REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202511301243
Waldir Júlio Teis
RESUMO
Este artigo examina como o comportamento do consumidor contemporâneo é moldado por pressões psicológicas, sociais e culturais que levam os indivíduos a uma perda progressiva de autonomia e senso crítico. Destaca como a publicidade excessiva, o fácil acesso ao crédito e os padrões culturais globalizados contribuem para o consumo descontrolado, frequentemente desconectado das necessidades reais. À medida que o consumo se torna um mecanismo psicológico de compensação, os indivíduos se expõem cada vez mais a práticas de trabalho autoexploratórias, particularmente em ambientes profissionais autônomos e de alta pressão, o que intensifica a prevalência da Síndrome de Burnout.
O estudo também discute como modelos culturais importados de sociedades dominantes influenciam as identidades locais, remodelam as expectativas sociais e geram novas demandas de consumo. Além disso, aborda o crescente fenômeno da judicialização e o uso indevido do sistema de justiça como consequência da fragilidade social, da intolerância e da ampla expansão dos direitos. Ao analisar essas dinâmicas, o texto reflete sobre a deterioração da convivência social, o enfraquecimento das instituições democráticas e a transformação do indivíduo em um sujeito governado pelo imperativo do “ter” em vez do “ser”.
Palavras-chave: Consumo; Sociedade de consumo; Vulnerabilidade; Síndrome de Burnout; Judicialização.
ABSTRACT
This paper examines how contemporary consumer behavior is shaped by psychological, social, and cultural pressures that lead individuals to a progressive loss of autonomy and critical judgment. It highlights how excessive advertising, easy access to credit, and globalized cultural patterns contribute to uncontrolled consumption, often disconnected from real needs. As consumption becomes a psychological mechanism of compensation, individuals increasingly expose themselves to self-exploitative labor practices, particularly in autonomous and high-pressure professional environments, which intensifies the prevalence of Burnout Syndrome.
The study also discusses how cultural models imported from dominant societies influence local identities, reshape social expectations, and generate new consumption demands. Moreover, it addresses the growing phenomenon of judicialization and the misuse of the justice system as a consequence of social fragility, intolerance, and the broad expansion of rights. By analyzing these dynamics, the text reflects on the deterioration of social coexistence, the weakening of democratic institutions, and the transformation of the individual into a subject governed by the imperative of “having” rather than “being.”
Keywords: Consumerism; Consumption culture; Consumer vulnerability; Burnout Syndrome; Judicialization.
Introdução.
Prosseguindo com o tema RELAÇÃO DE CONSUMO, aos poucos vamos descobrindo que o consumo não se limita tão somente à vontade da livre escolha. Com o passar do tempo e com a imensa pressão da mídia, inicia-se um processo de ansiedade (BAUMAN, 2008), que aos poucos vai tomando conta da própria vontade do indivíduo tornando-o refém do incentivo ao consumismo (BAUDRILLARD, 2011).
As ofertas massivamente apresentadas vão impregnando o sistema psicológico de tal forma que, quando o indivíduo se depara com a realidade já está tomado pela Síndrome de Burnout, tornando-o cada vez mais, presa fácil do anunciante (FREUDENBERGER, 1980; CODO, 2006), e para satisfazer essa ansiedade ilimitada, torna-se escravo de si mesmo.
Portanto, para melhor discorrer sobre o problema, vale o exercício de análise, ainda que não científica, mas de conhecimento empírico do cotidiano. A ânsia de consumo se constitui numa necessidade psicológica, onde a razão deixa espaço à impossibilidade de resistir à tentação do consumo.
Funcionamento da sociedade
Na organização e funcionamento da sociedade é que se percebe o quanto o homem se torna dependente dos seus próprios caprichos e da lógica do consumo (LIPOVETSKY, 2009). A partir de certo momento deixa de tomar consciência das consequências que isso traz para a saúde, para a família e para a sociedade, e nas relações de trabalho, criando a cada passo, necessidades progressivas que ele mesmo não percebe.
Com essa insensatez ele ultrapassa os limites de resistir à própria dificuldade de discernimento do que é necessário, daquilo que é apenas um “capricho hediondo” ou seja, pratica a si mesmo uma tortura psicológica e física, à qual ele mesmo se submete porque esqueceu de mensurar o “limite do razoável”.
A dependência psicológica criada pelo consumo excessivo reflete a lógica da sociedade contemporânea, guiada por estímulos externos e pela cultura do excesso (LIPOVETSKY, 2009; ROCHA; PEREIRA, 2012).
