CONCEITOS E TEORIAS APLICADOS NA PESQUISA DO TERRITÓRIO DA ALDEIA DA JAQUEIRA EM PORTO SEGURO (BA): UMA CONTRIBUIÇÃO DA CIÊNCIA GEOGRÁFICA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102502021405


Leandro Santana Souza
Orientador: Prof. Dr. Sebastião P. G. de Cerqueira Neto
Co-orientador : Prof. Dr. André Burigo Leite


Resumo

Localizada no município de Porto Seguro (BA), a Aldeia da Jaqueira além de ser um lugar de resistência da cultura Pataxó, abriga grande diversidade ambiental, apesar dos anos de exploração, sobretudo, de madeiras na região do Extremo Sul da Bahia bem como o descaso com as políticas públicas efetivas para a conservação do seu território. Esse artigo, que é parte de uma dissertação de mestrado, mostra os caminhos teóricos que conduziu a pesquisa em direção a compreensão da dinâmica ambiental do território pesquisado. Num território que mesmo com 522 anos de existência os estudos sobre os territórios dos povos originários ainda se encontra incipientes, foi fundamental adaptar conceitos gerais, sobretudo, da Geografia para descrever e analisar um lugar que a cada dia estreita as relações com os agentes da globalização através de conexões via internet principalmente para a sobrevivência econômica da aldeia. Nesse artigo foi dado relevância a descrição das características geográficas do territórios pesquisado e uma revisão bibliográfica de conceitos que contribuíram para a compreensão da dinâmica da Aldeia da Jaqueira. Sendo a Geografia uma ciência com relações umbilicais com a temática ambiental, desde a sua origem, optamos por construir o arcabouço teórico através das suas duas principais correntes de pensamento: Geografia Física e Geografia Humana.

Palavras-chave: Geografia. Território. Ciência Ambiental.

Abstract

Located in the municipality of Porto Seguro (BA), Aldeia da Jaqueira, in addition to being a place of resistance for the Pataxó culture, is home to great environmental diversity despite the years of exploitation, especially of wood in the extreme south region of Bahia, as well as the neglect with effective public policies for the conservation of its territory. This article, which is part of a master’s dissertation, shows the theoretical paths that led the research towards understanding the environmental dynamics of the researched territory. In a territory that, even with 522 years of existence, studies on the territories of native peoples are still incipient, it was essential to adapt general concepts, especially Geography, to describe and analyze a place that every day strengthens relations with the agents of globalization. Through internet connections mainly for the economic survival of the village. This article was given relevance to describe the geographical characteristics of the territories researched and a bibliographic review of concepts that contributed to the understanding of the dynamics of the Jaqueira Village. Since Geography is a science with umbilical relationships with the environmental theme, since its origin, we chose to build the theoretical framework through its two main currents of thought: Physical Geography and Human Geography.

Keywords: Geography. Territory. Environmental Science.

Introdução

Para estudar a dinâmica ambiental da Aldeia da Jaqueira localizada no município de Porto Seguro (BA) – território onde se desenvolve a minha pesquisa de mestrado no PPGCTA IFBA/UFSB – foi construído um arcabouço teórico com forte tendência geográfica, visto que a orientação da dissertação é realizada por um geógrafo com a co-orientação feita por um engenheiro ambiental que pesquisa as trilhas nas aldeias dos povos originários em Porto Seguro (BA). Identificada como Reserva da Jaqueira, neste artigo vamos tratá-la como Aldeia da Jaqueira, pois é assim que o povo Pataxó a chama carinhosamente, e nesse sentido o vocábulo aldeia é mais apropriado do que o vocábulo reserva.

A Geografia é responsável por produzir uma gama de pesquisas sobre a ocupação do território brasileiro sob diferentes vertentes de análise e em diferentes escalas dimensional, o que consequentemente colocou a Geografia em contato com diferentes áreas do conhecimento, como nos explica Mendonça (1988, p.17): “sendo a geografia uma ciência resultante do encontro de um grande número de outras ciências, estas, por sua vez, influenciaram no seu desenvolvimento. Entre essas análises certamente que a questão ambiental está intrínseca ao trabalho de geógrafo que construiu pontes com outras ciências objetivando uma compreensão mais ampla dos territórios pesquisados.

A história da Geografia nos mostra que enquanto ciência ela tem a sua origem na descrição dos elementos naturais de uma paisagem. Contudo, o papel da Geografia não se limitou em apenas descrever a paisagem, mas, interpretar os processos responsáveis pela transformação do território; seja o território urbano, rural, ecológico ou territórios onde vivem os povos tradicionais onde, além dos trabalhos de Antropologia, a Geografia tem dado suas contribuições. E é neste contexto que a Geografia e suas contribuições para as questões ambientais é abordada neste artigo.

Seria impossível listar neste artigo todos os estudos que a Geografia produziu no Brasil sobre as questões ambientais, pois, a Geografia tanto na sua ramificação física ou humana elaborou análises em diversas escalas (municipal, regional e nacional) utilizando diferentes vetores. Há pesquisas que partiram da observação da dinâmica dos elementos naturais, e outras que tiveram como vetor principal a ação humana sobre os territórios. No caso desse texto os conhecimentos da Geografia orientaram os trabalhos de campo na Aldeia da Jaqueira bem como a reflexão sobre sua dinâmica interna e externa.

