BIOSSEGURANÇA EM BIOMEDICINA ESTÉTICA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8111508


Lize Souza De Oliveira Falcão


RESUMO- Este artigo tem por objetivo aprofundar o estudo das práticas de biossegurança relacionadas À Biomedicina Estética. Trata-se de uma revisão bibliográfica sobre o assunto, a qual abrange o conceito de Biossegurança, os principais riscos que envolvem a Biomedicina Estética, o uso dos Equipamentos de Proteção Individual, incluindo as vestimentas e seu trato enquanto item de Biossegurança. Esta revisão bibliográfica utiliza-se de dissertações de conclusão de mestrados, informações oficiais de órgãos governamentais, artigos de revistas científicas e textos retirados da bibliografia tradicional da área, constituindo-se como artigo científico de Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção de grau de Pós Graduação em Biomedicina Estética.

PALAVRAS-CHAVE: Biomedicina Estética. Biossegurança. EPI´s.

1.INTRODUÇÃO

No Brasil, o conceito de biossegurança e sua aplicação em todo o território nacional foi definido pela Lei de Biossegurança, n. 11.105, de 24 de março de 2005, da Presidência da República. Esta lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização, entre outras determinações sobre manipulação, cultivo, transporte, transferência, importação, exportação, armazenamento, pesquisa e descarte de microrganismos geneticamente modificados e seus derivados, dentro de um princípio de segurança total para o homem e o meio ambiente, e que se aplica, por extensão, à manipulação de todo e qualquer microrganismo vivo de interesse, uma vez que a biossegurança é, em sua essência, um conceito universal independentemente do microrganismo manipulado. (TEIXEIRA, 1996, p. 396)

Outro agravante é que no Brasil, com o crescimento do número de clínicas e profissionais autônomos, as ações preventivas acabam se tornando falhas, abrindo um precedente para contaminações com os mais variados agentes patogênicos (PIATTI, 2018.). As estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) são da ocorrência mundial de três milhões de acidentes percutâneos com agulhas contaminadas por material biológico por ano entre trabalhadores da área da saúde. Baseando-se em um modelo de estudo de carga de doenças, a OMS considera que, em 2000, possam ter ocorrido 16 mil casos de hepatite C, 66 mil de hepatite B e mil de infecção pelo HIV devido a exposições ocupacionais percutâneas entre estes trabalhadores. (TEIXEIRA, 1996, p. 419)

Este artigo trata da relação entre o correto uso dos Equipamentos de Proteção Individuais e a minimização dos riscos inerentes à biossegurança, além de buscar explicar os conceitos de biossegurança

A disponibilização de informações técnicas que envolvam biossegurança, baseadas em legislações específicas do segmento de beleza e estética é essencial para direcionar a prática de profissionais do ramo e dos próprios órgãos de fiscalização sanitária. Além do mais, a Vigilância Sanitária tem o papel não apenas fiscalizador, mas, principalmente, de informar e incentivar a maior adesão às normas, como forma de subsidiar uma pratica profissional segura para trabalhadores e clientes. (GARBACCIO, 2013. p.96)

Considerando que, segundo dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, mais de 1,5 milhão de procedimentos estéticos são realizados anualmente no território brasileiro, o assunto da biossegurança relacionada à Biomedicina Estética torna-se essencial. Segundo Garbaccio:

O amplo acesso aos meios de comunicação também favoreceu a maior divulgação dos padrões de imagem e estilo, alimentados pela mídia e pelos astros do cinema e dos esportes, atingindo todas as camadas sociais e faixas etárias. O resultado foi a sofisticação do mercado de beleza e estética como empregador de expressiva quantidade de mão de obra, pela disposição das pessoas de trabalharem na área e, principalmente, pela facilidade de ingresso no ramo, que não exige importante investimento financeiro nem capacitação técnica para atuação (DWECK, 1999; MOORE; MILLER, 2007 apud GARBACCIO, 2013. p.14)

Por fim, este trabalho consiste em uma pesquisa bibliográfica sobre os assuntos de biossegurança, os riscos existentes em procedimentos de Biomedicina Estética, o uso de EPI´s e demais tópicos sobre Biossegurança em Biomedicina Estética.

