode oxidar rapidamente, tornando-se menos eficiente (CHEN et al., 2021). Nesse contexto, as farmácias de manipulação desempenham um papel essencial, viabilizando a personalização das formulações, o ajuste de concentrações e a adição de antioxidantes complementares para estabilizar a substância e maximizar seus benefícios (MARTINS; SILVA, 2018).

 Nesse contexto, o objetivo deste trabalho foi avaliar cremes manipulados em farmácias de Cascavel-PR, com foco na conformidade com as normas de rotulagem estabelecidas pela RDC 67/2007 e na quantidade de vitamina C presente nos produtos, conforme indicado no rótulo

REVISÃO DA LITERATURA

1.1 Farmácia Magistral

A farmácia magistral é um estabelecimento de saúde especializado na manipulação de medicamentos individualizados, formulados conforme as prescrições médicas específicas para atender às necessidades terapêuticas de cada paciente. Esses medicamentos são produzidos em pequenas quantidades, com rigorosos critérios de qualidade, a fim de garantir a eficácia e a segurança do tratamento. A farmácia magistral desempenha papel essencial na personalização da terapia, oferecendo soluções sob medida que muitas vezes não estão disponíveis nos medicamentos industrializados (Oliveira e Andrade, 2018).

Atualmente, a resolução em vigor é a RDC 67/2007, complementada pela RDC 87/2008 (CRF-PR, 2012). A RDC 87/2008 foi criada com o objetivo de aprimorar o Regulamento Técnico sobre Boas Práticas de Manipulação em Farmácias, buscando aumentar a segurança e a qualidade na manipulação de preparações magistrais e oficinais. Esta resolução estabelece diretrizes e requisitos para o monitoramento e controle das práticas farmacêuticas, garantindo a proteção da saúde pública. Além disso, visa assegurar que as farmácias sigam normas atualizadas e adequadas às necessidades do setor, promovendo um ambiente regulatório que fortaleça a qualidade dos produtos manipulados.

A farmácia de manipulação oferece diversas vantagens, especialmente no que se refere à personalização do tratamento medicamentoso. Entre as principais vantagens estão a possibilidade de ajustar a dosagem, adequar a forma farmacêutica e os excipientes conforme as necessidades específicas de cada paciente. Além disso, permite a criação de formulações não disponíveis comercialmente, como medicamentos livres de corantes ou conservantes, ou com combinações de ativos não encontradas em medicamentos industrializados. A farmácia de manipulação é essencial para atender pacientes com necessidades terapêuticas especiais, proporcionando uma terapia personalizada e muitas vezes única, que não seria possível com medicamentos industrializados (Silva e Lima, 2020).

As regulamentações que regulam as farmácias de manipulação, como a RDC 67/2007 e a RDC 87/2008, desempenham papel crucial na garantia da qualidade, segurança e eficácia dos produtos manipulados. A RDC 67/2007 estabelece as Boas Práticas de Manipulação em Farmácias, impondo padrões rigorosos para todas as etapas do processo de manipulação, desde a seleção das matérias-primas até a dispensação dos medicamentos, garantindo que os medicamentos manipulados sejam produzidos de maneira consistente e dentro das especificações exigidas para assegurar sua estabilidade e eficácia terapêutica. A RDC 87/2008 complementa a RDC 67, introduzindo atualizações e novos requisitos que fortalecem ainda mais o controle de qualidade nas farmácias magistrais, com foco na necessidade de monitoramento contínuo e adoção de práticas padronizadas para evitar variações indesejadas na composição dos medicamentos. A implementação dessas regulamentações é essencial para garantir que os produtos manipulados ofereçam a mesma confiabilidade e qualidade que se espera dos medicamentos produzidos industrialmente, promovendo a saúde pública e a confiança no setor magistral e nos serviços prestados (Santos e Almeida, 2019).

