CLASSIFICAÇÃO DE PERFIS DE JOGADORES POR MEIO DE UM JOGO DIGITAL ADAPTATIVO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10086513


Daniel Domingos Akira de Sá Pimentel Ohata¹
Pollyana Coelho da Silva Notargiacomo²


RESUMO

A classificação de perfil do jogador é uma das áreas que busca compreender as motivações, comportamento e preferências dos jogadores. Estes estudos buscam identificar o perfil do jogador por meio de formulário, dados cedidos por empresas, ou na observação dos jogadores durante a partida, para assim abstrair informações e classificar o indivíduo. Contudo, ações que os jogadores tomam durante uma partida nem sempre se refletem nas respostas dadas a um formulário, o que acaba levando a precedentes sobre como avaliar. Levando em consideração que o jogador deve expressar o seu perfil durante o jogo, o presente trabalho analisa as principais classificações de perfis e com base nos arquétipos desenvolveu um jogo digital adaptativo dotado de uma inteligência artificial e associado às mecânicas de jogos entreter e classificar o jogador. Desta forma o trabalho entregou uma ferramenta que avaliou vinte voluntários e conseguiu apresentar o perfil de cada um dos participantes.

Palavras-chave: Classificação de jogadores, jogo digital adaptativo, perfil de jogadores, jogo classificador, perfil de jogadores

ABSTRACT

Player profile classification is one of the areas that seeks to understand players’ motivations, behavior and preferences. These studies seek to identify the player’s profile through a form, data provided by companies, or by observing players during the match, in order to abstract information and classify the individual. However, actions that players take during a match are not always reflected in the answers given on a form, which ends up leading to precedents on how to evaluate. Taking into account that the player must express his profile during the game, this work analyzes the main profile classifications and based on the archetypes, developed an adaptive digital game equipped with artificial intelligence and associated with game mechanics to entertain and classify the player. . In this way, the work delivered a tool that evaluated twenty volunteers and managed to present the profile of each of the participants..

Keywords: Player classification, adaptive digital game, player profile, game classifier, player profile.

1. INTRODUÇÃO

A complexidade envolvida na criação de um jogo digital vai além da implementação de novas tecnologias. As empresas buscam conhecer quais são as expectativas, motivações e preferências dos jogadores (NEWZOO, 2017). Uma das pesquisas que busca atender essa demanda são as com foco na classificação de perfil de jogadores. Tais artigos procuram conhecer os hábitos que um jogador tem durante uma partida (BATEMAN et al., 2011). A classificação de Bartle (1996) surgiu ao tentar identificar as motivações dos jogadores, sendo precursora no tema ao observar e analisar os comportamentos dos participantes de um ambiente virtual (BARTLE, 1996). Para Bartle (1996) os tipos de jogadores demonstram interesses entre interagir com alguma coisa ou com alguém e que os jogadores têm um perfil primário, contudo o jogador pode ter características de outros perfis; esse fato ocorre conforme a situação, ambiente, ou objetivo apresentado no jogo, ou até o humor do jogador. Desta forma, um jogador pode, de maneira deliberada, assumir ações de outros perfis para alcançar o interesse do seu perfil primário (BARTLE, 1996). Destaca-se também que a taxonomia de Bartle (1996) propôs novos parâmetros para análise dos comportamentos dos jogadores, dando conhecimento às equipes de desenvolvimento de jogos digitais para criação de novas mecânicas (STEWART, 2011; BARTLE, 1996).

Entretanto, não é possível afirmar se as empresas do setor adotam o tema como um processo na criação de jogos digitais, isso se deve ao sigilo que as mesmas tomam sobre os processos de produção dos seus jogos. Tais jogos são produtos que contêm um foco direcionado ao seu gênero de jogo, estilo criativo peculiar de cada equipe ou seguem padrões de jogos populares no mercado, o que limita o seu público e, assim, o uso do mesmo por alguns perfis (BATEMAN, 2009; ROUSE III, 2014). Desta forma, a utilização desses jogos para a classificação de perfis se torna ineficiente, dado que nem todos os jogos contêm mecânicas de jogos diferenciadas ou elementos de jogo para todos os tipos de jogadores, sendo necessário a aplicação de um formulário com questões direcionadas para suprir esta lacuna (BARTLE, 2004; YEE, 2006).

Dada as circunstâncias, surge a dúvida se um jogo digital teria a capacidade de identificação de perfil de jogador, ponto que gerou a motivação desta pesquisa sobre um tema relevante para indústria e academia. A partir disso, o trabalho buscou estudar as metodologias aplicadas nas classificações de perfil de jogador para construir uma ferramenta computacional adaptativa que possa identificar o utilizador em um dos perfis conforme as decisões tomadas durante a partida. Assim, o artigo aborda o conceito de um jogo digital, os recursos aplicados para que o jogador entre no estado imersivo. Para posteriormente analisar os elementos teóricos sobre a classificação de jogadores, aprofundando a discussão da taxonomia de Bartle (1996), as influências que a taxonomia exerceu em outros trabalhos e como essas as outras pesquisas chegaram nas suas definições.

O CONCEITO DE JOGO

Uma vez que o trabalho alcançou o conhecimento necessário sobre as características dos arquétipos, os esforços são direcionados para construção do artefato avaliativo em formato de jogo digital. Para compreender o desenvolvimento de um jogo é importante saber o conceito do mesmo. Na visão de Salen e Zimmerman (2003) a experiência em jogar efetiva um elo entre o jogo e o jogador, sendo um processo de interação lúdica. Destaca-se que neste ambiente existem regras que moldam sua estrutura e que devem apresentar os resultados de suas ações e consequências (SALEN, ZIMMERMAN, 2003). Seguindo da mesma opinião, McGonigal (2011) descreve que a estrutura básica de um jogo é composta por quatro pontos que são: as metas que devem existir no jogo; as regras que limitam ações do jogador ao ambiente; um sistema de feedback que indica os erros e acertos que do jogador e a vontade da participação voluntária (McGONIGAL, 2011).

O modelo MDA (Mechanics, Dinamics and Aesthetics) exemplifica que os jogadores e desenvolvedores tendem a observar os jogos divididos em três camadas que são: as camadas de estética, dinâmicas e mecânicas. Contudo, as percepções para jogadores se iniciam pela estética do jogo, passando por um aprendizado das dinâmicas e por fim entendem como funcionam as mecânicas. Processo que se inverte na visão de um desenvolvedor que se preocupa com as mecânicas a serem aplicadas, como devem sincronizar com as dinâmicas e como a estética deve fluir como jogo (HUNICKE et al., 2004). Ao observar os efeitos que um jogo digital exerce ao seu jogador, seus elementos de game design colaboram para reter sua atenção e testar suas habilidades (CALLEJA, 2011). Esses recursos conectam o jogador ao mundo virtual e levando o jogador a um estado de fluxo (CHEN, 2007).

