REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202411301109
Camila Oliveir Assis1; Esther Eyshila Andrade Alves Branco2; Ricardo Henrique Nunes De Souza Soares3; Thalita De Paula Silva4; André Luiz De Oliveira Campos Rodrigues5
RESUMO
Introdução: A prescrição medicamentosa é uma atribuição essencial do cirurgião-dentista, e há diversas classes de medicamentos amplamente utilizadas na sua área de atuação, tais como anti-inflamatórios, analgésicos, anestésicos locais, antibióticos, antifúngicos e ansiolíticos. Cada uma dessas classes desempenha um papel específico no manejo de condições orais, permitindo ao profissional tratar adequadamente inflamações, infecções e dores associadas a procedimentos odontológicos. Objetivo: este trabalho tem como objetivo realizar uma revisão narrativa da literatura, explorando as principais classes de medicamentos prescritos pelos cirurgiões-dentistas. Metodologia: A busca por artigos foi realizada nas plataformas PubMed, SciELO e Google Scholar, priorizando publicações com até 10 anos, com vistas a identificar tendências atuais e as melhores práticas, com as seguintes estratégias de busca: “prescrição medicamentosa, cirurgião-dentista, odontologia”, “drug prescription, dentist, dentistry”. Conclusão: este trabalho destaca a importância do constante aprimoramento profissional e do conhecimento atualizado, para que o cirurgião-dentista exerça a prerrogativa da prescrição de medicamentos com responsabilidade e eficácia, reforçando a importância deste ato como parte essencial e frequente da prática clínica.
Palavras-chave: prescrição medicamentosa, cirurgião-dentista, odontologia.
INTRODUÇÃO
A prescrição de medicamentos por cirurgiões-dentistas é uma prática regulamentada pela Lei nº 5.081/1966, que estabelece as diretrizes para o exercício da odontologia. Essa atividade, amplamente reconhecida no Brasil e em diversos países, está associada ao manejo de condições que acometem a cavidade oral, os tecidos adjacentes e outras alterações sistêmicas com impacto no tratamento odontológico (“Lei No 5.081”, 1966)
No Brasil, o cirurgião-dentista está autorizado a prescrever medicamentos, incluindo analgésicos, anti-inflamatórios, antibióticos, anestésicos locais e antissépticos, conforme regulamentação do Conselho Federal de Odontologia. Esses fármacos são utilizados no manejo da dor, no tratamento de infecções odontogênicas e no controle de infecções gengivais, além de serem empregados no tratamento de distúrbios sistêmicos relacionados à saúde bucal, como em pacientes com diabetes ou hipertensão (“Lei No 5.081 ”, 1966).
Entretanto, é fundamental que essa prática seja conduzida com responsabilidade e embasada em evidências científicas, respeitando as diretrizes e regulamentações específicas de cada país. A prescrição envolve desafios significativos, como a escolha apropriada do medicamento, o domínio do conhecimento farmacológico, a avaliação de interações medicamentosas, a mitigação da resistência antimicrobiana, e a identificação de reações adversas e alergias, que podem impactar diretamente a eficácia do tratamento e a segurança do paciente (ANDRADE, 2016).
A Lei nº 5.081, de 24 de agosto de 1966, em seu artigo 6º, inciso II, determina que “compete ao cirurgião-dentista prescrever e aplicar especialidades farmacêuticas de uso interno e externo, indicadas em Odontologia.” Com base nessa regulamentação, fica evidente que a administração de medicamentos por meio de formulários de notificação de receita é permitida, desde que destinada exclusivamente ao tratamento de condições relacionadas à saúde bucal (“Lei No 5.081”, 1966).
O uso dessas prescrições para fins alheios ao escopo da odontologia caracteriza exercício ilegal da profissão, estando sujeito às sanções previstas pela legislação vigente. Portanto, é imprescindível que a prescrição seja restrita ao âmbito odontológico, respeitando as normativas (ANDRADE, 2016).
