REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7953073
Geovana Trindade Rodrigues1
Laurentino Xavier2
RESUMO
Este estudo teve como objetivo analisar a utilização de cartas psicografadas como meio de prova em processos judiciais. Por meio de uma revisão bibliográfica sistemática, foram examinados estudos e decisões judiciais relacionados ao tema, a fim de avaliar os critérios para a admissibilidade de cartas psicografadas como prova. A análise dos resultados apontou para a necessidade de critérios rigorosos e transparentes para a admissão desse tipo de prova, levando em conta a credibilidade do médium, a coerência do conteúdo da carta com outros elementos de prova e a possibilidade de fraude ou manipulação.
Palavras-chave: Cartas Psicografadas; Meios de prova; Processo judicial.
ABSTRACT
This study aimed to analyze the use of psychographed letters as evidence in legal proceedings. Through a systematic literature review, studies and judicial decisions related to the subject were examined in order to evaluate the criteria for the admissibility of psychographed letters as evidence. The analysis of the results pointed to the need for rigorous and transparent criteria for the admission of this type of evidence, taking into account the credibility of the medium, the coherence of the content of the letter with other elements of evidence, and the possibility of fraud or manipulation.
Keywords: Psychographed Letters; Means of evidence; Judicial process.
1. INTRODUÇÃO
As cartas psicografadas têm sido objeto de debate e controvérsia na área jurídica, especialmente em casos de herança, crime ou investigação policial. A questão é se elas podem ser consideradas como meio de prova legítimo em um julgamento.
Este estudo tem como objetivo geral analisar a utilização de cartas psicografadas como instrumento probatório em processos judiciais.
A justificativa para a realização deste estudo é a relevância do tema para o sistema judiciário. A utilização de cartas psicografadas como prova em julgamentos é um tema controverso, e há poucos estudos que abordam essa questão sob a perspectiva jurídica. Este estudo pode ajudar a esclarecer os critérios para a admissão de cartas psicografadas como prova em processos judiciais, contribuindo para uma melhor compreensão desse assunto pelos operadores do Direito e pela sociedade em geral.
O problema que orienta este estudo é: As cartas psicografadas podem ser consideradas como meio de prova legítimo em um julgamento?
A metodologia adotada será uma revisão bibliográfica sistemática, com análise crítica de artigos científicos, livros e decisões judiciais relacionados ao tema. Serão selecionados estudos publicados em periódicos jurídicos e psicológicos de renome, bem como decisões judiciais que abordem a questão da admissibilidade de cartas psicografadas como prova. A análise será realizada com base em critérios previamente definidos, incluindo a pertinência dos estudos e a qualidade da metodologia utilizada. Ao final da revisão, será realizada uma síntese dos principais argumentos a favor e contra a admissão de cartas psicografadas como prova, bem como a proposta de diretrizes para a admissão desse tipo de prova em processos judiciais.
2. TEORIA GERAL DAS PROVAS
No que tange à semântica, o termo “prova” advém da expressão em latim probatio, cujo significado é ensaio, exame, argumento ou inspeção (NUCCI, 2021, p.260). Quando relacionado ao processo, o vocábulo expressa os meios utilizados pelas partes para o convencimento do magistrado. Ademais, há doutrinadores que acreditam que as provas são a “alma do processo de conhecimento” (CÂMARA, 2015, p. 222) pois é a partir destas que o juiz define sua convicção acerca da conduta pré-existente que ensejou a demanda em pauta. Cumpre ressaltar que as provas são elementos de busca da verdade e são assim considerados todos os elementos trazidos ao processo pelas partes.
2.1 SISTEMAS DE APRECIAÇÃO DAS PROVAS
A livre confecção admite que o magistrado, ao sentenciar, deixe de motivar suas decisões. Seguindo essa lógica, complementa Ribeiro (2019, p.278) que esse sistema também permite que o juiz, se valha de seus conhecimentos pessoais ao impor sua decisão
A prova legal a se relaciona intimamente com o movimento positivista, vez que engessa a atuação do magistrado, que deve seguir o regramento pré-estabelecido pelo legislador ao valorar as provas constantes no processo, o que acaba por desconsiderar as peculiaridades do caso concreto.
A persuasão racional permite ao juiz que decida livremente de acordo com sua consciência, devendo, no entanto, motivar sua resposta, indicando suas razões. Complementa ainda que o sistema limita o magistrado que, ao proferir a sentença, só deve motivar sua resposta com provas produzidas em contraditório judicial.
2.2 ESPÉCIES DE PROVA
As provas lícitas podem ser definidas por exclusão, ou seja, são consideradas lícitas as provas que não sejam ilícitas. Portanto, para facilitar esse entendimento, faz se uma análise do conceito de provas ilícitas:
De acordo com Avena (2022, p.449) as provas ilícitas são aquelas que desrespeitam direitos, garantias e princípios constitucionais. Com relação a essa descrição, define o artigo 157 do Código de Processo penal que a ilicitude da prova é verificada quando esta fere preceitos constitucionais e legais.
Já as provas atípicas, são assim conhecidas como aquelas não defendidas nem previstas por lei e podem ser utilizadas no processo, uma vez que o rol de provas previsto nos Códigos Processuais Civil e Penal é meramente exemplificativo. (AVENA, 2022, p. 457).
Discorre Lourenço (2021, p. 286) sobre as provas diabólicas e negativas utilizando-se para essa classificação da capacidade de se provar determinado fato, sendo as provas diabólicas aquelas que não podem ser provadas por completa impossibilidade.