Dada a importância das práticas regulamentadas e das análises periódicas na manutenção da qualidade dos produtos manipulados, é relevante investigar como essas diretrizes se aplicam especificamente às formas farmacêuticas semissólidas, como cremes, pomadas e géis. A manipulação dessas formulações apresenta desafios únicos, tanto em termos de controle de qualidade quanto na escolha dos excipientes, o que exige atenção especial dos profissionais envolvidos. As análises dessas formas farmacêuticas incluem a verificação da descrição, aspecto, características organolépticas e pH (quando aplicável), além do peso. Essas análises devem ser realizadas periodicamente, com a farmácia realizando a análise de pelo menos uma fórmula a cada dois meses. Os excipientes utilizados devem ser padronizados com base em fundamentos técnicos, garantindo que os produtos sejam consistentes e seguros para uso.

1.2 Formas Farmacêuticas Semissólidas

As formas farmacêuticas semissólidas, como cremes, loções, pomadas e géis, desempenham papel crucial tanto na cosmética quanto na medicina. Essas formulações são compostas por uma combinação de fases, geralmente aquosa e oleosa, unidas por tensoativos que garantem a estabilidade do produto. A textura e a consistência dessas formulações variam de acordo com a proporção e o tipo de componentes utilizados em cada uma delas, oferecendo uma ampla gama de aplicações terapêuticas e cosméticas.

Cremes e loções, enquanto formas farmacêuticas semissólidas, são frequentemente emulsões que podem ser classificadas como óleo em água (O/A) ou água em óleo (A/O), dependendo da fase contínua presente. A fase contínua não só afeta a aparência do produto, que pode variar de translúcida a opaca, mas também influencia a espalhabilidade e a capacidade de penetração na pele. Além disso, o tamanho das micelas formadas durante o processo de mistura e homogeneização das fases determina a viscosidade final da formulação, sendo que os cremes geralmente apresentam maior viscosidade em comparação com outras preparações semissólidas (Lemke et al., 2013).

Essas formas farmacêuticas semissólidas são versáteis, pois podem carregar e liberar princípios ativos tanto na pele quanto nos cabelos, dependendo da finalidade do produto. No contexto cosmético, são amplamente utilizadas para hidratação, proteção e tratamento de condições dermatológicas, enquanto na medicina, podem ser formuladas para liberar medicamentos de forma controlada e localizada. Essas formulações apresentam uma matriz eficiente para a incorporação de ativos que necessitam de liberação prolongada ou localizada, maximizando os efeitos terapêuticos e minimizando os efeitos adversos sistêmicos (Silva e Rodrigues, 2021).

Além de suas aplicações práticas, as formas farmacêuticas semissólidas devem atender a rigorosos padrões de qualidade para garantir sua eficácia e segurança. A RDC 67/2007 e a RDC 87/2008, já discutidas, estabelecem diretrizes claras para o controle de qualidade dessas formulações, incluindo testes de pH, homogeneidade, estabilidade e propriedades organolépticas. O controle de qualidade nestes produtos é imprescindível, pois assegura que as formulações semissólidas mantenham sua integridade física e química durante todo o prazo de validade, evitando misturas indesejadas entre os componentes (Lima e Andrade, 2019).

Portanto, as formas farmacêuticas semissólidas desempenham papel vital na indústria cosmética e farmacêutica, sendo essenciais para a entrega eficaz de ingredientes ativos. Seu desenvolvimento e produção exigem um profundo conhecimento científico e o cumprimento das regulamentações vigentes para garantir que os produtos ofereçam benefícios terapêuticos e cosméticos com segurança e eficácia.

1.3 Formas Farmacêuticas Semissólidas com Vitamina C

As formas farmacêuticas desenvolvidas para fins cosméticos têm se destacado tanto na farmácia de manipulação quanto no mercado cosmético, desempenhando um papel crucial no atendimento às necessidades específicas dos consumidores.

Entre essas formas, incluem-se cremes, loções, géis e pomadas, elaborados com base em rigorosos critérios de qualidade para assegurar segurança, eficácia e estabilidade dos produtos. A farmácia de manipulação apresenta-se como uma alternativa valiosa, pois permite a criação de formulações personalizadas que atendem às particularidades de cada paciente ou consumidor, muitas vezes suprindo lacunas deixadas pelo mercado industrializado. Essa característica fortalece sua posição no setor cosmético, promovendo um cuidado mais individualizado e eficaz.

