CARE COORDINATION IN PRIMARY HEALTH CARE: THE ROLE OF THE MULTIDISCIPLINARY TEAM IN THE INTEGRATION OF HEALTH CARE NETWORKS
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10241161301
Beatriz Cruz de Paula [1]
Amanda Calzi Roldi [2]
Felype Deyvede Cunha Lima [3]
Sillwe Capitulino Farias Costa [4]
Maria Janaides Alves da Silva [5]
Caroline Maria Silva Lima [6]
Jefferson Adan Cavalcante Lopes [7]
Marden Costa Lopes [8]
Wilma Kátia Trigueiro Bezerra [9]
Marcela Marques Abbes [10]
Resumo
A Atenção Primária à Saúde (APS) é considerada o eixo central do Sistema Único de Saúde (SUS) e desempenha papel estratégico na coordenação do cuidado e na integração das Redes de Atenção à Saúde (RAS). Este estudo teve como objetivo analisar os desafios e avanços da APS na coordenação do cuidado, com ênfase na atuação das equipes multiprofissionais e no uso de tecnologias digitais para a integração das redes. Foi realizada uma revisão integrativa da literatura, analisando 10 artigos publicados entre 2015 e 2023, selecionados em bases como SciELO, PubMed e LILACS, com critérios de inclusão e exclusão. Os resultados indicam que, embora a APS tenha avançado na organização do cuidado, persistem desafios significativos, como a fragmentação dos serviços, a comunicação inadequada entre os níveis de atenção e a falta de articulação das equipes multiprofissionais. Por outro lado, estratégias como o fortalecimento da educação permanente, a adoção de tecnologias digitais, como o e-SUS AB, e a utilização de práticas colaborativas demonstram potencial para superar essas barreiras e fortalecer a coordenação do cuidado. Conclui-se que o fortalecimento da APS é fundamental para consolidar um sistema de saúde mais resolutivo, equitativo e centrado nas necessidades da população. Investimentos em infraestrutura, capacitação profissional e políticas públicas robustas são essenciais para que a APS consolide seu papel como coordenadora do cuidado e ordenadora das RAS.
Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Coordenação do Cuidado; Redes de Atenção à Saúde
1 INTRODUÇÃO
A Atenção Primária à Saúde (APS) é considerada o eixo central do Sistema Único de Saúde (SUS), assumindo a responsabilidade de coordenar o cuidado e organizar os fluxos dentro das Redes de Atenção à Saúde (RAS). Como primeiro ponto de contato dos usuários com o sistema, a APS desempenha um papel estratégico na promoção da integralidade e continuidade dos cuidados, além de articular ações de prevenção, tratamento e reabilitação de maneira integrada e resolutiva (Starfield, 2002; Mendes, 2011). No Brasil, o fortalecimento da APS tem sido uma prioridade, evidenciada por políticas e diretrizes, como a Portaria nº 4.279/2010, que define a APS como coordenadora do cuidado e ordenadora das redes (Brasil, 2010).
Apesar de seu potencial transformador, a efetivação da APS como coordenadora do cuidado enfrenta desafios significativos. A fragmentação dos serviços, a comunicação inadequada entre os níveis de atenção e a insuficiente integração das equipes multiprofissionais são algumas das barreiras que comprometem a capacidade da APS de atender às necessidades da população de forma equitativa e eficiente (Santos, Giordani & Almeida, 2020). Além disso, questões estruturais, como insuficiência de recursos, alta rotatividade de profissionais e falta de capacitação continuada, intensificam as dificuldades no desempenho desse papel central (Silva et al., 2020).
No âmbito da APS, as equipes multiprofissionais desempenham uma função essencial na articulação do cuidado. Compostas por profissionais de diferentes áreas, essas equipes promovem abordagens integradas e centradas nas necessidades dos usuários, ampliando a resolutividade dos serviços e fortalecendo a coordenação entre os diferentes níveis de atenção (Boaretto et al., 2021). No entanto, para que sua atuação seja efetiva, é necessário superar desafios como a ausência de protocolos padronizados, a fragmentação da informação e a escassez de estratégias tecnológicas que facilitem a comunicação e a integração dos dados (Brasil, 2023).
