REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7966234
Sílvia Marlene Esteves Afonso
Sara Neves Bento Silva
Resumo
A glomerulonefrite membranosa (GNM) é uma das causas mais comuns de síndrome nefrótica em adultos. Tem um curso clínico variável, desde casos que apresentam remissão espontânea da doença sem tratamento imunossupressor, até situações em que pode evoluir para insuficiência renal terminal que leva o paciente a necessitar de terapia renal substitutiva em poucos anos. Existem várias possibilidades terapêuticas que demonstraram eficácia na nefropatia membranosa dependendo da apresentação clínica.
Apresento uma paciente de 48 anos que recorreu ao Serviço de Urgência por quadro de dor na fossa ilíaca direita. Observado em Medicina Interna, a TC abdominal e pélvica revelou adenopatias inespecíficas retroperitoneais e inguinais no limite da normalidade. O estudo foi concluído com uma tomografia computadorizada do pescoço-tórax, colonoscopia, ecocardiograma, ANAs, ANCAs e marcadores tumorais, sem alterações significativas.
Evidenciou-se um aparecimento progressivo de edema em ambos os membros inferiores e um aumento nos valores da pressão arterial (180/110). Com a suspeita de síndrome nefrótica, foi solicitado estudo da urina de 24 horas e foi detectada proteinúria de quase 13 gramas, confirmando uma síndrome nefrótica clínica e bioquímica com função renal preservada. A paciente fez uma biópsia renal percutânea guiada por ecografia e PET-CT para monitorização das adenopatias retroperitoneais e ilíacas, que não demonstraram alterações significativas, excluindo-se a sua origem neoplásica. A biópsia renal demonstrou uma glomerulonefrite membranosa estágio I com confirmação de anti-PLA2R negativo. O tratamento foi iniciado com prednisona na dose inicial de 70 mg por dia e posteriormente ciclofosfamida na dose de 100 mg por dia. Esquemas decrescentes foram usados com uma diminuição progressiva da proteinúria em torno de 1,5-2 gramas, enquanto a função renal permaneceu estável como resultado da remissão parcial da síndrome nefrótica.
Palavras-chave: Síndrome nefrótica, glomerulonefrite membranosa.
Abstract
Membranous glomerulonephritis (GNM) is one of the most common causes of nephrotic syndrome in adults. It has a variable clinical course, from cases that present spontaneous remission of the disease without immunosuppressive treatment, to situations in which it can progress to terminal renal failure that leads the patient in a few years to require renal replacement therapy. There are several therapeutic possibilities that have demonstrated their efficacy in membranous nephropathy depending on the clinical presentation.
A 48-year-old patient who came to the Emergency Department due to pain in the right iliac. Observed in Internal Medicine, the abdominal and pelvic tomography revealed non-specific retroperitoneal and inguinal adenopathies at the limit of normal size. The study was completed with tomography of the neck-thorax, colonoscopy, echocardiogram, analytical, ANAs, ANCAs, and tumor markers, showing no notable findings.
There is a progressive appearance of edema in both lower limbs and an increase in Blood pressure. With the suspicion of nephrotic syndrome, a 24-h urine study was requested and proteinuria of almost 13 grams was detected, confirming a clinical and biochemical nephrotic syndrome with preserved renal function. He was admitted to the Nephrology department to perform an ultrasound-guided percutaneous renal biopsy and PET-CT to monitor the retroperitoneal and iliac adenopathies, which resulted in no findings, ruling out their neoplastic origin. Renal biopsy shows stage I membranous glomerulonephritis with confirmation of negative anti-PLA2R. Treatment was started with prednisone at an initial dose of 70 mg per day and later cyclophosphamide at a dose of 100 mg per day. Decreasing regimens are used with a progressive decrease in proteinuria of around 1.5-2 grams, while renal function remains stable as a result of partial remission of the nephrotic syndrome.
Keywords: Nephrotic syndrome, membranous glomerulonephritis
Caso clínico
Mulher de 48 anos que recorreu ao serviço de urgência em Novembro de 2015 por dor localizada na fossa ilíaca direita com irradiação esporádica para a fossa renal, de meses de evolução. Com perda de apetite e agravamento da dor na posição supina e uma hora após comer. Com calafrios associados sem febre, sem sudorese e sem perda de peso.
