ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA  HANSENÍASE NO ESTADO DO PARÁ, ENTRE 2016 E 2022

EPIDEMIOLOGICAL ASPECTS AND SPATIAL DISTRIBUTION OF  LEPROSY IN THE STATE OF PARÁ, BETWEEN 2016 AND 2022 

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202409281802


Jean Felipe da Costa Cordeiro1; Mayara do Socorro de Aquino Costa2; Aline Andrade Lopes3; Maria Eduarda Carvalho Pinto4; Jonathan Raony Souza da Silva5; Thalia Reis Pereira6; Samarah Pinheiro da Silva Costa7; Mayse Barbosa Lins8; Vitória Maria Lima da Fonseca Negrão9; Rita do Socorro Brito Feio10


Resumo 

A Hanseníase ainda é uma doença de elevada relevância para a saúde pública. O Brasil é o  segundo entre os países com maior prevalência da doença, e o Pará é o terceiro entre os estados  brasileiros. Esforços para o diagnóstico precoce e tratamento em tempo oportuno obtiveram  sucesso relativo, porém a doença segue sendo um problema de saúde. Objetivo: Descrever o  perfil epidemiológico dos casos notificados de hanseníase ocorridos no Pará. Métodos: Estudo  epidemiológico do tipo transversal e retrospectivo, acerca do perfil de saúde e espacial dos  pacientes com hanseníase no Pará, a partir de casos notificados entre 2016 e 2022. Foram utilizados dados de bancos oficiais do Ministério da Saúde. Resultados: O número total de  casos notificados foi de 15.003 casos. O Pará apresentou cerca de 10% desse total. Belém  apresentou 1522 novos casos. A população que estudou até a 4ª série do Ensino Fundamental  teve 3468 novos casos; enquanto aqueles que ingressaram no Ensino Superior, apenas 613.  Pessoas autodeclaradas pardas tiveram 11.074 notificações; 9.353 dos novos casos foram  indivíduos do sexo masculino, e pessoas entre os 30 a 39 anos responderam por 2.791 casos. A  classe Multibacilar estava presente em 11.486 das notificações. Conclusão: O estado do Pará  é o terceiro em número de notificações; Belém é o município com maior incidência. Pessoas  com menor escolaridade são mais acometidas que pessoas com maior grau de escolaridade; e a  incidência é maior entre pessoas autodeclaradas pardas, entre 20 e 69 anos, e do sexo masculino.

Palavras-chave: Hanseníase; Perfil de Saúde; Notificação de Doenças; Distribuição Espacial. 

ABSTRACT 

Introduction: Leprosy is still a disease of high relevance to public health. Brazil is second  among the countries with the highest prevalence of the disease, and Pará is third among  Brazilian states. Efforts for early diagnosis and timely treatment have had relative success, but  the disease remains a health problem. Objective: To describe the epidemiological profile of  reported cases of leprosy occurring in Pará. Methods: Cross-sectional and retrospective  epidemiological study, about the health and spatial profile of patients with leprosy in Pará,  based on cases reported between 2016 and 2022. Data from official databases of the Ministry  of Health were used. Results: The total number of reported cases was 15,003 cases. Pará  presented around 10% of this total. Belém presented 1522 new cases. The population that  studied up to the 4th grade of Elementary School had 3468 new cases; while those who  entered Higher Education, only 613. People self-declared as brown had 11,074 notifications;  9,353 of the new cases were males, and people aged 30 to 39 accounted for 2,791 cases. The  Multibacillary class was present in 11,486 of the notifications. Conclusion: The state of Pará  is third in number of notifications; Belém is the municipality with the highest incidence. People with less education are more affected than people with a higher level of education; and  the incidence is higher among self-declared brown people, between 20 and 69 years old, and  men. 

Keywords: Leprosy; Health Profile; Disease Notification; Spatial distribution.

1. INTRODUÇÃO 

A Hanseníase se caracteriza, hoje, como um importante desafio em saúde pública, no  Brasil. O país ocupa o segundo lugar na prevalência de casos, atrás apenas da Índia. Em 2020,  segundo dados do Ministério da Saúde, 93,6% de todos os casos da América Latina foram  diagnosticados neste país (BRASIL, 2022). 

