CÂNCER DE MAMA NO BRASIL – PREVALÊNCIA ENTRE 2014 E 2023 – E A IMPORTÂNCIA DA MAMOGRAFIA NO RASTREAMENTO

BREAST CANCER IN BRAZIL – PREVALENCE BETWEEN 2014 AND 2023 – AND THE IMPORTANCE OF MAMMOGRAPHY IN SCREENING

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202411301359


Drª Grazielly Soares Evangelista1;
Orientadora Drª Mara Costa Dutra2


RESUMO

O câncer de mama é uma das neoplasias mais prevalentes entre as mulheres e uma das principais causas de mortalidade oncológica mundialmente, com variações influenciadas por fatores genéticos, ambientais e socioeconômicos. No Brasil, o número de casos tem aumentado nos últimos anos, refletindo, entre outros fatores, as desigualdades no acesso aos serviços de saúde, com taxas de incidência variando entre as regiões. A detecção precoce, especialmente por meio da mamografia, é fundamental para reduzir as taxas de mortalidade, mas a cobertura do exame ainda é insuficiente, com grandes disparidades regionais. Comparado aos países desenvolvidos, onde o rastreamento é mais amplo – uma vez que iniciado mais em mais jovens, o Brasil enfrenta desafios na implementação efetiva do rastreamento mamográfico adequado. Neste contexto, o presente artigo visa revisar os dados epidemiológicos do câncer de mama no Brasil nos últimos 10 anos, isto é, entre 2014 e 2023, e analisar o impacto e a cobertura da mamografia como método de rastreamento. Também pretende-se revisar a literatura científica mais atual quanto às recomendações de rastreamento e seu impacto na prevenção à neoplasia maligna de mama.

Palavras-chave: Câncer de mama. Rastreamento. Mamografia.

ABSTRACT

Breast cancer is one of the most prevalent neoplasms among women and a leading cause of cancer-related mortality worldwide, with variations influenced by genetic, environmental, and socioeconomic factors. In Brazil, the number of cases has risen in recent years, reflecting, among other factors, inequalities in access to healthcare services, with incidence rates varying across regions. Early detection, particularly through mammography, is crucial for reducing mortality rates; however, exam coverage remains insufficient, with significant regional disparities. Compared to developed countries, where screening programs are broader and initiated at younger ages, Brazil faces challenges in effectively implementing adequate mammographic screening. In this context, the present article aims to review epidemiological data on breast cancer in Brazil over the past decade, specifically from 2014 to 2023, and to analyze the impact and coverage of mammography as a screening method. Additionally, it seeks to review the latest scientific literature regarding screening recommendations and their impact on preventing malignant breast neoplasms.

Keywords: Breast cancer. Screening. Mammography.

1. INTRODUÇÃO

O câncer de mama representa uma das neoplasias de maior prevalência entre as mulheres mundialmente e é uma das principais causas de mortalidade oncológica, com variações epidemiológicas influenciadas por fatores genéticos, ambientais, socioeconômicos e estilos de vida (BUI et al., 1996; CASTRO-ESPIN; AGUDO, 2022). No Brasil, os dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) refletem uma realidade alarmante: o número de casos de câncer de mama tem mostrado uma tendência de crescimento ao longo dos últimos anos, com taxas de incidência variando consideravelmente entre as regiões do país, refletindo desigualdades socioeconômicas e de acesso aos serviços de saúde.

Segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (INCA), em 2023, o Brasil registrou aproximadamente 73 mil novos casos de câncer de mama, correspondendo a uma taxa de incidência de 66,54 casos para cada 100 mil mulheres (INCA, 2023). Estes dados são particularmente preocupantes quando comparados com os números de uma década atrás, refletindo o aumento do envelhecimento populacional e de fatores de risco associados, como sedentarismo, obesidade e consumo de álcool (PIZOT et al., 2016; SOLMUNDE et al., 2023). Paralelamente, estudos evidenciam que as taxas de mortalidade por câncer de mama podem ser reduzidas com a detecção precoce da doença por meio de estratégias de rastreamento populacional, sendo a mamografia o método mais amplamente utilizado e recomendado (CUOGHI et al., 2022).