Como antecedentes destacam-se episódios de enxaqueca desde a juventude, obstipação crónica, colecistectomia em 2004, pneumonia comunitária à direita em 2014, síndrome do túnel do carpo, vertigem periférica com intolerância à indometacina e dor epigástrica relacionada a AINEs. Ex-fumadora de 25 maços/ano. Sem história de hipertensão arterial, Diabetes Mellitus e dislipidemia conhecida. O exame de urina revelou microhematúria e a ultrassonografia pélvica mostrou rins com localização, tamanho e espessura cortical adequados, sem sinais de dilatação e/ou litíase. Bexiga de capacidade adequada com paredes finas e regulares. Meato ureteral distal livre. Cisto anexial bilateral com diâmetro máximo de 30 mm em ambos os lados. Útero ecogênico e dimensões normais com provável mioma no pescoço à esquerda de 32 mm à esquerda. Devido à persistência da dor, foi realizada tomografia computadorizada abdominal e pélvica, que evidenciou múltiplas adenopatias retroperitoneais e ilíacas inespecíficas, a maior de 10 mm de diâmetro curto em ilíaco externo esquerdo no limite para suspeita de malignidade, as demais sendo de tamanho insignificante para malignidade. Dados os achados tomográficos e a persistência da dor, o doente foi referenciado para Medicina Interna em Dezembro de 2015. Durante a referida consulta, a doente apresentava um bom estado geral ao exame e a anamnese por aparelho evidenciou uma adenopatia supraclavicular esquerda duvidosa inferior a 1cm, pouco dolorosa, o abdómen mole e depressível, doloroso à palpação na fossa ilíaca direita com leve peritonismo sem massas ou organomegalias e com RHA positivo. Os exames complementares mostram: leucócitos 5.920 células/uL (N 51%, L 32,7%, M 6,5%), hematócrito 37,9%, plaquetas 269.000/uL, creatinina 0,66 mg/dl, proteína total 6,2 g/ dl, albumina 4 g/dl , ácido úrico 4,6 g/dl, glicose 106 mg/dl, colesterol 192 mg/dl, bilirrubina total 0,2 mg/dl, AST, ALT, GGT e fosfatase alcalina normais. Cálcio 9,6 mg/dl, ferro 33mcg/dl, Na 142 meq/L, K 4,1 meq/L, TRF 265 mg/dl, Sat 9,96%, PCR 8 mg/L, ferritina 10 ng/ml, ACE 33. Marcadores tumorais (CEA, Ca 125, Ca19.9, Ca15.3) negativo. Vitamina B12 523, folato 7,70. O estudo imunológico mostra ANAs e ANCAs negativos. Sorologia viral (CMV, EBV, hepatite B e C, HIV) negativa e estudo normal. O estudo foi completado com uma tomografia computadorizada de pescoço-tórax sem adenopatias cervicais ou supraclaviculares suspeitas de malignidade, com bócio multinodular, polipose nasossinusal e linfonodos subclávios direitos aberrantes como variante anatómica.
Colonoscopia com hemorróidas externas e adenomas tubulares com displasia de baixo grau. Cultura de fezes negativas. Ecocardiograma sem achados de interesse.
Desde o início dos sintomas descritos, foi detectado um aparecimento progressivo de edema em ambas as pernas e um aumento nos valores da PA (180/110), razão pela qual o tratamento foi iniciado com enalapril 5mg/12h, furosemida 40mg/48h e atorvastatina 40mg /24h..
Suspeitando-se de síndrome nefrótica, solicita-se análise que apresentou: creatinina 0,79 mg/dl, proteínas totais 4,3 g/dl, albúmina 2,2 g/dl, ácido úrico 5 g/dl, glucosa 93mg/dl, colesterol 387 mg/dl , bilirrubina total 0,1 mg/dl, cálcio 8,5mg/dl, AST, ALT, GGT e fosfatase alcalina normais. Observou-se débito urinário de 3800mL/d em urina de 24h, proteinúria 12,84g/dl, Na Cl Cr 99, proteína SO 500mg/dl e ausência de microhematúria, quantificação de Ig: IgG 271mg/24h, EPS: gamaglobulinas disminuidas, C3: 165, C4: 32,6. Como na análise laboratorial foi observada proteinúria de quase 13 gramas em urina de 24 horas com hipoalbuminemia e hipercolesterolemia, foi confirmada a síndrome nefrótica completa e foi solicitada avaliação pelo Serviço de Nefrologia. Durante o seu internamento no Serviço de Nefrologia, foi solicitado PET-CT para reavaliação da linfadenopatia, onde se observou poliadenopatia subcentimétrica retroperitoneal e intra-abdominal sem atividade metabólica significativa, o que afastou a sua origem neoplásica.