Para Capez (2022, p.155), as provas também podem ser classificadas em diretas e indiretas, sendo que as provas diretas recaem diretamente sobre o fato que se deseja provar enquanto as indiretas recaem sobre outros fatos que não o principal, mas a esse relacionados, alcançando-o por meio da dedução.
2.3 MEIOS DE PROVA
Conforme preceitua Ribeiro (2019, p.290), a prova documental é “toda atestação escrita ou gravada de um fato” sendo sua materialidade elemento essencial para sua classificação. Além da doutrina, o legislador penal também se propôs a identificar tais provas, definindo-a no artigo 232 do Código de Processo Penal como “quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, públicos ou particulares.”.
Há também a prova pericial, o termo perícia advém da expressão latina ‘peritia’ que significa habilidade, capacidade e saber e é utilizada no processo para verificar a veracidade de determinados fatos e documentos.
Ensina Mirabete (2006, p. 261) que a prova pericial decorre do ato praticado por profissional apto destinado a coletar elementos probatórios para embasar a resposta jurisdicional. Do mesmo modo, infere-se que a prova pericial é feita por terceiro imparcial com conhecimento técnico nomeado pelo juiz com o intuito de esclarecer determinado fato, e, conforme disposto no artigo 159 do Código de Processo Penal esta poderá ser feita por um perito oficial ou, ainda, por dois peritos nomeados.
Por outro lado, o depoimento pessoal tem por objetivo a obtenção de confissão da parte contrária. Nessa mesma linha, dispõe o Código de Processo Civil sobre o momento de colher o depoimento da parte, qual seja, na audiência de instrução e julgamento, podendo o magistrado ordenar, de ofício, essa medida. Por fim, há a prova fora da terra, que são consideradas provas fora da terra aquelas cuja produção se dê em local diverso ao foro de jurisdição do magistrado competente da causa.
3. CARTAS PSICOGRAFADAS COMO MEIO DE PROVA E PERÍCIA
A psicografia é determinada como o ato pelo qual o espírito (pessoa desencarnada) transmite uma mensagem para um médium (pessoa encarnada que possui a habilidade de manter contato com os desencarnados). Cumpre ressaltar, nesse sentido, que a mediunidade é um fenômeno experienciado por todos nós, em diversos graus e estágios, e suas consequências podem ser observadas nas mais diversas esferas.
No entanto, este trabalho será desenvolvido com enfoque na psicografia mecânica, fenômeno no qual o próprio espírito comunicante atua sobre a mão do médium, o qual funciona como uma conexão entre o mundo espiritual e o mundo físico, com a capacidade de sentir e ouvir a presença de espíritos no ambiente, sendo capaz até mesmo de emprestar o seu corpo provisoriamente para que espíritos desencarnados possam se comunicar com o nosso plano por diversos meios, incluindo a psicografia. (GALVÃO, 2011).
Segundo Didier Júnior e Braga (2014), o termo psicografia é derivado da palavra grega psyché, que tem como significado a escrita da mente ou da alma. A psicografia se constitui como carta escrita e unilateral, assinada ou não, na qual o remetente (espírito) envia uma mensagem ao seu destinatário por intermédio de pessoa capacitada (médium). Segundo Dantas e Fonseca (2018, p. 02) e nas palavras de Allan Kardec, a mensagem psicografada se transmite dos espíritos para os médiuns, sendo a mão do mesmo seu instrumento.
Ainda que o espiritismo seja a religião que mais explora o assunto, o investiga e o aprofunda, a psicografia perpassa todos os seres humanos, culturas, povos e crenças, não sendo, deste modo, um acontecimento exclusivo do espiritismo.Cumpre ressaltar, ademais, que a mediunidade é um fenômeno inerente ao ser humano, não sendo um privilégio ou invenção de nenhuma religião ou crença. (DANTAS; FONSECA, 2018).
Preceituam Didier Júnior e Braga (2014) que as mensagens psicografadas podem ser digitalizadas e impressas ou armazenadas em documentos eletrônicos, CDs, pen drives e outros. Por sua vez, Gaspareto (2013) relata que o conteúdo de uma psicografia pode conter declarações científicas de um acontecimento (documento testemunhal ou narrativo) ou até, por exemplo, um depoimento a respeito da ocorrência de um fato, como um atropelamento por veículo dirigido por motorista irresponsável ou a incompetência de um médico em um ato cirúrgico.
Na doutrina do Espiritismo, o espírito e o médium são os primeiros na autoria de uma carta ou mensagem psicografada. Segundo Garcia (2010, p. 58), diz-se então que a psicografia pode ser mecânica, intuitiva ou semimecânica.
Necessário citar o famoso médium mineiro Chico Xavier que desencarnou em 30 de Junho de 2002. Cresceu na pobreza, teve uma vida simples e se dedicou à caridade, ajudando os necessitados e aos espiritualmente abalados. Chico Xavier era médium mecânico (quando não tinha consciência do que escrevia); polígrafo (possuindo a capacidade de mudar a escrita de acordo com o espírito ou reproduzir com precisão a escrita de um espírito em vida) e poliglota ou xenoglota (escreve em línguas desconhecidas do médium ou mesmo em dialetos extintos, como o hebraico, nunca tendo aprendido outra língua). Este último é o tipo mais raro de psicografia, com capacidade de convencer até os mais incrédulos. (DANTAS; FONSECA, 2018)
Logo, Galvão (2011, p. 50), descreve a psicografia semimecânica como sendo aquela em que “o médium sabe que escreve, entretanto o movimento das mãos é involuntário”. Tudo isso é consistente com a literatura do espiritismo, que se baseia na crença religiosa de que existe tal conexão psicográfica entre o espírito e o médium. Entretanto, é importante saber como o direito processual brasileiro trata do assunto. Recomenda-se olhar para este fenômeno de uma perspectiva jurídica-positiva.