No mercado cosmético, cremes e loções são amplamente utilizados para hidratação, rejuvenescimento e tratamento de condições dermatológicas. Essas formas farmacêuticas possibilitam a incorporação de diversos ativos, como vitaminas, ácidos e extratos naturais, tornando-as versáteis e eficazes. Além disso, os cosméticos manipulados garantem a personalização necessária para atender às necessidades individuais, proporcionando maior segurança e eficácia (Lima & Silva, 2018).

Entre os ingredientes ativos mais valorizados na formulação de cremes cosméticos está o ácido ascórbico (vitamina C), amplamente conhecida por suas propriedades antioxidantes. A vitamina C estimula a produção de colágeno, clareia manchas e protege a pele contra os danos causados por radicais livres, sendo, portanto, reconhecida por seus benefícios no combate ao envelhecimento e na promoção de uma pele mais uniforme e radiante. Contudo, trata-se de um composto altamente instável, sujeito à oxidação quando exposto ao ar, luz ou calor, o que compromete sua eficácia. Dessa forma, é imprescindível que as formulações sejam elaboradas de modo a proteger a vitamina C dessas condições, garantindo sua estabilidade até o momento do uso (Oliveira et al., 2020).

Embora os cremes cosméticos com vitamina C apresentem vantagens significativas, como a melhora da textura e aparência da pele, redução da hiperpigmentação e proteção contra danos ambientais, suas desvantagens estão associadas à instabilidade do ativo. Esse fator demanda embalagens adequadas e condições específicas de armazenamento para preservar sua atividade. Adicionalmente, a concentração de vitamina C deve ser ajustada com cautela para evitar irritações, especialmente em peles sensíveis.

A farmácia de manipulação, com sua capacidade de personalização, oferece uma abordagem diferenciada, adaptando variáveis de concentração e veículo de acordo com as necessidades de cada consumidor. A importância de um controle de qualidade rigoroso não pode ser subestimada nesse processo, garantindo que a concentração de vitamina C declarada no rótulo corresponda ao teor presente no produto final. Esse controle é essencial para assegurar a eficácia do tratamento, eliminar contaminantes e manter a estabilidade da formulação durante todo o prazo de validade.

Práticas rigorosas de controle de qualidade, portanto, são fundamentais para que os produtos manipulados ofereçam segurança e eficácia comparáveis aos cosméticos industrializados. Essas práticas contribuem para a confiança dos consumidores e fortalecem a credibilidade das farmácias de manipulação, tornando-as um pilar no mercado de cosméticos (Santos e Almeida, 2019).

2. Encaminhamento Metodológico

2.1 Rotulagem

Este estudo incluiu a avaliação da conformidade dos rótulos de produtos manipulados em farmácias magistrais com os critérios estabelecidos pela RDC nº 67, de 8 de outubro de 2007. Essa regulamentação define as Boas Práticas de Manipulação de Preparações Magistrais e Oficinais, incluindo os requisitos mínimos que devem constar nos rótulos para garantir segurança, eficácia e rastreabilidade.

Os rótulos analisados foram avaliados quanto à presença das informações obrigatórias, como: Nome do paciente; Nome do medicamento ou substância ativa; Concentração ou dosagem; Forma farmacêutica; Modo de usar; Quantidade do produto; Data de fabricação e validade; Condições de conservação; Nome do farmacêutico responsável e inscrição no Conselho Regional de Farmácia (CRF); Número do registro da receita e do lote; Advertências obrigatórias e os Dados da farmácia. A análise foi conduzida verificando-se se cada item estava presente e devidamente descrito nos rótulos fornecidos pelas farmácias.

Os dados obtidos foram organizados em uma tabela para identificar quais informações estavam em conformidade e quais apresentavam ausência ou inconsistências em relação às exigências da RDC nº 67/2007.