O presente estudo parte da problemática relacionada à eficácia da Atenção Primária à Saúde (APS) no cumprimento de seu papel como coordenadora do cuidado e organizadora das Redes de Atenção à Saúde (RAS) no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS). Apesar de ser reconhecida como o eixo central do sistema, a APS enfrenta desafios estruturais, organizacionais e culturais que comprometem sua capacidade de promover a integralidade e a continuidade do cuidado. A fragmentação dos serviços, a comunicação inadequada entre os níveis de atenção e a atuação limitada das equipes multiprofissionais são barreiras recorrentes que dificultam a integração efetiva das RAS. Nesse cenário, surge a questão central desta pesquisa: Quais são os desafios e avanços da APS na coordenação do cuidado e como as equipes multiprofissionais podem contribuir para a integração efetiva das RAS?
A hipótese que orienta esta investigação sugere que, embora a APS enfrente barreiras significativas que limitam sua eficácia como coordenadora do cuidado, o fortalecimento das equipes multiprofissionais, aliado à implementação de tecnologias digitais e estratégias colaborativas, pode promover avanços na integração das RAS. Essas iniciativas têm o potencial de melhorar a continuidade do cuidado, aumentar a resolutividade dos serviços e oferecer um atendimento mais centrado nas necessidades dos usuários.
Com base nesse cenário, o objetivo geral do estudo é analisar os desafios e avanços da APS na coordenação do cuidado, com foco na atuação das equipes multiprofissionais e na integração das RAS. Para alcançar esse propósito, foram definidos objetivos específicos, incluindo a identificação dos principais desafios enfrentados pela APS no contexto das RAS, a exploração do papel das equipes multiprofissionais na integração dos serviços, a análise do impacto das tecnologias digitais e práticas colaborativas na coordenação do cuidado, e a proposição de estratégias que fortaleçam a APS como eixo articulador do SUS.
A abordagem adotada busca contribuir para uma compreensão mais aprofundada do tema, oferecendo subsídios para o desenvolvimento de políticas e práticas que reforcem o papel da APS na organização dos serviços de saúde, promovendo um sistema mais resolutivo, equitativo e centrado nas necessidades da população.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A Atenção Primária à Saúde (APS) é reconhecida internacionalmente como um pilar central para sistemas de saúde eficazes e equitativos. A APS não apenas representa o primeiro contato dos usuários com os serviços de saúde, mas também desempenha funções críticas na promoção, prevenção, tratamento e reabilitação (Starfield, 2002). No Brasil, a APS, estruturada pela Estratégia Saúde da Família (ESF), é o ponto central da organização das Redes de Atenção à Saúde (RAS), conforme destacado na Portaria nº 4.279/2010, do Ministério da Saúde, que a posiciona como ordenadora do cuidado no Sistema Único de Saúde (SUS) (Brasil, 2010). Essa portaria ressalta que o papel da APS vai além de ser um serviço de assistência direta, integrando serviços e articulando diferentes níveis de atenção.
A literatura especializada identifica a coordenação do cuidado como um dos atributos essenciais da APS, definindo-a como a capacidade de integrar os diferentes níveis de atenção, garantindo a continuidade e a integralidade dos cuidados. Starfield (1992) estabeleceu os atributos essenciais da APS, enfatizando que a coordenação do cuidado depende diretamente da relação longitudinal entre o profissional de saúde e o paciente, bem como da efetividade dos mecanismos de comunicação entre as equipes de saúde. No Brasil, essa coordenação é um dos maiores desafios, considerando a diversidade de demandas e a fragmentação histórica do sistema de saúde (Macinko & Harris, 2015).