2.Biossegurança

Não se pode falar sobre biossegurança sem antes delimitar o seu tudo aquilo que envolve o assunto. Assim a temos como o conjunto de ações voltadas para a prevenção, minimização ou eliminação de riscos inerentes, ou seja, são técnicas ou medidas adotadas, a fim de prevenir acidentes em ambientes biotecnológicos.(ZAMONER, 2018).

Sobre o assunto de biossegurança, Odith Leão diz o seguinte:

Segundo a Fundação Oswaldo Cruz, o conceito de biossegurança compreende um conjunto de ações voltadas para a prevenção, minimização ou eliminação de riscos inerentes às atividades de pesquisa, produção, ensino, desenvolvimento tecnológico e prestação de serviços, que possam comprometer a saúde do homem, dos animais, das plantas, do meio ambiente e a qualidade no trabalho desenvolvido (TEIXEIRA; VALLE, 1996. Apud LEÃO, 2019, P. 12).

Nogueira (1996) afirma que a biossegurança deve ser alcançada por meio de estratégias comunicacionais adotadas pelos membros constituintes de um estabelecimento e por meio da sistematização de normas de boas práticas, renovando a instituição e obtendo uma gestão de qualidade na empresa. (LEÃO, 2019, P. 12).

A biossegurança compreende o conjunto de práticas e ações técnicas destinadas a conhecer, controlar, eliminar e prevenir os riscos que o trabalho pode oferecer aos seres vivos, com preocupações sociais e ambientais, dentre outras (ALMEIDA; ALBUQUERQUE, 2000 Apud GARBACCIO, 2013).

Biossegurança é a ciência voltada para o controle e minimização de riscos advindos da prática de diferentes tecnologias, tanto em laboratório quanto aplicadas ao meio ambiente. De acordo com Ramos (2009), o fundamento básico da biossegurança é assegurar o avanço dos processos tecnológicos e proteger a saúde humana, animal e o meio ambiente. Segundo Juliana Garbaccio:

Engloba, também, a proteção e a segurança na biotecnologia com organismos geneticamente modificados. Contudo, no segmento da beleza e estética a biossegurança tem o objetivo de controlar e minimizar os riscos biológicos e químicos, reafirmando a importância do uso de EPI, do descarte de material perfurocortante, da higienização das mãos, da cobertura vacinal e do processamento de dispositivos usados na prática(NEVES et al., 2007, apud GARBACCIO, 2013. p.25-26)

Odith Leão ressalta o seguinte:

É possível e desejável, por estarem explícita ou implicitamente inseridas, considerar ações de biossegurança no contexto da gestão da qualidade, cuja finalidade é garantir que atividades, produtos e serviços gerados numa organização tenham a adequação esperada. Com isso, o resultado certamente será o do desempenho da biossegurança com maior competência e melhor qualidade. (LEÃO, 2019, P. 37)

No segmento da beleza e estética, ao contrário da vasta literatura encontrada no âmbito hospitalar, há escassez de estudos direcionados à biossegurança sobre o conhecimento, comportamento e adesão dos profissionais às medidas de PP (MOORE; MILLER, 2007). Ainda assim, os poucos trabalhos que abordam este tema demonstram uma realidade semelhante à da área da saúde relativa à adesão às medidas de biossegurança. Entretanto diferem no aspecto da formação e conhecimento, revelando a existência de profissionais desinformados sobre as medidas e os protocolos de biossegurança discutidos e elaborados por organizações nacionais e internacionais responsáveis pela recomendação de prevenção de agravos à saúde da população (GARBACCIO, 2013. p.16)

