REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202506051333
Pedro Lucas Nogueira1
Rafael Campos Vasconcelos2
Thomas Levi Oliveira de Souza3
Marlene Guimarães Santos4
RESUMO
A qualidade do sono é essencial para a manutenção da saúde física, mental e emocional, especialmente entre profissionais da saúde, cuja rotina envolve longas jornadas, turnos noturnos e múltiplos vínculos empregatícios. OBJETIVO: O estudo teve como objetivo revisar a literatura científica a fim de identificar os principais fatores associados à má qualidade do sono nessa população e suas repercussões no desempenho profissional e na qualidade de vida. METODOLOGIA: Trata-se de uma revisão bibliográfica de caráter descritivo, com abordagem qualitativa, realizada nas bases SciELO, PubMed e LILACS, utilizando descritores controlados. Além da análise narrativa, foi elaborado um quadro comparativo para sintetizar os dados dos estudos selecionados, com ênfase em características dos profissionais avaliados (sexo, faixa etária, categoria profissional) e principais achados relacionados à qualidade do sono. RESULTADOS: Os estudos analisados revelaram alta prevalência de distúrbios do sono entre profissionais da saúde, com sintomas como insônia, sonolência diurna, fadiga e uso de medicação para dormir. Também foram observadas associações com estresse ocupacional, trabalho em turnos e ausência de políticas institucionais de apoio. DISCUSSÃO: Os achados reforçam a necessidade de mudanças organizacionais que promovam o descanso adequado e a valorização institucional dos trabalhadores da saúde. A discussão aponta que os fatores ocupacionais e psicossociais são os principais determinantes da má qualidade do sono. CONSIDERAÇÕES FINAIS:Destaca-se a urgência de políticas públicas e ações institucionais que promovam a saúde ocupacional, a fim de preservar o bem-estar dos profissionais e a segurança dos cuidados prestados à população.
Palavras-chave: Fadiga. Profissionais da saúde. Saúde ocupacional. Qualidade do sono.
ABSTRACT
Quality sleep is essential for maintaining physical, mental and emotional health, especially among healthcare professionals, whose routine involves long hours, night shifts and multiple employment relationships. OBJECTIVE: The study aimed to review the scientific literature in order to identify the main factors associated with poor sleep quality in this population and its repercussions on professional performance and quality of life.METHODOLOGY: This is a descriptive bibliographic review, with a qualitative approach, carried out in the SciELO, PubMed and LILACS databases, using controlled descriptors. In addition to the narrative analysis, a comparative table was prepared to summarize the data from the selected studies, with emphasis on the characteristics of the professionals evaluated (sex, age group, professional category) and main findings related to sleep quality.RESULTS: The studies analyzed revealed a high prevalence of sleep disorders among health professionals, with symptoms such as insomnia, daytime sleepiness, fatigue and use of sleeping medication. Associations with occupational stress, shift work and lack of institutional support policies were also observed.DISCUSSION: The findings reinforce the need for organizational changes that promote adequate rest and institutional appreciation of health workers.The discussion points out that occupational and psychosocial factors are the main determinants of poor sleep quality.FINALS CONSIDERATIONS: The urgency of public policies and institutional actions that promote occupational health is highlighted, in order to preserve the well-being of professionals and the safety of care provided to the population.
Keywords: Fatigue. Healthcare professionals. Occupational health. Sleep quality.
1. INTRODUÇÃO
A qualidade do sono é um dos pilares fundamentais para a manutenção da saúde física, mental e emocional. Entre os profissionais da saúde, esse aspecto adquire ainda mais relevância, dada a natureza extenuante e emocionalmente exigente de suas atividades. Fatores como jornadas prolongadas, múltiplos vínculos empregatícios e turnos noturnos contribuem significativamente para alterações no ciclo sono-vigília, favorecendo o desenvolvimento de distúrbios do sono, como insônia, sonolência diurna e fadiga crônica (BARROS et al., 2019; AZAMBUJA et al., 2024).
