REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10183094
Aidimar Teixeira Ladeia Neto,
Fernanda Meira Tourinho Vianna,
Thales Almeida Sarmento Cavalcante,
Orientador: Me. Matheus Santos Marques.
RESUMO
O mormo é uma doença infectocontagiosa que afeta principalmente os equinos, mas também pode ocorrer em humanos, carnívoros e pequenos ruminantes. É causada pela bactéria Burkholderia mallei e é considerada uma das doenças mais antigas dos equinos. Embora tenha sido considerada erradicada no Brasil por algum tempo, o mormo ressurgiu nas áreas rurais, tornando-se uma preocupação crescente. No entanto, ainda há falta de conhecimento da sociedade sobre essa doença, mesmo o mormo sendo zoonótica. Diante disso, o presente trabalho possui como objetivo destacar as características patológicas do mormo em equídeos por meio de uma revisão integrativa da literatura. A pesquisa foi baseada em artigos acadêmicos encontrados em plataformas de pesquisa como Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Google Acadêmico. Os descritores utilizados para a busca dos artigos foram “doença infectocontagiosa”, “mormo”, “equídeos” e “equinos”. Foram analisados 8 artigos científicos e, através dessa revisão bibliográfica, foi possível obter informações sobre o mormo, incluindo formas de contágio, prevenção e distribuição geográfica da doença.
Palavras-chave: Mormo. Burkholderia mallei. Doença infectocontagiosa. Equídeos.
ABSTRACT
Glanders is an infectious and contagious disease that primarily affects horses but can also occur in humans, carnivores, and small ruminants. It is caused by the bacterium Burkholderia mallei and is considered one of the oldest diseases in horses. Although it was once considered eradicated in Brazil, glanders has reemerged in rural areas, becoming a growing concern. However, there is still a lack of public knowledge about this disease, despite its zoonotic nature. Therefore, the aim of this study is to highlight the pathological characteristics of glanders in equids through an integrative literature review. The research was based on academic articles found on platforms such as the Virtual Health Library (BVS), Scientific Electronic Library Online (SciELO), and Google Scholar. The search terms used for article retrieval were “infectious and contagious disease,” “glanders,” “equids,” and “horses.” Eight scientific articles were analyzed, and through this bibliographic review, information about glanders, including modes of transmission, prevention, and geographical distribution of the disease, was obtained.
Keywords: Glanders. Burkholderia mallei. Contagious disease. Equids.
1 INTRODUÇÃO
O mormo, caracterizado como uma doença infectocontagiosa, é causada pela bactéria Burkholderia mallei, um patógeno intracelular obrigatório, podendo variar de agudo a crônico. Embora afete principalmente equídeos, a saber: equinos, asininos e muares, também pode se estender a animais silvestres, carnívoros, pequenos ruminantes e até mesmo ao ser humano, tornando-se, assim uma zoonose (FERRAREZI et al., 2020). O ser humano para Petineli, Santos, Blankenheim (2020) é considerado um hospedeiro acidental dessa enfermidade.
Ela é altamente contagiosa e fatal, podendo ser transmitida por via oral, respiratória ou cutânea (PETINELI; SANTOS; BLANKENHEIM, 2020). É uma das doenças mais antigas conhecidas nos equídeos e foi provavelmente introduzida no Brasil, através de importações de cavalos infectados trazidos da Europa, para o Exército Brasileiro, no final do século XIX (HENRICH et al, 2019). Inicialmente, era conhecida por vários nomes, como catarro de burro, lamparão, catarro de mormo, garrotilho atípico e cancro nasal (SOUZA; ESTELUTI; BOVINO, 2020).
No passado, o mormo era comum em várias regiões do mundo devido à popularidade dos equinos, porém, com o passar do tempo, houve uma redução significativa no uso desses animais como forma de transporte, o que resultou em uma diminuição na incidência da doença (HENRICH et al., 2019). Hoje, encontra se erradicado em muitos países, mas infelizmente o Brasil não se enquadra nessa situação, visto que nos últimos anos, a doença tem ocorrido de forma praticamente endêmica, especialmente nos estados nordestinos, recuperando o status de doença reemergente (FERRAREZI et al., 2020).