3.Principais Riscos existentes em procedimentos de Biomedicina Estética

Os tratamentos em Biomedicina Estética são considerados potencialmente infectocontagiosos em decorrência da presença de fluidos biológicos como saliva, sangue e coleções purulentas. Segundo Schmidlin:

Assim, os profissionais que trabalham nesta área estão sujeitos a uma série de doenças. Com o intuito de se evitar a disseminação e a propagação destas doenças é que devem ser consideradas as medidas de Biossegurança na Biomedicina Estética e suas implicações, compostas por um conjunto de ações que visam à proteção do profissional, sua equipe e seus pacientes. (SCHMIDLIN, 2012. p. 22)

A disseminação dos agentes patogênicos deixou de ser exclusiva do âmbito hospitalar, atingindo vários serviços de interesse à saúde, dentre eles os da beleza e

estética. O risco da transmissão microbiana agrava-se quando os profissionais desconhecem e não utilizam medidas de biossegurança (GARBACCIO; OLIVEIRA, 2013).

Alguns dos principais fatores que levam à disseminação dos agentes patogênicos causadores de doenças são (Leão, 2019):

A insuficiência de instrumentos para atendimento de clientes; o reuso de materiais descartáveis, como lâminas; a inadequada desinfecção e esterilização de instrumentais e equipamentos; o uso incorreto de soluções químicas desinfetantes; a inadequada assistência no pós-trauma à pele e mucosas; o baixo índice de imunização contra o vírus de hepatite B (VHB), bem como o desconhecimento da necessidade de vacinar; o incorreto descarte de materiais cortantes e perfurantes; o uso inadequado ou o não uso de equipamentos de proteção individual (EPI’s) e as falhas na prevenção de acidentes associados às más condições físicas e sanitárias dos ambientes estéticos (GARBACCIO; OLIVEIRA, 2012 apud LEÃO, 2019, P. 13)

3.1 O risco biológico à saúde do trabalhador e do cliente no segmento da beleza e estética

Os riscos ocupacionais são classificados em: biológicos, químicos, físicos, mecânicos, fisiológicos e psíquicos, cuja exposição a eles pode culminar em um acidente de trabalho. Outra classificação é a estabelecida pela Portaria 3.214/78, do Ministério do Trabalho e Emprego, em suas Normas Regulamentadoras (NR-5) de Medicina e Segurança do Trabalho, que categorizam os riscos em: físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e acidentes (BRASIL, 1978 apud GARBACCIO, 2013. p.23)

Odith Leão (2019) classificou os riscos em biológicos, bioquímicos e químicos, físico-acidentais e ergonômicos, sendo caracterizados da seguinte forma:

  • Riscos biológicos: entra nessa categoria qualquer tipo de ser vivo que possa apresentar algum tipo de ameaça, como bactérias, leveduras, fungos e parasitas. O risco pode ficar em materiais usados pelos profissionais (alicates, espátulas, escovas, máscaras, luvas, touca, entre outros).
  • Riscos bioquímicos e químicos: risco químico é quando envolve algum perigo ao manusear materiais químicos, que podem causar danos físicos ou prejudicar a saúde. Podemos dizer que substâncias tóxicas se encaixam nesta categoria.
  • Riscos físico-acidentais: envolvem riscos com equipamentos, máquinas usadas pelo profissional de estética e também a infraestrutura e instalação da clínica. Entram nesta categoria: temperaturas excessivas, vibrações, radiações, umidade, eletricidade e incêndios.
  • Riscos ergonômicos: envolvem a engenharia humana. São fatores que também podem entrar na categoria de riscos físicos. Incluem-se aqui o esforço físico, a postura inadequada durante os procedimentos, às situações de estresse e a monotonia/repetitividade. (LEÃO, 2019, P. 30)

Odith Leão (2019) diante da expansão da área, com a inserção de novos tratamentos e tecnologias, diz que:

Faz-se necessário transmitir mais informações de maneira segura, ou seja, com embasamento científico. Os contaminantes que mais geram preocupação, tanto por parte dos profissionais quanto por parte dos clientes, são os biológicos, como os fungos e os vírus, pois são altamente infecciosos e estão relacionados a enfermidades graves e, às vezes, fatais. (LEÃO, 2019, P. 17)

3.2 Vias de contaminação.

A via de contaminação pode ocorrer de forma direta ou indireta. Odith Leão cita que:

A via direta se baseia na transmissão do agente biológico sem a intermediação de veículos ou vetores. Pode-se citar como exemplos a transmissão aérea por bioaerossóis, a transmissão por gotículas, o contato com a mucosa dos olhos e via cutânea. (LEÃO, 2019, P. 14)

O doente ou portador, quando fala, tosse ou espirra, dispersa agentes etiológicos de doenças de transmissão aérea. Deste modo, qualquer pessoa pode ser exposta a esses agentes quando em contato com o doente ou portador, ao entrar em ambientes contaminados, ou ainda ao realizar procedimentos nestas pessoas. (BRASIL, 2011. p. 11)

Já a via indireta é a transmissão do agente biológico por meio de veículos ou vetores, por exemplo, transmissão por meio de mãos devido ao uso de perfurocortantes, luvas, roupas, instrumentos, vetores, água, alimentos e superfícies (BRASIL, 2008, apud, LEÃO, 2019, P. 14).

O risco à saúde de profissionais e clientes envolve a possível transmissão de patógenos de transmissão sanguínea o que pode levar a doenças de relevância epidemiológicas e de impacto significativo na saúde pública, tais como as hepatites e a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids), além de micoses, dermatites e furunculoses (GARBACCIO, 2013. p. 15-16)

Quando o assunto é a transmissão de agentes infecciosos, a adesão às medidas de precauções padrão (PP) por profissionais de saúde e por qualquer outra categoria profissional deve ser encorajada para atividades de risco no dia a dia, por representarem um meio de prevenção eficaz (ASKARIAN; ARAMESH; PALENIK, 2006; SIEGEL et al., 2007). As medidas de PP são recomendadas na prestação de cuidados a qualquer pessoa quando há riscos potenciais ou na presença de sangue, secreções e excreções da pele e/ou mucosas. (GARBACCIO, 2013. p. 15-16)

Essas precauções consistem em: lavar as mãos, usar luvas, máscara, óculos de proteção e avental/jaleco, fazer o descarte adequado de material contaminado e vacinar contra hepatite B. Para os serviços de estética e beleza, as medidas de PP podem e devem ser aplicadas, além do processamento adequado de artigos e a desinfecção de superfícies (GARNER, 1996; RUDDY; CUMMINS; DRABU, 2001; MOORE; MILLER, 2007, apud GARBACCIO, 2013. p. 15-16)

3.3 A pele e seus anexos: colonização e infecção microbiana

No segmento da estética e beleza, a pele é o sítio corporal mais exposto aos procedimentos dos profissionais. Portanto, a microbiota de cliente e dos profissionais está sujeita a alterações e à inoculação de micro-organismos em áreas antes desprovida destes, como em anexos da pele e na corrente sanguínea (WINTHROP et al., 2002; ADELEYE, OSIDIPE, 2004; REDBORD et al., 2006; WAZIR et al., 2008, apud GARBACCIO, 2013. p.28-29).

A pele é o maior órgão do corpo em termos de área. Tem por função revestir o organismo, isolar componentes orgânicos do meio exterior, impedir a ação de agentes externos e proporcionar proteção imunológica. Juliana Garbaccio cita que:

A estrutura básica da pele é composta por: epiderme, derme e hipoderme (subcutâneo). A epiderme, quando íntegra, deve funcionar como barreira física eficaz contra microorganismos, por estar em contato direto com o ambiente externo A derme contém os folículos pilosos, dutos de glândulas sudoríparas e sebáceas, os quais possibilitam a passagem de microorganismos da pele para os tecidos mais profundos. A superfície íntegra da epiderme saudável raramente é penetrada por micro-organismos. Porém, quando rompida pode permitir infecções no tecido subcutâneo (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2009a; TORTORA et al., 2006 apud GARBACCIO, 2013. p.28-29)