Antes de realizar uma prescrição, é imprescindível que o profissional tenha domínio sobre o mecanismo de ação, as contraindicações e os possíveis efeitos adversos dos medicamentos a serem indicados. Além disso, um diagnóstico preciso e a definição da dosagem correta são etapas fundamentais para garantir a eficácia e a segurança do tratamento. Todo esse processo deve estar alinhado à responsabilidade ética e legal associada à prática profissional (PREFEITURA DE SÃO PAULO, 2014)
Diante das informações apresentadas, este estudo tem como objetivo ressaltar para o cirurgião-dentista a importância de uma prescrição adequada, abordando os conceitos e as restrições das principais classes de medicamentos comumente utilizadas na prática odontológica.
1 REVISÃO DE LITERATURA
No âmbito da odontologia, o cuidado com os pacientes transcende os procedimentos clínicos, englobando a prescrição de medicamentos essenciais para o alívio de desconfortos e a recuperação adequada. Contudo, a administração inadequada de fármacos pode gerar consequências adversas, comprometendo a segurança e o bem-estar do paciente.
Analgésicos
Os medicamentos analgésicos desempenham um papel essencial no alívio da dor intensa, sendo fundamentais para a gestão pós-operatória e no manejo de condições odontológicas. Segundo Carvalho et al., (2017), a dipirona sódica é o fármaco mais prescrito por cirurgiões-dentistas dentro dessa classe, devido à sua elevada eficácia. Com ação rápida e baixo risco de efeitos colaterais, a dipirona é amplamente utilizada no controle da dor pós-operatória e inflamatória, especialmente em procedimentos como extrações e cirurgias periodontais. Um estudo realizado em uma clínica odontológica de uma universidade no sul de Minas Gerais revelou que a dipirona corresponde a 66,66% das prescrições nessa categoria.
O paracetamol, por sua vez, é o segundo analgésico mais frequentemente prescrito, com uma taxa de 32,20% segundo o mesmo estudo (CARVALHO et al., 2017). No entanto, seu uso frequente e inadequado pode levar à hepatotoxicidade, conforme alerta a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Dados da Associação Americana para o Estudo de Doenças Hepáticas apontam que a toxicidade hepática relacionada ao paracetamol tem aumentado significativamente nas últimas décadas, sendo a principal causa de insuficiência hepática aguda nos Estados Unidos, Reino Unido e diversos países europeus. Nos Estados Unidos, o uso do paracetamol está associado anualmente a mais de 100.000 chamadas para Centros de Controle de Intoxicações, 56.000 visitas a emergências, 2.600 internações hospitalares e quase 500 mortes.
Esses dados destacam a importância do conhecimento aprofundado por parte dos cirurgiões-dentistas sobre os riscos associados ao uso inadequado e frequente desse medicamento, reforçando a necessidade de uma prescrição responsável e informada para garantir a segurança do paciente.
Embora seja pouco conhecido, os cirurgiões-dentistas também têm a capacidade de prescrever analgésicos da classe dos opioides como a morfina, codeína, tramadol, entre outros. Podem ser utilizados para tratar dores intensas após procedimentos invasivos e complexos quando os analgésicos não opioides, como paracetamol, não são suficientes para controlar a dor. Esses medicamentos são úteis nas desordens temporomandibulares, em situações de dores agudas, quando há exacerbação da dor musculoesquelética e dor pós-operatória em cirurgia oral. Entretanto, os dentistas são cautelosos quanto à prescrição desses medicamentos, devido ao potencial de dependência e outros efeitos colaterais que eles podem apresentar. Um estudo realizado no Brasil em “A national study on the use of opioid analgesics in dentistry”, obteve a média nacional de prescrições de analgésicos opioides entre os dentistas como 3,82 prescrições. Em que 50% prescreveram pelo menos 12 vezes durante um ano. A frequência de medicamento mais prescrito foi a codeína relacionada ao paracetamol, com uma taxa de 83,2% de prescrição entre os cirurgiões dentistas (LINO et al., 2019)