A caracterização da Aldeia da Jaqueira foi norteada pelos conceitos território e lugar. Mesmo com a popularização do uso desses termos, ou utilizados com outras concepções em outras áreas dos conhecimentos, eles são bastante delineados dentro da Geografia. Isso não quer dizer que há uma unanimidade na definição conceitual de cada um deles, pois, os geógrafos fazem o uso desses conceitos de acordo seus objetivos e interesses de pesquisa. Nesse sentido, o tópico que compila os conceitos sobre território e lugar tem por objetivo mostrar a diversidade de interpretações e ao mesmo tempo demonstrar sua aplicação para a Aldeia da Jaqueira.

No que se refere à escolha dos teóricos optamos por apresentar as perspectivas de geógrafos físicos como, por exemplo, Antônio Christofoletti (1995), Jean Tricart (1977) e Aziz Ab’Sáber (2003). Na Geografia Humana sublinhamos os trabalhos de Milton Santos (1991; 1992; 1996; 2003; 2006), Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro (1981) e Josué de Castro (1984). Esse rol de geógrafos foi elaborado a partir da etapa de revisão bibliográfica que seria utilizada para compor a espinha teórica da pesquisa.

Por mais que possa haver críticas a esta dicotomia dentro da Geografia, inclusive, reafirmada nesse texto a partir do momento em que separamos em tópicos diferentes as contribuições dos geógrafos físicos e as contribuições dos geógrafos humanos, “é quase impossível trabalhar sociedade e natureza dentro de uma única ciência, deve-se, entretanto, aceitar que o processo de desenvolvimento e evolução destes dois componentes do planeta se dê de maneira completamente diferente” (Mendonça, 1998, p.28). Portanto, não importa se há dicotomia entre geografia física e geografia humana, pois, o conjunto desses estudos fazem parte da sedimentação da científica da Geografia.

Característica do território pesquisado

A Aldeia da Jaqueira se localiza no território do município de Porto Seguro, que está localizado na região econômica do Extremo Sul da Bahia (figura 01). Mesmo pertencendo a uma mesma etnia os territórios dos povos originários apresentam características diferentes em suas dinâmicas. No caso da Aldeia da Jaqueira, por exemplo, há uma grande influência externa da economia do município na dinâmica da aldeia, sobretudo, através do setor turístico. O que pode parecer um cenário antagônico, pois, se coloca a resiliência desses povos com o capitalismo, no entanto, essa relação é é fundamental para sua sobrevivência econômica da etnia Pataxó que vive na aldeia.

Figura 01: Localização do Extremo Sul da Bahia

Fonte: CERQUEIRA NETO (2009)

O território da Aldeia da Jaqueira (figura 02) possui aproximadamente 827 hectares e é localizado a 5 km da área urbana de Porto Seguro -BA (a partir da Orla Norte do município), pertencente a etnia Pataxó. Sendo uma área de preservação ambiental, atualmente esta comunidade reside aproximadamente 40 famílias. Foi fundada em 1998 por um grupo de pessoas originárias da aldeia de Coroa Vermelha (município de Santa Cruz Cabrália-BA). Os fundadores desta comunidade justificam o foco da conservação de seu ecossistema e principalmente a preservação de sua cultura como pilar de sua existência naquele território.

Figura 02: Localização da Aldeia da Jaqueira.

Elaobração: Ronaldo Porto (2022)

O rios que banham esta reserva são o Rio dos Mangues e o Rio Itinga (figura 03), que é o utilizado pelos habitantes da reserva para lazer e lavagem de roupas, e que tem as suas margens protegidas pela vegetação da Mata Atlântica, como observado nos trabalhos de campo. O Rio Itinga localiza-se no município de Porto Seguro -BA, onde sua nascente fica na Estação RPPN da Veracel (Latitude 16°22’46.4″S e Longitude 39°07’49.0″ e desagua próximo da Reserva da Jaqueira, na barraca de praia Barramares (Latitude 16°22’56.6″S e Longitude 39°01’42.7″O), com aproximadamente 12km de percurso, desde sua nascente até o desaguamento. Este mesmo rio banha as Aldeias Juerana e Jaqueira. Segundo a resolução do CONAMA 357/2005 (alterada para a Resolução 430/2011), pertence a Classe Especial (à preservação dos ambientes aquáticos em unidades de conservação de proteção integral) de Classe 1 (à proteção das comunidades aquáticas em Terras Indígenas). A Reserva não possui nenhum tipo de serviço de tratamento de água e esgoto. O serviço de poço artesiano é o meio que atende toda a população.

As características físicas da área pesquisada tem o relevo com a predominância da Formação Barreiras, presente nos municípios litorâneos da região, tendo as falésias como principais formas de relevo desta formação. No topo das falésias há um intenso processo de loteamento acelerado e dificilmente de será contido devido à falta de infraestrutura dos órgãos competentes (CERQUEIRA-NETO, 2012).

