COMPLICAÇÕES OCULARES MAIS FREQUENTES NOS PACIENTES TRATADOS POR COVID-19: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA 

MOST FREQUENT EYE COMPLICATIONS IN PATIENTS TREATED FOR COVID-19: A SYSTEMATIC REVIEW OF THE LITERATURE 

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.11271510


Pedro Puccini Cobra Borges1
Eduardo Puccini Cobra Borges 2


Resumo 

As manifestações da Covid-19 no organismo humano acarretaram diversas consequências e reações imprevistas. Dentre os efeitos secundários da doença, os problemas oftalmológicos no período do pós tratamento é evidenciado na literatura com achados relevantes. Nesse constructo, para melhor compreender quais são as complicações oftalmológicas de pacientes já recuperados da Covid-19, o estudo teve por objetivo investigar as complicações oculares mais frequentes a esses pacientes. Para tanto, foi elaborada uma revisão sistemática da literatura, com estudos originais, qualificados pelo risco de viés através da ferramenta RevMan Cochrane. Assim, foi seguido o modelo de Prisma, com a extração e triagem dos estudos pela ferramenta Zotero. A coleta dos dados foi realizada pelos sites de busca Google Acadêmico, Scielo e Cochrane com os termos: “Covid-19 e complicações oculares”; “alterações oculares pela Covid-19” e pós “Covid-19 e oftalmologia”. Foram incluídos 6 estudos originais, sendo 1 estudo transversal, 1 estudo de coorte prospectivo, e 4 estudos de caso. A amostra dos 6 estudos computou 109 pacientes com idade entre 32 a 59 anos. Os resultados demonstraram que as complicações oftalmológicas em pacientes curados de Covid-19 leves ou grave, são: Uveíte, alteração retiniana sugestiva de cicatriz coriorretiniana inativa, lesão branco amarelada no polo posterior do olho, retinopatia unilateral do tipo Purtscher, hemorragias retinianas, oclusão venosa retiniana, olho seco e dor nos olhos. Perante os achados, entende-se que adultos saudáveis ou com comorbidades, após serem curados de Covid-19, podem sofrer com alterações oftalmológicas. Tendo a necessidade de estudos transversais e observacionais quantitativos, para a mensuração e prevalência dos casos. 

Palavras-chave: Reações oftalmológicas. Pós Covid-19. Complicações. 

1 INTRODUÇÃO 

A população mundial viveu um momento atípico, engendrado em diversas dúvidas, anseios, medos e incertezas. Esse contexto se fez em motivo da pandemia ocasionada pelo vírus Sars-Cov-2 (Covid-19), originada em Wuhan, China (ESTEVÃO, 2020). A doença que apresenta um espectro clínico variado, acarreta infecções sintomáticas, assintomáticas e quadros graves, levando milhares de pessoas a óbito. A maioria das pessoas infectadas não apresentaram sintomas, ou apresentam sintomas brandos, contudo, o curso clínico pode variar de assintomático até a uma pneumonia avançada, refletindo em uma síndrome do desconforto respiratório agudo grave, progredindo para outras complicações sistêmicas (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2024). 

Entre o grupo de pessoas consideradas de alto risco, estas pertencem às que estão acima dos 60 anos, bem como os portadores de alguma comorbidade subjacente (BIBERG- SALUM; LYRIO; CANALE, 2021). Haja vista que todos estão suscetíveis a serem contaminados, pois, o meio de contaminação se faz através das gotículas salivares expelidas no ar ou pelo contato com objetos e superfícies contaminadas. 

Para além da preocupação da cura da doença no auge da pandemia, este afligimento se posterga até o período atual pós-pandêmico, uma vez que pesquisadores investigam os efeitos secundários e complicações herdadas do pós Covid-19 (BIBERG-SALUM; LYRIO; CANALE, 2021; CAVALCANTE et al., 2021; FIGUEIREDO et al., 2021; NOGUEIRA et al., 2021; TROTT et al., 2023). 