2.2 Análise de Teor de Vitamina C

Para esta análise, foram adquiridos três cremes manipulados em farmácias magistrais aleatórias da cidade de Cascavel-PR, contendo 10% de vitamina C. A metodologia baseou-se na metodologia  descrita por Krambeck (2011), com adaptações.

O doseamento foi realizado utilizando espectrofotometria UV/Vis, ajustando-se o comprimento de onda para 265 nm. Foi preparada uma solução padrão de ácido ascórbico (1 mg em 50 mL de água destilada), a partir da qual foram retiradas alíquotas de 0,10; 0,16; 0,20; 0,24 e 0,30 mL 

Para determinar a vitamina C nos cremes, realizou-se a extração a partir de 0,5 g de creme. A amostra foi transferida para um balão volumétrico contendo 50 mL de álcool etílico absoluto (PA) e submetida a agitação intensa em agitador magnético por cinco minutos. Após a agitação, a solução foi filtrada com algodão e funil de vidro, e o filtrado foi analisado por absorbância a 265 nm. A análise foi realizada em triplicata com uma repetição.

Os valores  médios de absorbância foram aplicados à equação da reta gerada pela curva de calibração para calcular a concentração de vitamina C. Os resultados foram expressos em miligramas por mililitro (mg/mL) e convertidos em porcentagem, comparando-se com o teor declarado no rótulo do produto.

3. RESULTADOS e DISCUSSÃO

3.1 Os dados obtidos na analise da rotulagem foram expressos na tabela a seguir

  Tabela 1:  Rotulagem dos cremes manipulados

Legenda: P – possui, NP – não possui, QTD. – quantidade, Cond. – condições, Adv. – advertencias, Insc. – Inscrição.

A análise dos dados presentes nos rótulos das três amostras apontou uma consistência significativa quanto às informações fundamentais, mas também revelou lacunas relevantes que afetaram a conformidade com as Boas Práticas de Manipulação estabelecidas pela RDC nº 67/2007. Elementos essenciais, como o nome do paciente, a substância ativa, a concentração, a forma farmacêutica, o modo de usar, a quantidade do produto, as datas de fabricação e validade, além das condições de conservação, estavam devidamente presentes em todas as amostras analisadas. Esses itens asseguram que o medicamento seja identificado e utilizado de maneira segura pelo paciente, além de fornecer orientações claras para seu armazenamento correto.

Por outro lado, algumas informações obrigatórias apresentaram inconsistências entre as amostras analisadas. A inscrição no CRF do farmacêutico responsável, por exemplo, estava disponível apenas na Amostra 1, enquanto as Amostras 2 e 3 não continham essa informação. A ausência desse dado compromete a rastreabilidade profissional e a atribuição de responsabilidade técnica, especialmente em situações de fiscalização ou diante de possíveis problemas relacionados ao produto. Além disso, o número do registro da receita, fundamental para a rastreabilidade das preparações magistrais, também estava ausente nas Amostras 2 e 3, sendo registrado exclusivamente na Amostra 1. Esses dois itens são importantes para assegurar a conformidade com as normas legais e aumentar a segurança nas preparações manipuladas.

A obrigatoriedade do número do lote é um ponto importante para análise. Essa informação não foi identificada nas Amostras 1 e 2, mas estava presente na Amostra 3. De acordo com a RDC nº 67/2007, o número do lote é exigido para preparações produzidas em maior escala, como bases cosméticas voltadas à comercialização.

No entanto, para preparações magistrais individualizadas, destinadas exclusivamente a um paciente e elaboradas com base em prescrição específica, a rastreabilidade é assegurada pelo registro da receita e pelos demais dados contidos no rótulo, tornando o número do lote um item opcional. Dessa forma, a presença do número do lote na Amostra 3 reflete um cuidado extra com a rastreabilidade, ainda que sua ausência nas Amostras 1 e 2 não represente uma irregularidade, dado que se tratam de preparações personalizadas. Outro ponto crítico identificado foi a ausência de advertências obrigatórias em todas as amostras avaliadas. Orientações como “Mantenha fora do alcance de crianças”, “Uso exclusivo sob prescrição médica” ou outras indicações específicas ao tipo de preparação são essenciais para assegurar a segurança do paciente e o uso correto do medicamento. A falta dessas advertências pode ocasionar erros no armazenamento ou na administração do produto, além de comprometer o cumprimento das normas de rotulagem, configurando um risco tanto para a saúde do paciente quanto para a conformidade das preparações manipuladas.