Vale ressaltar que o estado de fluxo é explicado pelo autor Csikszentmihalyi (1990) como um estágio no qual os indivíduos alcançam ao exercem uma atividade que trazem prazer. O tipo de atividade varia conforme o indivíduo, contudo as ações não excedem as habilidades a ponto de levar ao sentimento de frustração e não são fáceis a ponto de levar ao tédio, mantendo em constante equilíbrio e instituindo uma experiência prazerosa (CSIKSZENNTMIHALYI, 1990).

A partir do que foi exposto, o trabalho entende que se faz necessário construir um jogo digital com elementos e mecânicas necessárias para estimular o jogador. Com as características encontradas na classificação de Bartle (1996), se torna necessário a criação de um fluxo de jogo para encontrar os elementos de game design necessário para o protótipo.

A ORIGEM DAS CLASSIFICAÇÕES DE PERFIS DE JOGADORES

O estudo sobre a classificação de perfis de jogadores iniciou no artigo escrito por Richard Alan Bartle em 1996. O autor observou que cada jogador realizava ações distintas durante as partidas do jogo digital MUD (Multi-User Dungeon). Ao término o autor entrevistou os participantes e a partir deste contexto, descreveu os arquétipos abaixo: (BARTLE,1996):

  • Achievers (Conquistadores): são jogadores que gostam de acumular pontos, recursos ou itens e superar as metas que o ambiente proporciona;
  • Explorers (Exploradores): são jogadores com foco no aprendizado e exploração das regras, mecânicas e do ambiente existente;
  • Socializers (Socializadores): são jogadores que gostam da interação com outros jogadores e de fazer parte das histórias contadas;
  • Killers (Assassinos): são jogadores que buscam a competição com outros jogadores, gostam de superar os demais adversários e serem os mais bem classificados.

Na visão de Bartle (1996) a maioria dos jogadores se enquadra em uma das categorias descritas. Contudo, ao observar os jogadores, o autor informa que deve existir um equilíbrio no ambiente para que cada perfil se motive e traga mais jogadores. Para isso se deve ter atenção nos quatro pontos a seguir:

  • Players (Jogadores): os jogadores devem ser orientados para compreender quais são suas ações e suas consequências, assim como deve existir sua comunicação com outros usuários. O excesso de jogadores leva ao conflito ou somente à comunicação entre eles, desmotivando o interesse sobre o ambiente;
  • World (Mundo): o ambiente virtual deve conter elementos atrativos e desafiadores que manterão o jogador motivado a conhecer o local. Contudo, o exagero de tais itens pode desorientar o jogador, tornando o local maçante ou frustrante;
  • Acting (Ação): são as ações executadas pelo jogador dentro das limitações existentes, essa ação pode ser contra outros jogadores ou não jogadores (Non Player Characters – NPCs). Os jogadores buscam aprender e dominar as ações que seus personagens executam, para isso o ambiente deve propor desafios que levem o jogador a isso, caso contrário levará ao tédio.

Interacting (Interação): as interações dos jogadores com o ambiente priorizam os desafios existentes. O que estimula a progressão e o conhecimento sobre o que está ao redor e orienta as sobre as regras existentes, mas sem o devido cuidado os jogadores podem não entender o que deve ser feito.

A Figura 1 ilustra o funcionamento da classificação de Bartle (1996) e os elementos existentes ao ambiente.

Figura 1 ‒ Tradução da representação gráfica da taxonomia de Bartle

Fonte: Bartle (1996)

A classificação Bartle (1996) contribui para o desenvolvimento e aperfeiçoamento de jogos, mas o autor faz ressalvas, dado que a classificação foi baseada em jogadores de um tipo específico de jogo (o MUD) e talvez sua aplicação não se destine a todos os tipos de jogos. O autor acredita que cada jogador pode ter um, arquétipo principal e um secundário e conforme inúmeros fatores externos o mesmo pode alterar (BARTLE, 1996; BARTLE, 2005).

OUTROS TIPOS DE CLASSIFICAÇÃO DE JOGADORES

Para ter uma dimensão da quantidade disponível de contribuições foi utilizado o trabalho de Klock et al. (2016), que se demonstrou pertinente por construir uma revisão sistemática sobre o tema. O artigo separou sua investigação em duas partes: o jogador (i.e., player, gamer) e a classificação (i.e., type, typology, personality). Após a busca, ocorreu o processo de seleção em que foram identificados, dez modelos de classificações de perfis. Para complemento do trabalho de Klock et al. (2016), o foi incluído a atualização da classificação de Bartle (2005), e a pesquisa de motivação de jogadores online de Yee (2006), desta forma criando a Quadro 1, com as descrições das pesquisas (KLOCH et al., 2016; BARTLE, 2005; YEE, 2006).

Quadro 1 ‒ Relação de classificações de tipos de jogadores

Autor (es)AnoBase de estudoMeio de coleta de dadosQuantidade de perfis encontrados
Bartle1996ComportamentalJogo, debate e formulário4
Bartle2005ComportamentalJogo, debate e formulário8
Bateman e Boon2005PsicológicaFormulário4
Bateman et al.2011PsicológicaFormulário4
Nacke et al.2014Psicológica e NeurobiológicasFormulário7
Marczewski2015ComportamentoFormulário6
Schuurman et al.2008ComportamentoFormulário4
Drachen et al.2009ComportamentoJogo adaptado4
Yee2006PsicológicaJogo e formulário10
Yee et al.2011PsicológicaJogo e formulárioSem arquétipos
Gow et al.2012ComportamentoJogo adaptado e Dados de jogo comercialSem arquétipos
Khan et al.2015ComportamentoDados de dois jogos comerciais e formulário6

Fonte: Elaborado pelo autor

Conforme apresentado na revisão sistemática, doze trabalhos seguem abordagens similares e, assim, trazem pontos relevantes a serem colocados. Dentre os trabalhos relacionados, cinco identificaram mais de quatro tipos de arquétipos, outros cinco identificaram quatro e somente a classificação de Gow et al. (2012) e Yee et al. (2011), não segue uma rotulação própria para os perfis encontrados. Destaca-se que dez trabalhos utilizaram formulários para identificar os traços de seus perfis, sete pesquisas utilizaram jogos digitais para auxiliar na coleta de dados, sendo que dois utilizaram mais de um jogo. Entretanto, nenhum dos jogos digitais utilizados foram concebidos para identificar, ou classificar o perfil de um, ou mais jogadores.

