REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202410301034
Bruno A. Pereira¹; Daniel L. Barbosa¹; Jhon Lucas T. Santos¹; Kelly Cristina dos Santos de Beija¹; Ketlyn Cristina B. Paula¹; Larissa de Pina M. da Silva¹; Michelle G. dos Santos¹.
RESUMO
O atendimento veterinário domiciliar surgiu como uma alternativa interessante, afim de proporcionar um ambiente familiar para os felinos, resultando em consultas mais eficazes e em diagnósticos mais precisos, visto que os felinos são animais naturalmente mais estressados. Essa revisão bibliográfica analisa o impacto do atendimento domiciliar no bem-estar felino, destacando a redução do estresse, um diagnóstico preciso e acompanhamento mais eficaz como um dos principais benefícios. Medidas como controle de ruídos, uso de manta própria, feromônios e até o uso da Gabapentina podem contribuir para a calma do animal durante os atendimentos. Embora o atendimento em casa tenha benefícios, ele apresenta limitações, como a falta de equipamentos adequados e a necessidade de um espaço apropriado. A telemedicina é uma opção viável, desde que o animal já tenha sido avaliado presencialmente. Em conclusão, o atendimento veterinário domiciliar promove a saúde e o bem-estar dos gatos, reduzindo o estresse das consultas, auxiliando no diagnóstico e tratamento para os bichanos.
Palavras-chave: Estresse em felinos, veterinário domiciliar, bem-estar de gatos domésticos.
1 INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, os animais de companhia, especialmente os felinos, têm ganhado crescente popularidade. Em particular, os gatos vêm ocupando um espaço significativo no convívio doméstico, sendo frequentemente descritos por seus tutores como animais divertidos, afetuosos, esteticamente agradáveis, únicos e cativantes. Como resultado, são cada vez mais reconhecidos como membros integrantes da família (FARACO, 2021). Mas infelizmente alguns profissionais da saúde veterinária, não compreendem a natureza do gato e seu comportamento natural. Dentre outros fatores, a falta de compreensão adequada sobre as reações dos gatos ao medo e à dor, dificulta o progresso das consultas veterinárias e resulta em uma subsequente carência de cuidados veterinários de rotina (LITTLE, 2016). Nos últimos tempos, o atendimento à domicílio vem se destacando e ganhando popularidade no campo de cuidados veterinários, inicialmente popularizado com os humanos na pandemia do COVID-19 (INFORMATIVO 79, 2020).
O atendimento em domicílio tem algumas vantagens. Entre elas, o interesse dos tutores no que se refere a redução de estresse para o animal, em relação ao trajeto para a clínica ou até mesmo no manejo ao colocar o animal na caixa de transporte, a possibilidade de observação do comportamento e conforto gerado em um ambiente familiar. Todavia esses atendimentos comportam alguns desafios, como a necessidade de equipamentos portáteis e a limitação de alguns recursos em comparação a clínica ou hospital completo (QUIMBY; LAPPIN, 2010). O medo é a principal causa de comportamento inadequado e agressividade, em gatos (LITTLE, 2016). É definido como uma resposta emocional que capacita um animal a evitar situações e atividades potencialmente perigosas (LITTLE, 2016). O estresse resultante do medo pode gerar diversos efeitos negativos para os gatos. Entre esses efeitos estão as respostas hormonais que alteram a concentração das células sanguíneas, incluindo a diminuição da concentração de hemoglobina, aumento do número de eritrócitos, hematócrito, plaquetas e leucócitos (FAM et al., 2010). O estímulo de estresse pode ser dividido em três fases de respostas: Alteração comportamental, estimulação do sistema simpático (estresse agudo); e ativação do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (estresse crônico) (FAM et al., 2010).
Para assegurar o bem-estar do felino, preservar somente a saúde física não é o suficiente. O gato pode estar com a saúde física em boas condições e sem infecções ou outras doenças físicas, porém sofrendo com estresse grave e ansiedade. Nesse momento, não se pode avaliar sua saúde por completo, pois seu estado comportamental (emocional e psicológico) vão comprometer tanto sua saúde quanto o seu bem-estar e seus exames posteriores (LITTLE, 2016).
Consequentemente a saúde física e a comportamental são essenciais para o bem-estar, a fim de que os cuidados de saúde preventivos devem ser voltados para ambos os aspectos (LITTLE, 2016). Contudo, essa revisão bibliográfica, investigará como o atendimento domiciliar pode minimizar o estresse, melhorar a qualidade do atendimento veterinário e, consequentemente, promover o bem-estar geral dos felinos.
