CAUSAS E EFEITOS DA COMPULSÃO ALIMENTAR NA SAÚDE DA MULHER NA FASE ADULTA

CAUSES AND EFFECTS OF BINGE EATING ON WOMEN’S HEALTH IN ADULTHOOD

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7879329


Talyne Cruz Rodrigues Wolter1
Isabela da Silva Moura2


Resumo

O presente artigo tem como objetivo evidenciar os aspectos gerais da compulsão alimentar. O transtorno da compulsão alimentar é um transtorno alimentar de natureza psicológica e física, evidenciado pela condição em que o indivíduo come muita comida durante um curto período de tempo até que o mesmo esteja desconfortavelmente cheio; são geralmente planejadas com antecedência, e feitas sozinhas incluindo comida que despertam a compulsão. Pode atingir afetar a pessoa independente da idade, sendo mais prevalente em mulheres do que homens. Os sinais e sintomas de alerta são se alimentar muito rápido; comer mesmo sem fome, ou depois de se sentir satisfeito; ter sentimento de tristeza ou culpa após o episódio; ainda depressão leve a moderada com extrema preocupação com o peso e a forma do corpo. É uma condição que pode trazer prejuízos significativos para a saúde mental e física, exigindo diagnóstico e intervenção terapêutica precoce. O diagnóstico é composto pelo conjunto de critérios clínicos e o tratamento envolve psicoterapia, medicamentos, aconselhamento nutricional.  

Palavras-chave: Transtorno Alimentar. Compulsão Alimentar. Transtorno de Compulsão Alimentar.

Abstract

This article aims to highlight the general aspects of binge eating. Binge eating disorder is an eating disorder of psychological and physical nature, evidenced by the condition in which the individual eats a lot of food over a short period of time until he is uncomfortably full; they are usually planned in advance, and done alone including food that triggers the compulsion. It can affect a person regardless of age, and is more prevalent in women than men. The warning signs and symptoms are eating too fast; eating even when not hungry, or after feeling satisfied; feeling sad or guilty after the episode; and mild to moderate depression with extreme concern about weight and body shape. It is a condition that can bring significant damage to mental and physical health, requiring early diagnosis and therapeutic intervention.Diagnosis is composed of the set of clinical criteria and treatment involves psychotherapy, medications, nutritional counseling.  

Keywords: Eating Disorder. Food Compulsion. Eating compulsion disorder.

Introdução

Os transtornos alimentares são delimitados como doenças de natureza mental e físicas graves que envolvem relacionamentos complexos e prejudiciais com a comida, a alimentação, o exercício e a imagem corporal (HILBERT et al., 2019).  Com prevalência subestimada, existe uma suspeição de que a incidência seja superior em mulheres em comparação com homens; configurando um quadro que poder ser identificado em todas as populações, independentemente de idade, etnia, status socioeconômico, religião, sexo, gênero, etc. 

Tal como a compulsão alimentar compõe o diagnóstico de transtorno alimentar e é caracterizado por episódios regulares de compulsão alimentar durante os quais os indivíduos ingerem quantidades comparativamente grandes de alimentos e experimentam perda de controle sobre seu comportamento alimentar. Está comumente associado à obesidade e a comorbidades somáticas e de saúde mental.

Apresentando prevalência mundial entre os anos de 2018 e 2020 estimados entre 0,6 e 1,8% em mulheres adultas e 0,3 e 0,7% em homens adultos. É uma condição que afeta de forma significativa a qualidade de vida do indivíduo, e pode desencadear agravos quando não detectado e tratado precocemente.

A etiologia é complexa, e inclui fatores genéticos e ambientais, bem como contribuições neuroendocrinológicas e neurobiológicas. A psicoterapia é o tratamento de primeira linha, e tem como enfoque os achados neurobiológicos como as deficiências no processamento de recompensas, controle inibitório e regulação emocional em pessoas que sofrem de compulsão alimentar. Entretanto, abordagens medicamentosas; aconselhamento e aconselhamento nutricional, ou a combinação desses também é viável.

