ASSISTÊNCIA OBSTÉTRICA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA DE BARBACENA: ANÁLISE DOS SERVIÇOS DISPONÍVEIS E DO PAPEL DO FISIOTERAPEUTA

OBSTETRIC CARE IN PRIMARY CARE IN BARBACENA: ANALYSIS OF AVAILABLE SERVICES AND THE ROLE OF THE PHYSIOTHERAPIST.

ATENCIÓN OBSTÉTRICA EN ATENCIÓN PRIMARIA EN BARBACENA: ANÁLISIS DE LOS SERVICIOS DISPONIBLES Y EL PAPEL DEL FISIOTERAPEUTA.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7847352


Nájilla Resende Andrade¹
Tamires Aparecida Jaques de Resende²
Thaís Moraes Pinto Nascimento³
Ana Amélia de Souza4
Priscylla Lilliam Knopp5


RESUMO

Introdução: O pré-natal é um conjunto de ações focado na mulher e sua família. No que diz respeito à atuação do fisioterapeuta na ESF, as ações voltadas à saúde materno-infantil envolvem atividades em grupos de gestantes, prevenção, dentre outros. Objetivo: Analisar os serviços oferecidos pelas Unidades de Atenção Primária à Saúde para gestantes. Materiais e Métodos: Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada nas 19 UAPS do município de Barbacena. Foram entrevistados o responsável técnico, o fisioterapeuta e, gestantes através de três roteiros semiestruturados. Em primeiro momento foi realizada entrevista com os responsáveis por telefone e, em segundo momento a coleta de dados das fisioterapeutas e gestantes presencialmente. Após a coleta, os serviços oferecidos  foram apresentados através de estatística descritiva e a análise da percepção das gestantes pelo método da hermenêutica-dialética. Resultados: A partir da transcrição, identificou-se 23 categorias empíricas, sendo condensadas em três categorias principais analisadas conforme as categorias analíticas do referencial teórico do estudo. Conclusão: Apesar da identificação do alto nível de satisfação das gestantes com o cuidado pré-natal, foi constatado o desconhecimento a respeito da assistência fisioterapêutica voltada para gestantes.

Palavras-chave: Gestantes; Atenção Primária à Saúde; Fisioterapia.

SUMMARY

Introduction: Prenatal care is a set of actions focused on women and their families. With regard to the role of the physiotherapist in the ESF, actions aimed at maternal and child health involve activities in groups of pregnant women, prevention, among others. Objective: To analyze the services offered by the Primary Health Care Units for pregnant women. Materials and Methods: This is a qualitative research carried out in the 19 UAPS in the municipality of Barbacena. The technician in charge, the physiotherapist and pregnant women were interviewed through three semi-structured scripts. At first, interviews were conducted with those responsible by telephone and, secondly, data were collected from physiotherapists and pregnant women in person. After collection, the services offered were presented through descriptive statistics and the analysis of the pregnant women’s perception through the hermeneutic-dialectic method. Results: From the transcription, 23 empirical categories were identified, being condensed into three main categories analyzed according to the analytical categories of the theoretical framework of the study. Conclusion: Despite the identification of the high level of satisfaction of pregnant women with prenatal care, a lack of knowledge about physiotherapeutic assistance aimed at pregnant women was observed.

Keywords: Pregnant women; Primary Health Care; Physiotherapy.

RESUMEN

Introducción: La atención prenatal es un conjunto de acciones enfocadas en la mujer y su familia. En cuanto al papel del fisioterapeuta en la ESF, las acciones dirigidas a la salud materno-infantil involucran actividades en grupos de gestantes, prevención, entre otras. Objetivo: Analizar los servicios que ofrecen las Unidades de Atención Primaria de Salud a la mujer embarazada. Materiales y Métodos: Se trata de una investigación cualitativa realizada en las 19 UAPS del municipio de Barbacena. El técnico a cargo, el fisioterapeuta y las gestantes fueron entrevistados a través de tres guiones semiestructurados. En un primer momento, se realizaron entrevistas telefónicas a los responsables y, en segundo lugar, se recogieron datos de fisioterapeutas y embarazadas de forma presencial. Después de la recolección, los servicios ofrecidos fueron presentados a través de la estadística descriptiva y el análisis de la percepción de las mujeres embarazadas a través del método hermenéutico-dialéctico. Resultados: A partir de la transcripción se identificaron 23 categorías empíricas, siendo condensadas en tres categorías principales analizadas según las categorías analíticas del marco teórico del estudio. Conclusión: A pesar de la identificación del alto nivel de satisfacción de las gestantes con la atención prenatal, se observó un desconocimiento sobre la asistencia fisioterapéutica dirigida a las gestantes.