A fragmentação dos serviços é uma barreira frequentemente apontada. Campos e Domitti (2007) destacam que a fragmentação está associada a uma organização setorial dos serviços, que frequentemente operam sem comunicação ou integração eficaz. Esse fenômeno é agravado pela falta de sistemas de informação que conectem diferentes níveis de atenção. Apesar do avanço em ferramentas como o e-SUS AB, que possibilita o registro integrado de informações dos pacientes, sua implementação ainda enfrenta desafios, como infraestrutura tecnológica insuficiente e resistência por parte de profissionais de saúde (Ministério da Saúde,
As equipes multiprofissionais são um componente essencial para que a APS desempenhe seu papel coordenador. Ainda, Mendes (2015) demonstra que a composição diversificada dessas equipes – incluindo médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos e agentes comunitários de saúde – contribui para uma abordagem integral e resolutiva. Essas equipes promovem um olhar ampliado sobre o cuidado, indo além dos aspectos biológicos e considerando fatores sociais, culturais e psicológicos que impactam a saúde do indivíduo e da comunidade.
A atuação interdisciplinar, entretanto, requer uma articulação eficaz entre os membros da equipe. Segundo Paim et al. (2011), a falta de integração entre os profissionais pode limitar o potencial resolutivo da APS. Reuniões regulares, discussões de casos e o uso de protocolos compartilhados são estratégias que têm demonstrado eficácia na construção de um cuidado mais coeso e centrado no paciente. No entanto, para alcançar resultados significativos, é necessário investir em educação permanente, capacitando as equipes para lidar com a complexidade das demandas contemporâneas (Santos et al., 2017).
Outro aspecto central para a coordenação do cuidado é a integração entre os diferentes níveis de atenção, incluindo atenção secundária e terciária. A ausência de mecanismos claros de referência e contrarreferência é uma barreira amplamente reconhecida. Estudos mostram que pacientes frequentemente enfrentam dificuldades em acessar serviços especializados devido à falta de alinhamento entre a APS e os níveis mais complexos de atenção (Santos et al., 2017). Além disso, a comunicação inadequada entre os serviços resulta em descontinuidade do cuidado, duplicação de exames e aumento da sobrecarga nos serviços de urgência e emergência.
A integração das redes de saúde requer não apenas avanços tecnológicos, mas também mudanças organizacionais e culturais. O fortalecimento da APS como coordenadora do cuidado passa pela adoção de políticas públicas que priorizem a articulação entre os serviços, como apontado por Mendes (2015). Além disso, a incorporação de ferramentas digitais, como sistemas de prontuário eletrônico integrados, pode facilitar a troca de informações e promover uma abordagem mais colaborativa entre os profissionais.
Apesar das diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde, a implementação efetiva da coordenação do cuidado enfrenta barreiras significativas. A fragmentação do sistema de saúde é uma das principais dificuldades, agravada pela insuficiência de recursos financeiros, infraestrutura inadequada e carência de profissionais capacitados (Paim et al., 2011). Além disso, a alta rotatividade de profissionais nas equipes da APS compromete a continuidade das relações entre profissionais e usuários, dificultando o estabelecimento de vínculos que são fundamentais para a coordenação eficaz. Outro desafio está relacionado à resistência de alguns profissionais em adotar novas práticas colaborativas e tecnológicas. Estudos como o de Macinko e Harris (2015) apontam que a falta de capacitação e a sobrecarga de trabalho contribuem para essa resistência, limitando a eficácia das iniciativas de integração.
Para superar os desafios apontados, é necessário um esforço conjunto entre gestores, profissionais de saúde e pesquisadores. Investir na capacitação contínua das equipes multiprofissionais, promover a integração tecnológica e fortalecer as políticas públicas que priorizem a APS como eixo central do SUS são passos indispensáveis. A literatura aponta que a consolidação da APS como coordenadora do cuidado exige um compromisso político e social que transcenda as barreiras estruturais e culturais, garantindo um sistema de saúde mais equitativo e eficiente (Starfield, 1992; Mendes, 2015).
3 METODOLOGIA
A metodologia adotada para este estudo baseou-se em uma abordagem qualitativa, com ênfase na revisão integrativa da literatura. Essa escolha permite sintetizar o conhecimento já produzido sobre a coordenação do cuidado pela Atenção Primária à Saúde (APS) no contexto das Redes de Atenção à Saúde (RAS), oferecendo uma visão abrangente sobre avanços, desafios e lacunas existentes na literatura científica. A revisão integrativa é reconhecida por sua capacidade de unir diferentes abordagens metodológicas, contribuindo para uma análise mais robusta e fundamentada.