É importante observar a influência que a classificação de Bartle (1996) exerceu nas demais, apesar de cada trabalho rotular seus arquétipos com nomes diferentes, as características identificadas coincidem com as encontradas nos perfis de Bartle (1996). O diferencial de cada pesquisa fica por conta da forma como foi identificado, as características dos indivíduos e os métodos aplicados para alcançar construção do perfil. Um exemplo é o arquétipo Gerentes (Managers) identificado por Bateman e Boon (2005), os autores utilizaram o formulário de personalidade de Myers-Briggs (1962). Em sua descrição, o arquétipo gosta de dominar o jogo e se dedica em aprender e explorar o ambiente para criar novas estratégias. Tais relatos têm certa similaridade nos perfis Mestre Mental (Masteminds) e Requerentes (Seekers) do trabalho de Nacke et al. (2014) que utiliza descobertas neurobiológicas e descreve o primeiro como pessoas movidas por desafios e que criam estratégias para superá-los e o segundo como jogadores que buscam conhecer o ambiente e sua curiosidade em explorar os motivam. As descrições destes perfis se assemelham aos Exploradores (Explorers), criado por Bartle (1996).

Compreendendo as semelhanças nos arquétipos identificados de cada classificação, o trabalho organizou todas as características encontradas de cada perfil e verificou as semelhanças com a classificação de Bartle (1996). Após a comparação foi criada um quadro unificando as características dos perfis (ver Quadro 2), entretanto foram descartadas a classificação Yee, Nelson e Likarish (2011), Drachen, Canossa e Yannakakis (2009), Bartle (2005) e Gow, Baumgarten, Cairns, Colton e Miller (2012). O primeiro contém quatro arquétipos, entretanto suas descrições não definem suas características com exatidão, deixando dúvidas. O segundo classificou seus arquétipos pelo conhecimento e experiência que os jogadores obterão ao jogar, e assim classificando a destreza e as habilidades do jogador, processo similar com a atualização de Bartle (2005), na qual inclui outros quatro arquétipos, mas que são frutos de jogadores que constroem suas motivações conforme a experiência obtida em inúmeras partidas de um mesmo jogo. Por fim, a classificação de Gow, Baumgarten, Cairns, Colton e Miller (2012) institui uma forma de métrica sem a necessidade de rótulos, sendo um método que pode ser implementado conforme o foco da pesquisa (YEE et al., 2011; DRACHEN et al., 2009; BARTLE, 2005; GOW et al., 2012).

Quadro 2 ‒ Comparativo entre a classificação de Bartel (1996) e as demais classificações

ClassificaçãoAnoArquétipos
Bartle1996SocializadoresExploradoresConquistadoresAssassinos
Bateman e Boon2005ParticipantesGerentesAndarilhosConquistadores
Bateman et al.2011DiplomáticoEstratégicoLogísticoTático
Nacke et al.2014SocializadoresMestre mental; RequerentesEmpreendedores; Sobreviventes; DemolidoresConquistadores; Demolidores
Marczewski2015Filantrópicos; socializadoresEmpreendedores; Espírito LivreJogadores; EmpreendedoresDisruptores; Jogadores
Schuurman et al.2008PassatemposEscapistasCompetidosFãs
Yee2006Socializar; Relação; Trabalho em equipe; Interpretação; Personalizar; EscapismoMecânica; Socializar; Descoberta; Interpretação; personalizar; escapistasAvanço; Mecânica; Descoberta; Personalizar; EscapismoAvanço; Mecânica; Competição; Descoberta; Escapismo
Khan et al.2015Socializadores; orientados à história; escapistasFinalizadores; orientados à história; Espertalhões; escapistasFinalizadores; escapistasCompetidores; escapistas

Fonte: Elaborado pelo autor

Ao término é possível distinguir as semelhanças de cada classificação em comparação ao modelo apresentado por Bartle (1996) o que fortalece o uso da classificação como base para identificação dos jogadores nesta pesquisa. Contudo, é necessário entender como é a estrutura de um jogo digital para dar continuidade ao objetivo deste artigo.

PLANEJAMENTO DO PROJETO

O trabalho elaborou um planejamento com a divisão dos itens necessários a serem estudados para atender as demandas para construção do jogo digital adaptativo. É importante ressaltar que o trabalho não tem interesse de criar uma classificação, e sim saber se o jogo digital adaptativo pode identificar um jogador.

A taxonomia de Bartle (1996) descreve que cada perfil tem características individuais peculiares ligadas as suas preferências ao jogar (BARTLE, 1996; STEWART, 2011), na Quadro 3 é apresentada uma breve relação das características que agradam aos arquétipos de Bartle (1996).

Quadro 3 ‒ Preferências dos arquétipos de Bartle.

Arquétipo de BartleDescrição de preferências em jogos
Conquistador (Achiever)Competição, conquistas, coletar itens, altas pontuações, níveis, objetivos claros, associação a grupos;
Explrador (Explorer)Quebra-cabeças, construção criativa, fantasia, análise de sistemas, teorização, surpresa;
Socializador (Socializer)Comunicação, fantasia, interpretação de personagens, histórias, cooperação, decoração, animais de estimação, eventos sociais;
Assassino (Killer)Ação frenética, vertigem, uso de equipamentos no jogo, horror, jogos de azar, disputas e competições, combos;

Fonte: STEWART (2011)

Um ponto importante é que a classificação definida foi criada baseada nas experiências de jogadores do jogo digital MUD (Multi User Dungeons) e que outros gêneros poderiam ter limitações de mecânicas para motivar os determinados perfis (Bartle, 1996). Um exemplo são os jogos de tiro em primeira pessoa (First Personal Shooter) gênero popular entre os jogadores. Tais jogos contêm uma ação tática frenética, realismo em seus elementos artísticos e uma complexidade em seus controles para execução das ações. Esse tipo de jogo, quando construído em um ambiente competitivo entre jogadores, agrada ao arquétipo Assassino (Killer), mas não tem o mesmo efeito para um Explorer (Explorers). Contudo, se o mesmo jogo contém itens a serem coletados, desafios e um enredo com personagens carismáticos, trará a atenção de outros arquétipos devido às novas mecânicas aplicadas (STEWART, 2011; ROGERS, 2012).