Entre as complicações encontradas há uma seara de estudos sobre as alterações oculares (BIBERG-SALUM; LYRIO; CANALE, 2021; COSTA, 2023; CUNHA et al., 2022; 

SOBRINHO; PEREIRA; NETO, 2021), tal fator pode estar relacionado à presença do vírus na lágrima ou conjuntiva, devido à alteração do ácido ribonucleico (RNA) (UZUNIAN, 2020). 

Compreender quais são as principais complicações oculares no pós Covid-19 se faz relevante, para apoiar novos estudos, bem como ampliar a literatura atual, que mesmo com estudos já publicados sobre a temática, é pertinente aprofundar o entendimento sobre estudos originais. Portanto, a pesquisa tem por objetivo responder à pergunta problema: quais as complicações oculares mais encontradas em pacientes que tiveram a Covid-19? Logo, o objetivo está em investigar as complicações oculares mais frequentes nos pacientes que tiveram a Covid-19. 

Para tanto, foi realizada uma revisão sistemática da literatura, com estudos originais, qualificados pelo risco de viés RevMam, e a verificação da qualidade dos estudos pelo checklist do Prima. A extração e triagem dos estudos foi realizada com auxílio da ferramenta Zootero. As buscas foram realizadas pelos sites de busca Google Acadêmico, Scientific Electronic Library Online (Scielo) e Cochrane com os termos: “Covid-19 e complicações oculares”; “alterações oculares pela Covid-19” e pós “Covid-19 e oftalmologia”.

2 METODOLOGIA 

O estudo é de cunho qualitativo, primando a análise de pesquisas publicadas com a amostragem de adultos que realizaram o tratamento da Covid-19, dos quais no pós-Covid, relataram complicações oculares. Quanto ao objetivo, foi realizada uma pesquisa exploratória, para a aproximação da temática do estudo (GIL, 2008). Seguimos o protocolo da revisão sistemática da literatura proposta por Sampaio e Mancini, (2007) consoante as etapas para elaboração da revisão: (1) definição da pergunta de pesquisa; (2) buscando a evidência; (3) revisando e selecionando os estudos; (4) analisando a qualidade metodológica dos estudos; (5) apresentando os resultados. 

Na etapa 1 a pergunta foi elaborada contendo a população com o problema, a exposição, o comparador, e o desfecho: Quais as doenças oculares encontradas em pacientes adultos após iniciado ou finalizado o tratamento de Covid-19? 

Na etapa 2 para a busca dos dados utilizou-se o Google Acadêmico, Scientific Electronic Library Online (Scielo) e Cochrane com os termos com a combinação dos termos pelos buscadores booleanos AND, OR, NOT: “Covid-19 AND complicações oculares NOT crianças”; “eye complications AND Covid-19 NOT children”; “Covid-19 AND complicações oculares NOT idosos”; Covid-19 AND eye complications NOT elderly “alterações oculares pela Covid-19 AND pós Covid-19 OR oftalmologia” e eye complications Covid-19 AND post Covid-19 OR ophthalmology; (((Covid-19) AND (covid-19)) ) AND (eye complications) post Covid. 

Na etapa 3 realizou-se eleição dos estudos, seguindo o que é proposto por Sampaio e Mancini (2007) uma vez que durante essa seleção fizemos a avaliação dos títulos e dos resumos, com a identificações por dois pesquisadores, de forma independente e cegada, obedecendo rigorosamente aos critérios de inclusão de estudos exclusivamente com pacientes adultos que testaram positivo para Covid-19. Foram selecionados, os artigos que confirmaram o diagnóstico de complicações oculares após episódio de tratamento da Covid-19. Para a exclusão foram definidos no protocolo de pesquisa os estudos incompletos ainda não acabados, como projetos, estudos de revisão, e estudos com público alvo de crianças ou idosos. A extração dos estudos foi iniciada com a separação dos artigos no organizador Zotero, sendo tabulados na tabela 1. 