O levantamento bibliográfico foi realizado nas bases de dados SciELO, PubMed e LILACS, amplamente utilizadas em estudos de saúde pública. Foram utilizados descritores específicos relacionados ao tema, como “Atenção Primária à Saúde”, “coordenação do cuidado”, “equipes multiprofissionais” e “Redes de Atenção à Saúde”, combinados com operadores booleanos (AND e OR) para otimizar os resultados e garantir a abrangência da busca.
Inicialmente, foram identificados 92 artigos publicados entre 2015 e 2023, período selecionado para garantir que as análises estivessem atualizadas com os contextos e políticas recentes do SUS. Após a leitura dos títulos e resumos, foram aplicados critérios de inclusão e exclusão para refinar a seleção. Os critérios de inclusão consideraram estudos publicados em português ou inglês, disponíveis em texto completo, que abordassem diretamente a coordenação do cuidado pela APS no contexto das RAS, e que utilizassem metodologias qualitativas, quantitativas ou mistas. Por outro lado, os critérios de exclusão eliminaram artigos duplicados nas bases consultadas, publicações sem acesso ao texto completo, e estudos que não discutissem a coordenação do cuidado ou que focassem exclusivamente em intervenções hospitalares.
Após a aplicação desses critérios, 10 artigos foram selecionados para análise detalhada. Os estudos escolhidos foram organizados em uma planilha estruturada, onde foram registrados os títulos, autores, ano de publicação, periódicos, objetivos, metodologias empregadas, principais resultados e conclusões. Esses dados foram sistematicamente analisados para identificar padrões, divergências e lacunas no tema investigado.
A análise dos dados seguiu uma abordagem qualitativa fundamentada nos princípios da análise de conteúdo de Bardin (2011), dividida em três etapas principais. Primeiramente, realizou-se uma leitura flutuante dos textos, destacando temas recorrentes e ideias principais. Em seguida, os conteúdos foram categorizados em tópicos temáticos, como “atributos da APS na coordenação do cuidado”, “desafios enfrentados pelas equipes multiprofissionais” e “estratégias tecnológicas para integração das RAS”. Por fim, os resultados foram interpretados e organizados em uma síntese narrativa, conectando os achados da literatura ao referencial teórico que sustenta este trabalho.
A escolha pela revisão integrativa e pela análise qualitativa permitiu uma compreensão aprofundada do papel da APS na coordenação do cuidado e da atuação das equipes multiprofissionais nesse contexto. No entanto, algumas limitações foram identificadas, como a exclusão de artigos não disponíveis em texto completo e a concentração em publicações acadêmicas, o que pode ter restringido a inclusão de dados provenientes de relatórios técnicos ou experiências práticas não documentadas em periódicos indexados.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
A Atenção Primária à Saúde (APS) representa o alicerce fundamental do Sistema Único de Saúde (SUS), assumindo o papel central na organização e prestação de cuidados, funcionando como a principal porta de entrada e coordenadora do cuidado nas Redes de Atenção à Saúde (RAS). Nesse contexto, a APS é responsável não apenas por atender às demandas iniciais de saúde da população, mas também por promover a continuidade e a integralidade dos serviços em diferentes níveis de atenção. Sua capacidade de articulação com outros serviços da RAS é essencial para garantir a eficiência e a efetividade do sistema de saúde como um todo (CHUEIRI; HARZHEIM; TAKEDA, 2017). Contudo, a operacionalização plena dessa função coordenadora enfrenta desafios significativos, como a fragmentação dos serviços, lacunas na comunicação interprofissional e a insuficiente articulação entre as equipes multiprofissionais, fatores que comprometem os princípios estruturantes do SUS.