As lesões ulcerativas na pele e nas membranas mucosas são características principais do mormo. Devido à sua alta morbidade e letalidade, é considerada uma zoonose grave, sendo obrigatória a sua notificação para a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE). Já, o seu o agente epidemiológico Burkholderia mallei, é um patógeno de grande interesse em termos de biossegurança, devido à sua possível utilização como arma biológica em atos de bioterrorismo, além de apresentar um alto potencial de disseminação (PETINELI; SANTOS; BLANKENHEIM, 2020; MEURER, 2021).
Mesmo o mormo sendo zoonótica, devido à falta de conhecimento sobre a doença, a maioria da população põe em risco a sua saúde quando entram em contato com animais enfermos, ou seja, é uma doença negligenciada e em várias partes do mundo é subnotificada (MEURER, 2021; RAMOS et al., 2021). Por isso, o presente trabalho tem como objetivo realizar uma revisão integrativa da doença mormo em equídeos, evidenciando as suas características patológicas e a importância do conhecimento sobre essa zoonose não só para a medicina veterinária, como também para a sociedade, pois apresenta um risco à saúde pública que requer medidas de prevenção adequadas.
2 METODOLOGIA
Para a realização deste trabalho, optou-se pela utilização da pesquisa de levantamento bibliográfico, através de uma revisão integrativa de natureza descritiva-discursiva. A revisão integrativa é uma modalidade que realiza uma pesquisa ampla, sendo muito utilizada na área de saúde. Ela fornece subsídios para analisar estudos relevantes que possuem evidências e conhecimentos científicos sobre o tema, utilizando abordagens qualitativas e quantitativas, literaturas empíricas e teóricas, fornecendo um panorama completo sobre os conceitos da temática (SOUZA; SILVA; CARVALHO, 2010).
A pesquisa foi realizada no mês de junho, através das plataformas: Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Google Acadêmico; e, utilizou-se artigos obtidos através do cruzamento dos descritores “doença infectocontagiosa”, “mormo”, “equídeos” e “equinos”. Como critério de inclusão, encontra-se todos os artigos publicados entre 2018 e 2023, período de 5 anos, disponíveis de forma gratuita e integralmente online. Já, como critério de exclusão, tem-se os artigos de temáticas diferentes, duplicados e incompletos.
A revisão integrativa se delimitou nas seguintes etapas: seleção da amostra através de buscas em bases de dados, avaliação dos estudos segundo os critérios através da leitura do título, resumo e resultados, categorização das informações dos artigos, interpretação e análise dos dados e, por fim, a apresentação dos resultados. Assim, de 37 artigos avaliados, 10 foram selecionados e contribuíram para a elaboração do trabalho.
Fluxograma 1 – Seleção dos artigos.
Fonte: AUTORES, 2023.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A amostra para essa revisão integrativa da literatura foi composta por 8 artigos, onde um foi publicado em 2019, três em 2020, três em 2021 e um em 2023. Todos são voltados para o estudo da zoonose mormo, bem como o seu agente bacteriano Burkholderia mallei. Em relação ao tipo de estudo, majoritariamente foram de revisão bibliográfica, sendo sete, e um foi estudo transversal, vale ressaltar que todos os estudos foram realizados no Brasil. A Tabela 1 apresenta os resultados, no qual os artigos utilizados foram sintetizados conforme ano, autor, título, objetivo e delineamento do estudo.
Segundo Costa et al. (2023), o pai da Medicina, Hipócrates, descreveu sintomas em equinos que indicavam estar relacionados ao mormo entre os séculos III e IV a.C., mais especificamente no ano de 425 a.C., com isso, essa patologia é considerada uma das mais antigas doenças que afetam equídeos. Originalmente, o mormo é uma doença endêmica nas regiões da Europa Oriental, Meio-Oeste e Sudeste Asiático. No entanto, casos esporádicos têm sido observados também em países ocidentais, como no Brasil (COSTA et al., 2023). Portanto, o mormo foi classificado como um patógeno reemergente, representando um risco crescente de infecções em seres humanos.