Um desafio a ser enfrentado no Brasil, é a alta taxa de automedicação entre os brasileiros, de acordo com a ANVISA, uma parte significativa da população utiliza medicamentos sem orientação médica, o que pode acarretar riscos à saúde. Dessa forma, as possíveis interações medicamentosas entre os analgésicos opioides e outros fármacos como, etanol, podem acarretar uma profunda sedação, causar depressão respiratória, e avançar para estágios mais graves como o paciente entrar em estado de coma, ou até a óbito. A combinação dessa classe com o medicamento tiopental e halotano, podem causar apneia, devido a depressão do sistema nervoso central que esses dois fármacos causam. Dessa forma, esse efeito é intensificado com o uso de analgésicos opioides, essa depressão pode afetar os centros respiratórios no cérebro, levando a uma diminuição da resposta respiratória. Quando combinados com benzodiazepínicos também apresentam um alto risco à saúde, provocando um aumento nos efeitos depressores respiratórios do sistema nervoso central. A bupropiona que é um medicamento utilizado para o tratamento da depressão, não deve ser administrada juntamente com os analgesicos opioides, pois apresentam um alta potencialização no risco de convulsões, também deve ser evitado a administração quando o paciente faz uso do medicamento metoclopramida, pois pode aumentar a disfunção motora. Dessa forma, é fundamental que os cirurgiões-dentistas estejam cientes das informações sobre os altos riscos associados à combinação de analgésicos opioides com outros medicamentos já utilizados por pacientes, a fim de prevenir sérios problemas de saúde (BERTOLLO; DEMARTINI; PIATO, 2014)
Embora menos conhecidos, os cirurgiões-dentistas têm a capacidade de prescrever analgésicos opioides, como morfina, codeína e tramadol. Esses fármacos são indicados no manejo da dor intensa, especialmente após procedimentos invasivos e complexos, quando analgésicos não opioides, como o paracetamol, não são suficientes para o controle da dor. Os opioides também têm aplicação em casos de desordens temporomandibulares, dores agudas associadas à exacerbação da dor musculoesquelética e na dor pós-operatória de cirurgias orais. No entanto, a prescrição desses medicamentos requer cautela, devido ao risco de dependência e a outros potenciais efeitos adversos
Um estudo realizado no Brasil, intitulado A National Study on the Use of Opioid Analgesics in Dentistry (LINO et al., 2019)), revelou que a média nacional de prescrições de opioides por cirurgiões-dentistas é de 3,82 por ano, com 50% dos profissionais relatando pelo menos 12 prescrições anuais. O medicamento mais frequentemente prescrito foi a combinação de codeína com paracetamol, representando 83,2% das prescrições dessa classe.
Um dos desafios no Brasil é a elevada taxa de automedicação, conforme alerta a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). O uso indiscriminado de medicamentos, combinado com opioides, pode acarretar sérios riscos à saúde, incluindo:
- Etanol: A interação com bebidas alcoólicas pode causar sedação profunda, depressão respiratória e, em casos graves, levar ao coma ou óbito.
- Tiopental e Halotano: Podem induzir apneia ao causar depressão do sistema nervoso central, potencializada pelo uso de opioides.
- Benzodiazepínicos: A combinação intensifica a depressão respiratória, aumentando o risco de insuficiência respiratória grave.
- Bupropiona: Este antidepressivo, quando associado a opioides, eleva significativamente o risco de convulsões.
- Metoclopramida: Seu uso concomitante com opioides pode exacerbar disfunções motoras.
A depressão do sistema nervoso central promovida pelos opioides pode comprometer os centros respiratórios do cérebro, resultando em uma resposta respiratória reduzida e potencialmente fatal. Assim, é imprescindível que os cirurgiões-dentistas estejam atentos às interações medicamentosas e ao histórico farmacológico dos pacientes, prevenindo complicações graves (BERTOLLO; DEMARTINI; PIATO, 2013).