A literatura aponta que a fragmentação é um dos principais entraves à coordenação do cuidado. Esse fenômeno se manifesta na desconexão entre os níveis de atenção e na dificuldade de compartilhar informações entre os diferentes pontos de atendimento. Segundo Lima e Costa (2023), a ausência de mecanismos claros de referência e contrarreferência impede a continuidade do cuidado, especialmente em casos que requerem a interação entre a APS e os níveis secundário e terciário. A falta de dados consistentes sobre o estado de saúde dos pacientes após alta hospitalar ou consulta especializada compromete o monitoramento longitudinal, limitando a capacidade da APS de exercer seu papel de vigilância e acompanhamento.
Além disso, a comunicação inadequada entre os profissionais de saúde intensifica esse problema. Conforme Santos, Giordani e Almeida (2017), a desarticulação entre as equipes resulta em lacunas na continuidade assistencial, sobrecarregando os serviços de urgência e emergência. Os gestores entrevistados pelos autores reconhecem a importância da APS, mas destacam a insuficiência de recursos financeiros, infraestrutura inadequada e carência de profissionais capacitados como barreiras críticas para a consolidação de uma coordenação eficaz. Esses fatores afetam não apenas a resolutividade dos serviços prestados pela APS, mas também a experiência do usuário no SUS, minando a confiança no sistema público de saúde.
Outro elemento crucial para a efetividade da APS é a atuação das equipes multiprofissionais. Essas equipes, compostas por médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais, desempenham um papel vital na articulação dos cuidados. Lima e Costa (2023) destacam que o trabalho colaborativo dentro dessas equipes permite uma abordagem mais integrada e centrada no paciente, promovendo a troca de informações e o alinhamento das ações entre os diferentes níveis de atenção. Contudo, os autores também ressaltam que a falta de protocolos padronizados e de práticas colaborativas regulares limita o potencial das equipes multiprofissionais.
Nesse cenário, a utilização de tecnologias digitais desponta como uma estratégia promissora para superar os desafios de comunicação e fragmentação. Sistemas de prontuário eletrônico integrados, como o e-SUS AB, podem facilitar o compartilhamento de informações entre os profissionais e garantir que os dados do paciente estejam acessíveis em tempo real. Chueiri, Harzheim e Takeda (2017) apontam que o uso dessas ferramentas não apenas melhora a continuidade do cuidado, mas também aumenta a resolutividade da APS, permitindo que as equipes multiprofissionais tomem decisões mais informadas e embasadas. Apesar de seu potencial, a implementação dessas tecnologias ainda enfrenta resistência por parte de alguns profissionais e falta de treinamento adequado, o que limita sua eficácia no cotidiano do SUS.
Além da dimensão tecnológica, a literatura também destaca a importância de capacitar continuamente os profissionais de saúde. Santos, Giordani e Almeida (2017) sugerem que a formação continuada em áreas como comunicação interprofissional, gestão do cuidado e uso de tecnologias digitais é indispensável para fortalecer a coordenação do cuidado na APS. Esses autores enfatizam que programas de educação permanente, alinhados às demandas reais do território, podem não apenas qualificar os profissionais, mas também promover uma cultura de aprendizado e colaboração, essenciais para a integração das redes de saúde.
Outro desafio apontado é a integração entre a APS e os serviços comunitários e intersetoriais, como programas de assistência social, reabilitação e apoio psicológico. A falta de articulação entre esses setores compromete a oferta de um cuidado integral, especialmente para populações vulneráveis, como idosos, pessoas com doenças crônicas e comunidades em situação de pobreza. Conforme Lima e Costa (2023), a ausência de diálogo entre os diferentes atores do território cria barreiras adicionais à coordenação do cuidado, perpetuando desigualdades no acesso e na qualidade dos serviços.
Apesar dos desafios, a literatura também evidencia avanços significativos. A adoção de práticas colaborativas, como reuniões interdisciplinares e o uso de ferramentas tecnológicas, tem demonstrado resultados promissores. Chueiri, Harzheim e Takeda (2017) destacam que protocolos clínicos compartilhados e metodologias participativas aumentam a eficiência das equipes multiprofissionais e fortalecem o papel da APS como coordenadora do cuidado. Essas práticas, quando alinhadas às diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2010), podem transformar a APS em um eixo organizador mais efetivo, promovendo a integração e a continuidade do cuidado.