 A mamografia de rastreamento consiste em um exame radiológico que permite a detecção de lesões assintomáticas, em estágios iniciais, aumentando as chances de tratamento menos invasivo e de melhor prognóstico (FEIG, 2015; NELSON et al., 2016). No Brasil, o SUS segue as diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde, recomendando a realização de mamografias para mulheres entre 50 e 69 anos a cada dois anos. No entanto, a adesão a essas diretrizes e a cobertura do exame apresentam grandes disparidades regionais, que se refletem na redução da efetividade do rastreamento populacional (ANTONINI et al,. 2022).

 Dados recentes do DATASUS mostram uma evolução no número de mamografias realizadas nos últimos anos, porém, esse número ainda está abaixo do necessário para uma cobertura ideal. Em 2022, foram realizadas aproximadamente 4 milhões de mamografias no Brasil, quantidade insuficiente para atingir a população alvo preconizada (HANNA et al., 2020).

Diante da relevância da mamografia na detecção precoce do câncer de mama, este artigo tem como objetivo revisar os dados epidemiológicos do câncer de mama no Brasil, entre 2014 e 2023, e analisar o impacto e a cobertura da mamografia como método de rastreamento. A análise dos dados do DATASUS e a comparação com as diretrizes de rastreamento de outros países, bem como a observação das recomendações das sociedades ginecológicas nacionais e internacionais, são fundamentais para compreender o cenário brasileiro e propor melhorias na política de rastreamento do SUS.

2. METODOLOGIA

Este estudo utilizou uma abordagem observacional e retrospectiva para avaliar a evolução epidemiológica do câncer de mama no Brasil entre 2014 e 2023 e revisar a literatura científica sobre a importância da mamografia no rastreamento da doença. O objetivo principal foi descrever e interpretar os dados relativos à incidência e mortalidade por câncer de mama no Brasil, considerando variáveis sociodemográficas e as diretrizes de rastreamento, com foco na mamografia como ferramenta diagnóstica.

O presente trabalho constitui-se em um estudo observacional, de natureza quantitativa e retrospectiva, fundamentado na análise de dados secundários obtidos do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), ambos acessados por meio do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). Além disso, foram consultadas bases de dados internacionais de literatura científica para revisão das diretrizes atuais sobre o rastreamento do câncer de mama, incluindo as recomendações sobre mamografia. Para garantir a completude e qualidade dos dados, foram excluídos os registros incompletos ou inconsistentes, seguindo critérios padronizados de qualidade para estudos epidemiológicos. As variáveis estudadas foram idade, agrupada em faixas etárias (20-39, 40-49, 50-69 e ≥70 anos), com especial foco no grupo-alvo recomendado para rastreamento (50-69 anos); cor/raça, segundo as categorias autodeclaradas no cadastro de atendimento, conforme classificação do IBGE.

Adicionalmente, foram extraídos dados sobre o número de mamografias realizadas anualmente, com foco em mulheres na faixa etária recomendada para rastreamento. Esse dado foi coletado no Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS), considerando o procedimento de mamografia de rastreamento.

Para a análise da literatura, foi realizada uma revisão sistemática em bases de dados internacionais, como PubMed, Scopus e Web of Science, utilizando os termos “breast cancer,” “mammography,” e “breast cancer incidence and mortality.” Estudos que abordavam diretrizes de rastreamento do câncer de mama e revisões sobre a efetividade da mamografia para diagnóstico precoce foram selecionados. A literatura foi limitada a artigos publicados nos últimos dez anos, garantindo a inclusão de evidências mais recentes e relevantes.

Por se tratar de um estudo com dados secundários de domínio público, extraídos de sistemas de informação nacionais, não houve a necessidade de aprovação por comitê de ética. No entanto, todas as etapas do estudo foram conduzidas respeitando as normas éticas de pesquisa com dados de saúde pública. Os gráficos e tabelas foram elaborados utilizando-se ferramentas do Microsoft Office, e estatística simples, como média aritmética e frequências absoluta.