A facilidade de crédito amplia essa vulnerabilidade (MARQUES, 2020; NUNES, 2022), estimulando decisões impulsivas (KOTLER; KELLER, 2019).
Esse comportamento fora dos padrões normais, surge com o excesso de oferta de fornecedores de bens, serviços e de financiamentos, pois não tem consciência da real necessidade de obter isso ou aquilo.
A facilidade de crédito é um dos fatores que mais escravizam o indivíduo, diria, nas “necessidades especiais”, pois, aquilo que lhe é colocado à disposição, sente a vontade e assim decide, de fazer uso da oferta como se o amanhã não existisse. Exemplo disso são as linhas de crédito de longo prazo para a aquisição de bens independentemente da necessidade, ou seja, a oferta se torna uma “tentação de consumo”, porque no seu íntimo, tudo aquilo que vem com mais tecnologia e novidade, e as facilidades de aquisição, para ele (indivíduo), sente um consolo psicológico que nada agrega, a não ser a sensação do “ter”.
Com o surgimento dos cartões de crédito que cria imensa facilidade de acesso à compra de qualquer coisa, leva o indivíduo a um estado de inconsciência que não importa o “tamanho” do esforço que deva empreender para obter determinado objeto ou bem, apenas recebe em troca uma “satisfação passageira”. Isso ocorre muitas vezes com as ofertas de “pacotes turísticos”, ignorando, inclusive, fronteiras, sejam de territórios ou mesmo culturais, além das ofertas de quinquilharias que se constituem apenas em novidades.
Normalmente para boa parte desses consumistas, é muito importante ter a satisfação de afirmar que foi a Miami para “dar um passeio”, porém com a intenção centralizada nas oportunidades de compra daquilo que em muitos casos, lá já foi descartado pelo seu povo originário, importando bens e coisas até incompatíveis com sua cultura local, tornando-se com isso um consumo “estéril”, pois, primeiro faz a compra sem saber o que fazer com o objeto comprado, e concluindo que não lhe é útil, faz a distribuição sem se importar com o resultado, o que torna um consumismo sem freio, pois não tem referência de “mais valor” na própria vida.
Padrões de comportamentos
Desde a colonização adotamos padrões de comportamentos externos. Com a vinda dos nossos colonizadores, apesar de terem encontrado apenas “povos originários” (índios), foram introduzindo quinquilharias naqueles nativos, como forma de conquistar a confiança necessária para o alcance dos seus objetivos. Conta-nos a história, que o “espelhinho” fazia sucesso nas conquistas. Com isso, na medida em que os europeus aqui se instalavam não havia outra forma, senão continuar disseminando suas culturas, pois não havia limites, tampouco, resistência.
A incorporação de hábitos culturais externos remonta à colonização (HOBSBAWM, 1995), sendo as práticas consumistas atuais uma continuação dessa imposição simbólica (CASTELLS, 2019).
A adoção de símbolos culturais americanos (McDonald’s, Coca-Cola, cultura pop) acompanha o fenômeno da globalização e do consumo identitário (BAUMAN, 2008)
Porém, atualmente, com a tentativa de uma prática de adoção da cultura local, com o poder da suavidade é possível controlar uma sociedade impondo-lhe um comportamento direto. Destaca-se nesse caso a invasão de um padrão consumista americano, podendo citar a vinda da mega fabricante de lanches MacDonald, a Coca Cola, e outras grifes.
Com a invasão do padrão consumista não foi apenas o Brasil que se curvou às grifes citadas. A Itália e a França, no pós II Guerra mundial, também aderiram e em todos os lugares onde aconteceu ou ainda pode acontecer, torna-se um mercado consumista, assim como é atualmente a indústria do cinema coreano.
Outro exemplo a ser citado é a montaria de rodeio – touros ou cavalos. Antigamente já se consumia e ainda muito se consume a música country americana, assim como os figurinos e as modalidades desses esportes, não ficando para trás a prática do hipismo, com suposta origem na Inglaterra. Atualmente e há muito tempo, os pais contratam uma escola de hipismo e satisfazem sua vontade inscrevendo o filho para ser um “grande montador”, o que muitas vezes leva o “pequeno” a um stress destruidor de sonhos, pois a capacidade de escolha fica reduzida cada vez mais.