Anti-inflamatórios:
Os anti-inflamatórios constituem a segunda classe terapêutica mais utilizada na prática odontológica, sendo empregados para reduzir a inflamação e o desconforto associado a condições dentárias e procedimentos clínicos. Dentro dessa classe, os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) e os esteroides (AIEs) se destacam, com os primeiros sendo os mais prescritos, uma vez que não contêm esteroides hormonais em sua composição (BATLOUNI, 2010).
Os AINEs atuam como inibidores da cicloxigenase (COX) e podem ser classificados em seletivos e não seletivos. Dentre os medicamentos dessa classe, a nimesulida é a mais prescrita devido ao seu potente efeito analgésico e anti-inflamatório, sendo especialmente eficaz no tratamento de condições odontológicas que envolvem inflamação, como abscessos e periodontites. No entanto, a segurança dos AINEs, especialmente os inibidores seletivos da COX-2, tem sido questionada, principalmente no que diz respeito aos efeitos adversos no sistema cardiovascular (BATLOUNI, 2010).
Estudos clínicos prospectivos e meta-análises apontam que esses medicamentos podem aumentar o risco de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca, insuficiência renal e hipertensão arterial. Por esse motivo, é fundamental que os AINEs sejam prescritos apenas após uma avaliação cuidadosa dos riscos e benefícios. Além disso, esses medicamentos podem interferir na eficácia de medicamentos anti-hipertensivos, elevando a pressão arterial, especialmente em pacientes idosos ou com hipertensão arterial sistêmica (VARGA; SABZWARI; VARGOVA, 2017).
A fim de avaliar o conhecimento dos cirurgiões-dentistas sobre a prescrição de AINEs em pacientes hipertensos, foi realizado um estudo com um questionário aplicado aos profissionais da rede pública de saúde de São José dos Campos. Os dados foram analisados por meio do teste de Wald e do teste exato de Fisher, com significância estatística definida por p<0,05. O estudo concluiu que o nível de compreensão dos cirurgiões-dentistas em relação à prescrição de AINEs é insuficiente, o que justifica a insegurança na prescrição desses medicamentos ((CARVALHO; BORGATTO; LOPES, 2010)
Além disso, a combinação dos AINEs com outros medicamentos pode gerar reações adversas significativas. Por exemplo, o uso concomitante com anticoagulantes, como dabigatrana, enoxaparina, dicumarol, varfarina, alteplase e heparina, aumenta o risco de hemorragias durante procedimentos odontológicos. A interação com medicamentos como efavirenz e naltrexona pode resultar em toxicidade gastrointestinal e lesões hepáticas. O metotrexato, utilizado em tratamentos de câncer e doenças autoimunes, pode causar supressão da medula óssea, nefrotoxicidade e hepatotoxicidade. Além disso, os anti-hipertensivos como atenolol e propranolol podem ter sua eficácia reduzida, comprometendo o controle da pressão arterial (LIMA et al., 2016) .
Antidepressivos como citalopram e sertralina podem aumentar o risco de sangramentos, especialmente quando combinados com anticoagulantes, e o lítio, utilizado no tratamento de transtornos bipolares, pode causar efeitos adversos como vômito e fraqueza, prejudicando a cooperação do paciente (IORIS; BACCHI, 2019).
Esses exemplos ressaltam a necessidade de uma prescrição cautelosa e bem fundamentada, considerando as interações medicamentosas e os riscos potenciais, para garantir a segurança e o bem-estar do paciente.
Antibióticos
Os antibióticos desempenham um papel essencial na odontologia, sendo amplamente utilizados tanto para prevenir como para tratar infecções bacterianas, especialmente em procedimentos invasivos, como extrações e implantes dentários. Sua utilização é crucial para o controle de infecções pré-existentes e para a prevenção de complicações pós-operatórias, garantindo uma recuperação mais segura para o paciente. Além disso, antibióticos são indispensáveis no tratamento de condições como abscessos dentários ou periodontites graves, ajudando a eliminar as bactérias responsáveis pela inflamação e tornando o tratamento clínico mais eficaz (OLIVEIRA et al., 2011).