3. RESULTADOS

Nos últimos 10 anos, isto é, de 2014 a 2023 – último ano com números compilados no DATASUS, houve 684.588 internações por neoplasia maligna de mama no Brasil. O ano com maior número de internações foi o de 2023, com 81.809 internações, e o de menor número de internações foi o de 2015, com 59.404 internações. Quanto ao número de óbitos, em números absolutos, o ano de 2022 foi o com maior número de óbitos (n = 6.246). Já no que toca à taxa de mortalidade, de forma geral, a taxa permanece em 8,23% das internações, com maior mortalidade no ano de 2020. Tais dados podem ser melhor visualizados na tabela (tabela 1) e gráfico abaixo (gráfico 1).

Tabela 1. Número de internações, óbitos e taxa mortalidade da neoplasia maligna de mama, no Brasil, nos últimos 10 anos (2014 a 2023).

Gráfico 1. Número de internações por neoplasia maligna de mama, no Brasil, nos últimos 10 anos (2014 a 2023).

FONTE: DATASUS, 2024

O número de internações aumentou ao longo dos anos, com um pico em 2023, onde se registraram 81.809 internações, enquanto o mínimo foi em 2015, com 59.404. Em relação à mortalidade, o total foi de 56.283, resultando em uma média de 5.628,3 mortes por ano. O máximo de mortalidade ocorreu em 2022, com 6.246 óbitos, e o mínimo foi em 2015, com 4.907. Observa-se que a mortalidade apresentou um aumento gradual, especialmente no ano de 2022, seguido por uma leve queda em 2023. A taxa de mortalidade média foi de 8,23%, com um máximo de 8,57% em 2020 e um mínimo de 7,51% em 2023. Essa taxa mostra uma leve tendência de queda nos últimos anos, particularmente a partir de 2022 (gráfico 2).

Gráfico 2. Número de óbitos e taxa de mortalidade por neoplasia maligna de mama nos últimos 10 anos (2014- 2023)

FONTE (DATASUS, 2024)

Quanto aos dados sobre a neoplasia maligna de mama conforme a faixa etária, a análise revela que a faixa etária com maior número de internações é a de 50 a 59 anos (189.813), enquanto as menores são observadas entre menores de 1 ano (135) e de 1 a 4 anos (39) – o que levanta a possibilidade de erros de registro, haja vista a improbabilidade de câncer de mama nessas faixas etárias. Nota-se um aumento progressivo nas internações até os 50-59 anos, seguido de redução nas idades mais avançadas. Em relação aos óbitos, o maior número absoluto ocorre entre 50 a 59 anos (15.157), mas a maior taxa de mortalidade é observada em idosos com mais de 80 anos (16,62%), refletindo maior vulnerabilidade dessa população (tabela 2 e gráfico 3). Adolescentes e jovens adultos (10 a 19 anos) possuem taxas de internação e mortalidade mais baixas, variando de 0,5% a 1,72%. Essa análise demonstra como a mortalidade é proporcionalmente mais impactante nos extremos de idade.

Tabela 2. Internações, óbitos e taxa de mortalidade por neoplasia maligna de mama, no Brasil, nos últimos 10 anos (2014 a 2023)

Gráfico 3. Óbitos e taxa de mortalidade por neoplasia maligna de mama, nos últimos 10 anos (2014 a 2023), no Brasil, conforme a faixa etária.

Por fim, quanto aos números relacionados à cor ou raça, conforme nomenclatura do DATASUS, nota-se diferenças significativas em termos absolutos e proporcionais de internações e óbitos. Mulheres brancas representam a maior parte das internações (305.529) e óbitos (24.505), correspondendo a cerca de 44,6% do total de internações e 43,5% dos óbitos. Em seguida, as mulheres pardas apresentam números expressivos, com 260.695 internações (38,1%) e 20.602 óbitos (36,6%). Já as mulheres pretas, embora com números absolutos menores (43.501 internações e 4.299 óbitos), possuem taxas de internação e mortalidade proporcionalmente significativas, no contexto das desigualdades raciais. Mulheres amarelas e indígenas apresentam números absolutos bem menores, com 7.830 internações e 669 óbitos entre as amarelas e 121 internações e 15 óbitos entre as indígenas, sugerindo possíveis subnotificações ou menor acesso ao diagnóstico e tratamento. Há também um número elevado de registros sem informação (66.912 internações e 6.193 óbitos), indicando lacunas nos dados que dificultam análises mais precisas.