Os jogos de gênero RPG (Role Playing Game) contêm uma estrutura que agradam a diferentes públicos devido à possibilidade de inserção de inúmeras mecânicas, o uso de enredos neste gênero amplia a profundidade sobre o jogo (APPERLEY, 2006). Dentro da visão de Schell (2008) os jogos utilização uma história como um elemento que auxilia na integração dos jogadores, o enredo contado para cada personagem faz com que o jogador crie empatia (SCHELL, 2008). Uma das estruturas populares para construção de enredos e histórias é a jornada do herói (CAMPBELL, 1997). O mono mito como também é conhecido, trata de uma jornada cíclica escrita por Campbell (1997), composta de eventos que transcorrem no caminho do protagonista (VOGLER, 2015). A criação de uma narrativa em um jogo digital se torna essencial para ampliar as experiências do jogador, os eventos que transcorrem em uma narrativa resultam em experiências individuais e únicos para cada jogador (TYCHSEN et al., 2006).

Outro ponto para escolha do gênero de RPG é que o mesmo pode ter subgêneros devido à inclusão de mecânicas de outros tipos de jogos, o que é comum na indústria (CLARKE, LEE, CLARK, 2017). Desta forma, a combinação com os gêneros de ação e aventura, se demonstra interessante devido a estes estilos de jogos serem populares entre os jogadores (NEWZOO, 2017; APPERLEY, 2006). Ao concluir essa etapa foi necessário definir o funcionamento da inteligência artificial para os personagens criados conforme o enredo é apresentado.

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

É importante informar que os personagens que não são controláveis são popularmente conhecidos pelo termo NPC (non-player characters), sendo que tecnicamente se trata de agentes virtuais que variam seus estados conforme a execução de uma rotina (SCHWAB, 2014). A utilização de NPC’s ajuda na conectividade do jogador ao ambiente virtual (LANKES, BERNHAUPT, 2011).

Tais agentes virtuais são máquinas de estado finito que alternam conforme a influência do ambiente e de terceiros (RUSSEL, NORVIG, 2003). Na figura 2 é possível encontrar um modelo de funcionamento de árvore de decisão combinado a uma máquina de estados (BUCKLAND, 2005). Seus benefícios remetem a dois pontos, sendo que o primeiro se trata de uma forma de marcar o ambiente com uma base de informações para motivar as decisões dos agentes ​​e o segundo ponto, é poder apresentar vários personagens e suas reações a essas informações (MILLINGTON, FUNGE, 2018). Desta forma, a combinação da técnica de scripts com o uso de árvore de decisão em um agente virtual que altera seus estados se demonstra efetiva na criação de uma lógica de comportamentos

Figura 2 ‒ Tradução do modelo de árvore de decisão de Buckland

Fonte: BUCKLAND (2005, p. 297)

Para o projeto foram utilizadas três categorias de personagens não jogáveis que estão sendo apresentadas na Quadro 4, cada categoria possui uma função e se apresenta ao jogador em diferentes formas.

Quadro 4 ‒ Inteligência Artificial aplicada nos personagens

Categorias de personagens não jogáveisAções que executam sem o acionamento do jogadorAção tomada para ativação das açõesAções que executam quando acionadosRepresentação visual dos personagens não jogáveis
InimigosMovimentos pelo cenárioAproximação do jogadorAtacar o jogador até sua pontuação de energia acabar.Morcegos; Gosmas; Caveira Flamejantes; Fantasmas e Chefes de tarefas.
Personagens colaborativosSem movimentaçãoInteração do jogadorAcompanha o jogador até o término de sua tarefa.Animais; Pessoas; Baús.
Personagens cooperativosMovimentos pelo cenárioInteração do jogadorInformam tarefas ao jogador.Pessoas.

Fonte: Elaborado pelo autor

Com as definições de como deve ser empregado o uso da inteligência artificial para os personagens não jogáveis, se fez necessário o desenvolvimento de um fluxo do jogo para identificar as mecânicas a serem aplicadas e as funções de cada personagem no enredo do jogo.

FLUXO DO JOGO

O fluxo do jogo é a estrutura das ações a serem seguidas pelo jogador e assim formando uma progressão, seja linear, ramificadas, ou baseadas em eventos (RABIN, 2005). Dentro desta estrutura são estipuladas as mecânicas que o jogo irá desenvolver com o jogador e quais dinâmicas poderão ser executadas conforme as regras criadas (ROGERS, 2012). Conforme a escolha do gênero RPG, a criação de regras se torna uma atividade complexa devido ao elevado conjunto de ações que o jogador pode executar (THORHAUGE, 2013).

Desta forma o trabalho elaborou um fluxo de jogo (ver Figura 3), onde as atividades do jogador mudam conforme suas interações com os personagens existentes.

Figura 3 ‒ Fluxo de atividades do jogador

Fonte: Elaborado pelo autor

Conforme descrito anteriormente, os personagens não jogáveis, conhecidos como NPC, darão as informações necessárias para realização de tarefas. Contudo, o jogador tem a liberdade de escolher se quer ou não realizar a tarefa, ou buscar outras interações. Caso não aceite ou não termine a tarefa selecionada, o NPC irá continuar no cenário, aguardando a resolução da tarefa. Novos contatos com esse agente apenas irão repetir a atividade que o jogador deve cumprir. No caso de conclusão da tarefa, o NPC muda o seu diálogo ou desaparece do cenário. A conclusão de cinco atividades relacionadas a um mesmo perfil é um dos fatores a demonstrar que o jogo conseguiu identificar o jogador. Entretanto, durante a partida alguns parâmetros servirão para medir ações que o jogador realizou durante o seu tempo, esses pontos serão utilizados para aprofundar a análise sobre o perfil do jogador. A seguir as variáveis que registram as atividades dos jogadores:

  1. Quantidade de tarefas incompletas;
  2. Números de inimigos abatidos;
  3. Valor de dinheiro acumulado;
  4. Quantidade de mortes;
  5. Nível de experiência alcançado;
  6. Tipos de tarefas realizadas;
  7. Quantidade de interações com personagens não controláveis;
  8. Acúmulo de itens encontrados.