Um aspecto importante a ser considerado no uso de antibióticos é a possibilidade de efeitos adversos devido à administração inadequada. O uso excessivo pode desestabilizar a flora intestinal, favorecendo o crescimento de Clostridium difficile, uma bactéria associada a diarreia severa e outras complicações intestinais. A amoxicilina, amplamente utilizada, é um exemplo de antibiótico com alta taxa de prescrição (84,84%), devido à sua boa absorção no trato gastrointestinal (BEACHER; SWEENEY; BAGG, 2015).
Os antibióticos também apresentam interações medicamentosas importantes que devem ser cuidadosamente analisadas. A amoxicilina, por exemplo, pode aumentar os efeitos hematológicos adversos quando combinada com metotrexato e potencializar o risco de sangramento quando administrada com varfarina ou dicumarol. Além disso, ela pode reduzir a eficácia de contraceptivos contendo etinilestradiol. A clindamicina, por sua vez, pode causar depressão respiratória quando associada a bloqueadores neuromusculares e toxicidade aguda quando combinada com verapamil, além de também reduzir a eficácia de contraceptivos orais (IORIS; BACCHI, 2019).
A tetraciclina pode interagir com antiácidos, como o carbonato de cálcio e o hidróxido de magnésio, prejudicando sua eficácia. Além disso, pode aumentar o risco de sangramento com varfarina e elevar os níveis de digoxina, gerando efeitos adversos como náuseas e distúrbios cardíacos. O uso concomitante de tetraciclina com sulfato ferroso ou sulfato de zinco pode comprometer sua biodisponibilidade, enquanto a combinação com insulina pode potencializar o efeito hipoglicêmico. O metronidazol, por outro lado, pode causar tonturas e palpitações quando combinado com amiodarona ou loperamida, e aumentar o risco de sangramento quando administrado com varfarina e dicumarol. Esse antibiótico também pode interagir com fenobarbital, atorvastatina e cisplatina, apresentando sérios riscos quando combinado com dissulfiram e etanol, podendo causar rubor e dificuldade respiratória (IORIS; BACCHI, 2019).
Na profilaxia antibiótica para adultos, a amoxicilina é o fármaco de primeira escolha, administrada em dose única de 2g, uma hora antes do procedimento. Para pacientes alérgicos à amoxicilina, a clindamicina é indicada em dose única de 600mg, também uma hora antes do procedimento. Para crianças, a dose preferencial de amoxicilina é de 50mg/kg (máximo de 2g), administrada uma hora antes do procedimento. Em casos de alergia à penicilina, podem ser prescritos cefalexina, azitromicina ou claritromicina (MATOS et al., 2024).
No tratamento de doenças não periodontais, a amoxicilina também é frequentemente prescrita, com doses recomendadas de 500mg a cada 8 horas, durante 7 dias para adultos. Para crianças, a dose varia entre 50 e 100mg/kg/dia, dividida em três administrações por 7 dias. Em caso de alergia à amoxicilina, a azitromicina é uma alternativa, com dose única de 500mg por dia durante 3 dias, ou 10mg/kg/dia para crianças, administrada uma vez ao dia por 3 dias (ANDRADE, 2014).
Em alguns casos, é necessário associar antibióticos a outros medicamentos para otimizar o tratamento. A combinação de amoxicilina com clavulanato de potássio, uma penicilina semissintética, é amplamente utilizada na odontologia, pois muitas bactérias responsáveis por infecções odontogênicas produzem a enzima betalactamase, que inativa o efeito da amoxicilina, tornando o tratamento menos eficaz. A adição do clavulanato de potássio inibe essa enzima, potencializando a ação antibiótica e melhorando os resultados terapêuticos (CARVALHO et al., 2017)
A prescrição de antibióticos deve ser sempre cuidadosamente avaliada, considerando tanto as necessidades do paciente quanto as possíveis interações medicamentosas e os riscos associados, para garantir a eficácia do tratamento e minimizar complicações.