Fluxo da cultura
A cultura sempre transita em grupos sociais maiores ou menores, provocando reflexos na economia e no trabalho. Aqui não se faz referência à cultura tão somente relacionada aos costumes, modus vivendi, ou de manutenção de tradições. Essas culturas impulsionam o consumo tanto quanto a necessidade de aderir aos novos modelos culturais que levam ao consumo.
A cultura circula entre grupos e gera novas necessidades de consumo (PEREZ, 2017).
A exportação de esportes como baseball e hipismo evidencia o impacto econômico e social do consumo cultural (KELLNER, 2001).
A busca constante por adaptação cultural leva à exaustão e intensifica a necessidade de desempenho (BLACKWELL; MINIARD; ENGEL, 2008).
Exemplo disso é a “exportação” do baseball, esporte muito praticado nos Estados Unidos da América e exportado para o Japão. É óbvio que essa assimilação do esporte obriga o indivíduo a se adaptar aos estilos originários (uniformes, equipamentos…) e com isso surge nova necessidade de consumo, inserindo novo esporte na cultura local, assim como o Jazz que lá também aportou.
Essa “afetação” à cultura esportiva provoca reflexos na economia e no próprio trabalho. O indivíduo procura absorver novos costumes, e agregados com os que já tem, vai levando-o à exaustão. Por isso, com a necessidade de se adaptar a um “agregado” no modus vivendi, pode ser que necessite aumentar o seu potencial produtivo, para satisfazer uma vontade que o leva à busca de novas fontes de renda, comprometendo o seu tempo consigo mesmo, ou seja, por mais que busque novas rendas, no seu íntimo ainda não são suficientes.
O trabalho autônomo
A auto exploração no trabalho — como ocorre com motoristas de aplicativos — é fator determinante para o avanço da Síndrome de Burnout (PIRES; SANTOS, 2020).
Muitas vezes dada à necessidade da satisfação própria e ilimitada, passa a exercer atividades autônomas, na certeza de que suprirá seus caprichos. É o caso de motoristas da UBER, embora seja estabelecido um limite de horário de 8 (oito) a 12 (doze) horas diárias no máximo, o indivíduo vai além disso, provocando uma “auto exploração”. Por sua vez, essa auto exploração é a maior causa da Síndrome de Burnout, pois todo esse processo se volta contra o próprio indivíduo, sendo vítima de si mesmo.
Ocorre que a falta de proteção do indivíduo contra si próprio é um desvio que tem repercussões sociais, pois havendo apenas um na família com essa síndrome, reflete na família inteira, o que culmina na redução de capacidade operacional.
Casos assim são perceptíveis com muita frequência na classe médica, principalmente naqueles recém graduados que buscam empreender a qualquer custo sua capacidade laborativa efetuando contratações de plantões em várias unidades de saúde dentro de um próprio município ou mesmo, junto aos municípios mais próximos do seu domicílio, onde, a soma de horas contratadas ultrapassa em muito, o limite do suportável.
Porém, não é somente essa “automutilação” laborativa que ocorre nos indivíduos que exploram suas atividades de forma autônoma. Nota-se isso no sistema bancário, nas lojas de departamentos, nos clubes esportivos de esporte individual, nas carreiras artísticas da música, e outros.
No sistema bancário é comum ser contactado via telefone, fora do horário comercial. As diretorias estabelecem metas de produção, tanto na venda de seguros, ofertas de captação, de cartões de créditos e outros produtos, obrigando o funcionário a empreender o máximo de esforço para cumprir as metas estabelecidas. Não é diferente nas lojas de departamentos, onde muitas vezes, a competição se torna tão aguerrida que obriga a direção estabelecer uma espécie de “fila dos vendedores” para atendimento de clientes.
Nos clubes esportivos de competições individuais, a situação muitas vezes vai além do limite físico do atleta. Casos como o da atleta Simone Biles evidenciam o impacto da pressão psicológica e do excesso de exigência (GOFFMAN, 1985; FREUDENBERGER, 1980)
Caso emblemático foi com a atleta americana Simone Biles, onde se colaciona a seguinte notícia:
FOCO NA SAÚDE MENTAL
A americana de 26 anos não entra em uma competição desde agosto de 2021, quando defendeu os EUA nos Jogos de Tóquio. Na ocasião, Simone Biles não chamou a atenção pelas conquistas, mas por ter desistido de diversas provas, como a final do individual geral, para priorizar sua saúde mental.6 de ago. de 2023.
https://www.google.com/search?q=atleta+que+desistiu+das+olimp%C3%ADadas&rlz
Casos assim são comuns nessas categorias, embora não sejam noticiados face à baixa repercussão com pessoas menos célebres.