Figura 03: Rio Itinga margeado por exemplares da vegetação da na Mata Atlântica dentro da Aldeia da Jaqueira.

Fonte: trabalho de campo do autor (2022).

A vegetação do Complexo Mata Atlântica predomina na região, entretanto, os processos de colonização da região promoveram sensivelmente uma diminuição da sua área de abrangência, ficando alguns residuais que abrigam suas espécies vegetais e animais localizados principalmente nos territórios das comunidades tradicionais ou em Áreas de Proteção Ambiental. “O pau-brasil que abundava em nossas florestas tropicais, ao longo da costa atlântica, foi o primeiro alvo do saque aos recursos naturais” (PORTO-GONÇALVES, 1995, p.312). No litoral a vegetação rasteira que recobre acosta de acumulação também está seriamente comprometida. Os tipos de vegetação mais presentes na região são: Floresta Ombrófila Densa, Formações Pioneiras com influência Fluviomarinha, Floresta Estacional Semidecidual e Floresta Ombrófila Aberta (IBGE, 1992). As áreas onde estão os exemplares

que restaram são utilizadas como trilha ecológica ou se tornaram Área de Proteção Ambiental – APA, como as de Coroa Vermelha (Santa Cruz Cabrália), a de Caraíva (Porto Seguro) e a de Santo Antônio (Belmonte).

Aldeia da Jaqueira: teritório e lugar

Ao priorizar a abordagem de território e lugar este artigo segue os termos que são utilizados pelos povos originários da Aldeia da Jaqueira para referenciar o espaço onde vivem, como por exemplo, “nosso território”, “nosso lugar”. Neste tópico introduzimos uma ínfima parte de um artigo intitulado Teoria e conceitos aplicados no estudo do Extremo Sul da Bahia aproveitando alguns conceitos de Geografia que foram utilizados pelo autor para formular seus estudos sobre a dinâmica do Extremo Sul da Bahia, região econômica onde se localiza a Aldeia da Jaqueira.

Silva e Silva (2003) entendem o território como uma “organização social”, por apresentar na sua essência elementos culturais que contribuem para a identificação do mesmo. E, para Gonçalves (1995, p.311) como o território é “originalmente um conceito jurídico- político torna-se um conceito-chave para os geógrafos”. Estes pensamentos que colocam o território como um componente passivo, sendo ele o resultado das ações humanas, refletem uma evolução ou uma nova vertente de interpretar a dinâmica social dentro dos seus limites geográficos. No entanto, (2002, p.21) lembra que “dentro da dimensão material do território é necessário, portanto, considerar essa dimensão natural, que em alguns casos ainda se revela um de seus componentes fundamentais”. E, ainda que seu uso, nos dias atuais, possa ser considerado reducionista ele continuará tendo um caráter geográfico. Machado (1997, p.24) relembra que “o conceito de território se origina dentro das ciências naturais, na botânica e na zoologia, as quais designam território como área de disseminação de espécies vegetais ou animais”. Este conceito também valoriza a delimitação de uma área territorial, não levando em consideração a presença humana.

É através dessa diversidade de olhares, que se complementam, que se pôde construir nossa percepção sobre a Aldeia da Jaqueira, pois ela é uma organização social/cultural, um território jurídico-político constituído também por uma diversidade ambiental.

Para o conceito de lugar, buscou-se em Santos (1996) a sua ideia de que a cidade representa o lugar de liberdade para aqueles que acabaram de sair da escravidão e é também um lugar revolucionário, pois na cidade se concentra a explosão de tecnologia e do conhecimento. A cidade se torna, então, um lugar construído cheio de simbolismo que reflete

a economia, a sociedade e a cultura que se pratica no seu interior. Lefebvre (1999) chamará a rua de lugar, um lugar de encontros, da prática teatral, da mistura, do comércio, enfim das relações. Para Tuan (1983) o lugar é um mundo de significado organizado. Segundo Castells (2003, p.515), lugares não são necessariamente comunidades, embora possam contribuir para sua formação. Todavia, a vida dos habitantes é marcada por suas características, portanto são, na verdade, lugares bons ou ruins dependendo do julgamento de valor do que seja uma vida boa.

A definição de Castells contrapõe com a ideia de que o lugar é sempre perfeito, quase um paraíso, onde as pessoas desejam viver. A definição de lugar para Carlos (1996, p.29) tem intrinsecamente o sentido de efervescência e transformação social quando ela diz que, ele é produto das relações humanas, entre homem e natureza, tecido por relações sociais que se realizam do plano do vivido, o que garante a construção de uma rede de significados e sentidos que são tecidos pela história e cultura civilizadora produzindo a identidade, posto que é aí que o homem se reconhece porque é o lugar da vida.