A ultrassonografia renal também foi normal. Foi realizada biópsia renal percutânea, evidenciando cilindro com córtex renal com no máximo 6 glomérulos por secção que não apresentava alterações significativas do ponto de vista óptico. Com compartimento túbulo-intersticial normal, as arteríolas não apresentam alterações e não são observadas artérias interlobulares no espécime.
Com a técnica de imunofluorescência foram descritos depósitos granulares finos na parede dos capilares glomerulares com anticorpos IgG, mas não com os demais IgM, C1Q e C3. O diagnóstico histológico de nefropatia membranosa (GNM) estágio I foi confirmado, com confirmação de anti-PLA2R negativos.
Durante o internamento, também foi realizada ressonância magnética das veias renais para descartar trombose e gastroscopia para completar o estudo, onde foi evidenciada pangastrite.
Perante os resultados, iniciou-se tratamento com dieta isenta de sal e restrição hídrica associada a diuréticos, estabelecendo-se tratamento com dose de 70 mg/dia de prednisona. Um mês depois, o valor da proteinúria é de 15 gramas com uma albumina de 2,4 g/dl e uma depuração de 85 ml/min. Esta evolução, juntamente com a confirmação histológica da biópsia, confirma o diagnóstico de nefropatia membranosa e inicia-se tratamento com ciclofosfamida na dose de 100 mg diários. A dosagem de prednisona é diminuída para 30 mg por dia, evidenciando em controles clínicos e analíticos subseqüentes aumento da proteinúria, atingindo até 18 gramas, com progressivo ganho de peso e edema, razão pela qual é internada para tratamento diurético IV (furosemida) e controle clínico estrito. Atinge-se então um balanço negativo inferior a 5kg e diminuição da proteinúria na alta para 6 gramas em 24h e albumina sérica de 3 gramas.
Posteriormente, foram prescritas doses decrescentes de ciclofosfamida e prednisona, terminando o tratamento com ciclofosfamida a 17 de maio de 2017 e suspendendo a diminuição dos corticóides em julho de 2017. A partir daí, conseguiu-se uma diminuição progressiva da proteinúria desde setembro de 2017 em cerca de 3 gramas e desde Dezembro de 2017 proteinúria em torno de 1,5-2 gramas. Dois meses depois (fevereiro de 2018) a função renal mantém-se sobreponível à anterior, com um valor de proteinúria sem alterações face aos controlos anteriores de 1,53 gramas, albumina 3,8g, creatinina 0,72mg/dl, em resultado da remissão parcial do síndrome nefrótico.
Discussão
O caso clínico exposto é o de uma paciente que apresentava um conjunto de critérios diagnósticos cuja etiologia não parecia óbvia. Com uma análise rigorosa e objetiva, chegou-se ao diagnóstico de Glomerulonefrite membranosa idiopática (GNM), patologia que está entre as doenças renais que mais frequentemente levam à síndrome nefrótica.
As manifestações clínicas que o doente apresenta, edema em membros inferiores com aumento de peso, hipertensão arterial, hipoalbuminemia e dislipidemia, juntamente com os exames complementares solicitados, condicionam o diagnóstico precoce e a ação terapêutica adequada e precoce.
A presença de proteinúria é um importante indicador de patologia renal. A proteinúria está frequentemente associada a doença glomerular e quando acompanhada de edema, dislipidemia e hipoalbuminemia, a probabilidade aumenta.
Ao realizar os exames complementares, a paciente apresenta função renal preservada, proteinúria na faixa nefrótica com hipoproteinemia e alterações lipídicas, sem a presença de outros dados como autoimunidade alterada ou consumo de complemento. A histopatologia da doença, que é a única medida diagnóstica, confirma o diagnóstico de GNM estágio I. Para o diagnóstico diferencial de GNM idiopática e secundária é necessário avaliar as características clínicas e histológicas do paciente. As formas secundárias estão associadas a doenças sistêmicas, infecções, neoplasias e drogas.
No paciente excluem-se glomerulopatias (GS) secundárias de etiologia infecciosa devido a hemogramas normais sem sinais de infecção e as serologias virais também são negativas, excluindo também doenças do tecido conjuntivo, uma vez que os autoanticorpos são negativos. A associação entre patologia da tiróide e doenças glomerulares, especialmente a associação entre doença de Graves e nefropatia membranosa, requer a sua exclusão. A paciente apresentava parâmetros tiróideos normais, excluindo qualquer associação. Excluíram-se as glomerulopatias de origem neoplásica por ausência de manifestações clínicas compatíveis, com TC abdome-pélvica e PET-CT sem achados significativos, com marcadores tumorais negativos.