Palabras llave: Mujeres embarazadas; Primeros auxilios; Fisioterapia.

1 INTRODUÇÃO

A Atenção Primária à Saúde (APS) é a principal porta de acesso à rede de serviços de saúde no Brasil. Ela é organizada pela estratégia de Saúde da Família (ESF)2 e tem como objetivo atender as necessidades de saúde de uma população de forma regionalizada, contínua e sistemática.1

Embora não haja atribuições específicas para fisioterapeutas na equipe de saúde da família, sua inclusão tem sido considerada relevante. O fisioterapeuta atua apoiando a equipe de saúde da família em atividades individualizadas ou coletivas, como grupos para crianças, idosos e gestantes, e planeja ações de forma clínica ou interdisciplinar. 2

A Estratégia de Saúde da Família, busca uma abordagem diferente do processo saúde-doença, tendo como objetivo levar equipes multidisciplinares para perto das famílias. Um dos serviços oferecidos é o cuidado à saúde materno-infantil, que inclui o pré-natal, importante para prevenir complicações e evitar mortes do feto e da gestante.5

Assim, a assistência pré-natal nas Unidades de Atenção Primária deve seguir os princípios da APS e incluir procedimentos de busca ativa para captar gestantes precocemente. As atividades incluem visitas domiciliares, educação em saúde, estabelecimento de vínculo com maternidade de referência, dispensação de medicamentos, vacinação, exames e encaminhamentos quando necessário. Fisioterapeutas na ESF podem atuar em grupos de gestantes, prevenção postural, saúde da criança, e realizar atendimentos individuais.4,8

A despeito da oferta de serviços no município, observa-se grande número de falhas da atenção primária na assistência obstétrica. Dentre os pontos negativos, citam-se: falta de humanização por parte dos profissionais envolvidos, orientações escassas, dificuldade de acesso, início tardio do pré-natal, ausência de visita a maternidade de referência, dentre outros. Todos esses fatores podem prejudicar a qualidade da assistência e possibilitar o aumento de mortalidade materna e neonatal.15,16,12 Esta lacuna despertou o interesse em pesquisar sobre o tema, no intuito de identificar e analisar os serviços oferecidos pela rede assistencial à gestante nas 19 UAPS presentes no município de Barbacena – Minas Gerais.

2 OBJETIVO

Analisar os serviços oferecidos pelas Unidades de Atenção Primária à Saúde voltados para gestantes.

MATERIAIS E MÉTODOS

A pesquisa foi realizada em Barbacena/MG, município que possui 25 Equipes  de ESF, 9 Equipes de Saúde Bucal e 3 Núcleos Ampliados de Saúde da Família e Atenção o Básica6 (NASF-AB) que conta com o serviço de 5 fisioterapeutas. Estas equipes estão alocadas em 19 UAPS, perfazendo uma cobertura de cerca de 83% da população da cidade.

3.1 Participantes

Integraram o campo de estudo as 19 UAPS do município. Em cada UAPS foram entrevistados o responsável técnico da equipe, o fisioterapeuta que dá apoio à ESF’s e as gestantes que realizaram acompanhamento.

O número máximo de responsáveis técnicos (RT) entrevistados seria de 19 e do de fisioterapeutas, cinco. Portanto, o critério de inclusão dos RT e fisioterapeutas foi a ocupação do cargo e aceite na participação. Foram incluídas as gestantes que realizaram no mínimo uma consulta pré-natal em cada UAPS pesquisada. O somatório de entrevistas de gestantes foi de limitado pelo método da saturação, procedimento que visa interromper a coleta qualitativa de dados mediante identificação de redundâncias nas informações dos interlocutores.9

Foram excluídos os fisioterapeutas e gestantes que não desejaram participar do estudo, gestantes menores de idade, assim como gestantes de alto risco, uma vez que a percepção sobre a gestação para estas mulheres é diferenciada.

3.2  Coleta de dados

Para coleta de dados foram utilizadas entrevistas com três roteiros semiestruturados, um para os responsáveis de cada UAPS, outro para os fisioterapeutas e um específico para gestantes. A coleta de dados através destes instrumentos permitiu o levantamento dos serviços oferecidos pelas UAPS e a percepção das gestantes sobre a assistência.