O jornalista Souto Mayor (2010, p. 16), não espírita é considerado o maior estudioso da vida de Chico Xavier, diz que “todo cético fica impressionado com as cartas escritas a jato cheias de nomes, sobrenomes e apelidos de família e informações detalhadas referentes a apelidos e ocorrências da morte”. Chico Xavier psicografou inúmeras cartas e mais de quatrocentas obras relacionadas aos mais variados temas, traduzidas em quinze idiomas.
Questiona-se, nesse sentido, como pode uma pessoa tão humilde escrever um livro, por exemplo, em alemão, francês, inglês, porque não conhece nenhuma língua estrangeira? Como poderia ter criado obras como sociólogo, filósofo, poeta, romancista, cronista e historiador se não tinha obtido nenhum conhecimento para realizar tal obra? Portanto, Chico Xavier esclareceu tais fatos de forma simples: “Os livros não me pertencem. Eu não escrevi nada. Eles, os espíritos, escreveram. Sou apenas uma ferramenta”. (SOUTO MAIOR, 2010, p. 96)
Segundo Constantino (2019), as cartas psicografadas pelo médium Chico Xavier aos familiares sempre impressionavam porque continham muitos detalhes sobre a vida de uma pessoa, informações íntimas conhecidas apenas pelos parentes, pessoas mais próximas, até mesmo nomes de familiares da vítima que nem sabia que eles existiam em vida, uma vez que haviam desencarnado há décadas. Em alguns casos, nem mesmo os parentes próximos ainda vivos sabiam, e após consultar os mais velhos da família, acabavam por descobrir o vínculo de parentesco.
3.1 PERÍCIA GRAFOTÉCNICA
A perícia caligráfica, do mesmo modo, é conhecida como grafoscopia, perícia grafotécnica ou documentoscopia e tem por base diversas disciplinas relacionadas, como caligrafía, criptografia e paleografia. Segundo Mendes (2019), a grafotécnica é um conjunto de recursos técnicos para estudo da escrita. Técnicas de grafar ou escrever e grafoscopia são partes da documentoscopia projetadas para identificar grafias comparando a caligrafia, para verificar sua autenticidade ou não e estabelecer a autoria quando desconhecida.
Santos (2017) revela que o grafismo é individual e possui características particulares e distintivas que são independentes e não podem ser mal interpretadas. Este princípio é a pedra de torque que rege todo o trabalho grafotécnico. O objetivo da perícia grafotécnica é, por conseguinte, verificar a autenticidade ou falsidade material de um texto ou assinatura com base na comparação de uma ou mais obras contestadas com outra ou outras obras consideradas autênticas, conhecidas como padrões. Estas podem ser divididas em duas categorias: padrões pré-existentes, isto é, amostras preparadas antes do documento solicitado e sem intenção pericial, e padrões coletados pelo perito com a finalidade periciais.
Segundo Dantas e Fonseca (2018), também é comum o uso da denominação “perícia grafotécnica”, que inclui do mesmo modo a perícia documental, o qual tem como objetivo averiguar eventual falsificação do suporte da escrita (papel, madeira, tecido, etc.). Na legislação brasileira, a perícia é considerada meio de prova. Na verdade, contudo, vai um passo além. Tem um papel extremamente importante, situando-se diretamente entre a prova e a sentença.
No entendimento de Badaró (2016, p. 438), “perícia é um exame que requer conhecimento técnico, científico ou artístico e serve para o convencimento judicial”. A perícia passa a existir da necessidade da apuração de provas, ela abrange a apuração de um fato. É o meio no qual, profissionais habilitados e qualificados averiguam fatos relacionados à decisão da causa, e levam ao juiz a prova por meio do laudo pericial, comprovando a técnica e imparcialidade.
A perícia caligráfica, especialmente em casos difíceis, está incluída na lista de exames solicitados pelos magistrados, visto que não possuem a formação técnica necessária para a realização deste tipo de exame. O perito grafotécnico não está preocupados apenas com a morfologia, eles estão preocupados principalmente com a morfodinâmica, ou melhor, o objeto de comparação não é apenas as formas, entretanto, sobretudo, os movimentos e forças empregados no gesto e hábitos da escrita, e a avaliação do significado de semelhanças, variações ou diferenças relevantes para que seja identificado a autoria (SANTOS, 2020).
Ainda, conforme Santos (2020), juízes, promotores, advogados e demais profissionais da área da justiça têm apelado à ciência da perícia grafotécnica para lhes proporcionar uma forma clara, profissional, objetiva, justa, precisa e conclusiva, casos e suspeitas de lançamentos caligráficos de linha duvidosa na esfera judicial nos tribunais brasileiros, por meio do conhecimento técnico e científico de um especialista, buscando e revelando a verdade.
O perito não se limita a relatar ao juiz o que aconteceu e o que aprendeu com a experiência científica ou artística, e o juiz geralmente já conhece os fatos do ocorrido, quer ter conhecimento a respeito das consequências dos fatos, e qual o seu valor, não sendo possível o diagnóstico e o prognóstico do perito ser analisados exclusivamente como meio de prova.
