REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202412051548
Ana Beatriz Monteiro Saad1
RESUMO
O carcinoma apócrino ductal cutâneo (CADC) é uma neoplasia epitelial maligna rara em cães, caracterizada por baixa taxa de metástase e comportamento localmente agressivo. Este relato descreve o caso de uma cadela Golden Retriever, 5 anos, que apresentou um nódulo na região do cotovelo direito com crescimento acelerado. Após avaliação clínica, optou-se pela excisão cirúrgica com ampla margem. O diagnóstico histopatológico confirmou o carcinoma apócrino ductal com bordas limpas (M4), minimizando o risco de recidiva. O acompanhamento por um ano não demonstrou sinais de recorrência. Este caso reforça a importância do diagnóstico precoce e da intervenção cirúrgica para alcançar um prognóstico favorável.
PALAVRAS-CHAVE: Carcinoma apócrino ductal, neoplasia cutânea, Golden Retriever, lesão nodular, excisão cirúrgica.
ABSTRACT
Cutaneous apocrine ductal carcinoma (CADC) is a rare malignant epithelial neoplasm in dogs, characterized by a low metastatic rate and locally aggressive behavior. This report describes the case of a 5-year-old female Golden Retriever presenting with a rapidly growing nodule in the right elbow region. After clinical evaluation, surgical excision with wide margins was performed. Histopathological diagnosis confirmed apocrine ductal carcinoma with clean margins (M4), minimizing the risk of recurrence. Follow-up over one year revealed no signs of relapse. This case highlights the importance of early diagnosis and surgical intervention to achieve a favorable prognosis.
KEYWORDS: Apocrine ductal carcinoma, cutaneous neoplasm, Golden Retriever, papiloma, surgical excision.
1. INTRODUÇÃO
Os carcinomas são neoplasias malignas epiteliais ou glandulares, com potencial para invadir tecidos adjacentes e formar metástases. Entre essas, os tumores originados nas glândulas sudoríparas são particularmente raros, sendo mais prevalentes em cães idosos, sem predileção racial (1). Esses tumores podem ter origem nas glândulas apócrinas ou écrinas.
Os carcinomas écrinos, geralmente, manifestam-se como inchaços solitários localizados na região dos coxins, dígitos ou membros distais. Embora apresentem baixa taxa de metástase, podem recidivar ou disseminar-se para linfonodos regionais e tecidos subcutâneos (5). Por outro lado, os carcinomas apócrinos são mais diversificados em sua apresentação anatômica, sendo frequentemente encontrados na região axilar, mas também em áreas como anogenital, mamilos, face, tronco, extremidades, pulsos, ponta dos dedos e lábios (2-4).
Esses carcinomas acometem preferencialmente cães com idade entre 8 e 12 anos, embora já existam relatos em animais jovens, como de 2 anos (4). Dentro desse grupo, os carcinomas apócrinos ductais cutâneos (CADCs) destacam-se por sua raridade, representando apenas 0,7% a 2,2% de todos os tumores de pele em canídeos (5). Essas neoplasias, geralmente, aparecem como nódulos solitários, embora múltiplas lesões também possam ser observadas em casos específicos. Inicialmente, os animais podem apresentar rubor e calor na região das lesões, que evoluem para nódulos subcutâneos rígidos, às vezes ulcerados.
Os CADCs possuem comportamento localmente agressivo, com tendência a invadir tecidos linfáticos da derme e alto índice de recidiva local após excisão cirúrgica. Apesar disso, apresentam baixa incidência metastática, de aproximadamente 2%, com metástases, quando presentes, localizadas em linfonodos regionais e pulmões (6-8). O diagnóstico é confirmado por exames citológicos e histopatológicos, com suporte adicional de exames de imagem, como ultrassonografia abdominal e radiografia torácica, para avaliar a extensão da doença e possíveis metástases.
O tratamento padrão consiste na excisão cirúrgica com ampla margem e retirada de linfonodos adjacentes. A sobrevida média após a cirurgia é de 30 meses, e o prognóstico, embora reservado, é geralmente mais favorável quando a excisão completa é alcançada (6-7). Além disso, como em outras neoplasias malignas, os CADCs podem estar associados à síndrome paraneoplásica, caracterizada por sinais clínicos como anorexia, caquexia, alterações endócrinas, hematológicas, neurológicas, gastrointestinais e febre (9-10).