As entrevistas com os responsáveis técnicos foram realizadas e gravadas por telefone mediante autorização do pesquisado, para posterior análise. Às entrevistas com as fisioterapeutas e gestantes foram realizadas presencialmente, também foram gravadas com a autorização dos participantes para depois serem analisadas. Foram realizadas em um local indicado pelo responsável técnico da UAPS, a fim de evitar constrangimentos no local de trabalho e conferir maior liberdade e segurança para expressão dos pesquisados.

Como prevenção e seguindo as regras para oferecer melhor segurança para pesquisadores e voluntários, as entrevistas foram feitas com utilização de máscaras, de álcool gel nas superfícies tocadas e nas canetas após utilização e manutenção do distanciamento mínimo obrigatório.

3.3 Análise de dados

Os serviços oferecidos pelas UAPS e pelos fisioterapeutas são apresentados através de estatística descritiva (frequências, média e desvio-padrão) conforme as categorias de assistência pré-natal. Por sua vez, a análise da percepção das gestantes se deu pelo método da hermenêutica-dialética. Essa forma de análise é baseada nos conceitos de compreensão da linguagem interpretando o discurso do sujeito, pela lógica da totalidade e da contradição, e o seu contexto social e histórico, respectivamente.9,10

Para a fase analítica utilizaremos da proposta de Minayo11, realizando os seguintes procedimentos:

  1. Transcrição das entrevistas realizada com os responsáveis técnicos, fisioterapeutas e gestantes.
  2. Organização sistemática do material onde separamos por participantes.
  3. Leitura horizontal do material e formulação das categorias teóricas empíricas (ou operacionais).
  4. Leitura transversal do material a partir das categorias empíricas formadas.
  5. Análise final: discussão entre as categorias empíricas e as categorias teóricas analíticas oriundas do referencial teórico do estudo. conforme as categorias analíticas do referencial empírico do estudo.

3.4 Aspectos Éticos

Este estudo segue os preceitos éticos emitidos pelo Conselho Nacional de Saúde, segundo resolução nº466, de 12 de dezembro de 2012. Apresenta riscos mínimos em sua execução, aqueles comuns às atividades de vida diária como conversar com terceiros.

Este estudo conta com a autorização do secretário de saúde de Barbacena e os Termos de Consentimento Livre para cada um dos participantes. A assinatura do TCLE pelos responsáveis técnicos foi digital, com o termo enviado por e-mail, uma vez que a entrevista foi por telefone, já o TCLE dos fisioterapeutas foi assinado no ato da entrevista, visto que foi realizada de forma presencial.

Após submissão e aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) de número 4.481.843-22/12/20, foi realizado convites às UAPS de Barbacena para participarem da pesquisa e início da coleta de dados com os responsáveis técnicos. Após término do isolamento social, as  gestantes foram entrevistadas.

4. RESULTADOS

4.1 Procedimentos de campo e análise das transcrições

A partir da transcrição das entrevistas, identificou-se 23 categorias empíricas, das quais, foram condensadas em três categorias principais. A primeira categoria, denominada C1, refere-se às formas de assistência que incluem os serviços oferecidos para as gestantes e os profissionais atuantes. C2 diz respeito às especificidades da assistência fisioterapêutica, descrevendo os atendimentos prestados no período gestacional, enquanto a categoria C3 trata da percepção das gestantes acerca da assistência oferecida nas UAPS. É importante ressaltar que foram utilizados pseudônimos ao referenciar as falas.

4.2 Caracterização dos entrevistados: Responsáveis técnicos e Fisioterapeutas

Os 19 responsáveis técnicos (RT) das UAPS pesquisadas são, em sua maioria, enfermeiros, com média de idade de 37 anos. Em apenas uma UAPS, a RT era técnica de enfermagem, mas ocupava esta função em substituição a enfermeira que estava de férias.

A amplitude do tempo de trabalho desses responsáveis técnicos varia de cinco dias a oito anos. Esta característica é produto das consecutivas mudanças de gestores no município que modificam, a cada nova administração, os RT´s das unidades. Este fato influência nas respostas das entrevistas deste estudo, uma vez que, considerando os profissionais com pouco tempo de trabalho nos locais, não houve tempo hábil para que eles se apropriassem da realidade e dinâmica dos serviços oferecidos. Inclusive, nota-se igualmente que, entre os fisioterapeutas, a variação no tempo de serviço é de três a treze anos.