Portanto, embora os rótulos analisados apresentem um bom nível de conformidade em relação às informações básicas, é crucial corrigir as falhas identificadas para atender integralmente às exigências legais e garantir a segurança e a rastreabilidade das preparações. Recomenda-se a inclusão sistemática da inscrição no CRF do farmacêutico responsável e do número da receita em todas as amostras, além da padronização das advertências obrigatórias conforme o tipo de produto. Para bases prontas ou outros produtos destinados à comercialização em maior escala, a presença do número do lote é indispensável. Adicionalmente, a implementação de processos padronizados e a realização de treinamentos contínuos são fundamentais para garantir a conformidade e a qualidade nas práticas de manipulação, permitindo que a equipe atue de forma eficaz na prevenção de inconsistências e na melhoria da qualidade dos serviços oferecidos à população.

3.2  Análise de Teor de vitamina C

3.2.1 Curva de Calibração 

Os resultados obtidos para a curva de calibração estão expressos na figura 1 abaixo.

Figura 1- Dados obtidos para a curva de calibração da Vitamina C

3.2.1.1 Resultados da curva de calibração 

A equação da reta obtida a partir da curva de calibração foi y = 1,0257x – 0,0043, onde Y representa a média das absorbâncias das amostras e X a concentração de vitamina C (mg/ mL). Essa equação foi utilizada para calcular as concentrações de vitamina C presentes nas amostras testadas. Foram encontradas  as concentrações em mg/ml de vitamina C presente nas amostras que foram levadas a testes que estão expressos na tabela a seguir: 

Tabela 2: Resultado do doseamento da Vitamina C

As amostras analisadas apresentaram uma diferença média de 28,41% em relação à concentração declarada no rótulo, indicando uma significativa redução nos níveis de vitamina C. Essa diferença pode ser explicada pelas características químicas da vitamina C, uma molécula altamente suscetível à oxidação devido à exposição à luz e ao oxigênio. Esses fatores ambientais, aliados a possíveis falhas no manuseio e no armazenamento, como a falta de proteção adequada contra luz ou armazenamento em temperaturas inadequadas, podem ter acelerado a degradação da substância. Esse processo resultou em concentrações abaixo do valor nominal de 10% descrito no rótulo, evidenciando a necessidade de condições rigorosas de conservação para preservar sua estabilidade e eficácia.

De acordo com Chen et al. (2021), o ácido ascórbico oxida rapidamente quando exposto ao ar ou à luz, tornando-se ineficaz. Técnicas como o encapsulamento lipídico e a regulação do pH para valores abaixo de 4 têm se mostrado eficazes para prolongar a vida útil do composto. Além disso, a adição de antioxidantes como ácido ferúlico e vitamina E melhora tanto a estabilidade quanto os efeitos terapêuticos da formulação (ALMEIDA et al., 2022).

Estudos recentes destacam a importância das condições de armazenamento na estabilidade da vitamina C em formulações cosméticas. Santos et al. (2019) analisaram fatores como temperatura e exposição ao ambiente, identificando que esses elementos influenciam diretamente a degradação do ácido ascórbico. A pesquisa sublinha a necessidade de um controle rigoroso das condições externas para preservar a atividade da substância. De modo semelhante, Aquino et al. (2013) expandiram essa análise, avaliando não apenas a estabilidade da vitamina, mas também a adequação das embalagens. Esse estudo investigou cinco marcas de produtos manipulados e constatou que formulações acondicionadas em bisnagas de alumínio e armazenadas sob refrigeração demonstraram maior estabilidade, com menores perdas no teor de vitamina C.

