CARACTERIZAÇÃO DOS ÓBITOS INFANTIS DE PERNAMBUCO NO TRIÊNIO 2018-2020

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202410311925


Renan Ramos de Oliveira2; Millena Rayssa De Andrade Silva1; Larissa Andrade Noia1; Débora De Moura Muniz1; Guilherme de Souza Silva1; Gustavo Ferraz Pereira1; Louis Hussein Patu Hazime1; Luis Henrique Remigio de Azevedo Filho1; Paulo Henrique Alves Melo2; Rodrigo Arthur Macedo Rizzardi1


RESUMO

A análise do óbito infantil é de extrema importância do ponto de vista epidemiológico, pois é utilizado como marcador da qualidade de vida de um país. O presente estudo aborda a mortalidade infantil em Pernambuco entre 2018 e 2020 e faz uma análise dos resultados encontrados. A mortalidade infantil mostrou uma diminuição, passando de 1714 óbitos em 2018 para 1493 em 2020, com a maior acentuação na faixa etária pós-neonatal. As principais causas de óbito variam conforme a faixa etária, com afecções perinatais predominando no período neonatal e doenças infecciosas ganhando maior ênfase na fase pós-neonatal. Ademais crianças do sexo masculino predominaram no montante de óbitos bem como crianças negras e pardas. As divisões administrativas com maior número de óbitos foram as regiões metropolitanas de Recife e Caruaru. O peso ao nascer foi um fator considerável, com a maioria dos óbitos neonatais ocorrendo em crianças com baixo peso. A análise revelou uma mortalidade superior em partos vaginais comparado aos cesáreos, resultado este não esperado considerando as pesquisas mais atuais.  Dados apontam também que aproximadamente 68% poderiam  ser evitáveis, visto que eram causados por fatores como condições maternas, baixo peso ao nascer e prematuridade. Fatores estes que podem ser melhorados mediante mudanças na assistência à saúde. A duração da gestação se mostrou ser um fator pertinente para análise, com maior número de óbitos em recém-nascidos a termo e prematuros extremos. O estudo portanto mostra a importância da vigilância epidemiológica dos óbitos infantis e sugere que é essencial melhorar a atenção perinatal, integrar a assistência pré-natal e ao parto, e promover melhorias na estrutura urbana e no acesso à saúde para reduzir a mortalidade infantil evitável.

ABSTRACT

The analysis of infant mortality is extremely important from an epidemiological point of view, as it is used as a marker of a country’s quality of life. This study addresses infant mortality in Pernambuco between 2018 and 2020 and analyzes the results found. Infant mortality showed a decrease, going from 1,714 deaths in 2018 to 1,493 in 2020, with the greatest emphasis in the post-neonatal age group. The main causes of death vary according to the age group, with perinatal conditions predominating in the neonatal period and infectious diseases gaining greater emphasis in the post-neonatal phase. In addition, male children predominated in the number of deaths, as well as black and brown children. The administrative divisions with the highest number of deaths were the metropolitan regions of Recife and Caruaru. Birth weight was a considerable factor, with the majority of neonatal deaths occurring in low-weight children. The analysis revealed a higher mortality rate in vaginal births compared to cesarean sections, a result that was not expected considering the most recent research.Data also indicate that approximately 68% could be preventable, since they were caused by factors such as maternal conditions, low birth weight and prematurity. These factors can be minimized through changes in health care. The length of gestation proved to be a relevant factor for analysis, with a higher number of deaths in full-term and extremely premature newborns. The study therefore shows the importance of epidemiological surveillance of infant deaths and suggests that it is essential to improve perinatal care, integrate prenatal and childbirth care, and promote improvements in urban infrastructure and access to health care to reduce preventable infant mortality.

1. INTRODUÇÃO

A Vigilância Epidemiológica é parte do campo de atuação do Sistema Único de Saúde – SUS de acordo com a Lei Orgânica da Saúde no seu Art. 6º, Parágrafo 2º, que diz: Entende-se por vigilância epidemiológica um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos. (BRASIL, 1990). 

A Portaria GM nº 1.172 (BRASIL, 2004b), de 15 de junho de 2004, preconiza que é atribuição do componente municipal do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde a “vigilância epidemiológica e o monitoramento da mortalidade infantil e materna”, e dos Estados, “de forma complementar a atuação dos municípios”. Isso é fundamental, pois é uma maneira eficaz de conhecer detalhadamente cada município para, assim, fazer as políticas e ações apropriadas para cada região. É importante salientar, no entanto, que isso não exclui a participação da vigilância do óbito dos outros setores responsáveis pela assistência à saúde, uma vez que a investigação do óbito procura obter informações referentes à assistência em todos os níveis de atenção, além de informações colhidas com a família para torná-la o mais completa possível (1).