Dantas e Fonseca (2018) relatam que, no entendimento de Perandréa (1991), famoso criminalista especialista em analisar e compreender a criminalidade a partir de um contexto, perito credenciado pelo poder judiciário em documentoscopia desde 1965 e professor de identificação de Datiloscópica (impressões digitais) e Grafotécnica da Universidade Estadual de Londrina desde 1974. A grafoscopia é um conjunto de conhecimentos orientadores dos exames gráficos, que analisam os motivos causadores e modificadores da escrita, por meio da metodologia adequada, para decisão da autenticidade e autoria gráfica.
Nos estudos de Dantas e Fonseca (2018), verifica-se que Perandréa elaborou mais de setecentos laudos técnicos em toda a sua carreira profissional, não havendo contestação sobre eles. Começou estudando com Chico Xavier e depois expandiu para outros médiuns e sempre todas as orientações e padrões estabelecidos pela ciência grafoscópica, avaliando a escrita dos próprios médiuns e comparando grafias, e também analisou os documentos originais do homem em vida.
Uma pessoa sem conhecimentos em grafotécnica geralmente conclui que a escrita está correta quando o desenho das letras é parecido, onde mesmo o menor detalhe não faz sentido, uma vez que não reconhece um universo de detalhes informativos. Acredita-se que as grafias parecidas se assemelham a irmãos gêmeos, que embora pareçam iguais e possam ser confundidos facilmente, se observados com atenção, é possível perceber que cada um tem suas peculiaridades. É relevante ter em mente que está fora da realidade que escritos traçados por mãos diferentes tenham origem gráfica idêntica (BADARÓ, 2018).
Boteon (2017) revela que por meio da prática da escrita e do desenvolvimento individual, impulsionado por fatores como habilidade artística, tônus muscular e comportamento, cada indivíduo tem a capacidade de criar sua própria escrita única e distinta, tornando-se um hábito automático que cria raízes no cérebro. Deve-se notar também que existem duas forças principais a vertical e horizontal, que determinam nossa escrita. A vertical é a pressão do instrumento de escrita contra o suporte, e a horizontal consiste em ser o movimento que não tem curvaturas nem sinuosidades é reto ou circular do instrumento escritor a respeito do suporte.
De acordo com Dantas e Fonseca (2018), o pesquisador e escritor francês Edmond Solange Pellat elencava as quatro leis do grafismo em seu livro “Les Lois de L’ecriture” (1927), que partia do pressuposto geral de que “a escrita é individual e inconfundível, e suas leis não dependem do alfabeto usado para a sua produção”.
As leis da escrita são essenciais para o trabalho dos peritos. Com embasamento nelas, fica claro que cada pessoa possui uma escrita própria, que não pode ser alterada pelo próprio indivíduo, pois a intensidade, direção e significado estão pertinentes a características individuais. Conforme advertido, o ato de escrever surge do movimento natural do cérebro que domina o sistema motor dos ossos, músculos e nervos, onde o tônus e controle variam de pessoa para pessoa. A escrita começa com um comando, mas continua com o instinto natural. O cérebro dirige os músculos e cria letras e outros símbolos sem a intervenção de vibrações, paradas bruscas, sobrecarga de tinta, desvios, mudanças de dinâmica, direção, pressão ou progressão (MONTEIRO, 2013).
A grafotécnica identifica com precisão a unidade gráfica que se libera do movimento involuntário do cérebro e estabelece o movimento dos punhos, isto é, qualquer modificação voluntária altera o grafismo e permite detectar o falsário, porque ele jamais será capaz de reproduzir parcial ou totalmente a gênese gráfica de outra pessoa (MONTEIRO, 2013).
O grafólogo tcheco Robert Saudek em 1929, fundador da Sociedade de Grafologia Profissional da Holanda, esclareceu que ninguém pode imitar os cinco elementos do grafismo ao mesmo tempo, como a riqueza e variedade de formas, dimensão, enlaces, inclinação e pressão. Logo, em 1930, Jules Crepieux-Jamin, médico francês escreveu em seu livro “ABC de la Graphologie” (PUF 1930) que nenhuma escrita é idêntica à outra, pois cada indivíduo tem uma escrita única que se distingue das demais e que é provável ser reconhecida (DANTAS; FONSECA, 2018).
Ainda nesse sentido, Santos (2020, p. 01) cita Federico Carbonel, que afirma que “não há duas pessoas com a mesma fisionomia, nem dois escritos com os mesmos traços por diferentes mãos com semelhante ou precisa fisionomia”. No momento, desconhecer a fidedignidade da perícia e todas as suas evidências científicas em relação às questões técnicas e pareceres analisados é desconhecer este preciso, importante e em alguns casos insubstituível auxiliar do poder judiciário, acabando com a assistência jurídica que presta no processo judicial. A análise de gênesis gráficas é uma ferramenta valiosa para produzir provas materiais discriminatórias, como íris, impressões digitais e testes de DNA.
3.2 PSICOGRAFIA NOS TRIBUNAIS
Nosso ordenamento jurídico aceita vários meios de prova em diversos campos, mas a aceitação de uma carta psicografada como tal certamente causa muita polêmica. Embora nosso ordenamento jurídico não permita especificamente esse tipo de prova, no entanto, também não proíbe sua utilização como prova. Isso porque, embora estejamos ligados a aspectos religiosos, o fato de vivermos em um estado laico não significa que devemos suprimir o teste relacionado às crenças pessoais de cada um. Estado laico significa que o país é neutro em assuntos da esfera religiosa, o que não significa que a religião deva ser censurada em assuntos específicos do ordenamento jurídico-normativo do país (PITTELLI, 2010).