Em suma, percebe-se que os conceitos de território e lugar apresentam certa uniformidade quando elaborados por pesquisadores que tomam como norteamento uma determinada sociedade e suas ações. Dentro de cada uma dessas partes do espaço geográfico existem componentes naturais, econômicos e culturais. Território e lugar são partes de um todo, do espaço geográfico, e como nenhuma parte é igual a outra, todos eles são únicos. Nesse pequeno rol de conceitos foi possível identificar que a dinâmica da Aldeia da Jaqueira apresenta características em cada um deles. Assim, esse território ou lugar pode ser compreendido por suas características cultural, ambiental e econômica lhe faz singular diante da diversidade do município de Porto Seguro (BA).

No próximo tópico apresentamos outros estudiosos da Geografia que contribuíram com a composição teórica desse artigo.

Contribuições da geografia física

Iniciamos esse compêndio através da contribuição do Prof. Antônio Christofoletti e sua proposição para analisar a dinâmica ambiental no Brasil. De acordo com Christofoletti (1995, p.334). As contingências no funcionamento do sistema terrestre foram responsáveis pelas mudanças ambientais ocorridas ao longo do tempo geológico. Todavia, o surgimento e a expansão dos seres humanos, culminando com na evolução do homo sapiens, propiciou a inserção de nova força modificadora.

Certamente que sendo um geógrafo que se dedicou a compreender a dinâmica natural do planeta Christofoletti utilizará como vetores de sua análise elementos como os rios e suas características, as formas e origens das rochas e dos relevos, ou, por exemplo, as condições climáticas de um determinado lugar. Contudo, com o aumento demográfico, a evolução tecnológica, a ação do homem passou a ter uma participação substancial na dinâmica ambiental na sua totalidade.

Entretanto, a Geografia Física nos ensina que “independentemente da ação e presença humana, a natureza físico-biológica do sistema terrestre organiza-se ao nível dos ecossistemas e geossistemas” (Christofoletti, 1995, p.337). Porém, essa afirmação de Christofoletti não pode ser interpretada como se o homem não tivesse influência nas mudanças ambientais, no entanto, é uma afirmação pedagógica no sentido de esclarecer que antes da existência do homem a Terra possuía uma dinâmica própria com eventos tectônicos, climáticos, bióticos e abióticos.

Ao negligenciarmos os estudos dos elementos naturais e suas transformações sem a participação humana estaríamos desprezando uma gama de pesquisas que foram e são importantes para a compreensão ambiental do planeta. De acordo com Ross (1997, p.82) “tratar a questão ambiental esquecendo-se do homem como ser social e agente modificador dos ambientes naturais ou, ao contrário, tratar o social, desmerecendo o ambiental é negar a própria essência do homem – sua inteligência.”

É preciso que saibamos ler pesquisas e entendê-las a partir do viés científico de cada pesquisador, por exemplo: quando Christofoletti (1995) relata sobre a ocupação do Nordeste brasileiro, principalmente, a Zona da Mata e diz que “a mata praticamente desapareceu. Entretanto, na escala regional não há registros de que as condições climáticas tenham sido modificadas. Elas permanecem semelhantemente as mesmas, pois a comunidade não chegou a perceber e registrar alterações” (Christofoletti, 1995, p.341). De forma alguma um estudo desse pode ser interpretado como uma apologia ao desmatamento, mesmo porque num território como o da Aldeia da Jaqueira a conservação da Mata Atlântica possui simbolismo espiritual e ambiental.

Evidentemente que um estudo sobre a dinâmica de um território envolve uma diversidade de fatores, e nenhuma ciência fechada em si conseguiria explorar todas as variantes que compõem um território e sua dinâmica. Portanto, Christofoletti (1995) sabia da necessidade de incluir os aspectos humanos numa análise ambiental de caráter físico. Para ele “não se pode excluir o conhecimento provindo das análises e estudos sobre os sistemas socioeconômicos, considerando os seus componentes e processos, sem omitir o estudo do comportamento e a tomada de decisões políticas” (Christofoletti, 1995, p.338). O que Christofoletti nos mostra através de seus estudos é que os territórios possuem suas particularidades ambientais. Para ele, por exemplo, ao modificar “a vegetação florestal e as condições climáticas na região amazônica modificar-se-ão ecossistemas e o próprio geossistema” (Christofoletti, 1995, p.344). Portanto, ainda que vivamos num único planeta, num único país, numa mesma região, os elementos naturais de uma paisagem irão se comportar diferentemente tanto pelas ações antrópicas ou por transformações de causas naturais.

Não há como falar em meio ambiente somente através das ações do homem sobre o território físico. Ademais, o território precisa ser conhecido em suas características físicas para podermos realizar os planejamentos nos meios urbano e rural, onde estão grande parte da sociedade mundial. Em Ecodinâmica (1977) Jean Tricart constrói uma proposta que parte das características dos elementos físicos de uma paisagem para demonstrar como estes são fundamentais na organização e reorganização dos territórios. Resumimos no quadro 01 alguns elementos que Tricart utilizou para traçar um diagnóstico ambiental de um dado território.

Quadro 1: Proposta de Tricart para se obter as características físicas dos territórios.