Benzodiazepínicos:
A classe dos benzodiazepínicos é uma ferramenta valiosa na odontologia, principalmente no manejo da ansiedade e do estresse dos pacientes antes e durante os procedimentos dentários. Esses medicamentos são conhecidos por suas propriedades sedativas, ansiolíticas e relaxantes musculares, proporcionando um efeito calmante que facilita o tratamento e melhora a experiência do paciente no consultório odontológico (COGO et al., 2006)
Os benzodiazepínicos, como o diazepam, bromazepam, alprazolam e lorazepam, são frequentemente prescritos pelos cirurgiões-dentistas para ajudar a controlar a ansiedade dos pacientes, especialmente aqueles que têm fobia de procedimentos odontológicos. Esses medicamentos têm a capacidade de induzir um estado de relaxamento que pode ser essencial para a realização de tratamentos mais invasivos ou prolongados, como extrações dentárias ou cirurgias periodontais (COGO et al., 2006)
Apesar de sua eficácia, muitos profissionais de odontologia mostram resistência à prescrição de benzodiazepínicos, possivelmente devido à falta de familiaridade com o uso desses fármacos ou ao receio quanto a potenciais efeitos adversos, como a sedação excessiva, a depressão respiratória ou a dependência. A sedação com benzodiazepínicos deve ser feita de maneira controlada, com o devido acompanhamento e orientação ao paciente para evitar complicações (COGO et al., 2006)
Uma questão relevante que emerge é a disposição dos pacientes em aceitar a sedação com esses medicamentos. A aceitação dos pacientes em relação à medicação com benzodiazepínicos foi investigada em um estudo realizado para avaliar o grau de conforto e disposição dos indivíduos para o uso desses fármacos durante o atendimento odontológico. O estudo revelou que, embora alguns pacientes estejam dispostos a tomar benzodiazepínicos para aliviar a ansiedade, outros podem ter reservas em relação ao uso de medicamentos sedativos, principalmente devido a preocupações sobre efeitos colaterais ou dependência (COGO et al., 2006)).
É importante que os cirurgiões-dentistas discutam com seus pacientes os benefícios e riscos dos benzodiazepínicos, garantindo que a escolha do tratamento seja feita com base no consentimento informado e no conforto do paciente, além de assegurar a administração segura desses medicamentos.
Anestésicos locais:
O uso de anestésicos locais na odontologia tem uma longa história e desempenha um papel crucial no conforto e bem-estar dos pacientes durante os procedimentos dentários. Desde a descoberta do óxido nitroso por Horace Wells em 1844, como anestésico geral, até o uso de anestésicos locais, como lidocaína, prilocaína, mepivacaína, bupivacaína e outros, a odontologia avançou significativamente na administração da dor (ANDRADE, 2006).
Lidocaína é o anestésico local mais utilizado na odontologia, sendo considerado o padrão de referência. Desenvolvido em 1943 por Nils Lofgren, seu início de ação ocorre em 2 a 3 minutos, com uma dose máxima recomendada de 7,0 mg/kg para adultos. É eficaz em concentrações de 1% a 2%, com ou sem vasoconstritor, e é bastante segura, sendo amplamente utilizada (RABÊLO et al., 2019).
Prilocaína, por outro lado, apresenta maior toxicidade que a lidocaína, mas também é utilizada com frequência, especialmente em combinações com vasoconstritores como felipressina. Sua ação começa de 2 a 4 minutos após a aplicação, e sua dose máxima é de 6,0 mg/kg (RABÊLO et al., 2019)..
A mepivacaína, desenvolvida em 1957, tem uma duração intermediária de ação e é eficaz em concentrações de 2% com vasoconstritor e 3% sem. Este anestésico oferece a vantagem de um tempo de anestesia mais longo sem vasoconstritor, sendo preferido em procedimentos onde a hemostasia não é essencial (RABÊLO et al., 2019)..
Bupivacaína, disponível no Brasil, é um anestésico de longa duração com uma potência superior à lidocaína, sendo eficaz por até 9 horas em procedimentos cirúrgicos. Sua toxicidade, no entanto, é menor que a da lidocaína. Utilizado principalmente em ambientes hospitalares, seu uso deve ser cuidadosamente controlado devido ao seu potencial de causar reações adversas em doses elevadas (RABÊLO et al., 2019)..