Considera-se que o reconhecimento e a pesquisa sobre o transtorno de compulsão alimentar aumentaram desde sua inclusão no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5). No entanto, configura-se necessários esforços contínuos para entendimento dos mecanismos subjacentes e, viabilizar melhorias nas medidas de prevenção e os resultados do tratamento para esse distúrbio. Todavia, esses esforços devem se basear na identificação e implementação de intervenções baseadas em evidências em ambientes de prática clínica de rotina.

Dito isso, o presente estudo tem como objetivo evidenciar os aspectos gerais da compulsão alimentar. Assim foi desenvolvida uma revisão de literatura narrativa, composta por livros e artigos científicos identificados nas bases de dados online. 

Desenvolvimento

Sabe-se que muitas pessoas comem demais de vez em quando, e várias dessas, muitas vezes sentem que comeram mais do que deveriam. Algumas, no entanto, sentem-se angustiadas por comer demais. Elas se sentem fora de controle e comem, na maioria das vezes, para controlar seu humor negativo ou outros sentimentos. Existe um forte desejo por comida que é experimentado como irresistível. Em geral, esses indivíduos comem o que a maioria das pessoas pensaria ser uma quantidade extraordinariamente grande de comida, de forma compulsiva (SILVA et al., 2020).

Nesse contexto, a compulsão alimentar é definida como comer, em um período de tempo discreto, de modo exemplificado, duas horas, uma quantidade de comida definitivamente maior do que a maioria dos indivíduos comeria durante um intervalo de tempo em circunstâncias semelhantes e com uma percepção de ausência de apetite, sem nenhum controle sobre a quantidade e tipo de alimentos ingeridos (ALVES et al., 2022).

Em concordância, Ribeiro (2016) refere que a compulsão alimentar é uma perturbação do comportamento alimentar, conhecida por ser uma forma de compensação rápida e alívio de outros sintomas que não a fome. O indivíduo sente perda de controle durante o episódio compulsivo ingerindo mais calorias do que o seu corpo consegue trabalhar e o peso aumenta, resultando num descontentamento com a sua imagem corporal, mas também com o seu autocontrole. Por esse motivo, sobrevêm outras complicações de natureza cardiovascular e respiratórias, mas também perturbações de natureza psicológica como a depressão, a ansiedade ou o abuso de substâncias. É considerada por essa razão uma doença psiquiátrica debilitante causada por um distúrbio nos hábitos alimentares ou no controle da massa corporal, que resulta em danos físicos ou psicossociais.

Recentemente, pesquisadores e profissionais de saúde reconheceram que a compulsão alimentar é um transtorno alimentar distinto. A prevalência é estimada entre 1,1 e 1,9% da população em geral, em que a incidência ao longo da vida é de 3,5% entre as mulheres e 2,0% entre os homens, respectivamente. Geralmente, homens e mulheres que comem compulsivamente apresentam níveis comparáveis de comprometimento clínico e alguns indivíduos também são expressivamente afetados pela obesidade (ALVES et al., 2022; OLIVEIRA et al., 2020).

Ademais, Bernardi et al (2020) e Bloc et al (2019) referem que consiste em um transtorno alimentar grave, com risco de vida e tratável, caracterizado por episódios periódicos de ingestão de quantidades expressivas de alimentos (muitas vezes muito rapidamente e a ponto de causar desconforto); uma impressão de perda de controle durante a compulsão; sentir vergonha, angústia ou culpa depois; e não usar regularmente medidas compensatórias insalubres para combater a compulsão alimentar, ou melhor, estimular episódios de vômitos, é considerado o distúrbio alimentar mais comum nos Estados Unidos, porém é bastante frequente no Brasil. Trata-se de um dos mais novos transtornos alimentares formalmente reconhecidos no Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5).