FERRAMENTA DE DESENVOLVIMENTO

O software de desenvolvimento utilizado foi o RPG Maker MV. Este é um motor gráfico (game engine) de produção de jogos 2D com foco no gênero de RPG, conforme a figura 4, sendo que utiliza a linguagem de programação de interpretação javascript e uma interface gráfica para construção de personagens e cenários, contendo recursos que possibilitam a aplicação de outras mecânicas de jogos (RPG Maker, 2018). A game engine conta com a possibilidade de criação de scripts para criação de comportamentos para os personagens, o que auxilia na construção do modelo de inteligência artificial. Outro ponto é a utilização da ferramenta em abordagens acadêmicas para criação de jogos educativos, como observado no trabalho de Sousa (2018) ou para o ensino de matemática proposto por Cruz e Albuquerque (2014).

Figura 4 ‒ Arte do protótipo em sprites com gráficos 2D

Fonte: Elaborado pelo autor

GAME DESIGN

Seguindo o enredo do jogo foram criados todos os ambientes do jogo digital adaptativo, com elementos artísticos correspondem a temática medieval com elementos de fantasia de um jogo clássico de RPG (Role Playing Game). Além dos cenários construídos foram aplicados em cada um dos locais os elementos de interação (personagens não controláveis e itens), tais interações serão variáveis para mensurar as ações do jogador. O jogador não é obrigado a seguir a mesma ordem para terminar o jogo, conferindo liberdade as escolher do jogador a executar conforme seu interesse. Contudo, o jogador será sempre direcionado no início para as tarefas de baixa complexidade. Esse processo se deve para diminuir a curva de aprendizado do jogador conforme joga, aprimorando suas habilidades e dando desafios conforme sua progressão, colocando o jogador no estado de fluxo. Podemos acompanhar a relação de atividades no quadro 5.

Quadro 5 ‒ Relação de tarefas por perfil

Mestre do Combate (Assassinos)
LocalPersonagem não jogávelDescriçãoRecompensaComplexidadeSolução
Casa da Idosa (Cidade de MackLand)IdosaEnfrentar os perigos que aterrorizam a casa da pobre velhinha.Medalha da BravuraBaixoEliminar cinco Gosma.
Casa do Darius (Cidade de MackLand)DariusEliminar as ameaças que surgiram na Floresta Sul.Medalha da BravuraMédioEliminar vinte três Gosma.
Cidade do BrásViajanteIr em busca de uma espada lendária.Medalha da Bravura e LightbringerAltoEncontrar o Baú com a espada lendária. (Enfrentar os inimigos é opcional)
Torre NegraFairyUma ameaça dominou a Torre Negra.Medalha da BravuraAltoEliminar o Behemoth.
Torre do ConhecimentoDariusSalvar Darius de uma grande ameaça.Medalha da BravuraAltoEliminar o Anjo e salvar o Darius.
Mestre da Conquista (Conquistadores)
LocalPersonagem não jogávelDescriçãoRecompensaComplexidadeSolução
Cidade de MakLandJovem fazendeiroO jovem fazendeiro não tem tempo de voltar a fazenda e solicita sua ajuda.Medalha do Triunfo e Molde do EscudoBaixoLevar o cavalo a fazenda.
Cidade MackLandSr. FloresO Sr. Flores quer completar sua coleção de flores e necessita de três espécies.Medalha do Triunfo e 1500GMédioBuscar em no lago, floresta sul e no acampamento um item de cada grande flor que está na margem do rio ou lago. (Eliminar os inimigos é opcional)
Cidade IndustrialSilviaSilvia quer chegar a Torre do Conhecimento, mas tem medo de ir sozinha.Medalha do Triunfo e Pedra de VibraniumBaixoEncontrar o caminho até a Torre do conhecimento.
Loja de armasFairyFairy identifica que existem dois materiais raros com você.Medalha do Triunfo e EscudoBaixoOs itens adquiridos podem ser utilizados para construção de um escudo pelo ferreiro.
Montanha da MorteFerreiroO ferreiro solicita três pedras de Adamantium.Medalha da TriunfoAltoSeguir pela trilha da montanha até a montanha da morte. (Eliminar os inimigos é opcional)
Mestre da Alquimia (Socializadores)
LocalPersonagem não jogávelDescriçãoRecompensaComplexidadeSolução
Cidade de MackLandJovem fazendeiroO jovem fazendeiro precisa encontrar o gato de sua filha que sumiu.Medalha da AmizadeBaixoEncontrar o Gato da filha do jovem fazendeiro.
Cidade de MackLandFreiraO Padre Paulo foi na cidade industrial e não deu mais notícias.Medalha da AmizadeAltoO Padre Paulo está cercado por fantasmas. (Eliminar os inimigos é opcional)
AcampamentoDinhaA Sra. do acampamento necessita de ajuda para encontrar seu marido e sua cachorrinha.Medalha da AmizadeMédioSerá necessário adquirir uma autorização do Minerador Master.
Cidade do BrásDono do restauranteO dono de um restaurante solicita ajuda para reformar sua loja.Medalha da AmizadeBaixoAo aceitar ajudar se inicia a reforma da loja.
Cidade do BrásCorretoraExiste uma loja de alquimia a venda na cidade do Brás.Medalha da Amizade.AltoO valor da loja é alto, entretanto a cada ajuda que foi realizada o valor da loja fica zerado.
Mestre da Conquista (Exploradores)
LocalPersonagem não jogávelDescriçãoRecompensaComplexidadeSolução
CasaEnigma do Baú de casaUm baú que está na sua casa não abre, é necessária uma chave para abrir.Medalha da SabedoriaBaixoEncontrar a chave que está na trilha da montanha. (Eliminar os inimigos é opcional)
Cidade de MackLandEnigma do baúUm baú na loja de itens da cidade nunca foi aberto e caso consiga ele é seu.Medalha do Sabedoria e carta enigmáticaBaixoA chave deste baú está na cidade de MackLand, dentro do baú contém uma carta
Cidade de MackLandViajanteEm uma casa abandonada um espírito reside e guarda enigmas com ele.Medalha da SabedoriaMédioO espírito irá realizar duas perguntas, a primeira é necessário responder para pegar sua espada de volta, a segunda dará um prêmio
Torre do conhecimentoPrestonPreston não consegue solucionar o desafio da cripta.Medalha da Sabedoria e OrbeMédioÉ necessário encontrar as duas partes do Orbe do, tele transporte para Preston consertar.
Torre do conhecimentoFeiticeiraA feiticeira procura um item perdido e solicitará sua ajuda.Medalha da SabedoriaTorre do conhecimentoFeiticeira

Fonte: Elaborado pelo autor

AVALIAÇÃO DE JOGADORES

Para certificar o funcionamento do jogo proposto, o mesmo foi submetido a uma prova de conceito. Para isso, foi necessário estabelecer critérios para os participantes, sendo selecionados indivíduos que são jogadores ativos na faixa etária entre 18 a 36 anos de ambos os sexos e com ensino superior completo ou cursando o mesmo. Esses critérios foram estabelecidos com base no relatório anual do mercado de jogos no Brasil, que mostra que essa faixa etária, se trata do maior número de jogadores de ambos os sexos no país (NEWZOO, 2017). E posteriormente comparado com os dados da Pesquisa Games Brasil (PGB19), pesquisa realizada com o foco no cenário onde a pesquisa foi realizada (SIOUX GROUP, BLEND NEW GROUP, ESPM, GAME LAB & GO GAMES, 2019).