Em 1991, o Brasil firmou o primeiro compromisso com a OMS de eliminar a Hanseníase  como problema de saúde pública até o ano de 2015, ou seja, alcançar a meta e reduzir a  prevalência para menos de 1 caso a cada 10 mil habitantes em todos os municípios do Brasil.  Em 2005 e em 2011 o compromisso foi reafirmado, porém sem sucesso (SANTOS et al, 2019).  Hoje, o país permanece dentro dos padrões de alta endemicidade, sobretudo nas áreas  endêmicas: as Regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste (BOIGNY et al, 2019). 

A hanseníase, amplamente conhecida como lepra, é uma doença crônica,  infectocontagiosa, cujo agente etiológico é o Mycobacterium leprae, também denominado  bacilo de Hansen. Essa enfermidade tem como característica o acometimento dos nervos  superficiais da pele e dos troncos nervosos periféricos, por isso os primeiros sinais aparecem  na forma de lesões cutâneas – as quais apresentam alteração da sensibilidade térmica, dolorosa  e tátil – e de sintomas neurais periféricos, podendo levar a sérias incapacidades físicas  (BRASIL, 2022). 

A hanseníase é uma doença antiga, sendo conhecida de 3 a 4 mil anos na Índia, na China,  no Japão e no Egito (BRASIL, 2022). Descrita na Bíblia com o termo “lepra”, era considerada  mais como uma maldição ou castigo divino do que como uma enfermidade corporal. As  primeiras ações profiláticas contra a doença se deram no Concílio de Lyon, em 583, onde foi estabelecido o isolamento das pessoas acometidas. A “lepra” chegou nas Américas com o  processo de colonização, juntamente com imigrantes da Holanda, França, Espanha e Portugal.  Os primeiros casos foram descritos em 1600 (FERREIRA, 2019). 

As primeiras medidas profiláticas levaram ao surgimento de instituições para abrigar os  doentes. Em Belém do Pará foi fundado, em 1815, o “Hospital dos Lázaros”. No Maranhão,  criou-se as “aldeias de leprosos”, e em São Paulo, o Hospital dos Morféticos” (FERREIRA,  2019). 

Em 2010, o Ministério da Saúde instituiu o Programa Nacional de Controle da  Hanseníase, que visa o fortalecimento das ações de vigilância epidemiológica da hanseníase,  bem como à organização da rede de atenção integral e promoção da saúde com base na  comunicação, educação e mobilização social (BRASIL, 2010). 

O Programa tem como base o modelo de intervenção para o controle da endemia, que é  baseado no diagnóstico precoce, tratamento oportuno de todos os casos diagnosticados,  prevenção e tratamento de incapacidades e vigilância dos contatos domiciliares (BRASIL, 2010). 

O diagnóstico da hanseníase é essencialmente clínico e epidemiológico, ou seja, consiste  no exame dermatoneurológico para identificar lesões ou áreas da pele que tenham a  sensibilidade alterada e/ou comprometimento dos nervos periféricos (BRASIL, 2022). O  tratamento é realizado através da Poliquimioterapia Única (PQT-U), ou seja, da associação de  três medicamentos, os quais são: Rifampicina, Dapsona e Clofazimina. São medicamentos  gratuitos, disponíveis para adultos e crianças no Sistema Único de Saúde. A duração do  tratamento é de 6 meses para doentes com a forma paucibacilar da doença, e de 12 meses para  aqueles com a forma multibacilar (BRASIL, 2021). 

A hanseníase ainda constitui um problema de saúde pública, uma vez que o controle da  transmissão é difícil de ser alcançado em alguns países, como no Brasil (BRASIL, 2022). A  transmissão é feita pelo ar, através de gotículas de aerossóis e secreções emitidas pelas vias  aéreas superiores de pessoas que apresentam alta carga bacilar e que não estejam em tratamento  (BRASIL, 2022). É necessária a exposição direta e prolongada com a pessoa doente para ser  infectado, por isso a principal fonte da doença é um parente próximo, o qual não sabe que está  doente, como pais, irmãos, avós e cônjuges. Estima-se que a maioria das pessoas apresentem  imunidade contra o M. leprae, de modo que de 10 pessoas que entram em contato com o bacilo,  apenas 1 adoece (BRASIL, 2018). 