Em geral, a compulsão envolve uma condição em que a ingestão de grande quantidade de alimentos não ocorre devido à necessidade da fome física, mas sim do desejo descontrolado e não explicado, com uma forte tendência a sentimentos de vergonha e culpa, desencadeando episódios repetitivos da compulsão especialmente em ocasiões de solidão (BERNARDI et al., 2020; ANJOS et al., 2020). A voracidade alimentar ou compulsão possui semelhança com a bulimia devido ao não respeito do limite de ingestão frente aos alimentos, mas ao contrário desta última, não provoca situações de vômito e nem é realizado algum tipo de desempenho compensatório após ocorrência do excesso alimentar (ALVES et al., 2022).

Sobre essa condição, Silva et al (2020) refere ser importante esclarecer que o transtorno da compulsão alimentar e bulimia nervosa são dois tipos muito graves de transtornos alimentares. Existem critérios sobrepostos para esses transtornos, sendo a principal diferença a presença de purgação, que ocorre na Bulimia. Os indivíduos com Bulimia Nervosa se envolveram em períodos de compulsão alimentar seguidos de vômitos, enquanto pessoas com transtornos de compulsão alimentar não purgam após um período de compulsão alimentar.

Todavia, Oliveira et al (2020) e Anjos et al (2020) acrescentam que o transtorno da compulsão alimentar e a bulimia nervosa são semelhantes, pois um indivíduo pode se sentir desconfortável perto de outras pessoas ao comer ou se recusar a comer com outras pessoas. No entanto, nem sempre é esse o caso. A bulimia nervosa também pode levar alguém a desenvolver rituais alimentares, como mastigar excessivamente, acumular alimentos ou comer apenas determinados alimentos.

No que tange às manifestações da compulsão alimentar, comumente, durante um evento compulsivo, os indivíduos tendem a consumir uma quantia de alimento superior ao da maioria das pessoas que em um intervalo de tempo similar sob situações parecidas. Durante, e em seguida um episódio compulsivo, os indivíduos tendem a sentir como se perderam o controle. Normalmente, a compulsão alimentar não é seguida de purgação (estimulação de vômitos, uso inadequado de enemas, diuréticos ou laxantes), jejum ou exercício excessivo. Além de tudo, essa é uma condição episódica; e não envolve a ingestão de alimento em excesso de forma constante (OLIVEIRA; CORDAZ, 2020; BLOC et al., 2019).

Segundo Oliveira et al (2020) e Ribeiro (2016) as manifestações comportamentais da compulsão alimentar envolvem: a sensação de entorpecimento enquanto come, ficando no “piloto automático”; apresentar inabilidade de interromper a refeição ou de ter controle da ingestão, ou melhor, comer até ter a sensação desagradável de estar cheio; consumo de grandes volumes de alimentos num período curto de tempo; comer sozinho por se sentir inibido pela sua intemperança; nunca tem a sensação de satisfação, independente da quantia de alimento que deglute; comer de modo contínuo, sem existir refeições esquematizadas; sentir-se encabulado, deprimido ou culpado depois da ingestão de forma compulsiva; anseio para controle do peso e os hábitos alimentares; e sentir estresse ou tensão que só alívio ao comer de vorazmente.

Com relação à sintomatologia psiquiátrica, há evidências de que indivíduos com compulsão alimentar apresentam taxas significativamente mais altas ao longo da vida de transtorno depressivo maior; transtornos de ansiedade; transtornos por uso de substâncias e transtornos de personalidade em comparação com indivíduos com excesso de peso sem problemas de compulsão alimentar. Dados preliminares também sugerem que esses indivíduos apresentam taxas mais altas de transtorno bipolar e transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (SOIHET; SILVA, 2019).