Definição do quadro regionalCondições    climáticas   analisadas    sob                   ângulo ecológico e morfodinâmico.
Análise morfodinâmicaEstudo do sistema morfogenético (condições climáticas, do relevo e da litologia. Estudo dos processos atuais que deve ser conduzido com base na perspectiva interdisciplinar. Influências antrópicas.
Recursos ecológicosRecursos e regimes hídricos. Condições ecoclimatológicas. Solos. Diagnóstico agroecológico (indispensável para que se possa decidir e aplicar com sucesso uma política de organização e gestão do território.

Elaboração: Autores

As ações e características sugeridas por Tricart (1977) apresentam vocábulos de difícil compreensão para o indivíduo que não tem contato com o ambiente acadêmico, sobretudo, na Geografia Física. Entretanto, o resultado dessas análises é fundamental para que a relação homem/natureza, ou a ocupação do território pelo homem, tenha por objetivo minimizar impactos que acontecerão inevitavelmente. Ao pensarmos na organização de um território é importante “verificar se há laços de interdependência dele com as regiões vizinhas. […]. Em uma palavra, é necessário integrar num conjunto mais amplo o perímetro a organizar” (Tricart, 1977, p.75). Essa visão, que inicialmente tem por escopo analisar um determinado território, dentro de uma escala, parece ter um caráter individualista, mas, Tricart trata logo de apontar para uma dinâmica integrada entre os agentes naturais e sociais dos diferentes territórios.

O Prof. Aziz Ab’Sáber que mapeou, descreveu e interpretou os Domínios Morfoclimáticos no território brasileiro, em Os domínios de natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas (2003) mostra que a substituição de componentes das paisagens tropicais – nos setores de mais amplo aproveitamento agrícola – tem sido a fórmula predominante e até hoje insubstituível para a conquista dos espaços econômicos das áreas primariamente florestadas dos trópicos úmidos (Ab’Sáber, 2003, p.25). Ab’Sáber (2003) não se restringiu em “apenas” caracterizar o Brasil através dos Domínios Morfoclimáticos, ele ao mesmo tempo denuncia as modificações ou a supressão dos elementos naturais em detrimento da expansão e mecanização da agricultura bem como da urbanização acelerada. Destacamos no quadro 02 pontualmente algumas dessas transformações citadas por Ab’Sáber (2003).

Quadro 2: Pontos de estrangulamento da paisagem citados por Ab’Sáber.

Sul da BahiaExploração      madeireira     para                      abastecer       as siderúrgicas contribuiu para o desfiguramento quase total de vastas áreas
AmazôniaDesde que as rotas terrestres franquearam a região, atingindo os interflúvios tudo se modificou.
Norte do BrasilMarabá (PA), Imperatriz (MA) sofreram com o imediatismo da exploração econômica do solo (grandes empresas agropecuárias).

Elaboração: Autores

De acordo com Ab’Sáber (2003, p.24) “decididamente, o brasileiro tem tido dificuldade, por uma razão ou por outra, em manter partes da cobertura vegetal e em conviver com uma paisagem onde sobreexistam florestas”. Nesse início de terceira década do século XXI é possível afirmar que, por todas as características da nossa atual política ideológica ambiental, a tendência é de que os residuais de nossos principais biomas diminuam. Logo, a descrença de Ab’Sáber com a preservação florestal no Brasil ainda faz parte dos sentimentos tanto por parte daqueles que pesquisam quanto por parte da população mais esclarecida. No trabalho de campo foi possível perceber que se não fosse os Pataxó grande parte do que restou da Mata Atlântica no território de Porto Seguro não estaria preservada.

Por outro lado, Ab’Sáber aponta, na sua concepção, dois movimentos que entravam a possibilidade de uma relação mais racional (alguns vão chamar de sustentabilidade) entre o homem e a natureza: o economismo que é imediatista e pode ser criminoso, e o ecologismo dotado de uma “ingenuidade e puerilidade tão grandes que chega a prejudicar qualquer causa que vise à proteção dos recursos naturais ditos renováveis, na maioria dos casos de muito problemática reconstrução” (Ab’Sáber, 2003, p.25-26). Acrescentaríamos que a politização desses dois elementos citados por Ab’Sáber é uma barreira quase que intransponível no acerto de políticas nacionais para um desenvolvimento menos predatório. De acordo com Mendonça (1998, p.32), muito influenciada pelo espírito cartesiano, a geografia física lablachiana colocou em vigor os trabalhos de campo promovendo bem marcadas descrições, classificações, comparações e correlações das partes integrantes do conjunto regional, produzindo ao final tipologias fisionômicas.

A inserção da ação humana, ainda que numa análise puramente de geografia física, mostra que este ramo da Geografia evoluiu, como nos mostrou Antônio Christofoletti, Jean Tricart e Aziz Ab’Sáber. Logo, não podemos imputar à geografia física uma análise limitada em apenas descrever, classificar e realizar analogias entre as paisagens. E essa é uma perspectiva indispensável para entendermos o processo histórico e as ações na história do presente da relação homem/natureza. Esses autores foram importantes para guiar os trabalhos de campo realizados na Aldeia da Jaqueira para a descrição dos seus principais elementos naturais, como, o Rio Itinga, a vegetação da Mata Atlântica e o relevo.