A presença de vasoconstritores, como adrenalina, noradrenalina, fenilefrina e felipressina, tem sido fundamental no aprimoramento da eficácia dos anestésicos locais. Eles promovem a vasoconstrição no local de aplicação, o que resulta em uma absorção mais lenta do anestésico, prolongando sua ação e reduzindo a toxicidade, além de melhorar o controle do sangramento durante a cirurgia (RABÊLO et al., 2019)..
No entanto, o uso de vasoconstritores pode ser contraindicado em pacientes com doenças cardíacas, como hipertensão não controlada, angina instável, infarto recente, entre outros, devido ao risco de elevação da pressão arterial e arritmias cardíacas. A felipressina, um análogo da vasopressina, é uma alternativa mais segura para esses pacientes, pois não afeta diretamente o miocárdio, mas pode ser contraindicada em pacientes com problemas na circulação coronariana (RABÊLO et al., 2019).
Gestantes também devem ser monitoradas com cautela ao se usar anestésicos locais. A lidocaína é considerada segura, enquanto a prilocaína e a articaína devem ser evitadas devido ao risco de metemoglobinemia, uma condição que interfere na capacidade do sangue de transportar oxigênio. A bupivacaína, devido a sua cardiotoxicidade, deve ser usada com precaução (RABÊLO et al., 2019)..
Outro aspecto importante é a interação medicamentosa entre vasoconstritores e antidepressivos, especialmente tricíclicos, que podem intensificar os efeitos adversos cardiovasculares, como aumento da pressão arterial e arritmias, em pacientes que usam medicamentos como imipramina. Para esses pacientes, é preferível usar felipressina, que tem um efeito cardiovascular menor, embora com menor efeito hemostático (RABÊLO et al., 2019)..
Portanto, a escolha do anestésico local e vasoconstritor deve ser cuidadosamente feita, considerando o histórico médico do paciente, a presença de comorbidades e a medicação em uso, com especial atenção para gestantes e pacientes com doenças cardiovasculares. O conhecimento profundo dos efeitos de cada anestésico e vasoconstritor, bem como de suas interações, é essencial para garantir a segurança do paciente e o sucesso do tratamento odontológico.
2 DISCUSSÃO
A prescrição de medicamentos na odontologia é um tema que gera intensos debates, principalmente quando se trata do uso de antibióticos, analgésicos e sedativos. A prática de prescrever antibióticos de forma indiscriminada, muitas vezes sem uma evidência clara de infecção sistêmica, tem sido alvo de críticas tanto pela comunidade científica quanto pelos órgãos reguladores (DENISCO et al., 2011).
Estudos apontam que cerca de 10% das prescrições de antibióticos nos Estados Unidos são realizadas por dentistas, mas muitas delas podem ser desnecessárias, indo contra as diretrizes da American Heart Association e da American Dental Association (ADA). A prescrição excessiva de antibióticos não só é desnecessária em muitos casos, como também contribui para o crescente problema da resistência bacteriana, uma preocupação destacada por Carvalho et al. (2017) e outros estudiosos da área.
A falta de comunicação entre dentistas e médicos agrava ainda mais esse problema. Pacientes que recebem antibióticos para tratamentos odontológicos nem sempre informam seus médicos sobre o uso dessas medicações, o que cria lacunas nos registros de saúde e pode levar a efeitos adversos graves, como a infecção por Clostridium difficile (BEACHER; SWEENEY; BAGG, 2015).
A prescrição de analgésicos também exige atenção. Embora a dipirona sódica seja frequentemente utilizada, o paracetamol surge como uma alternativa. Mas, o uso inadequado de paracetamol pode levar a hepatotoxicidade, um risco que não pode ser ignorado (QUEIROZ et al., 2013).