A pele é colonizada pela microbiota residente e, devido à sua extensão e localização, é constantemente exposta a diversos micro-organismos do meio ambiente, sendo colonizada pela microbiota transitória. A microbiota transitória coloniza principalmente a superfície do estrato córneo, parte superior dos folículos pilosos, sulcos da pele e ductos das glândulas sebáceas. De outro lado a microbiota residente se encontra mais profundamente, concentrando-se nas áreas mais úmidas e quentes, como axilas e períneo. (GARBACCIO, 2013. p.28-29)

A colonização microbiana da pele em diferentes áreas do corpo tem concentração de bactérias variáveis por centímetro quadrado (cm2), porém semelhantes entre si (GARBACCIO, 2013. p.28-29).

Citam-se como exemplo:

  • Couro cabeludo: 106 UFC (Unidades Formadoras de Colônias)/cm2
  • Axila: 105 UFC/cm2 .
  • Abdome ou antebraço: 104 UFC/cm2 .
  • Mãos de profissionais de saúde: 104 a 106 UFC/cm2 . (GARBACCIO, 2013. p.28-29)

O simples ato de lavar a pele com água e sabão pode diminuir em 90% o número de micro-organismos pertencentes principalmente à microbiota transitória, que adere por contato fracamente à pele e encontra-se mais superficialmente, junto à gordura e às sujidades. No entanto, de duas a três horas, em média, após este procedimento, a população bacteriana é totalmente reconstituída (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2009 apud GARBACCIO, 2013. p.28-29)

Ainda citando Juliana Garbaccio:

Fazem parte da microbiota residente da pele os gêneros Staphylococcus, Corynebacterium e Propioniobacterium, sendo as espécies mais comuns o Staphylococcus epidermidis, o Staphylococcus aureus e o Propionibacterium acnes. A microbiota transitória é frequentemente constituída por Staphylococcus aureus, Escherichia coli, Streptococcus pyogenes, Pseudomonas aeruginosa e Klebsiella sp (TRABULSI; ALTERTHUM, 2005; TORTORA et al., 2006). Deve ser lembrado ainda que fungos (Candida spp.) e vírus (hepatites A, B, C; da imunodeficiência humana/HIV; respiratórios, de transmissão fecal-oral como rotavírus; grupo herpes, como varicela; Epstein-Barr e citomegalovírus) podem colonizar transitoriamente a pele, principalmente polpas digitais, após contato com pessoas ou superfícies inanimadas, podendo ser transmitidos ao hospedeiro susceptível (KAMPF; KRAMER, 2004) (GARBACCIO, 2013. p.30)

Os fungos também são encontrados nos estabelecimentos de beleza e estética, e numerosas espécies causadoras de micoses em unhas, cabelos e pele podem ser transmitidas nestes locais. Sobre eles, Juliana Garbaccio afirma que:

Os fungos são ubíquos, pela sua capacidade de habitar diversos ambientes, e estão interligados com o ser humano sob vários aspectos, dentre eles infecções denominadas “micoses”, que podem acometer indivíduos com ou sem comprometimento sistêmico e imunológico. (GARBACCIO, 2013. p.33)

As micoses podem ser oportunistas quando atingem pessoas com algum grau de comprometimento na barreira protetora externa (pele), no sistema imunológico, pelo uso contínuo de corticóides e antibióticos, e naqueles acometidos por doenças de base como diabetes e câncer. As micoses podem ser classificadas em:

  • Superficiais: acometem as camadas mais superficiais da pele e pelos.
  • Cutâneas ou dermatomicoses: localizadas na pele, no pelo, nas unhas e nas mucosas.
  • Subcutâneas: acometem a pele e o tecido subcutâneo.
  • Sistêmicas: acometem órgãos internos e vísceras.