Evangelista (2020) explica que, mesmo nesse cenário, há uma grande discussão sobre a legalidade de incluir uma carta psicografada como prova se o réu entender que ela é essencial para a defesa e absolvição. No entanto, o artigo 232 do Código de Processo Penal (CPC) estabelece que “consideram-se documentos quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, públicos ou particulares”. Parágrafo único. À fotografia do documento, devidamente autenticada, se dará o mesmo valor do original” (BRASIL, 2019).
Melo (2014) afirma que é importante ressaltar que a lei se aplica a todos os tipos de registros e, portanto, os registros psicografados precisam ser considerados documentos em sentido amplo, visto que a única limitação à produção de prova documental são os documentos ilegais. Assim, compete ao tribunal decidir se deve ou não admitir a psicografia como prova.
Assaiante (2016, p. 01) também explica que “não há norma no ordenamento jurídico atual que proíba a apresentação de documento produzido por psicografia como prova em processo criminal”. Sob outra perspectiva, como não são reconhecidos no sistema judicial, alguns doutrinadores, juízes, promotores e demais, consideram seu uso ilegal, ficando assim divididos.
Borges (2019) destaca que a aceitação da psicografia como meio de prova também está claramente prevista no artigo 157 do Código Penal: “O juiz forma sua convicção pela livre avaliação da prova”. Porém, o especialista adverte que a psicografia só terá validade se fortalecer outras evidências nas provas ou apresentar fatos novos no processo psicográfico. O Estado brasileiro é laico e, por isso, não pode referir-se normativamente à validade ou não de material psicografado como meio de prova.
Assim, percebe-se que a psicografia é abarcante na esfera processual, pois a parte que diz “quaisquer registros” assim como menciona os autores citados acima inclui a possibilidade de utilização e interpretação da carta psicografada como objeto de prova no plenária.
Para Araújo (2015), cabe destacar que o ordenamento jurídico brasileiro tem adotado um sistema de livre argumentação, onde o juiz é obrigado a justificar sua decisão, contudo avalia as provas conforme seu entendimento, com capacidade de admitir uma psicografia. Além do mais, a psicografia não seria utilizada como exclusivo meio de prova. Outras provas, também serão avaliadas como a conduta moral do médium psicógrafo, a gratuidade e a integridade de seu trabalho, exame caligráfico, por fim, todo o conjugado probatório seria analisado.
Segundo Melo (2014, p. 18), “pelo princípio da verdade real é definida que consiste em apurar todas as provas e investigar exatamente como os fatos aconteceram”, assim busca-se a verdade processual, distinguido como possibilidade, extraída de um processo relacionado no adequado procedimento, respeitando-se o contraditório, ampla defesa, paridade de armas e regido por um magistrado parcial. Deste princípio advém a liberdade de prova, onde as partes são livres para obter, apresentar e produzir provas, menos as consideradas proibidas legalmente, como a prova ilícita.
A ampla defesa é um princípio legítimo consagrado na constituição, abrangido como o direito de uma pessoa apresentar em processo administrativo ou judicial todas as provas legalmente obtidas para provar a verdade. Deste modo, não sendo a carta psicografada uma prova ilícita, colhida por meio da violação de direito material, é provável ser aceita como meio de prova, como forma de consolidar os princípios supracitados (ARAÚJO, 2015).
Como aponta Evangelista (2020), não há fundamento em nossas leis que proíbam a aceitação de psicografias. Além disso, não há restrições quanto aos meios de prova no processo penal, ressalvadas as ditas ilícitas ou ilegítimas, primando-se pela busca do princípio da verdade real, a investigação e a ampliação dos meios de prova quando necessário, de modo que os meios de prova não se limitam às violações da lei. O réu pode receber uma ampla defesa detalhada dos autos com sua definição completa para que a acusação possa usar todas as condições prováveis para se defender do fato contestado. Segundo Nucci (2020), o princípio in dubio pro reo (expressão latina que significa literalmente na dúvida, a favor do réu).
No entanto, ao contrário do que alude, o princípio constitucional em nosso ordenamento jurídico (in dubio pro reo) não reflete uma circunstância em que mesmo uma pequena quantidade de provas substanciais seja satisfatória para condenar um suspeito. Além disso, esse tipo de documento, como uma tese elaborada pela defesa, parte da premissa de que deve ser utilizado para convencer os componentes do júri da inocência do réu. Os jurados podem considerá-lo crível ou não com base em suas crenças, princípios e entendimento (VIANO, 2022).
De acordo com Borges (2018), no Brasil, embora as cartas psicografadas não sejam estabelecidas como prova admissível pela lei, existem determinadas decisões baseadas nessas cartas, dentro ou fora do Tribunal do Júri. Por isso, de maneira especial em relação ao Tribunal do Júri, onde a análise da prova se baseia no princípio da íntima convicção dos jurados, trata-se de uma forma de processo penal pela qual os crimes dolosos contra a vida (homicídio, infanticídio, aborto e incitação, instigação ou induzimento ao suicídio) e, tendo em conta o impacto destes crimes na coletividade, coloca a determinação final nas mãos da sociedade por meio dos jurados.