Os humanistas

No tópico anterior vimos como os geógrafos que se dedicam ao estudo do território a partir da dinâmica dos elementos naturais. Neste tópico congregamos algumas das visões de geógrafos que tratam o território dentro da Corrente Humana da Geografia, como Milton Santos, Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro e Josué de Castro.

Abriremos esta abordagem através do Prof. Milton Santos que faz uma análise evolutiva da relação do homem com a natureza a partir da concepção de meio natural até o que ele chamará de meio técnico-científico-informacional. Ao falar sobre o meio natural e a relação com o homem, Santos (2006, p.157) diz que “quando tudo era meio natural, o homem escolhia da natureza aquelas suas partes ou aspectos considerados fundamentais ao exercício da vida, valorizando […] essas condições naturais que constituíam a base material da existência do grupo.” Aqui Santos (2006) refere-se uma situação na qual o homem dependia da dinâmica ambiental, o que deu origem ao pensamento do Determinismo Ambiental.

Em relação ao meio técnico, Santos (2006) descreve a condição de poder que o homem ganhou diante da natureza para modificá-la. Assim, ele passa a “enfrentar a Natureza, natural ou já socializada, vinda do período anterior, com instrumentos que já não são prolongamento do seu corpo, mas que representam prolongamentos do território, verdadeiras próteses” (Santos, 2006, p.159). Essas próteses são equipamentos, construções que vão, sobretudo, facilitar sua apreensão e locomoção pelo território natural ou urbanizado. Pode-se chamar esta fase de Possibilismo, que ao contrário do estágio anterior o homem transforma a natureza a partir das técnicas e do capital que possui.

Numa terceira fase, Santos (2006, p.159) entende que “a ideia de ciência, a ideia de tecnologia e a ideia de mercado global devem ser encaradas conjuntamente e desse modo podem oferecer uma nova interpretação à questão ecológica, já que as mudanças que ocorrem na natureza também se subordinam a essa lógica.” A união da ciência com a tecnologia, que apresenta também um caráter de informação é o que Santos (2006) chamará de meio técnico- científico-informacional que será utilizado para a universalização dos lugares, porém, não numa perspectiva humanista, mas, exploratória, mormente, dos recursos naturais. Outrossim, quando a ciência a tecnologia se instalam num dado território, este se torna um lugar luminoso, a falta delas poderão tornar os lugares opacos. Assim, “numa região desprovida de meios para conhecer, antecipadamente, os movimentos da natureza, a mobilização dos mesmos recursos técnicos, científicos, financeiros e organizacionais obterá uma resposta comparativamente mais medíocre” (Santos, 2006, p.162).

Um dos maiores envolvimentos do Prof. Milton Santos com a questão ambiental pode ser vistos através do seu texto intitulado A redescoberta da natureza (1992) onde ele discorre sobre a relação homem/natureza de um estágio de harmonia para um estágio de dominação. De acordo com Santos (1992, p.04-05), a história do homem sobre a Terra é a história de uma ruptura progressiva entre o homem e o entorno. Esse processo se acelera quando, praticamente ao mesmo tempo, o homem se descobre como indivíduo e inicia a mecanização do Planeta, armando-se de novos instrumentos para dominá-la.

Nessa evolução tecnológica e científica o homem passou a dominar a natureza, inclusive influenciando em sua dinâmica em diferentes escalas, como também passou a impor um poder sobre outros lugares e, consequentemente, subjugar outros povos. Também é importante ressaltar, mesmo em menor quantidade, algumas aldeias dos povos originários estão totalmente ou parcialmente integradas através da tecnologia. Por exemplo, na Aldeia da Jaqueira há smartphones conectados à internet e o uso de maquinas de cartão de crédito para atender aos turistas.

Se antes os eventos naturais que causavam incidentes provocando perdas humanas e econômicas, em alguns espaços de tempo, agora homem passa a ser também um vetor que interfere na geologia, na geomorfologia, no clima causando efeitos devastadores contínuos “e cumulativos graças ao modelo de vida adotado pela Humanidade” (Santos, 1992, p.05). Nesta mesma linha de raciocínio, Peloggia (1998) dirá que vivemos num período geológico que pode ser chamado de Quinário ou Tecnógeno.

O Prof. Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro, através do livro A questão ambiental no Brasil 1960 – 1980, ofereceu uma síntese crítica sobre os caminhos do desenvolvimento brasileiro e sua relação ao meio ambiente. Ao interpretar o papel da Conferência de Estocolmo (1972) como um marco histórico do debate mundial sobre as questões ambientais, e consequentemente, a participação dos países, Monteiro (1981, p.21) aponta que “o grande dilema dos países que tentam quebrar a barreira ao desenvolvimento é conciliar as ideologias do ecologismo e do economismo”. Essa dicotomia tem atravessou do século passado para este e em alguns países não se vê perspectiva de mudanças, pois, ambos os vetores se mostram, quase sempre, radicais.