A clínica do paciente está incluída entre os 70-80% dos pacientes que têm síndrome nefrótica como apresentação inicial, com presença de edema de aspecto progressivo, dos 10-20% que apresentam HTA, entre os 80% que apresentam hipercolesterolemia e entre os 40- 50% que apresentam microhematúria. Ultrassonograficamente, o tamanho do rim é normal, o que é compatível com o surgimento da patologia, assim como a função renal preservada que o paciente também apresentava.Em relação às características da biópsia renal, a doença encontra-se no estágio I, que é um estágio com bom prognóstico. Além disso, lesões tubulointersticiais graves, que é o fator mais fortemente associado à insuficiência renal, não são encontradas. Com a técnica de IFD, serão observados depósitos granulares finos na parede dos capilares glomerulares com anticorpos IgG, mas não com os demais IgM, C1Q e C3, e o diagnóstico histológico de nefropatia membranosa é confirmado. 70-80% dos pacientes com GNM idiopática apresentam anticorpos circulantes contra o receptor da fosfolipase A2 tipo M (anti-PLA2R), presente na membrana do podócito. Esses anticorpos representam um biomarcador útil para o diagnóstico de MGN idiopática. As análises atuais de sensibilidade e especificidade mostram que os autoanticorpos anti-PLA2R estão presentes em mais de 75% dos indivíduos com MGN idiopática. Por outro lado, embora a maioria dos estudos concorde que a presença de anticorpos anti-PLA2R é muito específica para MGN idiopática, alguns casos relatados relatam que sua presença também coincide com outras possíveis etiologias, e que cerca de 25% dos pacientes com GNM são anti- PLA2R negativo. Anticorpos contra outros antígenos podocitários foram descritos nesses pacientes. A paciente apresentava anti-PLA2R negativo. Outras razões possíveis para sua negatividade na MGN idiopática são descritas, como possíveis problemas técnicos com o ensaio imunológico, antígenos adicionais direcionados à doença ou classificação incorreta de pacientes com MGN idiopática que podem ter uma causa secundária não reconhecida. Outro fator possível é a falta de atividade da doença imunológica no momento em que suas amostras de soro foram coletadas, apesar da proteinúria (1,2,3). A probabilidade de remissão espontânea depende da idade, sexo, grau de proteinúria, presença de hipertensão e função renal basal (Cr sérica, mg/dl, eGFR, ml/min/1,73 m2). Outros fatores prognósticos para remissão espontânea são a determinação seriada de anti-PLA2R (como preditor de resposta ao tratamento e recaída) e excreção urinária elevada de IgG e algumas proteínas de baixo peso molecular, como α-1 microglobulina e ß2-microglobulina. (como um marcador para predizer o desenvolvimento de insuficiência renal). Na remissão espontânea, a diminuição da proteinúria é progressiva (<2 anos) e a faixa de proteinúria >8 g/dia não exclui a possibilidade de remissão espontânea (4).
A remissão completa (proteinúria <0,3 g/dia confirmada em duas medições separadas por pelo menos uma semana e com função renal estável) da síndrome nefrótica prediz excelente sobrevida renal e sobrevida do paciente. Uma remissão parcial (proteinúria <3,5 g/dia ou diminuição da proteinúria em pelo menos 50% em pacientes sem proteinúria nefrótica no diagnóstico com função renal estável) também significa risco reduzido de progressão para DRC. Assim, as remissões induzidas pelo tratamento estão associadas a um melhor prognóstico.
O tratamento da nefropatia membranosa idiopática permanece controverso. Na literatura existem diferentes visões e atitudes em relação à doença. Todos os tratamentos carregam toxicidade potencial, portanto a seleção inicial de pacientes com alto risco de progressão é muito importante para minimizar eventos adversos. Alguns estudos recomendam uma abordagem inicialmente conservadora dada a possibilidade de remissão espontânea e o bom prognóstico a longo prazo dos pacientes de baixo risco, enquanto outros estudos prospectivos e controlados demonstraram a superioridade dos imunossupressores em todos os pacientes.
Segundo Praga et al (5), um tratamento específico deve ser restrito aos casos de pior evolução, relatando que o uso restritivo de esquemas imunossupressores não diminui sua eficácia e que liberta um número significativo de pacientes que sofrem da doença efeitos colaterais dessas drogas, que evoluem espontaneamente para remissão. Estas conclusiones también son apoyadas por Polanco et al (6) que publicaron que el 31,7% de los pacientes con GNM idiopática cuando tratados de manera conservadora, han obtenido una respuesta espontánea, con remisión de la proteinuria, ocurriendo sobre todo en los primeros 2 anos. Neste estudo, a remissão espontânea foi mais frequente entre os pacientes com níveis mais baixos de proteinúria basal, com redução gradual para <50% da proteinúria basal nos primeiros 12 meses.