O sistema de Júri Brasileiro apenas determina pontos de fato. Isto é, pontos que digam respeito à Constituição material do que se alega, ou do que se nega. Ou seja, o conselho de sentença fala que se o réu é responsável ou não, quanto a totalização da penalidade fica a responsabilidade do Juiz. Capez (2011. p.651), diz que “a soberania dos veredictos alude na impossibilidade de o tribunal técnico mudar a deliberação dos jurados pelo mérito”. Versa-se de princípio relativo, já que no caso das apelações do Júri pelo mérito, o Tribunal pode revogar o julgamento e definir a concretização de um novo, se compreender que a determinação dos jurados confrontou manifestamente a prova dos autos.
O sigilo das votações, caracteristicamente informador do instituto do Tribunal do Júri e exclusivo em todo órgão julgador do Poder Judiciário. A principal preocupação do legislador, foi a de assegurar a imparcialidade, a independência, o livre-arbítrio de convencimento e de avaliação dos jurados (CAPEZ, 2011).
Em seguida, Pinheiro (2017) divulga que os casos em que as mensagens mediúnicas são usadas como prova são casos de homicídio. Como tal, juntamente com outras evidências, são essenciais para convencer os jurados no tribunal do júri. Os jurados julgam com base em suas próprias convicções e não precisam justificar sua decisão. Portanto, nada impossibilita que uma carta psicografada seja usada para convencer o júri. Ademais, é impossível determinar o quanto a mensagem teve a capacidade de influenciar no convencimento do jurado. Portanto, cada jurado tem suas crenças, contudo, enquanto um acredita o outro pode não acreditar. Assim, uma carta psicografada é uma faca de dois gumes e pode ter o efeito contrário ao que almeja.
Alguns juristas que defendem a aceitação de cartas psicografadas argumentam que é provável verificar a autenticidade desses documentos. Como os médiuns mais poderosos escrevem com a caligrafia de uma pessoa morta, o que faz com que um perito possa comparar o texto psicográfico com documentos escritos em vida pelo desencarnado. No entanto, o exame grafoscópico, ainda que útil para a ciência forense, possui um grau aceitável de incerteza. Supondo que existam verdadeiras cartas psicografadas, essas precisam expor outras características além da caligrafia da escrita do falecido, como estilo, erros ortográficos ou gramaticais repetidos, falhas de linguagem, escolhas lexicais e um nível de erudição adequado com a escolaridade e as experiências de vida. Não existe perícia com capacidade de para martelar em torno desses parâmetros (VIANO, 2022).
Melo (2014) relata que são muitos os depoimentos de juízes, advogados e juristas em geral que, após ler e reler cartas psicografadas para formar suas convicções, ficaram admirados e deslumbrados com os detalhes tão vividamente apresentados, os quais foram expostos de maneira que apenas a pessoa falecida teria tal conhecimento. Segundo Souza (2020), até o ano de 2020, foram 11 (onze) processos em que a psicografia foi usada como meio de prova em processos criminais em todo o Estado do Brasil, destaque para Goiás, onde aconteceram os 02 (dois) primeiros casos pertinentes à psicografia. Portanto, casos de psicografia serão analisados e apresentados no capítulo seguinte.
4. ANÁLISE JURISPRUDENCIAL, DOUTRINÁRIA E LEGAL ACERCA DA UTILIZAÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOGRAFADOS COMO MEIO DE PROVA
No sistema jurídico brasileiro, existem casos amplamente reconhecidos internacionalmente em que as comunicações psicografadas foram aceitas como prova em processos penais. Essas comunicações foram feitas pelos espíritos das vítimas de homicídio, que inocentaram os acusados, fornecendo informações discriminadas sobre os eventos que somente a pessoa falecida poderia saber. A precisão desses detalhes foi posteriormente confirmada pela investigação policial e pericial (AMORIM, 2020).
Dantas e Fonseca (2018) elucidam que as cartas psicografadas são frequentemente consideradas uma forma controversa de prova, pois não podem ser cientificamente comprovadas. Entretanto, existem casos notáveis no Brasil em que as cartas psicografadas foram utilizadas como meio de prova em processos judiciais. Embora o uso dessas cartas como prova remota de casos antigos no sistema jurídico brasileiro, como o primeiro caso aconteceu no ano de 1944 (caso Humberto de Campos). Portanto, o presente estudo se concentrará em casos emblemáticos no contexto do processo penal.
4.1 CASO HENRIQUE EMMANUEL GREGÓRIS
O primeiro registro de uso da psicografia como prova em um caso penal no Brasil foi envolvendo a morte do jovem Henrique Emmanuel Gregóris, de 23 anos, na cidade de Hidrolândia, em Goiás, com a participação de Francisco Cândido Xavier por psicografar uma carta relacionada ao caso (GOMES, 2019).
O réu foi acusado de homicídio culposo e o caso caiu nas mãos do juiz Orimar de Bastos, que decidiu pela ausência de dolo ou culpa, absolvendo João França, que confessou ter atirado em Henrique. Insatisfeita com a decisão, a mãe de Henrique solicitou que o advogado Wanderley de Medeiros recorresse da decisão em instância superior.
Segundo Dantas e Fonseca (2018), apenas dois dias após a impetração do recurso contra a decisão que inocentou João França, Chico Xavier em Uberaba – MG recebeu uma mensagem de Henrique Emanuel Gregóris, falecido no caso de homicídio em Hidrolândia, solicitando que sua mãe, dona Augustinha, perdoasse João França. Surpreendentemente, o médium desconhecia o processo de homicídio até então.