A maioria das compulsões pode ser dividida em quatro estágios, sendo eles: o acúmulo de tensão, com experimentação de sentimento instável, logo a tensão chegará a um ponto que exige alívio e isso inicia o próximo estágio; liberação de tensão, representada pela compulsão alimentar que libera a tensão e reduz a ansiedade. A compulsão pode apagar pensamentos e sentimentos, ou fornecer uma fonte de distração para problemas e sentimentos negativos. No entanto, essa sensação de alívio dura pouco e logo é substituída pela exaustão, muitas vezes chamada de “ressaca compulsiva”; pós-compulsão é o momento em que predominam os sintomas da “ressaca”. Os sintomas podem incluir dores de cabeça, náuseas, diarréia, letargia e fadiga; e novo começo, composta por resoluções renovadas e esperança, nesse ponto, o individua pode prometer não comer nada no dia seguinte ou decidir fazer uma dieta rigorosa (BERNARDI et al., 2020; BLOC et al., 2019).

De acordo com Oliveira et al (2020) e Ribeiro (2016) o diagnóstico é realizado através de critérios clínicos. E entre os critérios avalia-se que a compulsão ocorre, em média, ao menos uma vez na semana por no intervalo de três meses, assim os indivíduos apresentam sensação de descontrole em relação à alimentação. Para mais, cerca de três dos das seguintes condições devem estar presente como, comer excessivamente mais rápido do que o habitual; comer até ter a sensação de desconforto; comer grandes volumes de alimento quando não sente fome por necessidade física; e ter a sensação de náusea, depressão ou culpa após comer de maneira excessiva.

Como outros transtornos alimentares, o transtorno da compulsão alimentar resulta de uma mistura de fatores relacionados aos genes, pensamentos e sentimentos (particularmente sobre o peso e forma) bem como questões culturais, sociais e ambientais. Inclusive essa condição tem sido associada à depressão e à ansiedade. Para algumas pessoas, fazer dietas não saudáveis, como pular refeições, não comer o suficiente ou evitar certos tipos de alimentos, pode contribuir para a compulsão alimentar (OLIVEIRA et al., 2020).

Certas características psicológicas segundo Oliveira et al (2020) e Fusco et al (2020) parecem tornar as pessoas mais vulneráveis ao desenvolvimento da compulsão alimentar. Os fatores como baixa autoestima, depressão e sentimentos de ineficácia ou impotência muitas vezes precedem o aparecimento de problemas alimentares. Esses podem estar relacionados, embora nem sempre, a experiências traumáticas. A dificuldade em expressar emoções e sentimentos pode levar as pessoas a recorrerem à comida para lidar com isso.

Outras questões de grande relevância conforme Silva et al (2020) citam-se os fatores sociais também desempenham um papel em tornar uma pessoa vulnerável ao desenvolvimento de um distúrbio alimentar. Particularmente nas sociedades ocidentais, a mídia e as pressões sociais glorificam a magreza e valorizam a obtenção do corpo “perfeito”. A magreza é igualada ao sucesso, desejo, popularidade e felicidade. Também se associa ao controle, à disciplina e à eficácia. Os pais que têm problemas com peso e imagem corporal podem, muitas vezes inconscientemente, transmitir essas preocupações aos filhos.

De acordo com Alves et al (2022) frequentemente, uma pessoa que desenvolve um distúrbio alimentar tende a pensar no mundo em termos de “tudo ou nada”. Eles tendem a estabelecer padrões extremamente altos e rígidos em termos de realizações pessoais, acadêmicas ou outras. Há também uma tendência a ser fortemente autocrítico. Pode não ser óbvio que a pessoa tem baixa autoestima ou não tem confiança e, como tal, pode ser difícil entender por que um distúrbio alimentar se desenvolve.

Ressalta-se ainda, que pessoas com compulsão alimentar geralmente ficam presas em um ciclo vicioso de dieta e compulsão alimentar. Além disso, subjacente a isso está uma profunda falta de autoestima. Isso leva as pessoas vulneráveis a ficarem extremamente preocupadas com sua forma e peso, sobre como são vistas pelos outros e pode levá-las a seguir dietas rigorosas. A dieta, então, encoraja a comer demais por meio de mecanismos fisiológicos e psicológicos. A compulsão causa culpa e, para compensar, as pessoas voltam a fazer dieta. A única maneira de quebrar esse ciclo é parar de fazer dieta (ALVES et al., 2022; SILVA et al., 2020).