Ao descrever a política ambiental e seu aparelho institucional dentro do limite temporal do seu livro, Monteiro (1981) coloca em questão a relação entre ciência e política em nosso país. De acordo com Monteiro (1981, p.28), “a percepção comercial e o valor que se imputa aos recursos naturais têm estado sempre além e sido mais decisivo na tomada de decisão do que a percepção científica do ambiente”. Nesse século XXI, mesmo com todo o avanço das ciências no Brasil, se vive uma negação científica (não apenas pela pandemia) também na área ambiental. Por exemplo, as demissões, exonerações de pessoas técnicas e

cientistas de órgãos fundamentais para o planejamento, seja no desenvolvimento urbano, rural, bem como na proteção de áreas que possuem residuais considerados de biodiversidade e onde vivem comunidades tradicionais e os povos originários. Outrossim, salientamos o sucateamento da Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

Nessas referências teóricas a presença de Josué de Castro (1984) é imprescindível para nos ajudar a compreender a fome em nosso país a partir de suas análises social, econômica e ambiental. É comum, sobretudo, na classe política remeter a miséria do povo brasileiro às condições geográficas onde vive. Ao denunciar a precária alimentação do brasileiro, Castro (1984, p.50) dizia que a fome é muito mais um “produto de fatores socioculturais do que de fatores da natureza geográfica”. Após a primeira edição do livro “Geografia da Fome” em 1946 o Brasil não aprendeu com os estudos de Josué de Castro. Mesmo com toda a vitalidade do agronegócio no país, mesmo com projetos de fortalecimento da agricultura família, o Brasil ainda é um país de famintos. Nesse sentido, quando da fase mais crítica da pandemia do Covid-19, os povos originários foram gravemente afetados pela falta de alimentos, sobretudo, pelo fato de que seus territórios não são mais autossustentáveis.

Para Castro (1984, p.50), o Brasil com sua infinita variedade de quadros climato- botânicos seria possível produzir alimentos suficientes para nutrir racionalmente uma população várias vezes igual ao seu atual efetivo humano […] é que nossa estrutura econômico-social tem agido sempre num sentido desfavorável ao aproveitamento racional de nossas possibilidades geográficas.

Portanto, é preciso cobrar dos responsáveis o porquê da continuidade dessa contradição que detectada, por Josué de Castro, no século passado se prolonga pela segunda década do século XXI. Ou seja, porque a riqueza da produção dos setores econômicos não consegue diminuir a carência por alimentação de parte da sua população? E os povos originários que geralmente estão alijado do desenvolvimento do país, por diferentes motivos, sofrem com a insegurança alimentar, pois na maior parte dos seus territórios já não há pesca e caça em abundância e sobrevivem através de uma agricultura de subsistência dependente da variação climática e com o uso de ferramentas rústicas.

Castro (1984, p.267) é enfático ao dizer que, “a fome no Brasil, que perdura, apesar dos enormes progressos alcançados em vários setores de nossas atividades, é consequência, antes de tudo, de seu passado histórico, com os seus grupos humanos, sempre em luta e quase nunca em harmonia com os quadros naturais”. Josué de Castro, num dos prefácios da edição de 1984, dizia que falar da fome era um exercício delicado e perigoso por entender ser este um dos maiores tabus da nossa civilização. Concordando com Josué de Castro, para os políticos, sobretudo, os políticos de países, cidades que agem como ditadores, que negam a condição de miséria do seu povo, falar sobre a fome é apenas um exercício da retórica política.

Portanto, a grande contribuição de Josué de Castro está na dissociação da fome com as características ambientais de determinados lugar, seja no Brasil ou em qualquer outra parte do mundo. Entretanto, a associação entre a fome e as condições naturais de um lugar ainda é amplamente cultuado em nosso país, vide a condição permanente de miséria do semiárido brasileiro e que poderia também ser aplicado em grande parte dos territórios dos povos originários.

Considerações finais

Ao revisitar alguns clássicos da Geografia neste artigo o escopo principal foi subsidiar nossa análise sobre a relação homem/natureza a partir da dinâmica do território da Aldeia da Jaqueira. Por isso, a orientação da escrita foi no sentido de agregar conhecimentos advindos das duas Correntes da Geografia.

A Geografia Física estuda as características físicas do meio geográfico, considerando a disposição de elementos, inter-relações, tipos de formações geológicas e geomorfológicas, eventos climáticos, descrição de elementos naturais ou de qualquer outra característica natural do ambiente em estudo. Já a Geografia Humana considera as relações interpessoais desenvolvidas em certo ambiente que caracterizam, por exemplo, uma região, um método de produção, a constituição social e econômica, ou seja, atrelado às atividades humanas desenvolvidas em algum espaço e tempo.

Só existe uma Geografia enquanto ciência, as duas Correntes, Humana e Física, tratadas como dicotomia, como posições antagônicas, hoje podem ser compreendidas como uma evolução do geógrafo no que concerne a sua principal função, que é compreender o mundo em que vivemos; seja pela dinâmica dos elementos naturais, pela própria dinâmica da terra, seja através das ações humanas sobre o território, ou ainda, que seja pela combinação de todos os esses vetores. A complexidade do espaço geográfico não pode ser explicada somente por suas formas, assim como não tem seu fim nas relações sociais. A separação nesses campos distintos pode ser explicada justamente por sua complexidade e a dificuldade dos pesquisadores em construir o espaço geográfico com todos os elementos que deveriam compor seus estudos.