O presente relato descreve o caso de uma cadela da raça Golden Retriever, com 5 anos, diagnosticada com carcinoma apócrino ductal cutâneo, destacando o diagnóstico, o tratamento realizado e a evolução clínica.
2. RELATO DE CASO
Uma cadela Golden Retriever, fêmea, castrada, de 5 anos e pesando 50 kg, foi atendida em uma clínica particular apresentando um nódulo único na região do cotovelo direito. O tutor relatou que a lesão havia surgido há duas semanas, com crescimento acelerado que resultou em um aumento considerável no tamanho, dobrando em poucos dias. A cadela não apresentava sinais de dor, desconforto ou prurido associados à lesão e estava clinicamente ativa.
Durante o exame clínico, o animal demonstrou normotermia, normocardia e eupneia, com ausculta cardiorrespiratória limpa. A inspeção cutânea revelou escaras de decúbito em ambos os cotovelos, sendo mais espessas na região do cotovelo direito, onde se encontrava o nódulo. A lesão media aproximadamente 0,5 cm, era arredondada, firme, alopécica, de coloração acastanhada, com margens afiladas e irregulares. Além disso, o cotovelo apresentava uma zona de hiperqueratose e descamação. Com base nas características macroscópicas, o principal diagnóstico diferencial considerado foi a papilomatose, dada a aparência nodular e elevada do tumor.
Diante do crescimento acelerado da lesão e da localização em uma área de margem cutânea limitada, optou-se pela excisão cirúrgica imediata como abordagem terapêutica. O procedimento foi realizado com bisturi eletrônico, visando minimizar hemorragias e facilitar a cicatrização em uma região sujeita a movimentos constantes. Uma margem de 1 cm foi estabelecida ao redor da lesão para garantir a remoção completa.
A amostra foi enviada ao laboratório IDEXX para análise histopatológica. O laudo revelou uma lesão dérmica nodular, circunscrita, composta por células arredondadas a poligonais dispostas em pequenos aglomerados e ninhos sustentados por estroma fibrovascular. As células apresentavam características típicas de malignidade, incluindo núcleos ovalados com cromatina finamente pontilhada, nucléolos discretos, e citoplasma eosinofílico. Foram identificadas raras estruturas ductais circundando os ninhos celulares, confirmando o diagnóstico de carcinoma apócrino ductal. As bordas da amostra estavam limpas (M4), indicando baixo risco de recidiva.
Legenda: Incisão com bordas de segurança em região de cotovelo.
Fonte: Arquivo pessoal
O plano de acompanhamento incluiu avaliações trimestrais com citologia aspirativa da região, radiografias torácicas e exames de sangue por um ano. Não foram observados sinais de recorrência durante esse período. Após três exames negativos consecutivos, o caso foi considerado encerrado, com o diagnóstico de cura clínica.
3. DISCUSSÃO
Embora a citologia aspirativa seja um procedimento amplamente recomendado para o diagnóstico inicial de lesões cutâneas pequenas, a decisão de realizar a excisão cirúrgica imediata foi respaldada por fatores clínicos importantes. O rápido crescimento da lesão, aliado à localização em uma área de articulação, apresentou um risco significativo de comprometimento funcional e potencial invasão de tecidos profundos, como músculos e ossos. Assim, a intervenção precoce foi considerada essencial para preservar a qualidade de vida do animal e minimizar o risco de evolução para um quadro mais grave.
O diagnóstico histopatológico de carcinoma apócrino ductal cutâneo (CADC) reforçou a relevância da abordagem adotada, considerando a raridade dessa neoplasia em cães e a dificuldade de diagnóstico diferencial com outras lesões benignas, como papilomas. A apresentação clínica observada, incluindo a nodulação solitária com crescimento acelerado, é consistente com relatos da literatura, que descrevem o CADC como uma neoplasia de comportamento localmente agressivo, com tendência à invasão linfática e alta taxa de recidiva após excisão inadequada.