O mormo é uma doença zoonótica causada pela bactéria Burkholderia mallei, um cocobacilo gram-negativo. Essa bactéria é aeróbia estrita, não esporulada, imóvel e possui uma espessura de aproximadamente 0,5mm. Sua morfologia pode variar dependendo das condições de cultivo. A doença afeta principalmente equídeos, incluindo equinos, asininos e muares, que são os reservatórios naturais da infecção. No entanto, outras espécies também podem ser afetadas, como pequenos ruminantes, cães, gatos e até mesmo seres humanos (FERRAREZI et al., 2020; COSTA et al., 2023).
A Figura 1 ilustra o cultivo microbiológico da bactéria Burkholderia mallei em ágar com 5% de sangue ovino. Observa-se que as colônias são pequenas, mucosas, de cor acinzentada e não apresentam hemólise.
Tabela 1 – Artigos utilizados na revisão.
Artigo | Autor | Ano | Título | Objetivo | Delineamento |
1 | ROSADO | 2018 | Caracterização epidemiológica do mormo em equídeos no estado da paraíba com base em dados secundários | Caracterizar o mormo na Paraíba, demonstrando a distribuição geográfica da doença no Estado | Estudo transversal |
2 | HENRICH et al | 2019 | Mormo em equinos: revisão de literatura | Caracterizar os aspectos epidemiológicos, etiopatológicos e clínicos do mormo | Revisão de literatura |
3 | FERRAREZI; BIFFI; CAZAROTO; KLAIN; LIMA | 2020 | Burkholderia mallei e o mormo | Revisar a literatura disponível sobre o mormo, ressaltando o agente etiológico da doença, e discutindo sobre sua importância na Medicina Veterinária | Revisão de literatura |
4 | PETINELI; DOS SANTOS; BLANKENHEIM | 2020 | Mormo em equinos: uma revisão | Revisar a etiologia, epidemiologia, patogenia, sinais clínicos, diagnóstico, tratamento, prevenção e controle da bactéria Burkholderia mallei | Revisão de literatura |
5 | SOUZA; ESTELUTI; BOVINO | 2020 | Retrospectiva da incidência e legislação vigente de mormo no Brasil | Relatar a incidência de mormo no Brasil, desde seu primeiro caso até os mais recentes confirmados, e as exigências da legislação vigente de controle | Revisão de literatura |
6 | GOMES; DA SILVA; FERREIRA | 2021 | Doenças de notificação obrigatória de relevância em equídeos no Brasil | Apontar as principais doenças infectocontagiosas que mais acometem equídeos no Brasil | Revisão de literatura |
7 | MEURER | 2021 | Mormo, uma zoonose reemergente: aspectos gerais e principais ferramentas de diagnóstico | Descrever os aspectos gerias do mormo, apresentar dados recentes sobre sua epidemiologia no mundo e no Brasil | Revisão de literatura |
8 | RAMOS et al | 2021 | Avaliação epidemiológica do mormo no Brasil | Analisar o perfil epidemiológico do mormo no Brasil, no período de 2010 a 2019 | Estudo transversal |
9 | CARVALHO | 2022 | Identificação dos fatores de manejo associados à ocorrência do Mormo em equídeos no Nordeste do Brasil | Realizar um estudo epidemiológico da infecção por Burkholderia mallei em equídeos procedentes de propriedades nos estados de Pernambuco e Alagoas | Revisão de literatura |
10 | COSTA et al | 2023 | Aspectos gerais sobre o mormo e seu impacto na saúde pública: revisão de literatura | Abordar os aspectos gerais do mormo, desde o histórico ao estabelecimento da doença em animais e humanos, ressaltando a importância desta zoonose na saúde pública | Revisão de literatura |
Figura 1 – Cultivo microbiológico da Burkholderia mallei.
Fonte: CARVALHO, 2022.
Os humanos geralmente são hospedeiros acidentais da infecção, podendo ocorrer por inoculação cutânea, inalação ou, na maioria dos casos, por contato direto com animais infectados, carcaças ou exposição em laboratório, podendo causar pneumonia e infecções mais graves. O mormo é altamente contagioso para os equídeos e pode ser fatal para os seres humanos (MEURER, 2021; RAMOS et al., 2021).