Dantas e Fonseca (2018), acrescentam que Chico Xavier partiu para Hidrolândia, em Goiás, e entregou a carta psicografada de Henrique a sua mãe. Nessa carta, Henrique suplicava que sua mãe que cancelasse o processo contra João França, pois ele era inocente e a história estava prejudicando seu crescimento.
A mãe de Henrique atendeu ao pedido de seu filho e solicitou ao advogado que finalizasse cabalmente o caso e desistisse da apelação. João França foi considerado pela justiça como inocente. Tempos depois, o espírito de Henrique manifestou-se novamente através de uma carta psicografada, agradecendo à sua mãe por ter atendido seu pedido e permitido que ele o seguisse em paz.
Assim, o juiz Orimar, segundo Gomes (2019), considerou que a carta psicografada teve um valor complementar, corroborando com a sua já formada opinião declarada: os autos já possuíam provas e evidências que indicavam que o acusado não havia agido com dolo ou culpa, na análise das provas inseridas nos autos. Por isso, João França já havia sido absolvido por 6 votos a 1 antes mesmo da a carta psicografada ser usada no plenário. Nesse sentido, a mãe da vítima, influenciada por sua fé e crença de que a carta psicografada por Chico Xavier trouxe-lhe as respostas necessárias, acabou por desistir da apelação, tornando não ser necessária a análise da carta pelo plenário.
4.2 CASO MAURÍCIO GARCEZ HENRIQUE
Em 8 de maio de 1976, ocorreu um caso emblemático e de grande repercussão na cidade de Goiânia. José Divino Nunes, com 18 anos na época, foi acusado de homicídio de seu melhor amigo, Maurício Garcez Henrique, de apenas 15 anos. Segundo Martins (2018), os jovens estavam estudando na casa de Maurício quando este encontrou a arma do pai e, no meio de uma brincadeira, José Divino acabou disparando acidentalmente, matando o amigo.
Dantas e Fonseca (2018) menciona que desde a abertura do inquérito para apuração dos fatos, José Divino afirmou desde a primeira declaração oferecida à autoridade policial que não queria matar Maurício e que tudo não passou de uma enorme fatalidade, sendo horrível. O Juiz da 6ª Vara Criminal de Goiânia, Orimar Bastos, considerou que o delito não se enquadrava em nenhuma das sanções do Código Penal, levando em consideração as provas colhidas ao longo do processo.
No entanto, o caso ganhou ainda mais notoriedade quando uma carta psicografada por Chico Xavier foi adicionada aos autos, relatando os fatos e inocentando o réu. A carta continha uma reprodução perfeita do momento da morte, além da assinatura constante no registro de identidade de Maurício. Dantas e Fonseca (2018) mencionam que a carta foi considerada de valor subsidiário pelo juiz, que já havia considerado a inocência de José Divino antes mesmo de sua adição aos autos. O caso foi amplamente discutido nos meios jurídicos e na mídia, tendo em vista a importância da carta psicografada na decisão final.
Após a investigação das autoridades policiais, os peritos chegaram à conclusão de que a versão apresentada na carta psicografada de Maurício Garcez, sobre o tiro acidental, era coerente. A riqueza de detalhes sentidos na carta, psicografada pelo médium apresentado Chico Xavier, não contradiz as declarações do acusado em seu interrogatório e coincide com a versão da perícia sobre o tiro acidental. Consequentemente, no dia 16 de julho de 1979, o juiz Orimar de Bastos absolveu o estudante José Divino Nunes do crime (MARTINS, 2018).
De acordo com Amorim (2020, p. 02) parte da sentença proferida pelo juiz afirmava: “Durante o andamento do processo, foram incluídos nos autos recortes de jornal e uma mensagem espírita enviada pela vítima, através de Chico Xavier, em que ele relata o incidente que levou à sua morte, transmitido do além”.
Após a absolvição de José Divino Nunes, o Ministério Público interpôs um recurso de ofício e outro recurso contra a decisão, originado na reforma da sentença pelo Tribunal de Justiça, que pronunciou o réu e remeteu o caso ao Tribunal do Júri. Durante esse período, mais cartas psicografadas da vítima foram produzidas, reforçando a inocência do acusado. Em sessão de julgamento do Tribunal do Júri, ocorrida em 2 de junho de 1980, José Divino Nunes foi absolvido por seis votos a um (MARTINS, 2018).
Dantas e Fonseca (2018) relatam que apesar disso, a promotoria recorreu da decisão, mas o Tribunal recusou o provimento ao recurso e confirmou a decisão do júri, absolvendo definitivamente o réu. Embora o promotor do caso tenha afirmado que cumpriria a decisão soberana do júri e não continuaria, o Procurador-Geral da Justiça do Estado de Goiás nomeou outro promotor para oferecer as razões de apelação, que posteriormente foram acolhidas pela Procuradoria-Geral de Justiça do Estado. Dessa forma, o caso foi finalmente encerrado.
Assim, foi obtido por meio de perícia grafoscópica que as cartas psicografadas por Chico Xavier no caso de José Divino e Maurício Garcez continham uma assinatura que coincidia com a assinatura de Maurício presente em sua carteira de identidade. Isso gerou uma grande repercussão na época e foi narrado por jornais como o Diário da Noite (São Paulo/SP – 10/09/1979) e O Globo (Rio de Janeiro/RJ – 18/09/1979).