As diretrizes do Ministério da Saúde, especialmente aquelas descritas na Portaria nº 4.279/2010, reiteram o papel central da APS como o eixo organizador do Sistema Único de Saúde (SUS). Essa portaria estabelece princípios que definem a APS como coordenadora do cuidado e ordenadora das Redes de Atenção à Saúde (RAS), ressaltando sua responsabilidade em garantir a continuidade e a integralidade dos serviços. Além disso, o Ministério da Saúde (2023) enfatiza que a atuação de equipes multiprofissionais é essencial para atingir esses objetivos, pois permite uma abordagem integrada e colaborativa, abrangendo dimensões físicas, psicológicas e sociais do cuidado. A implementação eficaz dessas diretrizes é indispensável para consolidar um sistema de saúde que promova equidade e resolutividade no cuidado ofertado à população.
Apesar das diretrizes robustas, desafios persistem, como apontam Lima e Costa (2023), especialmente na comunicação entre a APS e os níveis secundário e terciário. Essas lacunas frequentemente resultam na duplicação de exames, atrasos no tratamento e um aumento no risco de erros médicos, comprometendo a experiência do paciente. A fragmentação do sistema de saúde, caracterizada pela falta de integração entre os diversos serviços, cria barreiras que impactam negativamente os resultados clínicos e a continuidade do cuidado. Esses autores destacam que superar tais desafios requer esforços significativos na articulação entre os níveis de atenção e a implementação de sistemas que promovam a troca de informações em tempo real.
As equipes multiprofissionais, no entanto, surgem como uma solução promissora, compostas por médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais, essas equipes desempenham um papel crítico na articulação e integração dos serviços dentro da APS. Segundo Lima e Costa (2023), práticas colaborativas, como reuniões interdisciplinares e o uso de protocolos clínicos compartilhados, têm mostrado grande eficácia na melhoria da resolutividade dos serviços e na coordenação do cuidado. Essas práticas não apenas promovem uma abordagem centrada no paciente, mas também facilitam a troca de informações entre os níveis de atenção, fortalecendo o vínculo entre os diferentes pontos da RAS e garantindo uma continuidade assistencial mais efetiva.
Outro componente essencial para o fortalecimento da coordenação do cuidado é o uso de tecnologias digitais, o Ministério da Saúde (2023) tem investido significativamente na implementação de sistemas como o e-SUS AB, que permite o registro e compartilhamento de dados dos pacientes em tempo real. Essa iniciativa busca reduzir a fragmentação dos serviços, melhorar a comunicação entre os profissionais e facilitar a gestão do cuidado. Apesar de seu potencial, a adoção dessas tecnologias enfrenta barreiras, como a resistência de alguns profissionais e a falta de capacitação específica. Santos, Giordani e Almeida (2017) ressaltam que a integração dessas ferramentas depende não apenas de infraestrutura tecnológica, mas também de uma mudança cultural nas práticas das equipes de saúde.
A capacitação contínua também é essencial para fortalecer a APS Santos, Giordani e Almeida (2017) destacam que o treinamento em áreas como comunicação interprofissional, gestão do cuidado e uso de tecnologias digitais pode melhorar significativamente a capacidade da APS de coordenar o cuidado. Eles sugerem que a inclusão dessas competências em programas de formação e educação permanente é crucial para preparar os profissionais para os desafios contemporâneos da gestão em saúde.
Os estudos convergem na necessidade de fortalecer a APS como coordenadora do cuidado no SUS. No entanto, alcançar esse objetivo exige a superação de barreiras estruturais, organizacionais e culturais que ainda limitam a efetividade do sistema. Investimentos em infraestrutura, capacitação profissional e tecnologias de informação são indispensáveis para consolidar a APS como o eixo articulador das redes de atenção. Além disso, é crucial promover políticas públicas que integrem os diferentes níveis de atenção e incentivem práticas colaborativas, fortalecendo o papel da APS como o centro do cuidado no SUS.