É importante esclarecer que o jogo digital adaptativo desenvolvido não é recomendado para menores de dez anos. Essa classificação se enquadra na criada pela Coordenação de Classificação Indicativa (Cocind) do Departamento de Promoção de Políticas de Justiça (DPJUS) responsável pela Classificação Indicativa (Classind) utilizada em território brasileiro (MINISTÉRIO, 2018).

TESTES E BALACEAMENTO

Os quinze primeiros voluntários corresponderam a um grupo de teste do jogo digital adaptativo. A amostra de teste busca encontrar falhas, erros e problemas que são camufladas durante o ciclo de produção (RABIN, 2005). Outro ponto é a definição dos protocolos a serem seguidos para instrução do voluntário e a forma correta para a coleta dos dados e identificar o perfil. O grupo de teste foi dividido em três partes iguais e antes do início da sessão de teste o voluntário era esclarecido sobre todo processo a ser realizado, a importância da sua participação e dos riscos e benefícios do experimento. Por fim, eram dadas as seguintes instruções aos voluntários:

  1. A sessão de jogo tem a duração de 45 minutos;
  2. Para melhor compreensão do que se deve fazer no jogo, leia todos os diálogos dos personagens com calma antes de prosseguir;
  3. O experimento não está avaliando seu desempenho, então jogue com calma e sem pressa;
  4. Caso tenha alguma dúvida, poderá ser respondida, mas não referente a progressão do jogo;
  5. Caso se sinta desconfortável, ameaçado, ou passe mal-estar, basta informar e a sessão será interrompida.
  6. Foi solicitado que o jogador salve os dados de sua progressão sempre.
  7. Em caso o jogador seja derrotado por um inimigo e seu personagem morra, o jogador pode retornar seu jogo do último dado salvo.
  8. Ao término da sessão, o voluntário respondeu o formulário Bartle Test of Game Psychology (Andreasen & Downey, 2003), em sua versão digital (Barr, 2019).

Este formulário de classificação de perfil de jogador (Bartle Test of Game Psychology) foi elaborado por Andreasen e Downey (2003) após analisarem os debates e as entrevista realizadas por Bartle (1996). O questionário é composto por trinta e oito perguntas, sendo realizadas de forma direta e com apenas duas alternativas. A cada resposta é atribuído um ponto a um perfil e no fim o que tiver maior pontuação determina qual é o arquétipo do entrevistado. O maior valor possível a ser pontuado por arquétipo é dezenove pontos (ANDREASEN, DOWNEY, 2003). A classificação identificada pelo formulário serve para confrontar o perfil encontrado pelo jogo. Após a explicação das instruções acima, era iniciada a sessão de jogo. Os cinco primeiros jogadores relataram os seguintes pontos:

  1. Dificuldades com o uso da versão para dispositivos móveis;
  2. Dificuldades para controlar o personagem pelo teclado;
  3. Erros em alguns diálogos e ações dos NPCs;
  4. Aprimoramento da curva de aprendizagem do jogador.

As soluções seguidas foram, desenvolvimento e apresentação de tarefas de baixa complexidade para cada perfil no início da experiência do jogador para que o mesmo tenha uma melhor compreensão do que deve realizar e como deve executar os comandos. As versões para dispositivos móveis foram descartadas devido às dificuldades de manuseio do personagem em telas grandes e de visualização para telas pequenas. Com isso todos os testes e desenvolvimento foram aplicados para a versão de computador. Introdução do uso de um gamepad controller, item que os voluntários que jogam têm afinidade ao usar se comparado ao teclado, gerando um conforto e encurtando a curva de aprendizagem para jogar. Correção de erros em alguns scripts de personagens não jogáveis, elaboração de diálogos objetivos e curtos para facilitar a leitura e entendimento do jogador e a introdução de legendas em locais de acesso ao jogador. Com o segundo grupo de teste resultou nas seguintes informações:

  1. Excesso de informações;
  2. Identificação de erros;
  3. Balanceamento do desafio nas tarefas.

As soluções tomadas foram, a subtração de itens, efeitos visuais, quantidade e tipos de inimigos da primeira versão constituiu em uma decisão necessária para respeitar e preservar a curva de aprendizado do jogador. Os excessos de informações apresentadas ao participante levarem à frustração de não conseguir assimilar de forma contínua, assim como interromperam o estado de fluxo que o jogo pretendia instituir. Com a exclusão de diversos itens, foi necessário um balanceamento nos desafios das tarefas e uma nova distribuição pelos ambientes do jogo, além da correção de erros de imagens e de efeitos sonoros aplicadas em alguns itens e personagens.

Já o terceiro e último grupo validou todas as correções aplicadas e definiu os procedimentos a serem executados para identificar os jogadores que não terminaram o jogo. Ainda assim, a leitura de algumas variáveis (nas quais o jogador mudou conforme sua progressão) foi usada para validar que perfil o jogador pertencia. Todo processo descrito acima contribuiu para o refinamento do jogo digital adaptativo, assim como os protocolos a serem seguidos para execução da coleta das informações geradas pelo usuário.

RESULTADOS OBTIDOS

Dando continuidade à proposta inicial do trabalho foram convidados vinte participantes. Todos os voluntários foram esclarecidos da existência do trabalho, da necessidade de sua participação. Em seguida foram fornecidas orientações de como jogar, o uso dos equipamentos (fones de ouvido e controle) assim como a duração do teste e, e pôr fim, apresentado o questionário de Bartle em seu formato digital. Todos os procedimentos aplicados seguem como realizado para o último grupo de testes. Todos os vinte participantes tiveram seu perfil identificado pelo jogo digital adaptativo, sendo que dezoito confirmaram seu perfil com o resultado encontrado no formulário digital e somente dois obtiveram um perfil diferente, sendo eles, os perfis de um Socializador que pelo formulário indicou um Explorador e um Assassino que o teve resultado pelo formulário como Conquistador. Na Quadro 6 seguem os resultados da amostra.