Estudos têm demonstrado que a privação do sono compromete funções cognitivas, a regulação emocional e o sistema imunológico, além de aumentar o risco de doenças cardiovasculares, transtornos de humor e exaustão ocupacional (SILVA et al., 2022; OLIVEIRA et al., 2024). No contexto profissional, isso se reflete em menor rendimento, maior propensão a erros e redução da segurança assistencial Silva et al. (2018), em estudo com profissionais da enfermagem, observaram que trabalhadores noturnos apresentam pior qualidade de sono, maior uso de medicação para dormir e menor disposição para atividades cotidianas. Já Azambuja et al. (2024), avaliando profissionais de emergência, identificaram forte associação entre má qualidade do sono, fadiga e redução da qualidade de vida, sobretudo nos domínios físico e psicológico.
Apesar da relevância do tema, observa-se escassa atenção institucional à saúde do trabalhador da saúde no que se refere à organização do trabalho, descanso e educação sobre higiene do sono (SILVA et al., 2024). Isso contribui para a naturalização da fadiga e o descuido com o bem-estar de quem cuida.
Diante disso, este estudo tem como objetivo revisar criticamente a literatura recente a fim de compreender como as condições de trabalho influenciam a qualidade do sono dos profissionais da saúde, identificando os principais fatores de risco envolvidos, suas consequências e possíveis estratégias de prevenção.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
O referencial teórico deste estudo baseia-se nos pressupostos da psicologia organizacional, da medicina do trabalho e da cronobiologia. Autores como Barros et al. (2019) e Oliveira et al. (2024) destacam que o sono é regulado por ritmos circadianos sensíveis à luz e à rotina social, os quais são frequentemente desregulados pelos turnos de trabalho e excesso de carga horária. A Teoria do Estresse de Lazarus e Folkman também oferece subsídios para compreender a relação entre demandas ocupacionais e respostas fisiológicas, como insônia e fadiga. Com base nesses fundamentos, entende-se que intervenções institucionais são essenciais para a promoção da saúde do trabalhador.
3. METODOLOGIA
Este estudo constituiu de uma revisão bibliográfica de natureza descritiva, com abordagem qualitativa, cujo propósito foi reunir e analisar produções científicas que abordam a qualidade do sono entre profissionais da saúde. A escolha por esse tipo de estudo se justifica pela necessidade de compreender, a partir do conhecimento já produzido, como as condições de trabalho, os hábitos de vida e os fatores psicossociais influenciam a saúde do trabalhador, especialmente no que diz respeito ao sono. A seleção dos materiais foi realizada nas bases de dados SciELO, PubMed e LILACS, por meio da combinação dos descritores: “qualidade do sono”, “profissionais da saúde”, “trabalho em turnos”, “fadiga” e “qualidade de vida”. Os termos foram utilizados em português, inglês e espanhol, de modo a ampliar o escopo da busca. Foram incluídos artigos publicados entre janeiro de 2000 e março de 2024, com acesso ao texto completo.
Quadro 1: Tabulação dos resultados com as caracteristicas dos estudos selecionados


4. RESULTADOS
A análise dos estudos selecionados revelou uma alta prevalência de distúrbios do sono entre profissionais da saúde, especialmente entre aqueles submetidos a jornadas exaustivas, turnos noturnos e múltiplos vínculos empregatícios. Os sintomas mais relatados foram insônia, sonolência diurna excessiva, fadiga persistente e sensação de sono não reparador.
Em estudo realizado por Azambuja et al. (2024), com profissionais atuantes em unidades de urgência e emergência, constatou-se que 72,2% apresentavam má qualidade do sono, conforme avaliação pelo PSQI-BR, e 75,9% estavam fadigados, com forte associação entre fadiga, necessidade de descanso e percepção negativa da qualidade de vida. Ainda segundo esse estudo, os domínios físico, psicológico e social avaliados pelo WHOQOL-bref apresentaram escores significativamente inferiores entre os participantes com pior qualidade de sono.