Desse modo, Silva et al (2020) refere que a compreensão do que tornou vulnerável e provocou a compulsão alimentar pode ser muito difícil. E para alcançar uma mudança sustentável duradoura, será importante o entendimento e abordagem dos fatores subjacentes que contribuíram para ocorrência desse distúrbio alimentar. 

Todavia, essa condição pode ser tratada de forma exitosa, entretanto, a detecção precoce e a técnica terapêutica são importantes para uma recuperação completa. Segundo Anjos et al (2020) e Bloc et al (2019) e os planos de tratamento para transtornos alimentares incluem psicoterapia, atendimento médico e monitoramento, aconselhamento nutricional, medicamentos ou uma combinação dessas abordagens. Os objetivos típicos do tratamento incluem a restauração da nutrição adequada; contribuição para alcance do peso ideal em um nível saudável; redução do exercício excessivo; e interrupção de comportamentos de compulsão alimentar e compulsão alimentar.

É importante ressaltar que a família de uma pessoa com essa condição pode desempenhar um papel crucial no tratamento. Em geral, os membros podem contribuir encorajando a pessoa com problemas alimentares ou de imagem corporal a procurar ajuda. Também podem fornecer suporte durante o tratamento e ser um grande aliado tanto para o indivíduo quanto para o profissional de saúde (BLOC et al., 2019).

Conforme evidenciado nas pesquisas de Bezerra et al (2023) e Leite et al (2022) a terapia cognitivo-comportamental (TCC) ensina as pessoas a controlar o consumo de alimentos e a mudar hábitos alimentares pouco saudáveis; também ajuda a alterar a maneira como reagem em situações difíceis. 

Já a psicoterapia interpessoal (IPT) ajuda as pessoas a olhar para seus relacionamentos com amigos e familiares e fazer mudanças nas áreas problemáticas que podem estar desencadeando o comportamento compulsivo. A terapia medicamentosa, como medicamentos estimulantes ou antidepressivos, pode ser útil para algumas pessoas (LEITE et al., 2022). Muito embora a TCC, o IPT e a medicação sejam eficazes, os pesquisadores continuam a procurar estratégias terapêuticas mais úteis. Outros caminhos potenciais incluem terapia comportamental dialética (DBT), que ajuda as pessoas a regular suas emoções (BEZERRA et al., 2023).

Ademais, Bloc et al (2019) evidencia que os esforços de prevenção podem envolver a redução de fatores de risco negativos tais como a insatisfação corporal, depressão ou basear a autoestima na aparência, ou ainda, aumentar os fatores de proteção, como uma autodefinição não orientada para a aparência e a substituição de dietas e sarcasmo corporal por alimentação intuitiva e apreciação pela funcionalidade do corpo. 

Considera-se que os distúrbios alimentares podem levar a uma série de efeitos físicos, tanto leves quanto graves. Condições como pele seca, perda de massa muscular, cabelos e unhas quebradiços e magreza extrema são alguns dos sintomas físicos mais evidentes. No entanto, também podem causar outras condições físicas, como diabetes tipo II e pancreatite. 

Segundo Mauro et al (2017), em curto prazo, as compulsões alimentares já têm consequências ruins para o corpo, tais como a presença de náusea, ganho de peso, enjôo, sensação de tristeza, remorso, e inchaço.

Em longo prazo, os distúrbios alimentares, como a compulsão alimentar podem afetar gravemente a saúde cardiovascular, desencadeando problemas cardíacos. A ausência de nutrientes essenciais afeta de forma significativa a musculatura, gerando uma cascata de agravos associados, relacionados ao bombeamento de sangue (MAURO et al., 2017).