A equipe da atenção básica da área de abrangência do local de residência da família é a responsável pela investigação domiciliar e ambulatorial dos óbitos, como parte integrante da sua atuação. Nos estabelecimentos de saúde, o  Núcleo Hospitalar de Epidemiologia (NHE), Comitê Hospitalar, ou outra estrutura designada pelo gestor local, deverá realizar busca ativa diária dos óbitos infantis e fetais ocorridos ou atestados em suas dependências, notificar o óbito ao serviço de vigilância epidemiológica municipal e disponibilizar o acesso aos prontuários para a equipe de vigilância de óbitos. A coleta de dados no prontuário hospitalar ou do pronto atendimento hospitalar pode ser feita por técnicos do NHE ou da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) que participam da equipe de vigilância de óbitos e/ou do Comitê Hospitalar, mas preferencialmente por profissionais não envolvidos diretamente na assistência ao óbito. É importante reafirmar a integração dos setores responsáveis pela assistência, uma vez que os objetivos principais do trabalho não se restringem à melhoria das estatísticas vitais, mas também à qualidade e organização do cuidado à saúde (1).

Embora todos os óbitos infantis devam ser investigados em, considerando-se as prioridades para a redução da mortalidade infantil e os óbitos com maior potencial de prevenção, recomenda-se a adoção de critérios mínimos de referência para investigação (1). São eles: pós-neonatais (28 dias a 1 ano incompleto de vida); neonatais (0 a 27 dias de vida; fetais (natimortos); óbitos ocorridos em domicílio. Os óbitos por malformação congênita grave/complexa/letal não teriam, portanto, prioridade na investigação e posterior discussão pois são considerados inevitáveis e de baixo potencial para prevenção. Além disso, recomenda-se priorizar os óbitos infantis de crianças com peso ao nascer adequado (maior ou igual que 2.500 gramas) e/ou compatível com a vida (maior ou igual que 1.500 gramas), pois fatos como esses alertam para a possibilidade de um óbito potencialmente evitável, ou seja, são considerados eventos sentinelas (1).

Ao fim da investigação, a equipe de vigilância de óbitos deve promover discussões com todos os profissionais envolvidos na assistência da criança (atenção básica, atenção especializada, urgência, sistema de transporte, atenção hospitalar) para análise ampla e detalhada de cada caso e conclusão sobre os problemas relacionados ao óbito infantil e de sua evitabilidade. As reuniões não têm caráter punitivo, mas sim o de prevenir mortes por causas similares no futuro. Por isso, a importância das discussões a fim de promover a correção imediata de problemas que influenciaram o óbito e sensibilizar as pessoas diretamente envolvidas na assistência e no preenchimento dos registros de atendimento e da DO (1).

2. OBJETIVOS:

2.1 Objetivo Geral: caracterizar os óbitos infantis que ocorreram entre 2018 e 2020 em Pernambuco.

2.2 Objetivos Específicos: 

  1. Analisar a proporção de óbitos infantis por causas listadas na CID-10 no período de 2018 a 2020 em Pernambuco;
  2. Analisar a proporção de óbitos infantis por raça/cor no período de 2018 a 2020 em Pernambuco;
  3. Analisar a proporção de óbitos infantis por sexo no período de 2018 a 2020 em Pernambuco;
  4. Analisar a proporção de óbitos infantis por proporção de óbitos infantis divisões administrativas estaduais no período de 2018 a 2020 em Pernambuco; 
  5. Analisar a proporção de óbitos infantis por peso ao nascer no período de 2018 a 2020 em Pernambuco; 
  6. Analisar a proporção de óbitos infantis  por tipo de parto no período de 2018 a 2020 em Pernambuco; 
  7. Analisar a proporção de óbitos infantis evitáveis no período de 2018 a 2022 em Pernambuco; 
  8. Analisar a proporção de óbitos infantis por duração da gestação no período de 2018 a 2022 em Pernambuco; 

3. METODOLOGIA:

Os dados foram adquiridos através do DATASUS, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10. Os dados de mortalidade infantil em Pernambuco foram selecionados. 

Para o cálculo da mortalidade proporcional por ano foi selecionado “ano” para compor as linhas, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada, realizou-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária analisada pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por ano no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 1.