Tabela 3. Número de internações, óbitos e taxa de mortalidade da neoplasia maligna de mama, no Brasil, nos últimos 10 anos (2014 a 2023), conforme a cor ou raça.

4. DISCUSSÃO

As recomendações de rastreamento do câncer de mama variam entre Brasil, Europa e Estados Unidos devido a diferenças nos sistemas de saúde e na interpretação das evidências científicas. No Brasil, o Ministério da Saúde recomenda mamografia bienal para mulheres de 50 a 69 anos, enquanto sociedades médicas defendem a realização anual entre 40 e 74 anos, considerando fatores de risco (FACINA, 2016). Na Europa, prevalece a mamografia bienal para mulheres de 50 a 69 anos, com variações regionais que ampliam a faixa etária ou personalizam conforme características individuais (SCHUNEMANN, 2020). Nos Estados Unidos, a USPSTF recomenda mamografias bienais de 50 a 74 anos, enquanto a American Cancer Society propõe início aos 40 anos, com periodicidade ajustada às preferências pessoais e maior uso de tecnologias como tomossíntese e ressonância magnética em casos de risco elevado (VENKATESAN, 2023). Essas diferenças refletem o desafio de equilibrar os benefícios do diagnóstico precoce com os riscos de sobrediagnóstico e sobretratamento.

Nos últimos 10 anos (2014 a 2023), as estatísticas de câncer de mama nos Estados Unidos, Europa e Brasil apresentam variações importantes em incidência, mortalidade e eficácia de programas de rastreamento. Nos Estados Unidos, a American Cancer Society (2023) reportou que a taxa de incidência do câncer de mama permanece estável, com cerca de 127 casos por 100.000 mulheres. Em 2023, foram estimados aproximadamente 297.790 novos casos de câncer de mama invasivo, além de 55.720 casos in situ, representando 31% de todos os novos casos de câncer entre mulheres. A mortalidade caiu 43% desde 1989, devido a avanços no diagnóstico e tratamento, embora ainda existam disparidades raciais significativas. Em termos de rastreamento, 72% das mulheres elegíveis realizaram mamografias em 2022, o que contribuiu para uma taxa de sobrevivência superior a 90% nos estágios iniciais da doença (AMERICAN CANCER SOCIETY, 2023).

 Na Europa, segundo o European Cancer Information System (2023), as taxas de incidência são maiores que às dos EUA, mas apresentam variações importantes entre os países. A taxa de incidência de câncer de mama na Europa varia entre os países, com índices ajustados de 100 a 194 casos por 100.000 mulheres em 2020. Este tipo de câncer correspondeu a cerca de 28,7% de todos os novos diagnósticos oncológicos entre mulheres na União Europeia naquele ano, consolidando-se como o câncer mais frequente em mulheres no continente. Diferenças nas taxas refletem fatores como estilos de vida, práticas de rastreamento e acesso a serviços de saúde. Regiões do Norte e Oeste da Europa geralmente apresentam maiores incidências devido a programas amplos de rastreamento, que também favorecem diagnósticos precoces (FERLAY et al., 2021). A Europa Ocidental exibe taxas de sobrevivência acima de 85%, reflexo de melhores sistemas de saúde e programas de rastreamento abrangentes, enquanto países da Europa Oriental enfrentam desafios estruturais. Programas organizados de rastreamento mamográfico são comuns na Europa, com taxas de cobertura entre 60% e 90%, dependendo da região (European Cancer Information System, 2023).

 No Brasil, o câncer de mama é o mais prevalente entre mulheres, com taxa de incidência de aproximadamente 66 casos por 100.000, inferior às registradas nos EUA e na Europa (INCA, 2023). No entanto, a mortalidade é elevada devido ao diagnóstico tardio e às limitações no acesso ao tratamento. A cobertura de rastreamento no país permanece baixa, atingindo menos de 50% das mulheres na faixa etária alvo em 2019, com desigualdades regionais importantes.