O conhecimento geográfico produzido na atualidade mostra-se comprometido com a ação política, com a vontade de combater as desigualdades sociais e com as questões ambientais. Pode-se dizer, dessa forma, que a Geografia tornou-se uma verdadeira ciência da denúncia. Como afirma Andrade (2006, p.118), “o geógrafo deve estar comprometido com os interesses da sociedade”; e as questões de todos os tipos de territórios são intrínsecas ao trabalho do geógrafo que está sempre estabelecendo pontes com outras ciências. Nesse sentido concordamos com Afonso (1999, p.27) que “somente equipes interdisciplinares são capazes de assimilar a integrar todas as informações de modo a formar um conjunto coerente. […] é um dos maiores objetivos em estudos ambientais”. E essa característica é explicitada na minha formação (Administração) e do orientador e co-orientador da pesquisa que gerou esse artigo.

O que norteou esse artigo foi adotar uma geografia integradora, onde os elementos sociais e naturais do espaço sejam contemplados e analisados rigorosamente sem dissociá-los. Só assim foi possível compreender a dinâmica da Aldeia da Jaqueira no que tange a relação do povo Pataxó com o seu território, que ao longo da história sofreu espoliação dos elementos naturais influenciando diretamente no seu modo de vida.

Sem a compreensão da dinâmica geográfica qualquer análise de outras ciências serão feitas com deficiência teórica e metodológica, tendo em vista que pouquíssimos resultados de pesquisa, independente da área de conhecimento, pode prescindir do espaço geográfico, dos territórios e lugares que possuem suas singularidades culturais, econômicas e ambientais.

A realização de pesquisas nos territórios de comunidades tradicionais não é uma atividade fácil, pois, envolve, sobretudo, uma imersão por parte do pesquisador na comunidade e “ganhar” a confiança dos seus moradores. Assim, esses territórios são carentes de pesquisa principalmente no que se refere a sua dinâmica ambiental, haja vista que a Geografia Humana, a Antropologia e a História, por exemplo, têm produzido estudos sobre a dinâmica socioeconômica e, principalmente, a despeito de novas dinâmicas introduzidas no território desses povos. Por isso, no desenvolvimento da pesquisa optou-se pela análise física do território e uma revisão bibliográfica de conceitos que pudessem contribuir para compreender a atual dinâmica da Aldeia da Jaqueira.

É importante salientar que os territórios de identidade estão incluídos num território maior, que é o município, portanto, a sua dinâmica ambiental faz parte de um grande ecossistema. Neste sentido, o planejamento ambiental entendido como “todo o esforço da civilização na direção da preservação e conservação dos recursos ambientais de um território”(FRANCO, 2000, p.34), é preciso também abranger as comunidades tradicionais.

Entendemos que ao analisar ou trabalhar somente os fenômenos sociais esquecendo do espaço físico sobre o qual eles se desenvolvem é tão incompleto do ponto de vista geográfico, quanto analisar ou trabalhar o quadro físico de um lugar sem considerar as ações e relações humanas em seu contexto (MENDONÇA, 1988).

O que se observa é que os Pataxó da Reserva da Jaqueira, assim como de outros territórios dos povos originários, têm cada vez mais procurado se aproximar da vida acadêmica e vice-versa. Essa aproximação entre os conhecimentos, isto é, os saberes tradicionais se encontrando com o conhecimento científico tem proporcionado intercambio de saberes entre o IFBA/Porto Seguro e os povos originários do município de Porto Seguro. Uma relação construída desde o ano de 2009 e que favoreceu o desenvolvimento da nossa pesquisa. O que justifica uma pesquisa voltada para conhecer a dinâmica ambiental em comunidades tradicionais está no fato de que são territórios, muitas vezes, desprezados pelos governos municipal, estadual e federal, e acabam por ficar suscetíveis a degradação ambiental, seja por condições internas de falta de infraestrutura sanitária ou por ações de grandes empreendimentos no seu entorno. Próximo ao território da Aldeia da Jaqueira há empreendimentos  imobiliários de                                grande  porte  que  podem,  no   futuro,            influenciar negativamente na dinâmica do território dos Pataxó inclusive podendo gerar diversos tipos de conflitos físicos.

A importância das Unidades de Conservação, e a Aldeia da Jaqueira pode/deve ser considerada como tal, está na garantia da proteção a territórios que apresentam características ecológicas e ambientais relevantes e devem ser mantidos sob um regime especial de administração, bem como oportunidade de garantir a mesma proteção aos povos e comunidades tradicionais (BRASIL, 2014, p.12). Mesmo porque o ser humano e os elementos naturais de uma paisagem são indissociáveis numa perspectiva holística de desenvolvimento e ao mesmo tempo de conservação ambiental.

Agradecimentos

Sem os recursos proporcionados tanto pelo IFBA quanto pela UFSB, através de auxílios financeiros, os deslocamentos para os trabalhos de campos seriam mais dificultados.

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