Na etapa 4, para a análise da qualidade metodológica e risco de viés dos estudos, utilizou-se a plataforma gratuita RevMan pelo Cochrane, seguindo os passos de análises como: i) Geração de sequência aleatória (viés de seleção); ii) Ocultação de alocação (viés de seleção); iii) Cegueira de participantes e pessoal (viés de desempenho): Todos os resultados;
iv) Dados de resultados incompletos (viés de atrito): Todos os resultados; v) Relatórios seletivos (viés de relatórios) e vi) Outro preconceito, sendo apresentados na seção de resultados pelas figuras 2 e 3. Na etapa 5 são apresentados os resultados conforme os estudos incluídos, foram 1 estudo observacional, 1 estudo de coorte e 4 estudos de caso

3   RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS

No fluxograma apresentado pela figura 1, é apresentado as etapas da pesquisa:

Figura 1 – Fluxograma da triagem dos estudos

Fonte: Os autores (2024).

A extração dos dados realizada pelo word, é apresentada na tabela 1, contendo as pesquisas incluídas, organizadas em ordem cronológica com Autor/data, objetivos, metodologia e amostra, com os resultados encontrados.

Tabela 1 – Síntese dos estudos

AUTOR/ DATAOBJETIVOMETODOLOGIA/AMOSTRARESULTADO
Sobrinho et al. (2021)Compartilhar um caso de uveíte intermediária, pós infecção da fase aguda, imunomediada pela SARS- CoV-2, documentando a capacidade de apresentação clínica multiforme desta infecção.Relato de caso, propedêutica armada e exames de imagem, com revisão de literatura bibliográfica. Homem, de 50 anos, sem comorbidades.15 dias após o diagnóstico precoce e o início do tratamento, o paciente evoluiu com melhora de acuidade visual.
Giampetro (2022)Descrever as características clínicas e oftalmológicas dos pacientes com SARS-CoV- 2.Dissertação de Mestrado com estudo transversal com análise dos resultados dos exames oftalmológicos realizados no centro de referência do INI/Fiocruz,  Grupo  1  =  5 pacientes Grupo 2 = 4 pacientes Grupo 3 = 1 paciente. Média de idade foi de 46,8 (dp 9,45).Os achados foram hemorragia em chama de vela e exsudatos algodonosos. Pacientes com 7 eram hipertensos (70%), 2 pacientes (20%) HIV positivos, 1 paciente obeso (10%) e 6 pacientes (60%) diabéticos.
Karasu        e Kesim (2022)Apresentar o caso de um paciente com diagnóstico de doença por coronavírus que desenvolveu oclusão de ramo de veia retiniana em ambos os olhos em diferentes momentos.Estudo de caso, paciente de 48 anos, após 2 meses de internação por Covid-19.Os médicos devem estar rigorosamente vigilantes na avaliação da retina em pacientes com perda de visão devido a um histórico leve de Covid-19.
Shroff, et al. (2022)Relatar um caso de Retinopatia unilateral do tipo Purtscher pós-COVID- 19.Relato do caso, paciente de 32 anos, retinopatia unilateral do tipo Purtscher no olho esquerdo.Efeito da ativação da cascata de coagulação dirigida por vírus, levando à microvasculopatia unilateral no paciente. O caso aumenta o espectro da retinopatia por COVID-19 e enfatiza a correlação entre as doenças graves da COVID-19 e o espectro vaso-oclusivo da retina.
Spolti et al. (2022)Relatar uma paciente jovem com queixa visual após infecção recente por COVID-19, evidenciando importantes hemorragias retinianas.Estudo de caso, paciente feminina, 32 anos, procura atendimento devido ao aparecimento de “manchas” escuras no olho esquerdo (OE). Sem comorbidades.Os achados oftalmológicos nesse caso, coincidem com a maioria dos estudos atuais, a presença de hemorragia vítrea dentro de um curto espaço de tempo pós-infecção, sugere depósitos de imunocomplexos causando oclusão dos vasos retinianos.
Costa (2023)Descrever os achados oftalmológicos em pacientes recuperados da COVID-19.Dissertação de Mestrado com estudo de coorte prospectivo, envolvendo 95 pacientes com idade de 42 a 59 anos.Maior frequência da doença do olho seco e associação da história de olho seco e/ou sintomas graves com a piora. Alterações benignas  discretas  da  retina  externa aproximadamente 80 dias após a fase aguda da COVID-19

Fonte: Dados da pesquisa (2024).