Assim também ocorre com artistas da música. Com determinada frequência há notícias de que o artista ficará afastado por determinado tempo com a justificativa mais ou menos nesses termos: o cantor “….” informa que deixará os palcos por … (determinado tempo) para tratar de assuntos pessoais, ou para se dedicar mais à sua família.
Quando isso ocorre, provavelmente o estresse já está num nível praticamente fora de controle, levando o indivíduo ao recolhimento, ao isolamento social, onde a visão crítica vai se perdendo a cada dia, diminuindo a capacidade de escolhas em face da perda dos limites.
Esses excessos são causados por fatores externos levando à submissão, desorientando os parâmetros normais em prol da conquista de mais espaço sempre querendo mostrar a sua importância na sociedade.
Essa pressão não ocorre somente na vida privada ou atividade privada. No setor público há certa diferença de comportamento do indivíduo dada às suas limitações funcionais, mas não o distancia do cumprimento de metas. Na atividade privada a pressão vem da submissão a um líder, ou seja, é de dentro para fora que a obrigação lhe é imposta, enquanto na atividade pública a pressão vem da sociedade – de fora para dentro, embora sempre há uma liderança, a cobrança é do povo, principalmente quando se trata da implementação de políticas públicas.
Na verdade, se constrói mecanismos para um homem que não existe, levando-o muitas vezes à ausência de horizonte, fazendo-o a fazer o que tem que fazer, porque nem sempre sua escolha é livre e consciente. Quando a escolha lhe é imposta perde a liberdade, e o que se sabe é que o homem é um ser condenado a fazer escolhas, porém nem sempre depende do seu livre arbítrio, e nos nossos dias deságua numa escolha sem juízo, consolando-o com o consumo.
No passado as escolhas do consumo dependiam da necessidade primária, ou seja, da sobrevivência, e atualmente esse consumo é uma necessidade criada pelo indivíduo, decorrente do enfrentamento da ausência concreta da necessidade. São escolhas sem critérios.
O endividamento.
O processo do consumismo aumenta o endividamento. Essa situação ocorre justamente pela falta de raciocínio lógico do indivíduo. O consumismo cria endividamento por meio da compra de símbolos de status (BOURDIEU, 2007).
A publicidade direcionada estimula escolhas sem racionalidade crítica (KELLNER, 2001).
O consumidor se torna presa fácil das ofertas e do glamour que o consumo de certas coisas ou bens provoca no meio social ao qual o indivíduo faz parte. Exemplificando: adquirir uma mansão para morar acomodando apenas o casal. Há necessidade? Ou ainda: adquirir pagando caro uma caneta Montblanc quando uma Bic supre a necessidade. Vale mais o glamour do que a necessidade propriamente dita, pois qual é a utilidade na visão dos outros?
Iguais x iguais, desiguais x desiguais
Temos como princípio constitucional estampado no artigo 5º da constituição, o da igualdade. O princípio constitucional da isonomia material encontra fundamento no art. 5º da Constituição Federal (BRASIL, 1988) e dialoga com a proteção consumerista dos vulneráveis (BENJAMIN; MARQUES; BESSA, 2020).Porém esse princípio não pode ser generalizado. A tutela oferecida à sociedade não pode ser genérica no sentido estrito da lei. Nem sempre uma medida aplicada de uma forma para determinado núcleo social terá os mesmos efeitos quando aplicada a um outro totalmente diferente, na sua forma de existir. Exemplificando, temos o bolsa família, vale gás e assim por diante.
Esses programas são destinados às pessoas menos abastadas ou com mínimas condições financeiras necessárias para a própria sobrevivência. Portanto, os iguais são tratados iguais, ou seja, aqueles que fazem parte dessa classe social exposta à vulnerabilidade de toda a sorte, tem um tratamento diferente daqueles que estão fora do alcance dessa vulnerabilidade.
O princípio da igualdade não pode ser mensurado por uma “régua” universal. Depende muito das nuances de cada núcleo social em razão do Estado ser obrigado a fazer essa medição nos parâmetros em que cada um se encontra. Embora no direito civil, penal, de relações comerciais e trabalhistas, entende-se que não pode haver distinção. Essa igualdade ou desigualdade em outros ramos do direito depende da situação social de cada um.