Por outro lado, Ponticelli et al (7) defendem o uso de esteróides mais clorambucil ou ciclofosfamida em todos os pacientes com síndrome nefrótica e função renal normal, independentemente do tempo de evolução.
É um assunto controverso e amplamente debatido na literatura, principalmente devido aos frequentes efeitos adversos que os imunossupressores apresentam. O que é consenso entre os vários estudos é que, em todos os casos, a hipertensão arterial, a dislipidemia e a diátese trombofílica devem ser tratadas vigorosamente.
No momento da apresentação inicial da doença, em 2015, o paciente tinha 48 anos. Apresentou síndrome nefrótica com proteinúria de quase 13 gramas/24h e iniciou tratamento conservador geral de acordo com as diretrizes terapêuticas para tratar os sintomas da síndrome nefrótica. Esquemas com enalapril 5mg/12h, furosemida 40mg/48h e atorvastatina 40mg/24h foram usados devido ao aparecimento progressivo de edema em ambas as pernas, aumento dos níveis pressóricos e aumento do colesterol. Posteriormente, foram prescritos ciclos de esteróides com ciclofosfamida. Iniciou-se tratamento com dose de 70 mg/dia de prednisona, que se mostrou ineficaz no controle da proteinúria com aumento da proteinúria, confirmando alguns estudos que relatam a ineficácia do corticóide em monoterapia. Um mês depois, o valor da proteinúria é de 15 gramas e o tratamento com ciclofosfamida é iniciado na dose de 100 mg por dia. proteinúria tem maior valor preditivo avaliado ao longo do tempo. Seus valores iniciais, por si só, têm baixa associação com o prognóstico do GNM. Mesmo assim, o desenvolvimento de insuficiência renal está consistentemente associado à presença de proteinúria maciça. Nos casos com remissão parcial, o prognóstico a longo prazo é bom. Segundo Du Buf-Vereijken et al (8), a deterioração da função renal pode ser usada para estimar a eficácia do tratamento, sendo a presença de remissão completa e parcial indicadores de eficácia terapêutica.
Atualmente, após 3 anos, a paciente mantém proteinúria subnefrótica (1,53 gramas) e a função renal permanece estável. Isso significa que houve remissão parcial da proteinúria em decorrência da boa resposta ao tratamento instituído. Resta saber se a mesma remissão ocorreria sem a instituição precoce da terapia imunossupressora.
A paciente tinha GNM com síndrome nefrótica persistente e sem comprometimento da função renal. Nesses casos, defende-se uma atitude conservadora devido à possibilidade de remissões espontâneas tardias, embora a probabilidade de remissão diminua com o tempo. A identificação dos fatores prognósticos mencionados é essencial para uma correta estratificação dos pacientes e para a adoção de decisões terapêuticas em casos individuais. Assim, pacientes mais jovens, principalmente se forem mulheres com função renal normal, em estágios histológicos iniciais e sem fibrose glomerular e/ou túbulos intersticiais, como é o caso da paciente, têm maior probabilidade de remissão espontânea. A presença de hipertensão no momento da apresentação inicial e a maior quantificação de Ig/24h (IgG 271mg/24h) foram os fatores prognósticos mais desfavoráveis que o paciente apresentou. Também seria útil ter informações sobre o valor de ß2-microglobulina na urina/24h, mas não há dados sobre esse parâmetro.
Uma vez que as evidências científicas (9,10,11,12) relatam a existência de um grande percentual de pacientes com remissão espontânea sem a instituição de tratamento imunossupressor e agregando efeitos adversos, deve-se considerar estabelecer inicialmente apenas o tratamento conservador. Se a proteinúria persistir elevada apesar do tratamento conservador e se observar uma deterioração progressiva da função renal (aumento da creatinina > 30% do valor basal) durante os 6 a 12 meses de observação, é aconselhável iniciar o tratamento imunossupressor de acordo com os protocolos estabelecidos, com acompanhamento rigoroso, para evitar complicações causadas pela síndrome nefrótica. Avaliando os fatores prognósticos do paciente no momento inicial da doença, apenas um tratamento conservador rigoroso poderia ter sido prescrito, e proteinúria e função renal avaliadas durante um período de 6-12 meses, para avaliar a possibilidade de remissão espontânea sem a necessidade de submeter o paciente a tratamento imunossupressor (13,14,15)
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