Os fungos causadores de micoses têm como reservatórios principais o homem, os animais e o solo. Nas micoses superficiais e cutâneas, o homem é o principal hábitat dos fungos e, a transmissão se dá por contato direto ou indireto com este reservatório. Os gêneros mais relevantes como causadores de micoses superficiais, cutâneas e subcutâneas são: Malassezia (Pitiríase versicolor), Microsporum e Trichophyton (dermatofitoses de pele, unha, pêlos), Candida (Candidíases) e Phaeonneleomyces (Tinea Nigra) (TRABULSI; ALTERTHUM, 2005 apud GARBACCIO, 2013. p.33)

4.Uso de EPI´s na Biomedicina Estética

A obrigatoriedade do uso de EPI é estabelecida para todos os trabalhadores brasileiros desde 1978 pela norma regulamentadora NR6 (BRASIL, 1978). No caso de riscos de contatos com material biológico, o uso dos EPI é uma medida universal, não restrita apenas aos profissionais de saúde, mas a todos que tenham a possibilidade de contato com sangue e outros líquidos corpóreos passíveis de transmissão microbiana. Isso inclui manicures e pedicures. (GARBACCIO, 2013. p.81).

O uso de luvas para a prevenção do contato com sangue deve ocorrer para todas as situações em que há o risco, e não somente após a exposição sanguínea ter acontecido (SIEGEL et al., 2007, apud BRASIL, 2011). O vestuário utilizado no cotidiano do profissional de saúde tem sido considerado como potencial reservatório envolvido na transmissão microbiana, mesmo que em menor proporção. A autora cita que:

As doenças virais transmitidas pelo sangue reafirmam a importância das medidas de prevenção de doenças infecciosas, representadas pela associação de estratégias disponíveis e conhecidas, como o uso de EPI, vacinação, processamento dos artigos e desinfecção de superfícies, devendo ser monitoradas e estimuladas pelos profissionais de saúde, dentre eles o enfermeiro. (GARBACCIO, 2013. p.38)

A adesão às medidas de biossegurança é essencial para a preservação da saúde dos trabalhadores e dos clientes e, para tanto, fazem-se necessários uma estrutura física apropriada, presença de dispositivos e equipamentos em boas condições de uso, os quais permitem procedimentos de limpeza/desinfecção adequada. Tendo em vista, que os profissionais deste ramo, manipulam áreas do corpo humano habitadas por microrganismos, tanto da microbiota normal quanto da transitória, que podem ser agentes potencialmente infecciosos e transmitidos por contato direto, por artigos e substâncias contaminadas ou por acidentes com materiais perfuro cortantes (GARBACCIO; OLIVEIRA, 2018, apud LEÃO, 2019, P. 37).

Em 1996, com a reformulação de tais conceitos, surgem as denominadas “Precauções Padrão”, associadas à prevenção do contato com fluidos corporais, pois todos estes envolvem risco de transmissão de doenças. Segundo Antunes (2015):

As precauções englobam o uso de equipamentos de proteção individual (EPI) — luvas, óculos, máscaras, avental. Entretanto, mesmo diante desta possibilidade de prevenção de acidentes, na prática, trabalhos têm demonstrado que exposições aos riscos biológicos e infecções continuam a ocorrer de maneira elevada. (ANTUNES, 2015. p. 336)

Toda atividade desenvolvida em estabelecimento de saúde e beleza implica em riscos, em maior ou menor grau. Conforme Ramos (2009), sem procurar esgotar as possibilidades existentes, pode-se citar algumas formas de minimizar os riscos gerados por resíduos em estabelecimentos de saúde e beleza:

  1. por meio da segregação, evitando a contaminação de resíduos comuns;
  2. com o uso de equipamentos de proteção individual e coletiva adequados a cada atividade;
  3. capacitando o pessoal de forma geral para que todos atuem noestabelecimento de forma segura e padronizada;
  4. adequando o projeto das instalações do estabelecimento visando à minimização do trajeto dos resíduos no interior do mesmo;
  5. planejando roteiros e estabelecendo horários das diversas atividades do estabelecimento para evitar a realização simultânea de atividades incompatíveis que possam agravar o risco de contaminação;
  6. identificando, por meio de símbolos, cores e expressões, os recipientes e locais que contêm resíduos perigosos;
  7. protegendo os locais de armazenamento temporário dos RSSS, instalando telas ou grades, por exemplo, para evitar a entrada de vetores (insetos e pequenos animais);
  8. elaborando e utilizando procedimentos de trabalho que busquem minimizar a ocorrência de incidentes envolvendo resíduos;
  9. utilizando a educação em saúde ambiental como forma de conscientização para os riscos envolvidos nas atividades do estabelecimento;
  10. buscando a participação de todo o quadro de funcionários do estabelecimento de saúde e beleza na identificação dos riscos e na geração de ideias para determinar formas de minimizar problemas. (LEÃO, 2019, P. 36-37)

Salienta-se que quando a esterilização for realizada em estufa (calor seco), a temperatura deve ser de 160º C para um tempo de 120 minutos e de 170º C para um tempo de 60 minutos. Quando for em autoclave (calor úmido), a temperatura deve ser de 121º C por 15 minutos, tempo a ser contado a partir de atingida a temperatura indicada (BRASIL, 1994). A autoclave é considerada o equipamento ideal pela vigilância sanitária (GHISI; SANTIN, 2011, apud LEÃO, 2019, P. 54)

4.1 Peças de vestuário enquanto EPI´s

Apesar da ausência de estudos sobre o vestuário dos profissionais da beleza e estética, infere-se que, como os de profissionais de saúde, eles podem se contaminar por micro-organismos capazes de causar danos, especialmente quando há algum desequilíbrio imunológico. Portanto, alguns cuidados devem ser tomados com uniformes, aventais e jalecos, usando-os apenas no salão de beleza e evitando circular com estes em outros ambientes fora do local de trabalho. (GARBACCIO, 2013. p.81)

O vestuário deve ser lavado diariamente, como o de profissionais da saúde, pois quanto menor a frequência deste cuidado maior a possibilidade de contaminação e manutenção dos micro-organismos nos tecidos (PILONETTO et al, 2007; BOYCE, 2007; BRASIL, 2005b; OLIVEIRA; SILVA; GARBACCIO, 2012;OLIVEIRA; SILVA, 2013 apud GARBACCIO, 2013. p.81)

Quando a lavagem do vestuário se der no âmbito doméstico, ele deve ser separado de outras roupas ou do restante da própria família e passado a ferro quente, pois microorganismos, em especial os fungos, podem resistir ao processo de lavagem simples, mas podem ser eliminados pela temperatura a que são submetidos quando passados a ferro (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2009b apud GARBACCIO, 2013. p.81)

5.Demais tópicos sobre Biossegurança em Biomedicina Estética

De acordo com o SEBRAE (2016), a gestão ambientalmente correta dos resíduos de estabelecimentos estéticos é uma obrigação legal e compreende os resíduos classificados como serviços de saúde, com normas específicas de armazenamento, tratamento e disposição final. Sobre a disposição final, Odith Leão diz o seguinte:

Muitos produtos utilizados nesses estabelecimentos possuem ingredientes químicos e geram resíduos infectantes que podem contaminar o solo e o lençol freático se destinados a aterros sanitários, por isso precisam ser encaminhados para empresas especializadas em tratamento e destinação final de resíduos de saúde, não podendo ser dispostos junto ao resíduo doméstico comum. (LEÃO, 2019, P. 14) Ela vai além:

O descarte correto dos resíduos por clínicas de tratamento estético preservará a população e o meio ambiente de doenças infecciosas e transmissíveis. Os cuidados devem ser tomados tanto na hora do atendimento ao cliente quanto no descarte dos materiais utilizados pelo profissional de estética. (LEÃO, 2019, P. 16)