Outro achado importante foi reportado por Silva et al. (2024), que avaliaram 40 médicos preceptores de uma clínica escola e identificaram que mais de 65% apresentavam padrões de sono insatisfatórios, sendo que a maioria possuía dois ou mais empregos e cargas horárias superiores a 60 horas semanais. A média de sono relatada foi inferior a seis horas por noite, e a sonolência diurna, avaliada pela ESS-BR, foi prevalente em cerca de 70% da amostra. Estudos também apontam que a qualidade do sono está frequentemente associada ao tempo de atuação profissional, ao tipo de vínculo empregatício e ao gênero. Em diversas pesquisas, as mulheres apresentaram maior vulnerabilidade a distúrbios do sono, o que tem sido atribuído à sobrecarga de responsabilidades profissionais e domésticas, além de fatores hormonais. A pesquisa conduzida por Silva et al. (2018), no Hospital de São Lourenço-MG, demonstrou que, mesmo entre profissionais submetidos ao regime de 12h por 36h de descanso, os trabalhadores noturnos apresentavam qualidade de sono inferior em relação aos diurnos. Foram observadas maiores latências para iniciar o sono, uso mais frequente de medicamentos indutores e maior indisposição para atividades cotidianas. A pontuação média no PSQI foi mais elevada entre os profissionais do turno da noite, indicando pior qualidade subjetiva do sono, maior fragmentação e menor eficiência. De maneira geral, os estudos analisados confirmam que há uma tendência de comprometimento do sono entre profissionais da saúde, independentemente da categoria ou do local de trabalho. No entanto, os impactos parecem mais acentuados em contextos de emergência, plantões noturnos e ambientes com baixa valorização institucional do trabalhador. Além disso, poucas instituições oferecem suporte efetivo, como programas de educação em saúde do sono ou intervenções voltadas à melhoria das condições laborais.
5. DISCUSSÃO
Os resultados desta revisão evidenciam que a má qualidade do sono entre profissionais da saúde é um fenômeno recorrente e multifatorial, com implicações que extrapolam o ambiente de trabalho e afetam diretamente o bem-estar físico, psicológico e social desses indivíduos. A elevada prevalência de distúrbios do sono observada nos estudos analisados reforça a necessidade de atenção institucional e acadêmica ao tema.
A associação entre jornadas extensas, trabalho noturno e maior índice de insônia, sonolência diurna e fadiga é um achado comum em diversos contextos da prática profissional em saúde. Profissionais que atuam sob regimes de plantão ou em serviços de emergência, como observado por Azambuja et al. (2024), tendem a vivenciar ritmos biológicos desregulados e repouso inadequado, o que contribui para quadros persistentes de cansaço e queda no desempenho. Outro aspecto que se destaca é a sobrecarga de múltiplos vínculos empregatícios, como relatado no estudo de Silva et al. (2024), o que pode levar à redução do tempo disponível para o sono e à consequente deterioração da sua qualidade. Além do volume de horas trabalhadas, a intensidade emocional do trabalho em saúde especialmente em unidades de pronto atendimento se mostra um fator agravante, elevando os níveis de estresse e dificultando a recuperação física e mental durante o repouso.
Os dados também indicam que, mesmo quando há intervalos entre os turnos, o tempo de descanso nem sempre é suficiente ou de qualidade. Silva et al. (2018) mostraram que profissionais do turno noturno apresentaram maior uso de medicação para dormir, maior latência e maior indisposição para atividades diárias. Isso indica que a simples existência de folgas não garante um sono reparador, especialmente quando não se respeitam os ritmos circadianos naturais.