Quadro 6 ‒ Dados encontrados entre o jogo digital e o formulário

Arquétipo de BartleQuantidade de perfis encontradas pelo jogoQuantidade de perfis encontradas pelo formulárioJogadores que concluíram o jogo por perfil
Explorador (Explorer)9100
Conquistadores (Achiever)563
Assassino (Killer)432
Socializador (Socializer)210

Fonte: Elaborado pelo autor

A informação da última coluna indica os jogadores que terminaram o jogo e seus respectivos perfis, dentro dos vinte voluntários, cinco terminaram o jogo digital, contudo mesmo que o jogador não concluísse o jogo era possível averiguar qual foi o perfil encontrado durante sua sessão. Isso se deve as variáveis criadas dentro do fluxo de jogo para monitorar determinadas ações relacionadas aos perfis de jogadores. Desta forma, o progresso e as ações que o jogador tomou indicaram o perfil ao término da sessão do experimento e assim foi possível se certificar qual perfil o jogador desempenhou mesmo sem que o mesmo tenha concluído o ciclo de cinco tarefas de um perfil.

Todos os voluntários completaram o tempo limite de 45 minutos, estipulado da sessão, assim como demonstraram interesse em saber se existiam versões disponíveis em plataformas comerciais. Esses fatos levam acreditar que o objetivo de criar um jogo digital que coloque o voluntário em um estado fluxo foi alcançado, e que o jogo digital adaptativo apresentado deram ao voluntário a sensação de participar de um teste de jogo comercial, mesmo que informado previamente que se tratava de um experimento de pesquisa acadêmica.

conclusão e trabalhos futuros

O objetivo deste trabalho era compreender se o jogo digital desenvolvido teria condições de classificar o jogador em um dos arquétipos de Bartle. Para alcançar este objetivo se fez necessário criar um ambiente virtual imersivo e prazeroso a ponto de colocar o jogador em um estado de fluxo. Desta forma, fazendo com que o jogador se sinta à vontade e desinibido de decidir o que realmente gostaria de fazer. Consequentemente as escolhas tomadas dentro do contexto que o jogador traçaria serviram como parâmetros para direcionar o tipo do perfil que o jogador tem, neste ponto o modelo de árvore de decisão contribuiu em qualificar o usuário dentro de suas escolhas.

O trabalho teve uma amostra com 20 voluntários e todos os participantes foram classificados pela prototipação. Independente se o voluntário terminou o jogo ou não, dentro dos quarenta e cinco minutos de duração da sessão o voluntário foi identificado em um dos quatro arquétipos da classificação de Bartle (1996). Contudo, para os voluntários que terminaram o jogo as tarefas que foram concluídas direcionavam para um dos quatro perfis, contudo para os que não terminaram foram utilizadas as variáveis que se baseiam nas preferências dos perfis para identificá-lo. Para autenticação dos dados encontrados pelo artefato, os voluntários responderam ao The Bartle Test of Gamer Psychology, em que 80% dos resultados encontrados pelo formulário se igualaram aos identificados pelo jogo digital proposto.

Os resultados se demonstraram satisfatórios, considerando que o objetivo foi alcançado pela proposta sugerida, entretanto, alguns pontos podem ser aperfeiçoados no trabalho. Um deles é automatização do processo de análise de dados do jogo digital adaptativo. Nos casos em que o jogador não terminou o jogo foi necessário observar as variáveis manualmente para que chegasse a definição do perfil do jogador, este processo poderia ser evitado se o jogo estivesse integrado a uma plataforma de game analytics. Com esse modelo de monitoramento e análise o teste poderia ser realizado em qualquer lugar, sendo solicitado ao voluntário um cadastro para registro de dados para pesquisa. A integração a um desses serviços tornará, também, possível o desenvolvimento de uma versão do jogo digital adaptativo com um modo para multijogadores, o que possibilita a análise de jogadores atuando com outros jogadores e abrindo novas possibilidades de análise de perfis dos jogadores. O que mudaria o formato da atual pesquisa na qual apresentou um jogo para interação de um jogador e aumentaria a quantidade da amostra coletada dos voluntários e talvez os resultados. Um ponto a ser observado é que a limitação de tempo para o teste do experimento e a presença do pesquisador durante a sessão de jogo pode ter afetado o comportamento do participante, sendo que alguns deles entenderam isso como um desafio e podendo ou não ter mudado seu comportamento ao jogar.

Apesar deste trabalho ser desenvolvido voltado a identificação de jogadores, os métodos aplicados na construção de um jogo podem ser reutilizados para outros fins, fato no qual motiva a continuação desta pesquisa e a produção de novas formas nas quais um jogo pode servir como ferramenta de mensuração e classificação de seus usuários.

REFERÊNCIAS

ANDREASEN, E. S., & DOWNEY, B. A. (2006). Measuring Bartle-quotient. Retrieved November, 29, 2018, from http://www.andreasen.org/bartle/

APPERLEY, T. H. (2006). Genre and game studies: Toward a critical approach to video game genres. Simulation & Gaming, v. 37, n. 1, p. 6-23.

BARR, M. (2010). The Bartle Test of Gamer Psychology. Retrieved November, 2, 2018, from https://matthewbarr.co.uk/bartle/

BARTLE, R. (1996). Hearts, clubs, diamonds, spades: Players who suit MUDs. Journal of MUD research, v. 1, n. 1, p. 19, 1996.

BARTLE, R. A. (2004). Designing virtual worlds. Indianapolis. In: New Riders.

BARTLE, R. (2005). Virtual worlds: Why people play. Massively multiplayer game development, v. 2, n. 1, p. 3-18.

BATEMAN, C., & BOON, R. (2005). 21st Century Game Design (Game Development Series). Rockland, MA. In: Charles River Media, Inc.

BATEMAN, C. (2009). Beyond game design: Nine steps toward creating better videogames. Boston In: Charles River.

BATEMAN, C., Lowenhaupt, R., & Nacke, L. (2011). Player typology in theory and practice. In: DiGRA Conference.

BUCKLAND, M. (2005) Programming Game Al by Example. Jones & Bartlett Learning.

CALLEJA, G. (2011) In-game: From immersion to incorporation. Cambridge, Mass. In: MIT Press.

CAMPBELL, J. (1997). O herói de mil faces. 10.ed. Trad. Adail Ubirajara Sobral São Paulo: Cultriz/Pensamento.

CANOSSA, A., EL-NASR, M. S., & DRACHEN, A. (2013). Benefits of game analytics: Stakeholders, contexts and domains. In: Game Analytics. Springer, London, p. 41-52.