2 OBJETIVOS
Esta revisão bibliográfica teve como objetivo principal descrever os benefícios do atendimento domiciliar para o bem-estar dos felinos. Em paralelo, buscou-se avaliar as consequências do estresse no bem-estar dos gatos e identificar os fatores estressores presentes no cotidiano deles. Além disso, foram abordadas estratégias para reduzir o estresse durante o atendimento, visando melhorar a precisão dos diagnósticos, consequentemente, a saúde dos felinos e satisfação por parte de seus tutores.
3 MATERIAIS E MÉTODOS
Foi realizada uma revisão de literatura narrativa, efetuada através da seleção de diversos artigos, revistas científicas e livros, nos idiomas de português do Brasil e inglês. As palavras chaves utilizadas para realizar a pesquisa foram “estresse em felinos”, “veterinário domiciliar”, “bem-estar de gatos domésticos”, “medicina comportamental dos gatos”, “fisiopatogenia do estresse em felinos”, “manejo cat-friendly”, “telemedicina na veterinária”, sendo utilizados apenas artigos publicados entre os anos 2010 até 2024.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise sobre o bem-estar dos felinos no contexto do atendimento domiciliar revela dados significativos sobre a percepção dos tutores e o impacto desse tipo de serviço na saúde e comportamento dos gatos. Dados de diversas fontes indicam que esse modelo de atendimento oferece inúmeros benefícios para os felinos (FERREIRA; MONTEIRO, 2018). Os principais resultados incluem redução do estresse, satisfação dos tutores, saúde e bem-estar (FERREIRA; MONTEIRO, 2018).
Os estudos revisados indicam que o atendimento veterinário domiciliar para felinos oferece benefícios substanciais tanto para os animais quanto para seus tutores. A redução do estresse é um fator crucial, pois o ambiente doméstico minimiza os estímulos estressantes comuns em clínicas, como a presença de outros animais e o transporte até a clínica (QUIMBY; LAPPIN, 2010). O comportamento mais calmo dos gatos durante o atendimento domiciliar pode contribuir para diagnósticos mais precisos e tratamentos mais eficazes, uma vez que os sinais clínicos não são mascarados pelo estresse, pois trata-se de seu habitat adaptado do qual já está acostumado. Mas, é importante reforçar que, mesmo em casa, algumas medidas como diminuição de ruídos, temperatura agradável e cautela com os saneantes de limpeza devem ser observados e pontuados pelo médico veterinário, como seria realizado caso fosse na clínica (MELO, 2021). O estresse no felino pode manifestar-se através de sintomas como taquicardia, bradicardia, respiração acelerada, pressão arterial elevada, hiperglicemia, hipertermia, hipopotassemia, leucocitose, agregação plaquetária e neutrofilia (MELO, 2022).
O tutor também pode familiarizar o gato com procedimentos veterinários desde cedo, usando reforços positivos para diminuir o estresse, para que o animal possa tolerar o manejo durante a consulta, com procedimentos como manusear patas, escovar os pêlos e cortar unhas, por exemplo. Em casos extremos, com animais muito reativos e medrosos, o uso da gabapentina pode ser prescrita por um médico veterinário para reduzir a ansiedade e facilitar a manipulação do animal (MELO, 2022).
Além disso, também podem ser utilizados alguns métodos calmantes para o gato, como o uso de alguma manta comumente utilizada pelo animal em sua residência. Além de dar a sensação de proteção ao animal, auxilia na contenção do animal, principalmente ao realizar coleta sanguínea, ao qual pode ser feito com agulhas de baixo calibre, já que vários estudos comprovam que não ocorre a coagulação das amostras (BRANCO, 2022). O médico veterinário ainda pode adotar o uso de feromônios sintéticos que diminuem a ansiedade do bichano, assim como, o uso de Catnip que é um subproduto popularmente conhecida como erva-do-gato (Nepeta cataria) que gera interesse no gato em ficar naquele local (BRANCO, 2022).