O primeiro relato documentado da presença do mormo no Brasil ocorreu em 1811, na Ilha de Marajó, suspeitas apontam que a doença foi introduzida por animais importados da Europa. Na época, vários surtos de epizootias ocorreram em todo o país, afetando muares, cavalos e até mesmo seres humanos, que apresentaram sintomas de catarro e cancro nasal (PETINELI; SANTOS; BLANKENHEIM, 2020).
Com o objetivo de controlar os surtos, foram contratados profissionais de medicina veterinária franceses. No entanto, os prejuízos e perdas no rebanho foram significativos. Após muitos relatos da ocorrência da doença em equídeos e humanos, parecia que o mormo havia sido erradicado no Brasil na década de 60. A última ocorrência registrada da doença foi em 1968, na cidade de São Lourenço da Mata, em Pernambuco. No entanto, após um período de 30 anos, foram notificados novos casos da doença em 1999, nos estados de Alagoas e Pernambuco (SOUZA; ESTELUTI; BOVINO, 2020; COSTA et al., 2023).
A Burkholderia mallei é um patógeno intracelular obrigatório, o que significa que depende de um hospedeiro para sobreviver. Além disso, é sensível à luz solar, calor e desinfetantes comuns, como iodo e etanol. Em ambientes úmidos, pode sobreviver por um período de 3 a 5 semanas no máximo. No entanto, esse bacilo é destruído em apenas 10 minutos quando exposto a uma temperatura de 55°C. As infecções causadas por essa bactéria podem variar de agudas a crônicas (FERRAREZI et al., 2020; MEURER, 2021).
Henrich et al. (2019) e Petineli, Santos e Blankenheim (2020) destacam que a idade é um fator importante no surgimento da forma crônica da infecção natural, sendo mais prevalente em animais idosos e debilitados devido às más condições de manejo e estresse. No entanto, Souza, Esteluti, Bovino (2020) e Ramos et al. (2021) discordam, apontando que os equídeos de todas as idades e sexos são suscetíveis à infecção, mas concordam quanto a maior probabilidade de ocorrer quando o animal é exposto a condições predisponentes, como estresse, má alimentação e habitação em ambientes contaminados.
O agente Burkholderia mallei penetra na mucosa intestinal e, em seguida, alcança a corrente sanguínea, resultando em septicemia e, posteriormente, bacteremia. O microrganismo pode ser encontrado nos pulmões, bem como na pele e na mucosa nasal. Nos animais infectados, formam-se lesões primárias no local de entrada (faringe), que se espalham para o sistema linfático, onde causam lesões nodulares. Lesões metastáticas também podem ocorrer nos pulmões e em outros órgãos, como baço, fígado e pele. No septo nasal, podem ocorrer lesões primárias de origem hematógena ou secundária a um foco pulmonar (HENRICH et al., 2019).
Os sinais clínicos comuns do mormo incluem febre, tosse e corrimento nasal. As lesões nodulares podem evoluir para úlceras e, após a cicatrização, formar lesões em forma de estrela. Essas lesões ocorrem principalmente na fase crônica da doença, que pode se manifestar de três formas diferentes: cutânea, linfática e respiratória. No entanto, um mesmo animal pode apresentar todas essas formas ao mesmo tempo. O período de incubação do mormo pode variar de três dias a meses, e na fase aguda pode ocorrer edema na região peitoral e levar o animal à morte em 48 horas. A doença também pode causar septicemia na fase aguda e apresentar sintomas como pneumonia crônica, tosse, dispneia, febre, apatia e caquexia na fase crônica (HENRICH et al., 2019; SOUZA; ESTELUTI; BOVINO, 2020; PETINELI; SANTOS; BLANKENHEIM, 2020; RAMOS et al., 2021).
Na forma nasal do mormo, o animal pode apresentar inicialmente um corrimento nasal seroso, que pode ser unilateral, e com o tempo evoluir para uma secreção purulenta de cor amarelada a purulenta hemorrágica. Essa secreção pode se tornar bilateral. Nos casos crônicos da doença, os equinos afetados podem ter tosse acompanhada de sangramento nasal (epistaxe) e dificuldade respiratória (dispneia). Além disso, podem apresentar lesões no septo nasal, secreção nasal purulenta e congestão. Esses sinais clínicos variam de acordo com a via de infecção (PETINELI; SANTOS; BLANKENHEIM, 2020; GOMES; SILVA; FERREIRA, 2021).