O consumo de alimentos pobres nutricionalmente, segundo Fusco et al (2020) bem como a flutuação de refeições pode causar desidratação e desnutrição. O não consumo de nutrientes importantes para a manutenção da saúde, pode acarretar prejuízos em diferentes sistemas; a desidratação pode contribuir para a ocorrência insuficiência renal, convulsões, fadiga, constipação e cãibras musculares; e a desnutrição pode favorecer a redução da função imunológica, tornando o organismo suscetível a prejuízos clínicos variados, tal como a anemia.

Pode afetar também, a função cerebral, conforme evidenciado por Mauro et al (2017), fazer dieta, jejuar, passar fome e/ou comer de forma irregular, entretanto, priva o cérebro da energia de que necessita para funcionar e se concentrar adequadamente.

Adicionalmente, a presença de níveis hormonais diminuídos, pois quando a alimentação é composta gordura e colesterol, o corpo utiliza para a criação dos hormônios. Quando o consumo de gorduras e calorias é limitado na dieta, os níveis de hormônios sexuais (estrogênio e testosterona) podem diminuir. Além disso, os níveis de hormônio da tireóide também podem diminuir, podendo levar a consequências graves, como perda óssea (FUSCO et al., 2020; BLOC et al., 2019).

De acordo com Leite et al (2022), pode ser observado também desconforto físico; uma refeição típica contém cerca de 850 quilocalorias. Durante uma compulsão, as pessoas podem comer cerca de 3.000 quilocalorias de uma só vez. O desconforto gastrointestinal ocorre frequentemente devido ao alto volume de alimentos ingeridos. Ainda, estar suscetível a morte súbita considera-se que comer tanto e tão rapidamente pode causar perfuração estomacal ou intestinal, porém mesmo as pessoas sem um diagnóstico formal da compulsão alimentar podem sofrer morte súbita durante uma compulsão.

O ganho de peso é uma situação de curto e longo prazo, todas as pessoas com compulsão estão acima do peso ou obesas.  Aqueles que ganham peso podem apresentar doenças cardiovasculares, pressão alta, níveis elevados de colesterol e diabetes na idade adulta. Pode causar insônia, pois existe uma relação entre a compulsão alimentar e problemas de sono. E em geral, muitas pessoas não conseguem dormir depois de um episódio de compulsão, e algumas comem porque não conseguem dormir. A falta de descanso adequado pode deixá-lo confuso e chateado no dia seguinte (LEITE et al., 2022).

Por mais significativas que sejam as consequências físicas de um distúrbio alimentar, o agravo psicológico pode ser superior, geralmente, indivíduos que possuem compulsão lutam com uma ou mais das seguintes complicações: sentir-se fora de controle e impotente para fazer qualquer coisa sobre os problemas; ansiedade, dúvida; culpa e vergonha, sentimentos de fracasso; hipervigilância; medo da descoberta; pensamentos e preocupações obsessivas; comportamentos compulsivos; e sentimentos de alienação e solidão (RIBEIRO, 2016).

Conforme evidenciado por Sheehan e Herman (2015) indivíduos com compulsão alimentar apresentam taxas aumentadas de comorbidades de saúde mental, incluindo depressão e ansiedade. Esses problemas, particularmente transtorno depressivo maior, estão associados a uma taxa aumentada de ideação e comportamento suicida. Ainda não está claro se a associação de compulsão com tendências suicidas é inteiramente uma consequência dessas outras comorbidades, ou se, independente do transtorno depressivo maior ainda estaria ligado a ideações e comportamentos suicidas. 

De acordo com o Eating Disorder Hope, aqueles que lutam contra um vício, seja na forma de alcoolismo, abuso de drogas ou um distúrbio alimentar como a bulimia, podem ter um tipo de personalidade propenso a impulsividade, extremos e alta ansiedade, estresse e pode precisar de mais estimulação para se sentir bem. Mas o alívio criado pela estimulação de alimentos, drogas ou álcool é breve e apenas cria um risco maior de dependência e hábitos formadores de vício. Como resultado, uma pessoa com transtorno alimentar e transtorno por uso de substâncias requer cuidados de diagnóstico duplos muito especializados e integrados ( SILVA et al., 2020).