Os AINEs, comumente prescritos para controle da dor pós-operatória, também apresentam riscos significativos, como problemas gastrointestinais e efeitos renais, o que exige uma análise crítica por parte dos profissionais. A questão da escolha do analgésico mais adequado deve ser discutida com base em uma avaliação mais detalhada dos riscos e benefícios, levando em conta a condição clínica do paciente e as melhores evidências científicas disponíveis (BATLOUNI, 2010; CARVALHO; BORGATTO; LOPES, 2010).
Outro ponto que gera controvérsia é a sedação consciente, principalmente quando realizada com benzodiazepínicos. A Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA) questiona a capacidade dos dentistas de administrar sedação em consultórios, alegando que o uso de sedativos e opioides exige um conhecimento técnico mais aprofundado, além de um risco maior para a segurança do paciente.
Por outro lado, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) defende a competência dos dentistas para realizar esses procedimentos, com base na legislação que os habilita a aplicar técnicas de anestesia, analgesia e sedação consciente. Embora esse embate tenha gerado discussões jurídicas, a legislação ainda confere aos dentistas o direito de realizar sedação, desde que estejam devidamente habilitados, o que enfatiza a importância da qualificação contínua e da segurança no manejo dessas técnicas.
Em relação aos anestésicos locais, como articaína e prilocaína, também existem controvérsias sobre os riscos envolvidos, especialmente em relação a efeitos adversos como a toxicidade. A escolha do anestésico deve ser feita com base em um julgamento clínico cuidadoso, levando em consideração as condições do paciente e as possíveis complicações. A literatura recomenda a utilização de alternativas mais seguras, como a mepivacaína, em determinados casos, mas a falta de dados conclusivos sobre os efeitos de algumas substâncias ainda deixa espaço para debates (RABÊLO et al., 2019).
Em resumo, a prescrição de medicamentos na odontologia exige uma abordagem crítica e bem fundamentada. A falta de consenso sobre várias práticas, como a profilaxia antibiótica e a sedação consciente, destaca a necessidade de mais estudos e discussões sobre o tema. A comunicação entre profissionais da saúde deve ser aprimorada, especialmente quando se trata de medicamentos como antibióticos, para evitar efeitos adversos e complicações (DENISCO et al., 2011; PREFEITURA DE SÃO PAULO, 2014).
A educação contínua em farmacologia e a implementação de programas de gestão de antimicrobianos são essenciais para garantir que os tratamentos odontológicos sejam realizados de forma segura e eficaz, sem expor os pacientes a riscos desnecessários. A legislação e a formação dos profissionais devem ser constantemente avaliadas para acompanhar os avanços na área e garantir a segurança dos pacientes.
CONCLUSÃO
O cirurgião-dentista está plenamente capacitado para prescrever medicamentos dentro de sua área de atuação, conforme regulamentado pela legislação e respaldado pela sua formação acadêmica. A prescrição de medicamentos, como antibióticos, analgésicos e sedativos, é parte essencial do tratamento odontológico, especialmente em procedimentos invasivos. No entanto, é fundamental que o profissional atue de maneira responsável, sempre considerando as diretrizes clínicas e os riscos associados. A contínua atualização e educação em farmacologia são cruciais para garantir práticas seguras e eficientes.
REFERÊNCIAS
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1Graduanda do curso de Odontologia pelo Centro Universitário Católica do Leste de Minas. E-mail: lais.canuto@a.unileste.edu.br
2Graduanda do curso de Odontologia pelo Centro Universitário Católica do Leste de Minas. E-mail: leticia.osousa@a.unileste.edu.br
3Graduando do curso de Odontologia pelo Centro Universitário Católica do Leste de Minas. E-mail: priscila.soliveira@a.unileste.edu.br
4Graduanda do curso de Odontologia pelo Centro Universitário Católica do Leste de Minas. E-mail: thayrone.santos@a.unileste.edu.br
5Cirurgião-dentista, Professor NDII do Centro Universitário Católica do Leste de Minas Gerais – Unileste, Mestre em Fisiologia pela Universidade Federal De Minas Gerais. Especialista em Implantodontia e Prótese Dentária. E-mail: andre.oliveira@p.unileste.edu.br