Na Figura 2, pode-se observar o corrimento nasal em equinos afetados pelo mormo. Na imagem (A), é possível ver um corrimento nasal mucopurulento. Já na imagem (B), o corrimento nasal mucopurulento está associado a crostas.
Figura 2 – Corrimento nasal em equinos com mormo.
Fonte: ROSADO, 2018.
Já, na Figura 3, pode-se observar um caso de mormo cutâneo em um equino. Na imagem (A), são visíveis nódulos cutâneos e edema no membro pélvico direito, resultante de uma linfangite. Na imagem (B), na região caudal da coxa, pode-se observar úlceras multifocais e coalescentes.
Figura 3 – Mormo cutâneo em um equino.
Fonte: ROSADO, 2018.
Nesse sentido, o diagnóstico do mormo consiste na avaliação dos aspectos clínicos, epidemiológicos, anatômicos e histopatológicos, além da identificação da bactéria Burkholderia mallei por meio de isolamento ou métodos moleculares. Testes sorológicos como a Fixação do Complemento (FC) e Ensaio de Imunoabsorção Enzimática (ELISA), também são utilizados, assim como a reação imunoalérgica (maleinização). O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) recomenda a realização dos testes de fixação do complemento e maleinização para fins de diagnóstico e controle da doença. No entanto, todos os testes sorológicos podem apresentar resultados imprecisos até seis semanas após a realização do teste de maleína (HENRICH et al., 2019; FERRAREZI et al., 2020).
A portaria n°35 de 17 de abril de 2018 estabelece que os testes oficiais para o diagnóstico laboratorial do mormo são a FC ou ELISA, podendo ser complementados pelo teste de Western Blotting (WB). O Ministério estabelece que o teste de FC e o ELISA sejam realizados por laboratórios credenciados, enquanto o exame de WB deve ser realizado apenas pelo laboratório do Serviço Veterinário Oficial (SVO). A maleinização e a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) ainda podem ser utilizadas em situações específicas com autorização do Ministério (FERRAREZI et al., 2020; PETINELI; SANTOS; BLANKENHEIM, 2020; COSTA et al., 2023).
A bactéria Burkholderia mallei possui alta resistência a antibióticos devido à presença de 33 genes em seu genoma (FERRAREZI et al., 2020). Não há vacinas eficazes para prevenir a infecção por essa bactéria em animais ou humanos. O tratamento com antibióticos é proibido pelo MAPA devido ao risco de transmissão para humanos (PETINELI; SANTOS; BLANKENHEIM, 2020; HENRICH et al., 2019). Em áreas endêmicas, os animais suscetíveis devem ser isolados e afastados de outros, evitando o compartilhamento de utensílios. As instalações devem ser mantidas em quarentena, com limpeza e desinfecção adequada (FERRAREZI et al., 2020).
Os animais reagentes positivos devem ser submetidos a testes de rotina ou eutanásia para contribuir para a erradicação da doença. A disseminação da doença ocorre principalmente pela secreção oral e nasal, através da contaminação de forragens, bebedouros e cochos. A infecção por inalação de partículas não é comum. O mormo não tem cura, e animais positivos devem ser sacrificados e os materiais contaminados devem ser incinerados ou enterrados no local (PETINELI; SANTOS; BLANKENHEIM, 2020; RAMOS et al., 2021).
Segundo o MAPA, o mormo está presente em vários estados brasileiros, incluindo Acre, Alagoas, Amazonas, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima e Sergipe (FERRAREZI et al., 2020). Ele ainda que suspeitas de mormo em animais sejam informadas às autoridades competentes, como as Secretarias Estaduais de Agricultura e/ou o próprio MAPA, e também ao Ministério da Saúde. O mormo é uma doença de notificação obrigatória no Brasil, e ações coordenadas são realizadas pelo Programa Nacional de Sanidade dos Equídeos (PNSE) (GOMES; SILVA; FERREIRA, 2021).