As pós-graduações dos referidos RT´s, quando existentes, são alocadas nas áreas de Obstetrícia, Estratégia de Saúde da Família, Urgência e Emergência intra e pré-hospitalar, Gestão em saúde, Terapia Intensiva, Saúde Pública e MBA em Gestão  e Auditoria. Assim, percebe-se que algumas formações continuadas atendem às necessidades e lógicas próprias da atenção primária, enquanto outras são mais condizentes com a atenção especializada em nível pré-hospitalar e hospitalar.

Em relação às 5 fisioterapeutas entrevistadas, cuja média de idade é de 36  anos, apenas duas possuem especialização voltada para atenção primária à saúde, das quais constam: Atenção Domiciliar e Saúde Pública. Portanto, evidencia-se um descompasso entre a prática profissional e seu conhecimento teórico sobre seu campo de atuação.

DISCUSSÃO

5.1  Formas de assistência: os serviços oferecidos e os profissionais atuantes

As gestantes do município de Barbacena são vinculadas às UAPS através do programa de assistência pré-natal, levando em      consideração seu endereço. Conforme recomendações do Ministério da Saúde12, a assistência pré-natal deve ser ofertada através de medidas integralmente acolhedoras, desenvolvendo ações preventivas e facilitando o acesso aos serviços de saúde oferecidos. Em conformidade a este pressuposto, identificam-se no campo deste estudo uma série de serviços com a mesma finalidade, a exemplo das falas de alguns responsáveis técnicos, como:

Quando a gente identifica alguma coisa, aí a gente encaminha de forma preventiva (RT Lúcia)
A gente segue basicamente o protocolo do ministério. (RT Emerson)

Assim, nota-se que o discurso dos profissionais é síncrono ao que o Ministério da Saúde preconiza, pois, identificam-se em suas práticas a verificação de necessidades “maiores” e atuação de forma preventiva. É importante avaliar, contudo, em que medida a observação dos protocolos ministeriais torna a assistência gestacional excessivamente padronizada, uma vez que, independente de qual UAPS a gestante for atendida, receberá o mesmo conjunto de serviços relacionados ao pré-natal. Portanto, cabe questionar se esta padronização observada   em Barbacena, ainda que atenda aos protocolos ministeriais, pode limitar a oferta de uma assistência particularizada às necessidades de cada gestante/parceiro(a).

Há espaço, contudo, para certa flexibilidade entre as equipes estudadas, configurando uma dinâmica que opera entre padronização e singularidade da assistência, como se identificam nas falas em que os entrevistados citam a situação de gestantes que desejam atendimento em UAPS fora do seu local de cadastro. Como exemplo, segue o fragmento de entrevista do RT Marcelo:

A gente não pode limitar a gestantes só do bairro, as do bairro é mais fácil de ter o controle sobre elas, informações, entrega de exame, consultas, então fica tudo mais fácil, mas a gente não pode limitar qualquer gestante que venha de Barbacena que queira fazer o pré-natal aqui na unidade.

Portanto, caso a gestante não se adapte à unidade ou tenha preferência por realizar o acompanhamento em outra UAPS, o SUS garante a transferência segura e a continuação dos atendimentos em outra unidade do município.13 Desse modo, como demonstra a fala de Marcelo, as gestantes podem realizar o acompanhamento mesmo  não sendo em seu território de abrangência.

Independente da UAPS escolhida, o cadastro e acompanhamento das gestantes é feito o mais rápido possível, de preferência no 1º trimestre da gravidez. Abaixo a responsável Isadora fala sobre o cadastro na UAPS em que trabalha.

A paciente tem que tá gestante, ela vai trazer o exame quando tiver feito, se não tiver a gente vai solicitar. Tendo confirmado… A gente faz o cadastro e vai acompanhando essa gestante durante os 9 meses. (RT Isadora)

Para assegurar a precocidade de acesso a estes serviços, as unidades devem garantir a possibilidade de que as mulheres realizem o teste de gravidez.14 Deste modo, o início do pré-natal requer a apresentação do exame sanguíneo de Beta-HCG positivo para não retardar o início do acompanhamento.