Outro aspecto relevante deste caso foi a ausência de metástase, alinhando-se aos baixos índices descritos na literatura, em torno de 2% para metástases linfáticas e pulmonares. No entanto, a possibilidade de disseminação metastática, mesmo que rara, justifica o acompanhamento rigoroso realizado no pós-operatório. Este monitoramento, por meio de exames de imagem e citologia, permitiu a confirmação da ausência de recorrência após um ano, consolidando o sucesso terapêutico.
Este caso também destaca a importância de considerar a biologia do tumor e a história clínica do paciente na definição de estratégias terapêuticas. A escolha por uma abordagem cirúrgica ampla, com margens adequadas, garantiu a remoção completa da neoplasia e contribuiu para o prognóstico favorável. Esse resultado corrobora a recomendação de intervenções cirúrgicas rápidas e eficazes em casos de lesões com características atípicas e potencial maligno.
Por fim, o manejo multidisciplinar do caso, com o suporte de técnicas avançadas de diagnóstico e tratamento, reflete a evolução das práticas clínicas na oncologia veterinária, permitindo maior precisão no diagnóstico e melhores desfechos para pacientes com condições raras como o CADC.
4. CONCLUSÃO
A intervenção cirúrgica imediata foi essencial para o manejo do carcinoma apócrino ductal cutâneo, garantindo a remoção completa da lesão e minimizando o risco de recidiva. Este relato reforça a importância do diagnóstico precoce e da tomada de decisão cirúrgica em lesões neoplásicas cutâneas, particularmente em áreas de difícil acesso.
REFERÊNCIAS
1 Kusters A.H., Peperkamp K.H. & Hazewinkel H.A. 1999. Case report Atrichial sweat gland adenocarcinoma in the dog. Veterinary Dermatology. 10: 51-54.
2 BACARAT, F.F. Fernandes Jr.,H.J., Silva, M.J. Cancerologia Atual: Um enfoque Multidisciplinar. 1 ed, São Paulo: Editora Roca LTDA, 2000. pp. 122-123 e p. 291- 293. ISBN: 85-7241-306-5.
3 COSTA, S.R.P, HENRIQUES, A.C., HORTA, S.H.. Carcinoma de glândula apócrina em coxa direita. Einsten, 2008. Disponível em: . Acesso em outubro 2009
4 DALECK, C.R., DE NARDI, A.B, RODASKI, S.. Oncologia em cães e gatos. São Paulo: Editora Roca 2009. 1 ed. Capítulo 15 p.264-266. ISBN: 978- 85-7241-764-8
5 Gross T.L., Ihrke P.J., Walder E.J. & Affolter V.K. 2009. Doenças de Pele do Cão e do Gato: Diagnóstico Clínico e Histopatológico. 4.ed. São Paulo: Roca, 904p.
6 BAHARAK, A.; REZA, K.; SHAHRIAR, D.; OMID, A.; DARUOOSH, V.; NASRIN, A.Metastatic apocrine sweat gland adenocarcinoma in a terrier dog. Asian Pac J Trop Biomed,v.8,p.670-672,2012.
7 RÜTTEN, A.; REQUENA, L. Sweat gland carcinomas of the skin. Der Hautarzt, v.59, p. 151-160, 2008.
8 SIMKO, E.; WILCOCK, P.B.; YAGER, A.J. A retrospective study of 44 canine apocrine sweat gland adenocarcinomas.The Canadian Veterinary Journal ,v.44,p.38-42, 2003
9 MANGIERI, JUAN. Síndromes paraneoplásica. In: DALECK, R.C; NARDI, B.D.A; RODASKY, S. Oncologia em cães e gatos. 1ª Ed. Local: Roca,2009. p.346-352.
10 RAMOS, R.S. et. al. Estudo da prevalência das principais síndromes paraneoplasicas de 14 cães com linfoma – relato de casos. Vet. e Zootec. Supl. Ao v.15, n.3, dez. p. 38-39, 2008
1 Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais- São Paulo (ANCLIVEPA-SP)