Sobre essa questão, Bloc et al (2019) refere que a compulsão alimentar e abuso de substâncias estão intimamente ligados. Algumas pessoas usam substâncias para lidar com o sofrimento psicológico causado pela compulsão alimentar, mas o abuso de substâncias pode piorar o distúrbio alimentar.

Os prejuízos mentais e físicos observados em indivíduos com compulsão alimentar podem ter consequências diretas na qualidade de vida. Embora essa última e a jornada do paciente permaneçam primordiais, os transtornos alimentares podem ter um impacto negativo na vida das pessoas do círculo social interno. Os amigos próximos e familiares podem ter problemas para lidar com as mudanças no estilo de vida e as demandas que acompanham muitos sintomas de transtorno alimentar. As repercussões na saúde física e mental também podem fazer com que as pessoas do círculo íntimo do paciente se preocupem e se estressem com seu ente querido. À medida que essas questões cobram seu preço, o círculo social perde sua capacidade de apoiar adequadamente o paciente enquanto eles trabalham para buscar o tratamento seletivo do transtorno alimentar (BLOC et al., 2019; RIBEIRO, 2016; TIRICO et al., 2010).

Todavia, Bloc et al (2019) refere que a discussão acerca das comorbidades no escopo da compulsão alimentar sugere o crescimento da consideração dos sujeitos de forma mais ampla, pois isto representa a tentativa de considerar que essa condição, assim como os outros transtornos, não afeta os indivíduos em um único aspecto. Ainda que exista uma demanda de isolamento e caracterização, os estudos sobre a compulsão alimentar também se direcionam para a multiplicidade dos transtornos.

Conforme já evidenciado por Bezerra et al (2023), Alves et al (2022)  explana que a abordagem terapêutica é um recurso necessário; sendo fundamental manter-se alerta na avaliação psicológica com base em sinais, sintomas e hábitos alimentares do paciente. Em geral, se há suspeita de transtornos alimentares, o profissional pede exames que ajudem a determinar o diagnóstico. Porém, sempre multidisciplinar e envolve profissionais como médicos psiquiatra, psicólogo e nutricionista. Mas, se o paciente já tiver efeitos mais expressivos à saúde, pode ser necessário o envolvimento de mais especialistas.

Para Ribeiro (2016) dentro da equipe multidisciplinar que deve tratar do paciente com transtornos alimentares, o nutricionista é um profissional melhor capacitado para propor modificações do consumo, padrão e comportamento alimentares, aspectos estes que estão profundamente alterados nos transtornos alimentares, sobretudo, na compulsão alimentar.

O trabalho do nutricionista na área de compulsão alimentar exige habilidades não-inerentes à sua formação, como conhecimentos de psicologia, psiquiatria e das técnicas da terapia cognitivo-comportamental. Deve ser criado um vínculo com o paciente, atuando de forma empática, colaborativa e flexível (RIBEIRO, 2016).

Nesse contexto, cita-se a nutrição comportamental delimitada como um tratamento que engloba diferentes práticas para melhorar o modo como o indivíduo enxerga e experimenta o ato de comer. Para isso, o profissional responsável deve ser capaz de considerar os aspectos sociais, fisiológicos e emocionais da alimentação. O objetivo é fazer com que o momento da refeição seja tratado com a devida importância, sem deixar o prazer da degustação de lado. Assim, contrariando as ações que visam restringir a dieta e causar sensação de culpa, a nutrição de comportamento busca o equilíbrio entre apreciar sabores e nutrir o corpo (ALVARENGA et al., 2019).