Esses dados refletem a importância de programas organizados de rastreamento. Enquanto os EUA e a Europa mostram maior eficácia em seus programas, o Brasil enfrenta desafios estruturais para atingir níveis comparáveis de diagnóstico precoce e sobrevida (American Cancer Society, 2023; ECIS, 2023; INCA, 2023).

O câncer de mama permanece uma das principais causas de morbimortalidade global, com atrasos no tratamento associados a aumento significativo da mortalidade, cerca de 6-8% por cada mês de atraso (HR = 1,08/mês; IC 95%: 1,06–1,10; p < 0,001), sendo os atrasos em cirurgias curativas particularmente graves (RR = 1,09/mês; IC 95%: 1,04–1,14; p = 0,002) (HANNA et al., 2020). No Brasil, embora 4,2 milhões de mamografias tenham sido realizadas pelo SUS em 2022, persistem desigualdades regionais que afetam a cobertura (INCA, 2022). Estratégias integradas de rastreamento, acesso a tratamentos e intervenções preventivas são essenciais para reduzir o impacto da doença (MARCELINO et al., 2023).

A baixa adesão às diretrizes oficiais é evidenciada por Antonini et al. (2024), que identificaram que apenas 48% dos médicos brasileiros conheciam corretamente as recomendações do Ministério da Saúde (p < 0,01). Campanhas como o Outubro Rosa aumentam temporariamente o número de mamografias, mas não sustentam a prática preventiva, com queda de 12% nos meses subsequentes (p < 0,001). Dados internacionais confirmam que o rastreamento mamográfico reduz a mortalidade em mulheres de 50 a 69 anos (RR = 0,80; IC 95%: 0,73–0,89; p < 0,001), enquanto em mulheres de 40 a 49 anos a redução é menor (RR = 0,85; IC 95%: 0,75–0,95; p = 0,01) (NELSON et al., 2016).

 Apesar dos benefícios, o rastreamento enfrenta desafios como sobrediagnóstico e manejo de achados incidentais. Feig (2015) minimiza o impacto clínico do sobrediagnóstico frente à redução da mortalidade. Por outro lado, a incidência crescente em mulheres jovens (<40 anos) reforça a necessidade de políticas específicas para alto risco, já que 14% dos casos entre 2010 e 2020 ocorreram nesse grupo, com aumento médio de 2,5% ao ano (p < 0,01) (BONADIO; MOREIRA; TESTA, 2022). Desigualdades regionais e étnicas também impactam negativamente o prognóstico, como evidenciado por menor sobrevida ajustada em mulheres negras (HR = 1,35; IC 95%: 1,12–1,62; p = 0,002) (MARCELINO et al., 2023).

 Estilo de vida e terapias adjuvantes têm papel relevante na prevenção e tratamento. Atividade física regular reduz o risco de câncer em até 25% (RR = 0,75; IC 95%: 0,66–0,85; p < 0,001), enquanto dietas saudáveis podem diminuir mortalidade e recidiva (CASTRO-ESPIN; AGUDO, 2022). Por outro lado, a terapia de reposição hormonal eleva substancialmente o risco de desenvolvimento da doença (PIZOT et al., 2016). No contexto terapêutico, a supressão ovariana combinada ao tamoxifeno reduziu a recorrência em 20% (RR = 0,80; IC 95%: 0,72–0,90; p < 0,001), com melhora significativa na sobrevida (HR = 0,76; IC 95%: 0,64–0,91; p = 0,002) (BUI et al., 2020).