Nota: dp=desvio padrão; INI/Fiocruz=Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas.

Os estudos apresentados, foram 4 realizados no Brasil (COSTA, 2023; GIAMPIETRO, 2022; SOBRINHO; PEREIRA; NETO, 2021; SPOLTI et al., 2022) e dois

realizados em âmbito internacional, sendo na Índia (SHROFF et al., 2022) e Turquia (KARASU; KESIM, 2022). As amostras dos 6 estudos computaram 109 pacientes com idade entre 32 a 59 anos. Os dados foram submetidos ao RevMam apresentado um gráfico geral dos 6 estudos, conforme a figura 2, não apresentando risco de viés.

Figura 2 – Gráfico de risco de viés dos estudos da pesquisa

Fonte: Os autores (2024).

Quanto à randomização às cegas, os estudos apresentaram 100% de confiabilidade, uma vez que se trataram de pesquisas observacionais, de estudo de caso e coorte, não tendo qualquer necessidade de se comprovar a eficiência de algum tratamento ou medicamento. Logo, o único estudo que apresentou 3 grupos de pessoas com problemas oculares, foi o de Giampetro (2022) com o levantamento dos registros de pacientes após 30 dias de diagnóstico da Covid-19. Dos 150 pacientes investigados, 10 apresentaram problemas oftalmológicos, se tornado a amostra da pesquisa. Os 10 pacientes foram divididos em Grupo 1 com 5 pacientes que estiveram internados na UTI, Grupo 2 com 4 pacientes que estiveram internados na unidade semi-intensiva e 1 paciente do atendimento ambulatorial fazendo parte do Grupo 3. Não houve cegamento para a separação dos grupos, pois não se tratava de um estudo randomizado. A maior parte amostral pertencia ao sexo masculino, eram hipertensos, diabéticos e apresentaram alterações oftalmológicas de chama de vela e exsudatos algodonosos. Todos os pacientes apresentavam alguma comorbidade, e apenas um deles apresentou o valor de d-dímero superior ao valor de referência. Apesar dos achados oftalmológicos secundários à COVID-19 serem descobertos em pacientes com comorbidades, a autora sugere que estudos maiores avaliem se há associação dos parâmetros de gravidade e comorbidades de pacientes internados com as alterações oftalmológicas descritas.

Quanto ao cegamento dos resultados e apresentação de qualquer outro risco de viés não foi encontrato. Contudo, os dados concernentes às dúvidas quanto aos relatos e resultados, apresentou-se 75% de baixo risco de viés, com 25% de pouco risco de viés devido ao estudo de Sobrinho et al. (2021), uma vez que foi realizado no ano de 2020, apresentando algumas ponderações quanto a objetividade da relação entre o efeito secundário da doença de Covid-19 no estudo de caso do paciente. Apesar do homem de 50 anos ter sido diagnosticado com problemas oftalmológicos 15 dias após ser tratado por Covid-19, os autores não puderam confirmar se a Uveíte acarretada no paciente, sem qualquer comorbidade, foi um efeito secundário da doença. Contudo, apresentaram um diagnóstico presumido de Uveíte intermediária secundária ao coronavírus, tendo como segunda hipótese que a doença não se manifestou anteriormente, devido a utilização concomitante de corticoides sistêmicos e após a suspensão do mesmo, a inflamação intraocular instalou-se. Tal hipótese pode ser corroborada através de novos estudos sugeridos pelos autores, uma vez que a Uveíte se caracteriza pelo processo inflamatório da úlvea, região que constitui a túnica vasculosa bulbi compondo a íris, corpo ciliar e coroide, sendo sinônimo de inflamação intraocular consoante a etiologias, de origem autoimune ou infecciosa, que podem desenvolver a patologia.