Para o cálculo da mortalidade proporcional por capítulo do CID-10  foram utilizados os seguintes filtros: “Capítulo CID-10” para compor as linhas da tabela, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada, foi selecionado as 5 principais causas de mortalidade e seguiu-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por capítulo da CID-10 no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 2. 

Para o cálculo da mortalidade proporcional por raça/cor foi selecionado “raça/cor” para compor as linhas, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada, realizou-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária analisada pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por raça/cor no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 3a. Uma nova tabela foi gerada, selecionando “raça/cor” para compor as linhas e “Ano de óbito” para compor as colunas. Os dados foram expostos na tabela 3b. 

Para o cálculo da mortalidade proporcional por sexo foi selecionado “sexo” para compor as linhas, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada, realizou-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária analisada pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por sexo no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 4.

Para o cálculo da mortalidade proporcional por GERES foi selecionado “Divisão administ estadual” para compor as linhas, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada, realizou-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária analisada pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por Divisão administ estadual no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 5.

Para o cálculo da mortalidade proporcional por peso ao nascer foi selecionado “Peso ao nascer” para compor as linhas, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada, realizou-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária analisada pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por peso ao nascer no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 6.

Para o cálculo da mortalidade proporcional por tipo de parto foi selecionado “Tipo parto” para compor as linhas, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada, realizou-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária analisada pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por tipo de parto no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 7.

Seguiu-se a análise das causas evitáveis e mal definidas. Para o cálculo da mortalidade proporcional por causa foi selecionado “Causas evitáveis – 0 a 4 anos” para compor as linhas, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada o total de óbitos infantis de cada tipo de causa (evitáveis, não claramente evitáveis e mal definidas) foi separado em outra tabela e  realizou-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária analisada pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por tipo de causa no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 8. Em seguida as principais causas específicas de cada tipo foram separadas em novas tabelas divididas por faixa etária e seguindo ordem decrescente de casos absolutos para melhor visualização, estando expostos nas tabelas 9a, 9b e 9c.

Para o cálculo da mortalidade proporcional por Duração da Gestação foi selecionado “Duração da Gestação” para compor as linhas, “Faixa etária 01” (todas as categorias: 0-6 dias, 7-27 dias, 28-364 dias) para compor as colunas, “óbitos por residência” para compor o conteúdo. O período selecionado foi o triênio 2018-2020. Na tabela gerada, realizou-se o cálculo da mortalidade proporcional para cada faixa etária analisada pela seguinte fórmula: número de óbitos infantis por duração da gestação no período selecionado / número total de óbitos infantis no período selecionado * 100 e estão expostos na tabela 10.

Diante dos dados recolhidos do DATASUS/TABNET, observa-se uma nítida queda nos números absolutos de mortalidade infantil, passando de um total de 1714 óbitos registrados em 2018 para 1493 em 2020. Essa queda se verifica em todas as faixas etárias estudadas. Na faixa etária pós-neonatal (28-364 dias de vida) constata-se a maior diminuição, na qual no ano de 2018 comporta 36,86% do total de óbitos para o triênio, enquanto no ano de 2020 houve 29,54%. Na faixa neonatal precoce (0-6 dias de vida) encontra-se a menor diminuição (2018 com 34,15% do total e 2020 com 32,38%). Esses dados seguem as estatísticas brasileiras, que mostram queda da mortalidade em todas as regiões (DATASUS/TABNET).

Ao analisar as principais causas de óbito por faixa etária  segundo capítulo CID-10 (Tabela 2) nota-se que diferentes causas predominam em diferentes idades. No período neonatal (0-27 dias de vida) predominam afecções próprias do período perinatal e malformações congênitas/anomalias cromossômicas. Já nos óbitos na faixa etária pós-neonatal essas causas diminuem pela ascensão de doenças infecciosas e parasitárias e causas externas. Assim, percebe-se que o fator que desencadeia o óbito nessa faixa etária está mais relacionado a acesso à saúde, bem como diagnóstico e tratamento de doenças infecciosas. Vale ressaltar que a grande maioria dos óbitos infantis predomina no período neonatal precoce (54,93%). Os estudos demonstram que os óbitos dessa faixa etária estão intimamente ligados à gestação, ao parto e ao pós-parto, em geral passíveis de serem prevenidas por meio de assistência à saúde de qualidade. Fica, portanto, evidente a íntima relação entre a saúde da mulher tanto antes quanto durante o parto, impactando diretamente na sobrevida do bebê (6).