4.3 A ADMISSIBILIDADE DA PSICOGRAFIA EM OUTROS PAÍSES
Não há um consenso internacional sobre o uso de cartas psicografadas como meio de prova em julgamentos. Em alguns países, como o Brasil, o uso desse tipo de prova é geralmente rejeitado pelos tribunais, enquanto em outros países pode haver jurisprudência que permita ou rejeite o uso dessas provas em determinados casos.
Nos Estados Unidos, as cartas psicografadas não são geralmente aceitas como meio de prova em julgamentos, devido à falta de validade científica comprovada dessa prática. Em geral, os tribunais americanos seguem o princípio da “admissibilidade de prova”, que estabelece que as provas apreendidas em um julgamento devem ser relevantes, competentes e verificáveis, além de estar em conformidade com as regras e normas protegidas pela lei (JESUS PINHA, 2018).
Segundo Borges (2019) as cartas psicografadas, que são alegadamente escritas por meio de uma suposta comunicação com os mortos, não são consideradas uma prova confiável e verificável pelos tribunais americanos, pois não há uma metodologia científica comprovada que sustente sua validade. Em geral, o sistema jurídico americano é baseado em evidências concretas e verificáveis, e as provas tecnológicas nos tribunais devem ser apoiadas por fundamentos científicos experimentais. Como a psicografia não tem uma base científica comprovada, ela é geralmente rejeitada como prova nos tribunais americanos.
Em alguns casos, conforme Justino (2015) pode haver distintamente em que as cartas psicografadas são permitidas como prova em julgamentos, mas apenas se houver presença de evidências, que sejam apoiadas por provas adicionais que as tornem confiáveis e verificáveis. Por exemplo, se uma carta psicografada contém informações alegadas que podem ser corroboradas por outras fontes de prova, como evidências físicas ou testemunhos de outras pessoas, essa carta pode ser considerada como parte de um conjunto de evidências maiores.
No entanto, em geral, as cartas psicografadas não são consideradas como prova suficiente para sustentar uma personalidade ou absolvência em um julgamento nos Estados Unidos. Os tribunais americanos apresentam a exigência de provas concretas e verificáveis que podem ser corroboradas por meio de evidências científicas e testemunhos de vigilância (JESUS PINHA, 2018).
Em outros países, como na Espanha, uma carta psicografada pode ser considerada como meio de prova em julgamentos, mas isso depende do caso em questão e de como a carta foi julgada e apresentada como prova. O Tribunal Constitucional da Espanha estabeleceu que as cartas psicografadas podem ser admitidas como prova, desde que sejam concomitantes por outros elementos de prova que possam corroborar a sua veracidade e fidelidade para o caso. Isso significa que a carta psicografada deve ser considerada como um elemento a mais de prova, em conjunto com outras evidências mais concretas e verificáveis (AMORIM, 2020).
Além disso, a carta psicografada deve ter sido tratada de forma legal e ética, sem violar as leis de proteção de dados pessoais ou outros direitos fundamentais. A carta deve ser apresentada em juízo por meio de um especialista em psicografia, que pode ser submetida a questionamentos e que deve explicar como a carta foi tratada e interpretada.
No entanto, é importante destacar que a aceitação de cartas psicografadas como prova na Espanha é controversa e depende da avaliação dos tribunais em cada caso específico. Alguns tribunais podem ser mais céticos em relação a esse tipo de prova, enquanto outros podem considerá-las relevantes para uma decisão final. Portanto, a carta psicografada pode ser considerada como meio de prova em julgamentos na Espanha, mas é necessário que seja acompanhada por outras provas concretas e verificáveis, e que tenha sido processada de forma legal e ética. A decisão final sobre a admissibilidade da carta como prova depende da avaliação dos tribunais em cada caso específico.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base na revisão bibliográfica realizada, é possível concluir que a admissibilidade de cartas psicografadas como prova em processos judiciais ainda é um tema controverso e complexo. Embora algumas decisões judiciais tenham admitido cartas psicografadas como prova, outros tribunais têm rejeitado sua admissibilidade por considerá-las como provas insuficientes ou inconfiáveis.
Por outro lado, a análise dos argumentos a favor e contra a admissão de cartas psicografadas como prova aponta para a necessidade de critérios rigorosos para a sua aceitação. É necessário avaliar a credibilidade do médium, a coerência do conteúdo da carta com outros elementos de prova e a possibilidade de fraude ou manipulação.
Nesse sentido, é importante ressaltar que a psicografia não é uma técnica reconhecida pela ciência, o que aumenta a possibilidade de fraudes e manipulações. Além disso, a análise das cartas psicografadas é bastante subjetiva e depende da interpretação do perito ou do juiz, o que pode gerar resultados distintos em casos semelhantes.
Diante desses aspectos, sugere-se que a admissibilidade de cartas psicografadas como prova seja decidida caso a caso, com base em critérios rigorosos e transparentes, e que sejam levadas em conta todas as circunstâncias do caso concreto. É importante que a decisão seja fundamentada em critérios objetivos e não se baseie apenas na opinião subjetiva do perito ou do juiz.
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SILVA, Igor Luis Pereira. Princípios Penais. 2. ed. rev., atual e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2020
1Discente do 9º período de Direito da Universidade Evangélica de Goiás – Ceres.
2Professor Orientador, docente do curso de Direito da Universidade Evangélica de Goiás – Ceres