Os exames sanguíneos do período gestacional, dos quais inclui-se o Beta- HCG, são garantidos pelo SUS, conforme a fala do responsável técnico Emerson: “Os exames são ofertados via SUS durante todo trimestre de gestação”. É notório que as UAPS de Barbacena seguem o que é recomendado durante  o acompanhamento pré-natal sobre os exames laboratoriais, mas a capacidade real de executá-los, assim como provê-los em tempo hábil pode ser um fator limitante.

Além dos exames laboratoriais, o acompanhamento dos ACS é um aspecto diferencial da assistência à gestante. Carvalho15 mostra que são sete as competências atribuídas ao ACS na Saúde da Mulher, dentre elas, visita domiciliar, trabalho em equipe, promoção de saúde e o acompanhamento. O referido autor os considera fundamentais para a identificação e gerenciamento desse recorte populacional, portanto, são elos importantes da cadeia assistencial. O trecho de entrevista a seguir retrata a ação dos ACS:

Não, o SUS é pra todas as gestantes, mesmo sendo pré-natal particular a gente tem que fazer o cadastro dela, o Agente Comunitário vai fazendo a busca ativa de como tá o andamento dela no pré-natal, porque se acontecer de ela ter um aborto espontâneo ou acontecer um parto prematuro eu tenho que ter notícia dessa gestante, mesmo sendo particular. (RT Aline)

A assistência pré-natal deve acompanhar a evolução da gestação, evitar quando possível as complicações e fornecer uma assistência de qualidade por profissionais capacitados.16 Nas 19 UAPS envolvidas neste estudo o trabalho através de equipes multiprofissionais se apresenta, como citado pela RT Rose.

Tem os profissionais do NASF, né, que é composto por educador físico, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, assistente social, nutricionista, é… tem os médicos clínicos né, aqui a gente possui é… médicos residentes também em saúde da família e comunidade é… tem a ginecologista e a obstetra que atende pela FUNJOB e a dentista né, a parte da odontologia.

Contudo, embora o trabalho multiprofissional se faça presente, identificam-se poucas ações que são realmente compartilhadas entre os profissionais, já que cada um desenvolve ações em sua respectiva área e poucos serviços envolvem alguma articulação real de saberes e intervenção conjunta.

5.2 Especificidades da assistência fisioterapêutica

A fisioterapia pode atuar na prevenção, promoção e tratamento de dores e desconfortos geradas durante a gestação. Segundo Júnior18 a  gestação significa, sobretudo uma série de compensações geradas pelo corpo das gestantes. Entre essas compensações estão: desconforto respiratório, repercussões na postura corporal e a principal citada foi a dor lombar.

Dentre as formas de atuação deste profissional, encontra-se os grupos operativos. Neles são feitas orientações quanto ao relaxamento, exercícios de alongamento, auxílio do retorno venoso e orientações quanto às posturas corporais, exercícios respiratórios, cuidados com o bebê e aleitamento.18 Para Araújo et al19, a atividade em grupo é extremamente importante, pois, ajuda na diminuição dos medos e inseguranças e é um momento de partilha de experiências. O fragmento da fala da fisioterapeuta Paula demonstra exemplo de atividade em grupo com as gestantes realizada em Barbacena.

Então, nosso trabalho com gestantes tem sido muito atividade de grupo, na maioria das vezes eu trabalho com elas só em grupos de gestantes tá… que a gente faz esses grupos ou o CRAS, então como são feitos esses grupos, diversos temas por exemplo, tem diversos profissionais… (Fisioterapeuta Paula)

Conforme a fala da fisioterapeuta Paula, identificou-se, nesta pesquisa, que uma das intervenções realizadas era o grupo de gestantes, mas, devido à pandemia, ele foi suspenso, sem que houvesse alternativas de trabalho. Não  foi citado pelos entrevistados nenhuma modalidade assistencial à distância durante o período de pandemia, embora a realização de grupos virtuais pudesse ser uma possibilidade. O estudo de Nobrega et. Al20 demonstra a importância de grupos virtuais, independente da realidade pandêmica, realçando a importância do grupo como forma de apoio.