Shroff et al. (2022) por vez, realizaram um estudo de caso com um paciente de 32 anos, quadro de retinopatia unilateral do tipo Purtscher no olho esquerdo, 2 semanas após se recuperar de uma infecção grave por COVID-19. Foi diagnosticado pelo exame de fundo de olho revelando branqueamento intrarretiniano e poucas manchas algodonosas, explicadas pelos autores, que ocorreram devido ao efeito da ativação da cascata de coagulação dirigida por vírus, levando à microvasculopatia unilateral. Essa evolução do quadro, inicialmente foi de espectro ocular inicial da COVID-19 por conjuntivite e manchas algodonosas ocasionais, resultando em uma retinopatia por COVID-19 associada à alteração microvascular de espectro vaso-oclusivo e embólico, atribuído à ativação das vias do complemento, o que acarreta uma maior formação de coágulos e alteração da resistência do leito vascular, levando a um estado pró-inflamatório e de agregação plaquetária. Portanto, mesmo o paciente não sendo portador de qualquer comorbidade, houve uma correlação direta da gravidade da COVID-19 com o diâmetro da veia da retina.

Semelhantemente o estudo de caso apresentado por Spolti et al. (2022), realizado em uma paciente de 32 anos, curada de Covid-19 pouco sintomática, um mês antes do aparecimento do problema ocular, apresentou importantes hemorragias retinianas, encontradas pelo exame de fundo de olho, sendo observado escavação aumentada e assimétrica no olho direito. No olho esquerdo apresentou sangramento pré-retiniano e vítreo,

perfazendo a arcada superior e inferior da retina proximal ao disco com vitreíte. Apresentou também edema de disco óptico. Perante os sintomas, os autores concluíram que a paciente sem qualquer comorbidade teve características que tornaram plausível a correlação entre a infecção Covid-19 e as manifestações retinianas encontradas no presente caso, uma vez que em primeiro aspecto se deriva de um estado de pseudovasculite como resultado de uma infiltração viral nas células endoteliais, que posteriormente em uma segunda condição passa a ser hipercoagulável caracterizada por uma coagulação intravascular disseminada.

Em um estudo recente, Karasu e Kesim (2022) relataram um caso de um paciente com idade de 48 anos, e apesar de internado por Covid-19, apresentava sinais leves da doença que evoluiu para um quadro grave de síndrome respiratória aguda. Sem qualquer comorbidade, após 2 meses de tratar a doença, foi diagnosticado com oclusão de um ramo da veia retiniana em seu olho esquerdo e constatou-se uma acuidade visual de 20/100 no mesmo olho. No terceiro mês de tratamento, os mesmos sintomas desenvolveram-se no olho direito e foi diagnosticada a oclusão de um ramo da veia retiniana. Constatou-se uma acuidade de 10/100 no olho direito. Os autores, destacam a importância da atenção médica mesmo a pacientes com estágio leve da Covid-19, por desencadear a microangiopatia viral e hipercoagulação, por isso há uma necessidade de vigilância na avaliação da retina destes pacientes com perda de visão devido ao quadro leve de Covid-19.

Costa (2023) para defender sua dissertação de mestrado, alocou 95 pacientes após serem tratados por Covid-19 de gravidade leve a grave. Como achados oculares de pacientes que se recuperaram da Covid-19, 100 ± 44 dias após o início dos primeiros sintomas da doença, observou-se que a 50 pacientes (52,6%) apresentaram queixa de embaçamento visual ao se submeter aos exames oftalmológico, sendo que 36 (37,9%) relataram que a queixa apareceu ou piorou simultaneamente com a Covid-19; quanto à queixa de dor ocular, 10 pacientes (10,5%) referiram o sintoma no momento do exame oftalmológico. Em relação aos achados do polo posterior associados a comorbidades prévias, os três principais foram: 12 (12,3%) com retinopatia diabética não proliferativa, 19 (20,0%) com aumento da tortuosidade vascular da retina e três (3,2%) tinham diagnóstico de glaucoma. Não houve diferença significativa entre as complicações oftalmológicas consoante ao grau de Covid-19, contudo, pessoas com comorbidades e já portadoras de problemas oculares, foram as mais acometidas.

Corroborando a confiabilidade dos estudos, a figura 3 apresenta o relatório detalhado consoante a todas as fases de elaboração, com protocolo seguido por cada estudo incluído na presente revisão.

Figura 3 – Relatório de confiabilidade dos estudos

Fonte: Os autores (2024).