A vitamina C apresenta instabilidade significativa devido à sua elevada sensibilidade a fatores como calor, oxigênio e luz ambiente, que aceleram sua oxidação e a convertem em ácido deidroascórbico. Essa forma menos estável, por sua vez, degrada-se em ácido dicetogulônico e outros subprodutos (Tarragot-Trani et al., 2012; Spinola et al., 2013). O estudo em questão identificou que falhas no armazenamento e no manuseio de cremes manipulados contendo vitamina C, como o uso de embalagens plásticas sem proteção contra a luz e a exposição a temperaturas entre 26°C e 28°C, contribuíram para a degradação do ativo. Essas condições inadequadas resultaram em concentrações inferiores às esperadas, ressaltando a necessidade de práticas otimizadas para garantir a eficácia do ácido ascórbico.

A comparação entre produtos manipulados e industrializados revela questões cruciais. Produtos industrializados frequentemente incorporam tecnologias avançadas, como o uso de nanopartículas, para estabilizar a vitamina C, enquanto as formulações manipuladas oferecem maior personalização e custo reduzido. Entretanto, a falta de estudos clínicos abrangentes que comprovem a eficácia das formulações manipuladas permanece uma limitação significativa (Ferreira et al., 2021). Além disso, Almeida et al. (2022) ressaltam que a combinação da vitamina C com agentes hidratantes, como o ácido hialurônico, intensifica seus benefícios, promovendo maior hidratação cutânea e facilitando a penetração do ativo na epiderme, o que amplifica seus efeitos antioxidante

 A educação do paciente sobre o uso e armazenamento correto dos produtos é um aspecto essencial. Chen et al. (2021) demonstraram que fatores como a exposição ao ar e à luz podem comprometer a eficácia de cremes manipulados, mesmo quando esses são formulados corretamente. Esse dado reforça a necessidade de orientar os usuários sobre práticas adequadas para maximizar os benefícios terapêuticos dessas formulações.

Nesse sentido, futuros estudos envolvendo a vitamina C como princípio ativo devem priorizar condições otimizadas de manuseio e armazenamento, garantindo que os resultados alcançados estejam dentro dos padrões esperados. A implementação de boas práticas e a conscientização do paciente são fundamentais para o êxito de tratamentos que utilizam essa substância, especialmente em formulações manipuladas, que apresentam um potencial na dermatologia.

Apesar das vantagens das formulações manipuladas, existem desafios significativos relacionados à padronização e ao controle de qualidade. Moura et al. (2020) apontam que a ausência de regulamentações rigorosas nas farmácias de manipulação pode resultar em inconsistências na qualidade dos produtos. Isso reforça a necessidade de investimentos em treinamentos para os farmacêuticos e na implementação de regulamentações mais rígidas para assegurar a segurança e eficácia das formulações

.

4. CONCLUSÃO

A análise da rotulagem demonstrou inconsistências em relação às exigências estabelecidas pela RDC nº 67/2007, o que reforça a necessidade de padronização e de controle de qualidade mais rigorosos no setor magistral.

Os resultados obtidos neste estudo evidenciam a importância de práticas adequadas de armazenamento e manipulação na preservação da eficácia de cremes cosméticos contendo vitamina C. A instabilidade do ativo foi confirmada, uma vez que as amostras analisadas apresentaram teores inferiores aos declarados, muito provavelmente devido a condições inadequadas de conservação, como exposição à luz e oxigênio.

Reforça-se, assim, a importância de um processo de manipulação que priorize a estabilidade do ativo, aliado a treinamento técnico especializado e à orientação adequada do consumidor. Medidas como a seleção de embalagens opacas e apropriadas, o controle rigoroso de condições ambientais, incluindo temperatura e exposição à luz, além do cumprimento estrito de legislações e normativas vigentes, são fundamentais para garantir a segurança e a eficácia das formulações manipuladas.

Este trabalho oferece uma contribuição valiosa para a compreensão dos desafios enfrentados no setor magistral, particularmente no desenvolvimento e comercialização de cosméticos contendo ativos instáveis, como a vitamina C. Ele destaca a relevância de investir em boas práticas e inovação tecnológica para assegurar maior confiabilidade e estabilidade das formulações, fomentando avanços expressivos na área de cosméticos.

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