4.1 Limitações e Normas para o atendimento domiciliar
O atendimento domiciliar é uma ótima alternativa à prestação de serviços médicos e redução de estresse dos felinos, mas possui algumas limitações e regras a serem seguidas. A realidade é que a maioria dos procedimentos médicos só podem ser feitos em clínicas e hospitais que têm condições e equipe para isso. Como consta nas normas do Conselho Regional de Medicina Veterinária de São Paulo, o atendimento domiciliar não é regulamentado, porém, a Resolução CFMV n.º 1275/2019, dispõe que procedimentos cirúrgicos, anestésicos e internações só podem ser realizados em clínicas veterinárias com centro cirúrgico, internação ou em hospitais veterinários (INFORMATIVO 79, 2020).
Atualmente é permitido aos profissionais realizarem em seus atendimentos domiciliares serviços como consultas, anamnese, coleta de parâmetros não invasivos, coleta de sangue para exames, aplicação de vacinas e medicamentos comuns, corte de unhas, microchipagens, curativos e atestados de saúde para viagens. Ainda podem ser realizados exames de imagem, desde que o animal não precise ser sedado ou anestesiado (CRMV-MS, 2017).
4.2 Telemedicina na Medicina Veterinária
De acordo com as normas estabelecidas pelo Conselho Regional de Medicina Veterinária de São Paulo (CRMV-SP), é permitido realizar atendimento domiciliar de forma remota em situações onde o veterinário e o paciente estão em locais diferentes, desde que não sejam casos de urgência ou emergência. Para isso, o animal deve ter passado previamente por uma consulta presencial. Essa flexibilização do atendimento remoto tem mostrado ser bastante eficaz no cuidado com gatos, já que o transporte até a clínica pode causar estresse considerável no animal (JUNIOR; PINHEIRO; LIRA, 2023), resultando em alterações na concentração de células sanguíneas (FAM et al., 2010).
Seguindo a resolução CFMV Nº 1.465/2022, o médico veterinário pode realizar a triagem dos pacientes remotamente, decidindo se é necessária uma consulta presencial imediata. Além disso, ele pode fornecer orientações sobre os cuidados com os pets. No entanto, nesse tipo de atendimento remoto, não é permitido fazer diagnósticos, definir tratamentos, solicitar exames ou prescrever medicamentos (CFMV, 2022). Para pacientes com doenças crônicas ou em recuperação de cirurgias, o atendimento online é autorizado desde que o profissional já tenha realizado uma consulta presencial prévia e mantenha uma consulta presencial a cada 180 dias (CFMV, 2022).
4.3 Melhor acompanhamento na saúde dos felinos
A alta satisfação dos tutores reforça a viabilidade e a aceitação desse serviço, sugere que a demanda por atendimento veterinário domiciliar possa crescer à medida que mais tutores se conscientizam dos benefícios. A confiança no veterinário e a percepção de uma abordagem personalizada são aspectos que devem ser mantidos e aprimorados para garantir a continuidade desse nível de satisfação (SILVA; DIAS, 2019).
Com isso, a maior frequência das consultas resultantes da conveniência do atendimento domiciliar tem implicações positivas na saúde preventiva dos felinos. A possibilidade de monitorar condições crônicas de forma regular pode levar a um manejo mais eficaz dessas doenças, melhorando a qualidade de vida dos animais (FERREIRA; MONTEIRO, 2018). No entanto, é importante considerar alguns desafios, como a logística do atendimento e a necessidade de um espaço adequado na residência do tutor para a realização dos procedimentos. Investir na formação contínua de veterinários especializados em comportamento felino e no desenvolvimento de protocolos específicos para o atendimento domiciliar pode ajudar a superar essas dificuldades (PEREIRA; MARTINS, 2015).
5 CONCLUSÃO
A análise do atendimento veterinário domiciliar para felinos ressalta sua relevância para o bem-estar dos gatos, ao proporcionar um ambiente menos estressante e favorecer diagnósticos e tratamentos mais eficazes. Os benefícios observados incluem a redução do estresse, a satisfação dos tutores e a melhoria da saúde dos animais, o que reflete a crescente aceitação desse modelo. Embora existam limitações e regulamentações a serem consideradas, a integração de telemedicina e atendimento domiciliar podem otimizar o acompanhamento da saúde felina, sempre mantendo um diálogo aberto com os tutores sobre a necessidade de consultas presenciais em clínicas ou hospitais veterinários.
Dessa forma, o atendimento domiciliar e o acompanhamento por telemedicina são ótimas alternativas para aprimorar a qualidade de vida dos felinos. A implementação de protocolos específicos e abordagens cat-friendly é fundamental para maximizar essa prática, promovendo uma relação mais saudável entre tutores e seus pets.
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¹Aluno do curso de Medicina Veterinária