 A pandemia de COVID-19 agravou atrasos no rastreamento e no tratamento. Entre 2019 e 2021, houve redução de 47% no número de mamografias no Brasil, resultando em aumento de casos avançados (+5%, p = 0,02) (BESSA; NOVITA; FREITAS-JUNIOR, 2022). Investimentos na atenção primária, como demonstrado por Sala et al. (2021), podem melhorar a adesão ao rastreamento (OR = 1,30; IC 95%: 1,10–1,54; p < 0,01), contribuindo para reduzir o impacto da doença.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo apresenta limitações inerentes ao uso de dados secundários, como a possibilidade de subnotificação ou inconsistência nos registros, além da falta de dados específicos para alguns aspectos da doença. A revisão da literatura científica apresenta o risco de viés de seleção, embora o uso de critérios claros de inclusão tenha buscado minimizar esse impacto.

O aumento nas internações pode refletir uma maior conscientização e diagnóstico mais frequente de neoplasias malignas de mama, mas a mortalidade ainda é uma preocupação significativa. A diminuição da taxa de mortalidade – marcadamente entre 2020 e 2023, pode sugerir progressos no rastreamento, e tratamento, embora também possa ser atribuída a elementos externos, como a pandemia de COVID-19 (BESSA; NOVITA; FREITAS-JUNIOR (2022) Portanto, é essencial continuar monitorando essas métricas para entender melhor as tendências, além de investir em programas de prevenção e aprimoramento dos cuidados, visando reduzir a mortalidade por essa condição e realizar estudos adicionais para investigar as causas subjacentes do aumento da mortalidade em anos críticos.

Percebe-se que houve importantes avanços e desafios na abordagem do câncer de mama no Brasil ao longo da última década. A análise evidencia um aumento no número de internações por neoplasia maligna de mama, atingindo o pico em 2023, com mais de 81 mil casos, enquanto a mortalidade também apresentou elevações pontuais, especialmente em 2020 e 2022. A taxa média de mortalidade foi de 8,23%, com uma leve tendência de redução nos últimos anos, o que sugere progressos nos esforços de detecção precoce e manejo da doença. Ainda assim, a desigualdade regional e racial, refletida nos dados, permanece um ponto crítico. Mulheres negras, indígenas e de regiões menos favorecidas continuam a apresentar maiores desafios em termos de acesso ao diagnóstico e tratamento.

 A mamografia é um método essencial no rastreamento e na detecção precoce do câncer de mama, especialmente em estágios iniciais, com taxas de realização que, apesar de terem aumentado, ainda não atingem a cobertura ideal da população-alvo. Em 2022, foram realizadas mais de 4 milhões de mamografias pelo SUS, porém, a cobertura nacional foi insuficiente para alcançar um impacto mais robusto na mortalidade. As políticas públicas precisam se concentrar em melhorar o acesso a exames e tratamentos, especialmente para grupos vulneráveis. Além disso, a análise destaca que campanhas de conscientização, como o Outubro Rosa, enquanto eficazes para aumentar momentaneamente a adesão, não têm sido suficientes para promover mudanças sustentáveis no comportamento da população.

 Os resultados enfatizam a necessidade de um sistema de saúde que priorize intervenções equitativas, integrando estratégias educacionais, ampliação do acesso ao rastreamento e infraestrutura adequada para manejo da doença em todas as regiões. A redução sustentável da mortalidade por câncer de mama no Brasil exige não apenas avanços técnicos, mas também esforços sistemáticos para reduzir desigualdades e promover o cuidado centrado na paciente, complementados por mais pesquisas que explorem barreiras estruturais e sociais que ainda limitam a efetividade do sistema atual.

Conclui-se que, embora tenham ocorrido avanços na prevenção do câncer de mama no Brasil, com ampliação de programas de rastreamento, os dados de mortalidade e internações permanecem elevados. Há uma necessidade urgente de fortalecer políticas públicas que promovam o acesso equitativo ao rastreamento, especialmente em populações vulneráveis. Para que a prevenção seja efetiva, é fundamental que sejam superados os desafios relacionados à conscientização e adesão da população, bem como à capacitação de profissionais de saúde para o atendimento adequado. Mais trabalhos são necessários para caracterizar melhor essa realidade.

5. REFERÊNCIAS

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1Médica Residente Em Ginecologia E Obstetrícia
Fundação Universitária Evangélica

2Mestre Em Patologia Mamária – Ufmg
Mastologista
Professora Assistente Da Pontifícia Universidade Católica De Goiás