ATENDIMENTO ODONTOLÓGICO A PACIENTES COM SÍNDROME DE DOWN: REVISÃO DE LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10307533


 Jacklliny Duarte Reis1
Gisele Santos de Souza2
Orientador: Prof. Saul Alfredo Antezana Vera3


RESUMO

A Síndrome de Down é uma condição genética causada pela trissomia do cromossomo 21, ocorrida durante a divisão embrionária. Apesar de os pacientes com Síndrome de Down apresentarem características específicas, essa condição requer um diagnóstico médico. O objetivo deste trabalho foi discutir em uma revisão de literatura os principais aspectos relacionados aos atendimentos odontológicos a pacientes com síndrome de Down, bem como suas manifestações clínicas. Portanto, o cirurgião-dentista tem um papel primordial no atendimento odontológico aos pacientes com síndrome de Down. Além de manter o papel humanizado, o profissional precisa ter habilidade para reconhecer as principais manifestações bucais, garantindo direito à saúde bucal nesses pacientes especiais. 

PALAVRAS-CHAVE:  Síndrome de Down. Trissomia. Assistência odontológica.

ABSTRACT

Down Syndrome is a genetic condition caused by trisomy 21 that occurs during embryonic division. Although patients with Down Syndrome have specific characteristics, this condition requires a medical diagnosis. The objective of this work was to discuss in a literature review the main aspects related to dental care for patients with Down syndrome, as well as its clinical manifestations. Therefore, the dentist has a primary role in dental care for patients with Down syndrome. In addition to maintaining a humanized role, the professional needs to have the ability to recognize the main oral manifestations, guaranteeing the right to oral health in these special patients.

KEYWORDS: Down Syndrome. Trisomy. Dental care.

1. INTRODUÇÃO

A síndrome de Down (SD) ou Trissomia do 21 representa a anomalia cromossômica mais comum da espécie humana. Nos últimos anos houve um grande progresso no tratamento físico e mental de pacientes com essa síndrome, resultando em um significativo aumento na sobrevida e maior integração à sociedade (VENAIL et al.,2004).

De acordo com a literatura, existem três tipos de Síndrome de Down: a Trissomia 21 simples ou padrão, prevalente em 95% dos casos de Síndrome de Down, a translocação, presente em 3 a 4% dos casos e a mosaico, com prevalência em 1 a 2% dos casos. (OLIVEIRA et al., 2017).

A deficiência mental é uma das características mais presentes no desenvolvimento de uma criança com Síndrome de Down, o que pode provavelmente ser justificado por um atraso global no desenvolvimento variando de criança para criança (HENN et al., 2008).

Dentre as características físicas dos pacientes  portadores  da  Síndrome  de  Down,  podemos  relacionar:  olhos  com  formatos amendoados, pré-disposição a cardiopatias congênitas, hipotonia muscular ou tônus muscular enfraquecido e maior suscetibilidade a doenças infecciosas (Vilela et al.,2018).

Raramente as doenças bucais e as malformações orofaciais acarretam risco de morte, entretanto, apresentam riscos de dor, infecções, problemas mastigatórios e respiratórios (OLIVEIRA et al.,2008).  

Do ponto de vista estético, características como mau hálito, dentes mal posicionados, traumatismos, sangramento gengival, hábito de ficar com a boca aberta e ato de babar podem mobilizar sentimentos de compaixão, repulsa e/ou preconceito, acentuando atitudes de rejeição social (OLIVEIRA et al.,2008).

Mesmo diante de tantas informações, os pacientes com síndrome de Down normalmente encontram certa dificuldade em receber tratamentos odontológicos, em virtude   da insegurança e falta de informação dos profissionais da área. Quando tratados desde jovens, pouco a pouco vão acostumando-se e diminuindo a necessidade de anestesia geral em  tratamentos  mais  invasivos.  Normalmente são pacientes  amorosos  e  fáceis  de  lidar,  não  existindo  necessidade  de  encaminhar  a  um  profissional  especialista,  apenas  atentando-se  a  observar  as  limitações  que  cada  um  possui (OLIVEIRA et al., 2017).

Portanto, o objetivo deste trabalho foi discutir em uma revisão de literatura os principais aspectos relacionados aos atendimentos odontológicos a pacientes com síndrome de Down, bem como suas manifestações clínicas.