Para Melo21, as rodas de conversa são uma modalidade de grupo que proporciona o reforço do vínculo entre equipe e população, além de promover a maior interação entre os participantes, o que contribui para novas ações e mudanças no cotidiano. A respeito dos grupos de gestantes oferecidos, foi relatado por mais de um responsável a persistência em mantê-los e diversas tentativas de chamar a atenção das grávidas:

Tinha uns grupos de gestante apesar de que os grupos de gestante a adesão é muito baixa, muuito, é o único que não dava muito certo a gente já insistiu várias vezes, mas assim sempre vem uma ou duas só. (RT Rose)

Apesar da importância dos grupos de gestantes, o interesse em participar do mesmo se mostrou baixo, mesmo quando criadas alternativas para atraí-las. Segundo  Hoga et all22 em estudo acerca de como montar estratégias para um grupo de gestantes, a média de participantes se manteve alta em todos os encontros desde que sejam utilizadas metodologias apropriadas ao desenvolvimento de grupos. Este cuidado facilitaria a adequação do processo grupal e o atendimento das demandas próprias das gestantes e de seus familiares.

No contexto da pandemia do novo coronavírus (COVID-19) as equipes multiprofissionais tiveram dificuldade em realizar ações consideradas simples, todavia essenciais e efetivas no cuidado, um dos serviços que sofreu alteração diante a pandemia, foi justamente a realização dos grupos de gestantes, como dito pela responsável técnica Rose:

“Agora com a pandemia não tá tendo mais.”

Observa-se que, ao abordar o tema da assistência pré-natal na atenção primária, os responsáveis técnicos citaram orientar as gestantes como uma de suas principais práticas. Nas entrevistas desta pesquisa, algumas gestantes relataram as orientações recebidas destacando alguns pontos relacionados com o estudo de Júnior18, a respeito das ações de orientação em grupo. Os trechos a seguir são ilustrativos:

O que comer. O que não comer. O que eu posso fazer, minhas atividades físicas, tudo. Agora não tô lembrando, mas eles me passaram tudo. Não tenho dúvida quanto a isso não. (Gestante Luana)
O jeito certo de dá mama, a forma certa de tomar remédio. (Gestante Mara)

Percebe-se, assim, que uma boa orientação é imprescindível para este público, visto que as gestantes estão entrando em uma nova fase da vida em que se apresentam muitas dúvidas e incertezas. O  trecho a seguir exemplifica esse aspecto:

É… lá na UBS a gente procura oferecer instrução principalmente, porque muitas chegam lá e não sabem nem como engravidou para você vê. É muita falta de informação. (RT Mariana)

Em contrapartida, algumas relataram que não receberam nenhuma orientação. Quando foi questionado sobre as orientações recebidas obtivemos como resposta das gestantes respectivamente, Angélica e Vanessa, “Não muito” e “Não…”. Essas falas, contraditórias, sugerem a instabilidade dos serviços oferecidos que ora informam; outras não.

Foi verificado no estudo de Gomes et. Al23 que 95,23% das gestantes relatam dor lombar durante a gestação. Este foi, igualmente, a maior queixa relatada durante as entrevistas. As fisioterapeutas citaram que a principal procura pela fisioterapia tem relação com lombalgia. Segundo relato da fisioterapeuta Joice:

É gestante a gente já sabe que a parte de dores lombar é obvio né, não tem como elas não sentirem então assim a gente realmente já pensou em ter um trabalho nessa parte de ajuda no pré-parto né.

Não só os fisioterapeutas, mas os próprios responsáveis técnicos da UAPS relataram essa queixa das gestantes quanto a dor lombar, o que reforça o sistema de encaminhamento dessas gestantes para a fisioterapia, conforme demonstra a fala:

A gente trabalha em conjunto né, muitas vezes a gestante no final da gestação queixa muito em lombalgia, aí a gente trabalha muito com a fisioterapia nessa parte da orientação, a forma de descanso que ela vai ter que se posicionar na cama, aí tudo isso a gente encaminha pro fisioterapeuta pra tá indicando e informando pra ela. (RT  Marcelo)

Embora Marcelo indique esse trabalho “em conjunto”, algumas gestantes negaram o acompanhamento com a fisioterapeuta, inclusive, citaram desconhecer tal serviço. No conteúdo das falas, não foi possível discernir se esta limitação é originada do não encaminhamento dos RT, do desconhecimento da população sobre a atuação da fisioterapia na APS ou ainda nenhuma iniciativa/devolutiva dos fisioterapeutas em relação a essa demanda. Contudo, quando questionados, os fisioterapeutas argumentam que a falta de recursos é um grande empecilho para que possam desenvolver as atividades propostas como mostra a fala da fisioterapeuta Paula:

Então a gente ainda trabalha com orientação, trabalho de prevenção, atividade em grupo […] e os atendimentos individuais […] mas como a gente não tem muito recurso e material pra isso, a gente fica bem limitado…