Dos 6 estudos com dados primários, todos foram livres de qualquer viés de comprovação, conforme já mencionado anteriormente. Os estudos de dissertação, os quais envolveram maior grupo amostral (COSTA, 2023; GIAMPIETRO, 2022), encontraram que pessoas com comorbidades e doenças oftalmológicas preexistentes, foram mais suscetíveis a quadros secundários de complicações por Covid-19. Os resultados dos autores foram detalhados para todos os participantes.

Contudo, as demais pesquisas (SOBRINHO et al., 2021; KARASU; KESIM, 2022; SHROFF et al. 2022; SPOLTI et al., 2022) foram realizadas em pessoas sem qualquer histórico de comorbidade, os quais apresentaram resultados dos exames conforme o protocolo aplicado na pesquisa. A escolha das amostras ocorreu conforme os objetivos de cada autor, nesse contexto, alguns participantes sabiam dos estudos, porém, não houve risco de manipulação dos comportamentos, pois, não se tratavam de estudos experimentais, outrossim, observacionais, apresentando 100% sem risco de viés.

Somente o estudo de Sobrinho et al. (2021) realizado no ano de 2020 apresentou 25% de baixo risco de viés, uma vez que alguns dados quanto aos resultados não ficaram tão claros, apresentando certa insegurança no relatório final, entretanto, confirmaram algumas hipóteses.

Consoante aos exames realizados pelos autores fortalecendo os resultados explanados em cada relatório final, a tabela 2 apresenta os sinais e sintomas detalhados em cada relatório, bem como quais exames foram realizados para os diagnósticos e tratamentos, fazendo o mapeamento do que foi demonstrado pelos autores:

Tabela 2 – Mapeamento dos relatos apresentados

EstudosSinais e sintomasExamesDiagnóstico e Tratamento
Sobrinho et al. (2021)baixa acuidade visual e embaçamento visual bilateralRetinografia simples. Reavaliação após 15 dias de tratamento, realizando biomicroscopia e fundoscopiaVitreíte em ambos os olhos, 2+/4 em OD e 1+/4+ em OE e haze vítreo, com uveíte posterior ou coriorretinite. Tratamento tópico com colírio de acetato de prednisolona 1,0%, uma gota, em ambos os olhos, de 4/4hrs.
Giampietro (2022)Não foram citados, por se tratarem de pacientes internados, com exceção de somente 1 ser atendido pelo ambulatório.Oftalmoscopia binocular indireta. Pacientes em acompanhamento ambulatorial exame da acuidade visual, biomicroscopia de segmento anterior, mapeamento de retina, retinografia simples colorida, tomografia de coerência óptica, exame de autofluorescência, redfree, infrared e OCTA (Optovue Avanti). Pacientes internados nas unidades semi-intensiva e UTI foram examinados através da oftalmoscopia binocular indireta.Hemorragia em chama de vela e exsudato algodonoso.
Karasu        e Kesim (2022)Diminuição e visão turva em cada olho em momentos distintos.Exame fundoscópico, com acuidade visual de 20/100. Medida da pressão intraocular pelo tonômetro de aplanação de Goldmann, dímero D estava bem acima do normal no perfil de coagulação.ORVR em olho esquerdo. Após 3 meses de terapia ORVR direito. Tratamento para ORVR e coagulação.
Shroff et al. 2022Visão turva no olho esquerdo.Varredura SS-OCTA de 6 × 6 mm (PLEX® Elite 9000; Carl Zeiss Meditec, Inc, Dublin, CA). Posterior ao tratamento realizou-se a Varredura HD 51. Humphrey Visual Field 24-2.Uso de antiinflamatórios não esteroidais e reavaliado após 2 meses.
Spolti et al. (2022)Manchas escuras no olho esquerdo.Biomicroscopia, exame de fundo de olho, tomografia de coerência óptica macular e de disco óptico e retinografia.Sangramento pré-retiniano em arcada superior e inferior proximal ao disco, e sangramentos pontuais em arcadas terminais, com ausência de edema macular. tratamento com bevacizumab 1,5 mg.
Costa (2023)Embaçamento visual, queixa de olhos irritados; queixa de olhos secos;Refratometria e Acuidade Visual, exames para detecção de sinais oculares de olho seco realizados como o Tempo de ruptura do filme lacrimal e a Coloração com fluoresceína tópica. Realizou-se o Tonometria de aplanação e a Avaliação da retina e do vítreo.Um paciente com alteração retiniana diagnosticada como distrofia padrão do EPR.