A notificação é importante devido à falta de vacinas eficazes e tratamentos, além do potencial zoonótico. Souza, Esteluti e Bovino (2020) expressam que entre 2006 e 2015, foram registrados 582 casos de mormo no Brasil, com uma média de 58 casos por ano, onde a região Nordeste concentrou a maioria dos casos, o que pode ser explicada pela grande quantidade de equídeos utilizados no transporte da cana-de-açúcar, que não recebem o manejo sanitário adequado. Além disso, esses animais são mantidos em ambientes coletivos com pouca ventilação e alta umidade, o que facilita a disseminação da bactéria.
Na Bahia, o primeiro registro de mormo ocorreu em 2012, e o último surto significativo foi em 2019, em uma fazenda ilegal de criação de jumentos para abate e exportação de carne, localizada em Euclides da Cunha. Durante o surto, dois animais infectados foram sacrificados e a propriedade foi temporariamente interditada. Também foram relatados casos de mormo em Feira de Santana no mesmo ano. No primeiro semestre de 2023, foram registradas vinte ocorrências, com seis animais testando positivo para mormo, dois testando negativo e sete aguardando resultados (G1, 2019; ADAB, 2023).
4 CONCLUSÃO
Durante o desenvolvimento do estudo, foi observado que o mormo é uma doença grave, de natureza infectocontagiosa, que afeta principalmente os equídeos e, ocasionalmente, os humanos, tornando-se uma zoonose. Devido à sua alta capacidade de contaminação, a bactéria Burkholderia mallei representa um grande risco para a saúde em geral. Portanto, é necessário implementar uma rigorosa fiscalização, incluindo o monitoramento ativo dos animais e o controle epidemiológico, identificando áreas de foco e interditando zonas suspeitas, a fim de controlar a endemia no país.
Quando os animais apresentarem qualquer sinal de suspeita, é importante colocá-los em quarentena e isolá-los de outros animais até que um diagnóstico seja obtido. Se confirmado, as medidas de profilaxia e controle incluem a limpeza adequada do local, além da eutanásia e incineração da carcaça do animal. A legislação atual de controle e erradicação da doença estabelece novos testes, como o FC ou ELISA e o WB, para triagem e confirmação, respectivamente. A utilização desses métodos de diagnóstico reduz os resultados falso-positivos e inconclusivos, tornando o diagnóstico mais preciso e eficiente.
Diante disso, é crucial implementar medidas de controle afim de evitar a propagação da enfermidade no país. Vale ressaltar, que existem poucos estudos epidemiológicos disponíveis na literatura sobre o mormo, tanto no Brasil quanto no mundo, em comparação com outras doenças infecciosas. Aliado a isso, a falta de um tratamento eficaz, destaca a importância da disseminação de informações sobre a doença, a fim de prevenir novos casos. Assim, é necessário aumentar a divulgação e a conscientização sobre a ocorrência do mormo no Brasil, com o objetivo de facilitar a implementação de medidas preventivas, controle e investigação, reduzindo os danos causados por essa doença.
REFERÊNCIAS
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CARVALHO, J. C. S. Identificação dos fatores de manejo associados à ocorrência do Mormo em equídeos no Nordeste do Brasil. 2022. Dissertação (Mestrado em Ciência Animal) – Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, 2022.
COSTA, Maria Lucília Machado da et al. Aspectos gerais sobre o mormo e seu impacto na saúde pública: revisão de literatura. Rev. Univer. Bras., v.1, n.2. p. 27-34, 2023.
FERRAREZI, B. F.; BIFFI, B. M.; CAZAROTO, B. A.; KLAIN, P.; LIMA, S. R. Burkholderia mallei e o mormo. Revista Intellectus, v. 56, n. 1, p. 91-100, 2020.
G1. Após surto entre jumentos criados para exportação de carne, doença do mormo é controlada na Bahia. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2019/09/21/apos-surto-entre-jumentos criados-para-exportacao-de-carne-doenca-do-mormo-e-controlada-na bahia.ghtml. Acesso em: 02 out. 2023.
GOMES, L. R.; DA SILVA, G. R.; FERREIRA, A. L. M. Doenças de notificação obrigatória de relevância em equídeos no Brasil. Enciclopédia Biosfera, Centro Científico Conhecer, v.18, n.35, p. 81-95, 2021.
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