Quando foi questionado sobre a percepção das gestantes acerca dos serviços prestados pelo fisioterapeuta, a grande parte das gestantes manifestou não saber que era oferecido esse serviço em suas respectivas unidades de saúde, como se identifica nos fragmentos:

“Não, nunca ouvi falar não” (Gestante Mara)
“Eu não fiz, mas já ouvi falar, dizem que é muito bacana né…” (Gestante Kênia)

Portanto, nota-se uma grande lacuna quando falamos dos serviços prestados pelos fisioterapeutas nas UAPS de Barbacena, visto que a grande maioria das gestantes mal sabia da existência do serviço.

Outro ponto importante a ser destacado é que no decorrer das entrevistas, identificou-se a baixa adesão de gestantes aos serviços oferecidos de forma multidisciplinar, além do pré-natal, como citado pela responsável técnica Ayla:

O problema é que eles não sabem aproveitar, elas têm tudo dentro da unidade, eles têm fisioterapeuta, fono, psicológico, assistente social, tem tudo, mais a população não consegue aproveitar o que tem.

Tal fator pode ser correlacionado com a falta de informação e oferta dos serviços existentes, já que, gestantes e demais entrevistados, entram em contradição quando questionado sobre a procura e oferta.

CONCLUSÃO

Através do presente estudo foi possível compreender a percepção das gestantes em relação ao acompanhamento recebido na assistência primária à saúde, relatando as possibilidades no atendimento pré-natal. Apesar da identificação de algum nível de satisfação das gestantes com o cuidado pré-natal, foi constatado o desconhecimento sobre a assistência fisioterapêutica para gestantes.

Foi evidenciada a baixa adesão das gestantes aos serviços oferecidos de forma grupal, ainda que este serviço esteja suspenso devido ao período de pandemia do Covid-19. Além disso, um ponto importante destacado pelas fisioterapeutas, é a falta de recursos para realizar atendimento de forma adequada prejudicando o desenvolvimento de determinadas atividades. Essa constatação pode colaborar para a conscientização dos gestores de saúde de como este tipo de insatisfação pode afetar a adesão das gestantes ao cuidado pré-natal e consequentemente podem influenciar a saúde materna-infantil do município, sendo este um problema já relatado a seus superiores, mas, sem retorno significativo.

Em relação à baixa adesão devem ser avaliados vários fatores, como: a distância que devem percorrer até o local de atendimento, temáticas que sejam relevantes e deem abertura a questionamentos sem roteiro fixo e que promova interação entre as participantes na modalidade de atendimento grupal.

Quanto à suspensão dos grupos, notamos que não houve tentativa de dar continuidade, buscando outras maneiras de interação entre elas, como, atendimento virtual. Evidencia-se assim a necessidade da equipe multiprofissional, que tem o cuidar como essência profissional, a discussão de novas formas para desenvolver as atividades relacionadas à educação em saúde e oferta do serviço fisioterapêutico. Como sugestão, considera-se integrar ao grupo de gestantes mulheres em período puerperal para que haja trocas de experiências, buscando, desta forma aprimorar o atendimento. Por este motivo, se reforça a continuidade deste estudo com a inclusão de puérperas.

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¹graduada em Fisioterapia. UNIPAC – Barbacena/MG. Av. Sete de Setembro, 615, matozinhos, São João del Rei/MG. Email: najillaresende@hotmail.com. Tel: 32 999460394
²graduada em Fisioterapia. UNIPAC – Barbacena/MG. Rua poeta Venâncio castanheira filho, 16, colônia do marçal, São João del Rei/MG. Email: tamiresjaques@hotmail.com. Tel: 32 98705-4097
³graduada em Fisioterapia. UNIPAC – Barbacena/MG. Rua Artur Bernardes, 256, apt 501, centro, Barbacena/MG. Email: thaismnascimento@outlook.com.br. Tel: 32 98816-9844
4graduada em Fisioterapia. UNIPAC – Barbacena/MG. Tel: 32 99800-3723
5Dra. em saúde coletiva IESC/UFRJ. Email: contato.pririani@gmail.com
6Até o momento de construção da metodologia deste trabalho de conclusão, a prefeitura de Barbacena manteve a nomenclatura NASF-AB. A partir de primeiro semestre de 2021, as referidas equipes estão passando por transição para o modelo Previne Brasil de equipes multiprofissionais de atenção básica.