O Estado Judiciário e a tutela universal
Com a criação de inúmeras leis, as quais decorrem do comportamento humano, o Estado se obriga a estabelecer parâmetros para conter as próprias desigualdades, assim como, o direito de cada um.
Por sua vez, a Carta Magna Brasileira estabelece no artigo 5º, XXXV o seguinte:
Art. 5º …
(…)
“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
A expansão de direitos e a crescente judicialização são temas debatidos por juristas contemporâneos (MARQUES, 2020; NUNES, 2022).
O aumento de demandas judiciais também é reflexo da fragilidade social e da perda de tolerância coletiva (BAUMAN, 2008; PIERUCCI, 1998).
Ocorre que atualmente, face à inafastabilidade da justiça se constata que há excessos na busca dessa própria justiça. Essa inafastabilidade do Poder Judiciário, que é a busca da pacificação social, resulta em muitos casos, num custo social abarcado pelo cidadão, que poderia ser evitado.
Há uma banalização do Poder Judiciário, ou seja, banalização da jurisdição, porque muitas vezes, o que em tempos não muito remotos era normal, atualmente já é anormal. Nosso Parlamento foi “criando” leis e direitos de tal forma que muitos fatos ou atos poderiam ser resolvidos ou tolerados, mas se criou uma figura chamada “dano moral”, que qualquer incidente vira uma ação no Poder Judiciário. Por exemplo, o atraso de um voo, o mau atendimento em determinados estabelecimentos, a não entrega no prazo de um bem adquirido, e muitos outros fatos. Esse dano moral é tão difícil de mensurar, que as autoridades competentes sequer têm parâmetros objetivos, e quando tudo depende da subjetividade, nem sempre a decisão se torna em ato de justiça ou de pacificação.
Com isso, a banalização da Justiça resulta numa demolição institucional do país, a ponto de comprometer a própria democracia, com a fragilização da própria Instituição em face dos ataques que recebe. Quando isso ocorre, algo está errado, não propriamente com a Instituição, mas os erros são decorrentes de pessoas que a incorporam como se elas fossem. Vivemos uma verdadeira crise de autoridade no Brasil, a ponto de começar um “entendimento coletivo” de que o país seria melhor caso a Instituição não existisse.
Por isso, o abalroamento de ações no Poder Judiciário vai “minando” a sua essência em face de que busca a solução de tudo como se fosse o único caminho. Ocorre que se não houvesse a interpretação de que a justiça só é conseguida via Poder Judiciário, teríamos a justiça mais célere e com soluções mais adequadas para muitos fatos e casos de “varejo”. A exemplo disso são os Conselhos de Defesa do Consumidor. Nossa legislação deveria ser adequada de tal forma que não haveria caminho a ser percorrido caso a solução não agradasse a A ou B.
Em suma. Todo esse estresse causado pelo próprio comportamento do homem, vai se tornando um fator em que a boa convivência e a própria paz social se perdem nos corredores, chegando a tal ponto em que o individualismo é o destino do indivíduo, culminando num nível de tolerância “zero”, pois o “ter” para a ser prioridade do “ser”.
CONCLUSÃO
Conclui-se, portanto, que o consumo contemporâneo deixou de ser um simples instrumento de satisfação de necessidades para transformar-se em um mecanismo de pressão psicológica, social e econômica que molda o comportamento e a identidade do indivíduo. A força da publicidade, aliada à facilidade de crédito e à influência de padrões culturais globalizados, cria um cenário propício à perda do senso crítico e à adoção de hábitos consumistas que, muitas vezes, se afastam da utilidade real e se aproximam da busca simbólica por status e pertencimento.
Nesse processo, o indivíduo se torna cada vez mais vulnerável, submetendo-se à auto exploração em diferentes contextos laborais, principalmente em atividades autônomas e de alta competitividade, o que favorece o surgimento da Síndrome de Burnout. A pressão por desempenho e a necessidade de corresponder às expectativas sociais, familiares e culturais resultam em desgaste emocional profundo e na perda da autonomia decisória.
Além disso, o estudo demonstra que a desigualdade social e o tratamento diferenciado entre grupos vulneráveis e não vulneráveis repercutem diretamente no modo como o consumo é vivenciado, ampliando disparidades e revelando desafios estruturais na efetivação do princípio da igualdade. Por fim, a crescente judicialização de conflitos cotidianos evidencia uma sociedade fragilizada, que recorre ao Judiciário como primeira via de solução, contribuindo para a sobrecarga institucional e para a deterioração da confiança coletiva.
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