As repercussões desses distúrbios vão além da saúde individual. Há um risco ampliado de erros profissionais, acidentes de trabalho e comprometimento na relação com os pacientes. A literatura tem apontado que profissionais com privação crônica de sono apresentam desempenho cognitivo reduzido, queda na concentração e maior propensão a falhas, o que pode comprometer a qualidade e a segurança da assistência prestada.
Apesar da gravidade do problema, observou-se que poucas instituições implementam políticas voltadas à promoção da saúde do trabalhador. A ausência de ações estruturadas como programas educativos, estratégias de reorganização das escalas e suporte psicológico contribui para a naturalização da fadiga e para a negligência em relação à saúde ocupacional dos próprios cuidadores.
Adicionalmente, deve-se considerar que fatores como gênero, idade, tempo de profissão e condições sociais também influenciam a experiência do sono, e que medidas universais podem não ser eficazes se não forem adaptadas à realidade de cada grupo profissional. O reconhecimento das especificidades de cada categoria é fundamental para o desenvolvimento de políticas públicas e intervenções eficazes.
Por fim, esta revisão reforça que a qualidade do sono deve ser reconhecida como um indicador relevante de saúde ocupacional. A negligência com essa dimensão favorece o adoecimento silencioso de trabalhadores essenciais, e compromete diretamente a sustentabilidade dos serviços de saúde.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os dados analisados nesta revisão apontam que a má qualidade do sono entre profissionais da saúde é um problema recorrente e negligenciado, com impactos significativos na saúde física, emocional e na qualidade dos serviços prestados. Destaca-se a urgência de medidas institucionais que promovam condições adequadas de trabalho, escalas mais humanizadas, programas de educação sobre higiene do sono e apoio psicológico. Reconhecer o sono como um componente fundamental da saúde ocupacional é essencial para garantir a segurança do cuidado e o bem-estar dos trabalhadores.
7. REFERÊNCIAS
AZAMBUJA, V. A. et al. Avaliação da qualidade do sono, fadiga e qualidade de vida de profissionais de saúde de urgência e emergência. Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, v. 37, eAPE01001, 2024. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ape. Acesso em: 28 maio 2025.
BARROS, M. B. A. de et al. Qualidade do sono, saúde e bem-estar em estudo de base populacional. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 53, p. 1–11, 2019. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp. Acesso em: 28 maio 2025.
OLIVEIRA, A. V. et al. Impactos da qualidade do sono na saúde mental de estudantes de medicina: uma revisão sistemática. Revista de Neurociências, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 15–23, 2024.
SILVA, A. F. et al. Qualidade do sono, variáveis pessoais e laborais e hábitos de vida de enfermeiros hospitalares. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 30, 2022.
SILVA, C. S. et al. Avaliação da qualidade do sono em profissionais médicos de uma clínica escola de Porto Velho – RO. Revista Contemporânea, Porto Velho, v. 4, n. 8, 2024.
SILVA, E. S. et al. Avaliação da qualidade do sono e sua relação com a qualidade de vida de trabalhadores noturnos da enfermagem do Hospital de São Lourenço-MG. Revista Saúde em Foco, São Lourenço, v. 10, p. 581–589, 2018.
1Bacharelando em Medicina /Faculdade Metropolitana, União de Ensino Superior da Amazônia Ocidental (UNNESA) E-mail: nogueirapedro2015@gmail.com
2Bacharelando em Medicina/ Faculdade Metropolitana, União de Ensino Superior da Amazônia Ocidental (UNNESA) E-mail: rafaelcampos.vasconcelos@hotmail.com
3Bacharelando em Medicina/ Faculdade Metropolitana, União de Ensino Superior da Amazônia Ocidental (UNNESA) E-mail: thomasoliveira402@gmail.com
4Doutora em Biologia Experimental pela Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR) Faculdade Metropolitana, União de Ensino Superior da Amazônia Ocidental (UNNESA) E-mail: marlene.santos@metropolintana-ro.com.br