5 CONCLUSÃO
A Atenção Primária à Saúde (APS), como eixo central do Sistema Único de Saúde (SUS), desempenha um papel essencial na coordenação do cuidado e na integração das Redes de Atenção à Saúde (RAS). Apesar de avanços significativos, como o fortalecimento de equipes multiprofissionais e a implementação de tecnologias digitais, persistem desafios estruturais e organizacionais que limitam sua atuação. A fragmentação dos serviços, as lacunas na comunicação entre os níveis de atenção e a insuficiência de recursos são barreiras que comprometem a continuidade e a integralidade do cuidado, impactando negativamente a qualidade e a resolutividade dos serviços oferecidos à população.
O fortalecimento da APS exige uma abordagem integrada que combine estratégias de gestão, educação permanente para os profissionais e a utilização de tecnologias de informação que facilitem a comunicação entre os diferentes pontos da rede. As equipes multiprofissionais, quando atuam de forma colaborativa e articulada, demonstram ser uma solução promissora para ampliar a resolutividade e promover um cuidado mais centrado no paciente.
Este estudo contribuiu para evidenciar tanto os avanços quanto as lacunas na atuação da APS como coordenadora do cuidado no SUS. No entanto, para que a APS alcance seu pleno potencial, é imprescindível superar as barreiras identificadas por meio de investimentos contínuos em infraestrutura, formação e políticas públicas que priorizem a articulação entre os níveis de atenção e a equidade no acesso aos serviços de saúde. Assim, a APS pode consolidar seu papel como eixo estruturante de um sistema de saúde mais eficiente, resolutivo e centrado nas necessidades da população.
REFERÊNCIAS
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CAMPOS, G. W. S.; DOMITTI, A. C. Apoio matricial e equipe de referência: uma metodologia para gestão do trabalho interdisciplinar em saúde. Cadernos de Saúde Pública, v. 23, n. 2, p. 399-407, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2007000200016. Acesso em: 2 dez. 2024.
CHUEIRI, P. S.; HARZHEIM, E.; TAKEDA, S. M. P. Coordenação do cuidado e ordenação nas redes de atenção pela Atenção Primária à Saúde – uma proposta de itens para avaliação destes atributos. Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, v. 12, n. 39, 2017. Disponível em: https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/1363. Acesso em: 2 dez. 2024.
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STARFIELD, B. Primary care: Concept, evaluation, and policy. New York: Oxford University Press, 1992.
[1] Discente do curso de Medicina do (Universidade Federal de Alfenas na UNIFAL e-mail: beatrizcruz.paula@sou.unifal-mg.edu.br
[2] Enfermeira e Mestranda em Políticas Públicas e Desenvolvimento pela Emescam. e-mail: roldiamanda@hotmail.com
[3] Médico pela UniEvangélica. e-mail: felypedclima@gmail.com
[4] Fisioterapeuta Esp. em Fisioterapia Intensiva pela Faculdade Estácio de Sá do Rio Grande Do Norte e em Doenças Raras pela UNIESP e-mail: nome@provedor.com.br
[5] Enfermeira Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, Hospital Universitário Walter Cantídio, Maternidade-Escola Assis Chateaubriand, Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Ceará, Fortaleza – Ceará e-mail: janaidesalves@hotmail.com
[6] Enfermeira Esp. pela Residência em Saúde da Família pela Unimontes e-mail: carolinemariasilvalima703@gmail.com
[7] Farmacêutico Esp. em Saúde da Família pela Universidade Federal do Oeste do Pará e-mail: jeffersoncavalcante.stm@gmail.com
[8] Enfermeiro com Residência Multiprofissional em Saúde da Família pela Unimontes e-mail: mardenlopes@hotmail.com
[9] Enfermeira e Mestrado em Sistemas Agroindústrias pela UFCG, Esp. em Saúde da Família, Auditoria em Saúde, Gestão em Saúde, Servidora Efetiva estatutária no município de Paulista/PB e Locada na Secretaria de Saúde Plantonista do Hospital Municipal Emerentina Dantas, Paulista/PB e-mail: wilmatrigueiro@gmail.com
[10] Médica pela Unirv – Campus Aparecida e Residente em Clínica Médica – SCMGO e-mail: marcela_abbes@hotmail.com