2. MATERIAIS E MÉTODOS DA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 

Para a elaboração deste estudo de revisão literária, foi realizado uma pesquisa na base de dados digitais de artigos científicos disponibilizados em: PubMed (https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/), SciELO (https://scielo.org/), Google Acadêmico (https://scholar.google.com.br/), Periódico Capes (https://www-periodicos-capes-gov-br.ezl.periodicos.capes.gov.br/index.php?). Os termos pesquisados foram as palavras-chaves: “Síndrome de Down”, “Trissomia” e “Assistência odontológica”. Os critérios de inclusão foram os artigos publicados em português, inglês e espanhol que abordassem temas e pesquisas dentro da (Atendimento odontológico a pacientes com Síndrome de Down) sendo os mais relevantes e foi imposto o limite temporal dos últimos 20 anos, sendo assim, foram obtidas um total de 15 artigos selecionados.

3. REVISÃO DE LITERATURA

3.1 Síndrome de Down

A Síndrome de Down foi descoberta por John Langdon Down  em  1866,  sendo  uma  das  anomalias  cromossômicas  mais comuns. Em 1959, os cientistas Jerome LeJeune e Patricia Jacobs descobriram a causa dessa anomalia, sendo a trissomia do cromossomo 21 (Melo et al.,2017). 

3.2 Incidência de cárie e outras doenças bucais

De acordo com Falcão et al. (2019), a  literatura ainda  é  escassa  e  conflitante  no  que  tange  aos  achados  científicos  sobre  a  incidência  da  doença cárie em portadores de Síndrome de Down, dificultando o estabelecimento de conclusões concretas.  

Para Castilho e Marta (2010), há uma menor prevalência de cárie nesse grupo de indivíduos, o que provavelmente acontece pelo fato de terem uma  grande  tendência  aos  hábitos  de  bruxismo  que  deixa  a  superfície  dos  elementos  acometidos  lisas  e  desgastadas pelo ranger dos dentes, pelo aumento da capacidade tampão da saliva, e outra explicação seria o  atraso  na  irrupção dos  dentes,  presença  de  diastemas,  agenesias  e  perda  precoce  de  alguns  elementos  dentários. Contudo, há vários fatores encontrados no paciente sindrômico que explicam a alta predisposição à cárie como a dificuldade de manter uma higiene oral adequada, respiração bucal, dieta cariogênica e má oclusão que são fatores principais para o desenvolvimento da doença.

3.3 Características sistêmicas

Com relação a características sistêmicas, Mariano et al.  (1999) realizaram um estudo com 53 pacientes com Síndrome de Down no qual observaram que as alterações sistêmicas mais frequentes nesses pacientes foram: cardiopatia, pneumonia, alérgica, bronquite, amidalite, convulsão e discrasias sanguíneas. Ainda segundo esses autores, a cardiopatia congênita foi a alteração sistêmica mais encontrada (46,15%). 

3.4 Manifestações bucais

Com relação às características mais comuns relacionadas à pacientes com síndrome de Down, podem ser citadas principalmente:  lábios fissurados, mandíbula e cavidade oral pequenas,  língua  fissurada,  palato  duro  menor  e  de  forma  ogival,  úvula  bífida  bem  como  fenda  labial  e  palatina.  Também  são  encontradas  alterações  oclusais,  sendo  a  mais  comum  uma  má  oclusão  de  Classe  III  de  Angle  de  origem  essencialmente  esquelética,  caracterizada  pelo  posicionamento  mais  anterior  da  mandíbula  em  relação  à  maxila,  sendo  que  a  discrepância  pode  ser  causada  pela  deficiência  anterior  da  maxila,  prognatismo  mandibular  excessivo  ou  a  combinação  e,  mordida  cruzada  anterior  e  posterior.  A  posição  da  língua  mais  anteriorizada  produz  força  anormal  nos  dentes  anteriores.  Em alguns casos, bruxismo  e  macroglossia  decorrente  de  hipotonia  lingual,  retardo  na  erupção  dos  dentes  principalmente  dos decíduos, taurodontia, agenesias, microdentes, dentes conóides e hipodontia também podem ser encontrados em pacientes com essa síndrome (Rodriguez et al.,2015).

O bruxismo noturno também foi relatado e é comum devido a uma ansiedade crônica apresentada em pacientes sindrômicos. Esse hábito leva a um desgaste oclusal dos dentes, podendo causar em longo prazo sobrecarga dos tecidos de suporte e fratura dental, podendo ser necessário tratamento endodôntico em alguns casos. Além disso, há presença também do hábito de morder os lábios, podendo gerar a formação de lábios ressecados e vermelhos (SILVA, 2001).