Fonte: Os autores.

Nota: EPR= Epitélio pigmentar da retina; mm= milímetro; ORVR= oclusão de ramo da veia retiniana; SS- OCTA= Placa superficial da angiografia por tomografia de coerência óptica de fonte varrida de 6 × 6 mm. UTI= Unidade de terapia intensiva.

Sobrinho et al. (2021) destacam que os efeitos da Covid-19 se assemelham a uma síndrome hiperferritinêmica, nos seus principais estágios, progredindo para uma linfopenia, redução do número e atividade de linfócitos NK, coagulopatia e hiperferritinemia, demonstrando a alta tendência pró inflamatória, que induz a expressão de diferentes mediadores inflamatórios, comumente a IL-1β.

Giampetro (2022) destaca que devido os pacientes estarem internados, não foi possível determinar se os fatores impactaram no aumento de risco dos pacientes com Covid-19 apresentarem alterações oftalmológicas, de igual modo, não foram apresentados os sinais e sintomas, já que os pacientes estavam em internação. Sendo necessário novos estudos para a comprovação dos riscos.

Karasu e Kesim (2022) atribuem que a razão mais comumente atribuída para o desenvolvimento de ORVR na COVID-19 é a “coagulopatia induzida por sepse”. Outra particularidade no caso se fez pelos níveis mais elevados de dímero-d, indicando uma atividade trombótica após estimulação da ativação celular possivelmente induzida pelo vírus.

Shorff et al. (2022) destacaram que o efeito da ativação da cascata de coagulação dirigida pelo vírus da Covid-19 levou à microvasculopatia unilateral do paciente, destacando a importância do rastreio da retina, especialmente em pessoas com doenças moderadas a grave. Spolti et al. (2022) sugerem que a infecção por Covid-19 pode predispor a eventos trombóticos ao detectarem uma hemorragia proximal ao disco óptico e edema de disco óptico em um paciente de 32 anos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi possível o alcance do objetivo do estudo de investigar as complicações oculares mais frequentes nos pacientes que tiveram a Covid-19, uma vez que as pesquisas consultadas apresentaram dados corroborativos de algumas complicações mais frequentes em pessoas adultas. Entre os achados, a Uveíte foi citada, alteração retiniana sugestiva de cicatriz coriorretiniana inativa, lesão branco amarelada no polo posterior do olho, retinopatia unilateral do tipo Purtscher, hemorragias retinianas, oclusão venosa retiniana, olho seco e dor nos olhos.

Essas alterações foram associadas a pessoas com comorbidades oculares ou não, conquanto, também foram diagnosticadas em adultos saudáveis. Nenhum dos estudos comprovaram qualquer correlação entre a gravidade da Covid-19 e os efeitos oftalmológicos secundários. E todos os diagnósticos foram relatados no mínimo após 2 semanas até 100 dias após tratamento de Covid-19.

Há um consenso sobre a importância da realização de exames para o fundo do olho, para detecção de alterações na retina, uma vez que os achados sugerem rompimentos de veias e vasos devido a anormalidades plaquetárias, originando hemorragias retinianas. Porém os poucos achados foi um limitador da pesquisa.

Sugere-se estudos complementares, tendo em vista métodos transversais, quantitativos e amostrais, para a demonstração e corroboração de novas hipóteses sobre a correlação e proporcionalidade dos graus de Covid-19, comorbidades dos pacientes e os tipos de problemas oftalmológicos desencadeados.

REFERÊNCIAS

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1 Médico Generalista Formado Pela Universidade Nove De Julho – Vergueiro. E-mail: Pedropuccini97@gmail.com. 
2 Médico Generalista Formado Pela Universidade Nove De Julho – Guarulhos. E-mail: Eduardopcborges@gmail.com.