Para garantir a eficiência do processo de limpeza e higienização, as instalações devem possuir superfícies (piso, paredes e teto) lisas e impermeáveis, sem rachaduras, resistentes aos agentes sanitizantes e facilmente laváveis. Odith Leão ressalta que:

O estabelecimento de estética deve ser devidamente planejado, fazendo até mesmo um projeto arquitetônico que leve em consideração as normas e práticas de biossegurança, trazendo bem-estar para seus funcionários e clientes. De acordo com Mota et al. (2004), são cada vez mais procurados os atendimentos que proporcionam saúde e embelezamento ao mesmo tempo, aumentando a preocupação com o risco de infecções por microrganismos patogênicos ou não. (LEÃO, 2019, P. 54)

Após exposição a material biológico, cuidados locais com a área exposta devem ser imediatamente iniciados. Recomenda-se a lavagem exaustiva com água e sabão em caso de exposição percutânea ou cutânea (CENTER FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION, 2005; RICHTMANN, 2005; BRASIL, 2010 apud GARBACCIO, 2013. p.86)

Para um efetivo controle da contaminação em ambiente potencialmente infectado, como uma clínica de Biomédicos Estetas, faz-se necessária a adoção das normas de precauções universais (BRASIL, 2012). Em Biomedicina Estética os cuidados devem ser tomados tanto em relação aos profissionais prestadores de serviço como aos usuários do mesmo (BREVIDELLI; CIANCIARULLO, 2010 apud SCHMIDLIN, 2012. p. 10-11)

Os cuidados profissionais devem elencar, além de outros recursos, as imunizações, a lavagem e secagem das mãos e o uso do equipamento de proteção individual (avental comprido de manga longa, óculos com proteção lateral, gorro, máscara e luvas descartáveis). Não se pode deixar de citar a importância dos procedimentos relativos ao ambiente de trabalho, que incluem limpeza, desinfecção e barreiras mecânicas de proteção; o mesmo deve ser feito com os materiais contaminados, que obrigatoriamente devem passar por processos de limpeza e posterior esterilização (BRASIL, 2012 apud SCHMIDLIN, 2012. p. 10-11)

A desinfecção constitui a eliminação parcial da população microbiana e pode ser de baixo, médio e alto nível. A de alto nível propicia a morte de todos os microorganismos, exceto de uma pequena quantidade de esporos bacterianos (RUTALA et al., 2008). Por outro lado, a esterilização é o processo que permite a eliminação completa dos micro-organismos, inclusive das formas esporuladas. Considera-se, portanto, um artigo estéril quando a chance de sobrevivência dos micro-organismos é menor do que 1:1.000.000. (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2000, BRASIL, 2001; RUTALA et al., 2008 apud GARBACCIO, 2013. p.90)

6.CONSIDERAÇÕES FINAIS

Vimos, portanto, sobre o que trata o conceito da Biossegurança e a importância da mesma no tocante à Biomedicina Estética. Cientes disso e dos principais riscos a que estão acometidos os profissionais da área, ressaltamos a importância do uso correto dos Equipamentos de Proteção Individual e do manejo correto das vestimentas destes profissionais para o bem da saúde de todos os envolvidos neste processo.

Cabe ressaltar que, por tratar-se de tema ainda pouco estudado no meio acadêmico, carece de dados mais atuais para a continuidade do estudo sobre a relação do uso correto dos equipamentos de proteção e a biossegurança, bem como estatísticas mais fidedignas sobre incidentes envolvendo o descuido na observância destas indicações.

7.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Cartilha de Proteção Respiratória Contra Agentes Biológicos para Trabalhadores de Saúde. 2011. Disponível em: www.smurb.ufba.br/cpr.pdf..

COSTA, M. A. F. et al… Educação em Biossegurança: contribuições pedagógicas para a formação profissional em saúde. 2010. Ciência & Saúde

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