Segundo Alvarenga et al (2019) a mudança do comportamento alimentar envolve estratégias de aconselhamento nutricional, técnicas do comer intuitivo, terapia cognitivo-comportamental, entrevista motivacional e táticas para comer com atenção plena.  Ou seja, tem como foco o indivíduo e a sua relação com a comida, contribuindo para que a pessoa assuma o controle sobre a saciedade e, dessa forma, passe a se alimentar de forma consciente. 

Desse modo, Cunha et al (2021) e Catão et al (2020) refere que alguns métodos de automonitoramento, como metas graduais, desenvolvimento de diário alimentar, planejamento e questionamentos para modificações de pensamentos espontâneos podem ser estratégias apropriadas para mudanças no comportamentos de indivíduos com compulsão alimentar.

Sabe-se que em muitos casos os indivíduos com compulsão possuem problemas para organizar, planejar refeições, lista de suprimentos e na preparação dos alimentos. Isto contribui para que os mesmos acabem comendo o que está acessível ou disponível naquele momento, e que em geral são os alimentos ultraprocessados, com baixa qualidade nutritiva. Além disso, pode ocorrer uma disposição em comer quando estão com fome e posteriormente a situações de tristeza ou ansiedade, mesmo que sem perceber. Deste modo, o planejamento e organização das refeições, como também o preparo dos alimentos deve ser primordial para o trabalho no tratamento nutricional (CUNHA et al., 2021).

Outra técnica que pode contribuir na compulsão alimentar é o comer com atenção plena, ou melhor, comer direcionando a atenção totalmente na comida, evitando distrações externas. A refeição com atenção plena pode contribuir para a redução do uso da comida para enfrentamento de questões psicológicas e também, atenuar a resposta a gatilhos na alimentação e impulsividade na insuficiência de fome. As estratégias com enfoque na atenção plena também podem aprimorar a percepção dos sinais de saciedade e fome, além de aspectos relativos à imagem corporal (CATAO et al., 2020; MONROE, 2015)

Sobre a técnica supracitada, Warren et al (2017) a descreve como mindful eating, evidenciada como o ato de tentar compreender todos os mecanismos que possam influenciar na hora de se alimentar. Faz com que o indivíduo tenha uma melhor clareza do que está ingerindo, sabendo identificar a associação das emoções com os alimentos, contribuindo com a maioria das crenças limitantes relacionadas à comida.

Portanto, Catao et al (2020) ressalta que os indivíduos que possuem compulsão alimentar, em seguida de episódio podem em muitos casos sentir-se culpados, com tristeza ou medo. Nesse momento, é fundamental que essas emoções sejam trabalhadas, ensinando a praticar o comer sem ajuizamentos, com consciência e sintonia. É importante amparar o paciente para o reconhecimento de seus sentimentos, como tédio, tristeza, ansiedade e angústia e como enfrentar sem utilizar a comida; e antes de procurar um alimento, o mesmo deve ser instruído a se indagar o que de fato está sentindo naquele momento.

Conclusão

O transtorno da compulsão alimentar é uma patologia que afeta muitas pessoas; e muitas vezes podem ser mascaradas pela falta de habilidade, ou conhecimento acerca dessa condição. E muitos indivíduos deixam passar despercebido e acabam sofrendo os impactos que podem ser provenientes da mesma.

Em geral, está associado a prejuízos na saúde física e mental, o que pode diminuir a qualidade de vida e a funcionalidade e levar ao aumento da utilização de cuidados de saúde e diminuição da produtividade. No entanto, alguns cuidados são necessários na interpretação desses achados porque ainda não está claro se a compulsão alimentar é uma condição antecedente, uma complicação associada a uma condição psiquiátrica comórbida ou uma característica não relacionada que ocorre concomitantemente com essas comorbidades e deficiências. Ademais, para a compreensão precisa acerca dos mecanismos envolvidos na compulsão alimentar é preciso o desenvolvimento de estudos controlados e randomizados para a definição de aspectos objetivos e subjetivos. 

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 1Acadêmica de Nutrição da Universidade Nilton Lins.
 2Me. Orientadora da Universidade Nilton Lins