Em relação à raça/cor, em todas as idades estudadas houve predomínio de crianças pardas em relação a outras cores. De um total de 4840 óbitos, 3398 (70,21%) eram crianças pardas. Esses dados estão em congruência com os encontrados no Nordeste, segundo DATASUS/TABENET. Neste período também observou-se redução do número absoluto de óbitos infantis em todas as raças/cores estudadas. 

Já em relação ao Sexo do bebê houve maior mortalidade em crianças do sexo masculino, 54,65% contra 43,95% de óbitos femininos. Há diversos estudos que concordam que a mortalidade para crianças do sexo masculino é maior do que a do feminino no Brasil. Entretanto, pouco se sabe os fatores que estão associados a esse fenômeno. Atribui-se a essa diferença a fatores biológicos, que indicam uma maior fragilidade de bebês do sexo masculino a alguns tipos de doença ligados a causas externas, além de terem maior risco de alterações genéticas. O Manual de óbito infantil e fetal do Ministério da Saúde aponta como o indicador mais apropriado para a análise da assistência obstétrica e neonatal e de utilização dos serviços de saúde o peso ao nascimento.

Na contabilização de óbitos infantis segundo divisões administrativas, a GERES I, com sede em Recife, que é a região metropolitana e portanto detentora do maior número de habitantes e pacientes encaminhadas para realizar o parto, sai na frente. Apenas a GERES I concentra 38,47% dos óbitos. A GERES II, com sede em Caruaru, ocupa o segundo lugar com 14,73% dos óbitos. As outras 10 GERES juntas detém 46,8% e a GERES com a menor quantidade de óbitos infantis é a VII, com sede em Salgueiro e 1,67% do total. A grande concentração dos óbitos nas duas primeiras Gerências Regionais de Saúde pode ser explicada pelo fato de terem a maior parte da população do estado. 

O peso ao nascimento é conhecidamente um dos principais fatores de risco para mortalidade infantil. No presente estudo observa-se claramente a influência desse fator: 71,87% dos óbitos neonatais precoces acontecem em crianças com baixo peso ao nascer (menor que 2.500 g). 

O estudo pernambucano reafirma o peso ao nascer como um parâmetro que não só indica as condições intrauterinas em que a criança foi submetida durante o período gestacional, mas também avalia a saúde do neonato, podendo ser um dos principais determinantes para a sobrevivência do mesmo. É considerado fator que isoladamente contribui para diversos problemas para a saúde da criança, dentre eles, uma maior predisposição para a mortalidade nas primeiras semanas de vida. O MS recomenda o uso do peso de nascimento como indicador mais apropriado para a análise da assistência obstétrica e neonatal e de utilização dos serviços de saúde (7). 

No comparativo entre parto vaginal e cesáreo, ao contrário do que se esperava no presente estudo, as crianças nascidas através de partos vaginais tiveram maior mortalidade. No período neonatal precoce, 58,03% dos óbitos foram de bebês que nasceram a partir de partos vaginais, contra 38,55% para parto cesáreo. 

Discutindo os motivos específicos dos óbitos, encontra-se o dado mais perturbador desse trabalho: 68% do total de óbitos infantis no período são considerados evitáveis. Dentre as causas mais frequentes pode-se levantar como causas mais associadas à mortalidade infantil, condições maternas, o baixo peso ao nascimento, duração curta da gravidez e as causas infecciosas. No período neonatal precoce, predominam as complicações e afecções maternas, bem como o baixo peso ao nascimento e a prematuridade. Ao observar o período neonatal tardio, identifica-se um período de transição com aumento das causas infecciosas e diminuição das complicações relacionadas à gravidez – que ainda se mantém elevada. Finalmente, no período pós-neonatal, muda-se o perfil e as causas infecciosas começam a predominar.  A discriminação das causas mais frequentes por faixa etária estão expostas nas tabelas 9a, 9b e 9c. Há consenso entre os artigos estudados que quanto menor o peso ao nascer, maior o risco à mortalidade fetal e infantil. Indica que a renda média, o baixo peso ao nascer, o número de consultas de pré-natal e a taxa de fecundidade são importantes fatores associados à mortalidade infantil no país (8).