3.5 Acolhimento família x importância do CD

De acordo com Camera et al. (2011) a prevenção é a melhor forma  de  atendimento  a  crianças  com síndrome de Down,  podendo alcançar  grandes  índices  de  sucesso.  A orientação  aos  responsáveis  sobre  as  anormalidades  da  Síndrome,  a  importância  do  cirurgião-dentista  nos  cuidados bucais necessários, estimulação do aleitamento materno quando possível, alimentação saudável, imunização   e   acompanhamento   periódico   devem   ser   preconizados;   higienização   supervisionada   é   fundamental  tendo-se  em  vista  a  predisposição  de  patologias  de  gengiva  e  deficiência  motora. Portanto, o papel da família é de suma importância para o sucesso  do  tratamento  odontológico.  O cirurgião-dentista deve estar atento ao  comportamento  do  paciente  e  de  seus  responsáveis,  quanto  à  ansiedade  e  superproteção  ou  rejeição, observando sempre se é um paciente colaborador ou se oferece dificuldades ao tratamento. Importante ressaltar que os cuidados e apoio da família são primordiais e indispensáveis, iniciando desde a infância até a fase adulta.

4. DISCUSSÃO

Pereira et al. (2022) realizaram um estudo por meio de um relato de caso no qual concluíram que, ao avaliar a condição periodontal destes pacientes  notou-se  que  há  uma negligência quanto a higiene relacionada a saúde bucal de pacientes com síndrome de Down, dentre outros fatores que  podem  agravar  ainda  mais  a  doença  periodontal,  como  a  resposta  imunológica alterada destes pacientes, idade e a dificuldade de coordenação motora para realizar a própria escovação. Em todos os pacientes analisados apresentou-se um alto acúmulo de biofilme  e  sangramento  gengival.  Além do acúmulo de biofilme sabe-se que  nestes pacientes  a  patogênese  da  doença  periodontal  é  acentuada  devido  à  resposta  imune mediada  por  células  e  humoral prejudicadas,  diminuição  da  resposta  quimiotática  e fagocitária, bem como por conta do aumento da quantidade de prostaglandinas. Concordando com esses preceitos, Algholme et al. (1999) concluíram que a frequência de periodontite em indivíduos com síndrome de Down aumentou acentuadamente durante um período de 7 anos, embora a gravidade e a progressão da doença tenham sido limitadas, em comparação com o que foi previamente relatado na literatura. Além disso, houve uma associação entre inflamação gengival e perda óssea alveolar, indicando que os programas preventivos de higiene oral devem ser considerados de particular importância para pacientes com síndrome de Down.

Ainda com relação à saúde bucal de pacientes com síndrome de down, a halitose é frequentemente relacionada a fatores de predisposição.  Na  literatura,  o  mau  hálito  não  é  descrito nas  crianças  com  Síndrome de Down,  mas  pode  se  tornar  presente em adultos sindrômicos devido a alguns fatores que se tornam cada vez mais presentes na cavidade oral dessa  parcela  da  população  à  medida em que  a  idade avança:  higiene  oral  precária,  respiração  bucal, motricidade oral deficiente, maloclusões e problemas periodontais. A língua apresenta a superfície bem fissurada e essas fissuras normalmente acumulam restos alimentares que propiciam halitose (GONZALES, 2002). Corroborando com esses estudos, os autores Agholme et al. (1999) ressaltaram em seus estudos a importância do conhecimento dos cirurgiões-dentistas acerca das doenças periodontais frequentes em pacientes com síndrome de Down, acrescentando que, dos indivíduos, 41% tinham uma ou mais bolsas periodontais patológicas no início do estudo, em comparação com 65% no acompanhamento. No exame inicial, 35% dos indivíduos apresentaram perda óssea alveolar em comparação com 74% no acompanhamento. 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base no que foi exposto, o cirurgião-dentista tem um papel primordial no atendimento odontológico aos pacientes com síndrome de Down. Além de manter o papel humanizado, o profissional precisa ter habilidade para reconhecer as principais manifestações bucais, garantindo direito à saúde bucal nesses pacientes especiais. 

REFERÊNCIAS

  1. Agholme, MB, Dahllöf, G. e Modéer, T. Mudanças no estado periodontal em pacientes com síndrome de Down durante um período de 7 anos. Jornal Europeu de Ciências Orais, 1999; 107: 82-88.
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