CHEN, J. (2007). Flow in games (and everything else). Communications of the ACM, v. 50, n. 4, p. 31-34.

CLARKE, R. I., LEE, J. H. & CLARK, N. (2017). Why video game genres fail: A classificatory analysis. Games and Culture, v. 12, n. 5, p. 445-465.

CRUZ, D. M., & de ALBUQUERQUE, R. M. (2014). A produção de jogos eletrônicos por crianças: narrativas digitais e o RPG Maker. Comunicação & Educação, 19(1), 111-120.

CSIKSZENTMIHALYI, M. (1990). Flow. The Psychology of Optimal Experience. New York: HarperPerennial.

DRACHEN, A., CANOSSA, A., & YANNAKAKIS, G. N. (2009). Player modeling using self-organization in Tomb Raider: Underworld. In: Computational Intelligence and Games. IEEE Symposium on. IEEE, p. 1-8.

GOW, J., BAUMGARTEN, R., CAIRNS, P., COLTON, S., & MILLER, P. (2012). Unsupervised modeling of player style with LDA. IEEE Transactions on Computational Intelligence and AI in Games, v. 4, n. 3, p. 152-166.

HUNICKE, R., LEBLANC, M. & ZUBEK, R. (2004). MDA: A formal approach to game design and game research. In: Proceedings of the AAAI Workshop on Challenges in Game AI. p. 1722.

KAHN, A. S., SHEN, C., LU, L., RATAN, R. A., COARY, S., HOU J., MENG, J., OSBORN, J., & WILLIAMS, D. (2015). The Trojan Player Typology: A cross-genre, cross-cultural, behaviorally validated scale of video game play motivations. Computers in Human Behavior, v. 49, p. 354-361.

KLOCK, A. C. T., FLORES, T. H., GASPARINI, I., & HOUNSELL, M. S., (2016). Classificação de jogadores: um mapeamento sistemático da literatura. In: Anais do Simpósio Brasileiro de Jogos e Entretenimento Digital. Porto Alegre: SBC.

LANKES, M, & BERNHAUPT, R. (2011). Using embodied conversational agents in video games to investigate emotional facial expressions. Entertainment Computing, v. 2, n. 1, p. 29-37.

MARCZEWSKI, A. (2015). Even ninja monkeys like to play: Gamification, game thinking & motivational design. CreateSpace Independent Publishing Platform In: Gamified UK.

McGONIGAL, J. (2011). Reality is broken: Why games make us better and how they can change the world. New York In: Penguin.

MILINGTON, I & FUNGE, J. (2018). Artificial intelligence for games. CRC Press.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICOS (2017). O que é classificação indicativa. Retrieved October, 20, 2017, from https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/seus-direitos/classificacao-1

MYERS, I. B. (1962). The Myers-Briggs Type Indicator: Manual.

NACKE, L. E., BATEMAN, C., & MANDRYK, R. L. (2014). BrainHex: A neurobiological gamer typology survey. Entertainment computing, v. 5, n. 1, p. 55-62.

NEWZOO. (2017). Global Games Market Report. Retrieved October, 20, 2017, from https://newzoo.com/insights/trend-reports/newzoo-global-games-market-report-2017-light-version/

RABIN, S. (2005). Introduction to Game Development (Game Development). Charles River Media, Inc.

ROGERS, S. (2012). Level UP: um guia para o design de grandes jogos. São Paulo: Blucher.

ROUSE III, R. (2014). Game design. In: The Routledge Companion to Video Game Studies. Routledge, p. 109-116.

RPG Maker (2018). RPG Maker MV. Retrieved October, 2, 2018, from https://www.rpgmakerweb.com/products/programs/rpg-maker-mv

SALEN, K. & ZIMMERMAN, E. (2004). Rules of play: Game design fundamentals. Cambridge, Mass. MIT press.

SCHWAB, B. (2014). AI postmortem: Hearthstone. In: Lecture, Game Developer’s Conference AI Summit.

SCHELL, J. (2014). The Art of Game Design: A book of lenses. Burlington. In: AK Peters/CRC Press.

SCHUURMAN, D., DE MOOR, K., DE MAREZ, L. & VAN LOOY J. (2008). Fanboys, competers, escapists and time-killers: a typology based on gamers’ motivations for playing video games. In: Proceedings of the 3rd international conference on Digital Interactive Media in Entertainment and Arts. ACM. p. 46-50.

SIOUX GROUP, Blend New Group, ESPM, Game Lab & Go Games (2019). Pesquisa Games Brasil – PGB 2019, Retrieved June, 20, 2019, from https://www.pesquisagamebrasil.com.br/ebooks

SKUBCH, H. (2019). Interações de ambiente: melhorando a credibilidade aproveitando a IA baseada em regras. In: Game AI Pro 360 . CRC Press. p. 113-124.

STEWART, B. (2017). Personality And Play Styles: A Unified Model. Retrieved December, 20, 2017, from http://www.gamasutra.com/view/feature/6474/personality_and_play_styles_a_.php

SOUSA, R. F. D. C. (2018). O software RPG Maker e a construção do jogo Apolo: uma experiência com professores de matemática. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil.

TYCHSEN, A., HITCHENS, M., BROLUND, T., & KAVAKLI, M. (2006). Live action role-playing games: Control, communication, storytelling, and MMORPG similarities. Games and Culture, 1(3), 252-275.

THORHAUGE, A. M. (2013). The rules of the game—The rules of the player. Games and Culture, v. 8, n. 6, p. 371-391.

VOGLER, C. (2015). A jornada do escritor: estrutura mítica para escritores. Aleph.

YEE, N. (2006). Motivations for play in online games. CyberPsychology & behavior, v. 9, n. 6, p. 772-775.

YEE, N., DUCHENEAUT, N., NELSON, L., & LIKARISH, P. (2011). Introverted elves & conscientious gnomes: the expression of personality in world of warcraft. In: Proceedings of the SIGCHI Conference on Human Factors in Computing Systems. ACM, p. 753-762.

.


1 Bacharelado em Sistemas de Informação e Mestre em Engenharia Elétrica e Computação pela Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo. E-mail: danthyl@hotmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6833-8660

2 Pós-Doutorado pela Universidade Federal de Uberlândia e Doutora e Mestre pela Universidade de São Paulo. Professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie na Faculdade de Computação e Informática (FCI) e no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica e Computação (PPGEEC), E-mail: pollyananotargiacomo@mackenzie.com.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8292-1644