No presente estudo, a duração da gestação que teve o maior número absoluto de óbitos infantis no triênio de 2018-2020 foi a de “37 semanas a 41 semanas” (termo), o que pode ser considerado alarmante, já que seriam recém-nascidos que não deveriam falecer, tendo em vista as boas condições de maturidade de crescimento esperada para o nascimento. Logo em seguida, aparece a faixa de “22-27 semanas” (prematuro extremo). Quando observamos apenas o período neonatal precoce, o maior número de mortes é da faixa prematura extrema (31,59% contra 22,30% da faixa termo). Isso pode ser explicado pelo maior número de bebês que chegam à fase pós-neonatal, explicando a maior mortalidade proporcional desses sobre os prematuros extremos nessa faixa etária. O achado de maior mortalidade do grupo prematuro extremo está em consenso com o encontrado nos outros artigos que fundamentam essa discussão. Algo interessante que merece ser pontuado, é a proporção elevada de óbitos cujo tipo de parto foi classificado como “ignorado” na declaração de óbito, sendo motivo de crítica e alerta em relação à negligência dada ao correto preenchimento da DO por parte dos médicos assistentes.

5. CONCLUSÃO

Diante do exposto, fica clara a estreita relação do óbito infantil com a saúde da mulher, o que torna imprescindível consolidar a organização da atenção perinatal no Estado, promovendo a saúde integral da mulher, desde a pré-concepção e planejamento familiar, à regionalização e hierarquização da assistência e integração entre a assistência ao pré-natal e ao parto, mantendo-se a continuidade da atenção ao recém-nascido e à puérpera. Isso diminuiria a incidência de óbitos infantis evitáveis e relacionados à assistência materna, contribuindo para uma queda dramática das mortes. Também é importante mencionar que, na medida em que a criança cresce, a causa do óbito muda de perfil, aproximando-se de fatores associados ao contexto social em que ela vive, como infecções e desnutrição, fortalecendo a ideia de que é preciso promover uma mudança significativa na estrutura das cidades e do melhor acesso e assistência à saúde, assim como pronto reconhecimento de situações de risco.

6. REFERÊNCIAS

1. Manual de vigilância do óbito infantil e fetal e do Comitê de Prevenção do Óbito Infantil e Fetal / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. – 2. ed. – Brasília : Ministério da Saúde, 2009.

2. Diretrizes Nacionais da Vigilância em Saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. – Brasília : Ministério da Saúde, 2010.

3. Canuto, Indianara Maria de Barros et al. Perfil epidemiológico, padrões espaciais e evitabilidade da mortalidade fetal em Pernambuco. Acta Paulista de Enfermagem [online]. 2021, v. 34 [Acessado 10 Novembro 2022] , eAPE001355. Disponível em: <https://doi.org/10.37689/acta-ape/2021AO001355>. Epub 26 Nov 2021. ISSN 1982-0194. https://doi.org/10.37689/acta-ape/2021AO001355.

4. Alves, Taytiellen Fernandes e Coelho, Alexandre Bragança. Mortalidade infantil e gênero no Brasil: uma investigação usando dados em painel. Ciência & Saúde Coletiva [online]. 2021, v. 26, n. 4 [Acessado 10 Novembro 2022] , pp. 1259-1264. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/1413-81232021264.04022019>. Epub 19 Abr 2021. ISSN 1678-4561. https://doi.org/10.1590/1413-81232021264.04022019.

5. https://www.abrasco.org.br/site/wp-content/uploads/grupos/arquivos/200607181

6. Souza M.D.F.M.D., Malta D.C., França E.B., Barreto M.L. Changes in health and disease in Brazil and its States in the 30 years since the Unified Healthcare System (SUS) was created. Cienc. Saude Coletiva. 2018;23:1737–1750. doi: 10.1590/1413-81232018236.04822018.

7.  Malta D.C., Prado R.R.D., Saltarelli R.M.F., Monteiro R.A., Souza M.D.F.M.D., Almeida M.F.D. Preventable deaths in childhood, according to actions of the Unified Health System, Brazil. Rev. Bras. Epidemiol. 2019;22:e190014. doi: 10.1590/1980-549720190014.

8. Vieira-Meyer A.P.G.F., de Araújo Dias M.S., Vasconcelos M.I.O., Rouberte E.S.C., de Almeida A.M.B., de Albuquerque Pinheiro T.X., de Lima Saintrain M.V., Machado M.D.F.A.S., Dufault S., Reynolds S.A., et al. What is the relative impact of primary health care quality and conditional cash transfer program in child mortality? Can. J. Public Health. 2019;110:756–767. doi: 10.17269/s41997-019-00246-9


1Médico (a) pela Universidade de Pernambuco (UPE)
2Médico pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)