A hanseníase tem ocorrência distribuída desigualmente no mundo, atingindo populações  socioeconomicamente desfavorecidas e marginalizadas, como a América Latina, África e a Ásia (COSTA et al, 2019). No contexto brasileiro não é diferente, a ocorrência da doença é  maior nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, as mais pobres do país (BOIGNY et al,  2019). Em 2015, o Pará foi o quarto estado com maior incidência da doença, apresentando taxa  de detecção geral de novos casos em 35,2/100.000 habitantes (BRASIL, 2023). Ressaltando-se  que essa taxa já alcançou o valor de 63,77/100.000 habitantes no ano de 2008 (CUNHA et al,  2019). Em 2019, o estado foi o terceiro em número de novos casos, ultrapassando 2.000  (BRASIL, 2020). 

Portanto, este trabalho tem como objetivo analisar o perfil epidemiológico dos pacientes  diagnosticados com Hanseníase, e sua distribuição espacial, no território do estado do Pará, no  período de 2016 a 2022, para favorecer o combate efetivo à doença. 

2. METODOLOGIA  

2.1. ASPECTOS ÉTICOS 

Para consecução do estudo, não foram utilizados dados relativos aos sujeitos ou descrições  sobre as situações assistenciais, ou seja, foram usados apenas dados secundários e  informações disponíveis em base de dados de domínio público, o que dispensou  encaminhamento e aprovações por Comitês de Ética em Pesquisa, segundo resolução nº  466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. 

2.2. TIPO DE ESTUDO  

Trata-se de um estudo epidemiológico do tipo transversal e retrospectivo, com abordagem  quantitativa, acerca do perfil de saúde e espacial dos pacientes com hanseníase em território  paraense, a partir de casos notificados no período de 2016 a 2022.  

Na pesquisa quantitativa, segundo Sousa (2007), o pesquisador envolve a análise dos números  para obtenção da resposta à hipótese da pesquisa. Assim, ela atua em níveis de realidade onde  existe a necessidade de extrair e evidenciar indicadores e tendências a partir de grande  quantidade de dados. Os dados são filtrados, organizados e tabulados para depois serem  submetidos a técnicas de organização e classificação bem como testes estatísticos para  transformá-los em informações a serem analisadas e discutidas à luz do de um referencial  teórico, bem como de outras pesquisas correlatas (MARTINS, 2013). 

2.3. TEMPO E LOCAL DE ESTUDO 

O tempo de corte do estudo transversal foi de 7 anos, entre os anos de 2016 e 2022,  para ocorrer uma análise mais recente possível dentre os dados disponíveis no DATASUS, mas que ainda seja possível observar a evolução ano a ano do perfil epidemiológico da  hanseníase. 

O estudo foi desenvolvido com dados do estado do Pará, localizado na região Norte  do país. Este local foi escolhido por haver elevado número de casos, sendo em 2019 o 3º no  Brasil em número de casos novos, com mais de 2 mil (BRASIL, 2020). Além disso, é o local  de residência e de atividades acadêmicas dos autores, havendo assim uma maior proximidade  com sua realidade local. 

2.4. CASUÍSTICA 

Todos os casos de Hanseníase registrados no Pará, considerando as variáveis  norteadoras da doença, estão disponíveis no banco de dados estudado dentro do período  de 2016 a 2024. 

2.5. METODOLOGIA DA COLETA DE DADOS 

A pesquisa ocorreu a partir de fontes oficiais sobre casos de hanseníase notificados do estado  do Pará por meio do SINAN net no período de 2016 a 2022; do SIM de 2016 a 2019; de  dados disponíveis no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS)  pelo MS, e pelo Boletim Epidemiológico oficial do Ministério da Saúde de 2024. 

O SINAN net é alimentado por meio das informações coletadas durante o preenchimento da  Ficha de Notificação/ Investigação individual de Hanseníase (Anexo 1) em serviços de saúde.  Trata-se de um instrumento de coleta da vigilância contínua que deve ser utilizado caso a  pessoa apresente uma ou mais das seguintes características e que requer poliquimioterapia:  lesão de pele com alteração de sensibilidade, acometimento de nervo com espessamento  neural e/ou baciloscopia positiva. 

O SIM é um sistema de vigilância epidemiológica nacional que utiliza as informações obtidas  por meio das Declarações de Óbito (Anexo II) para fornecer informações sobre mortalidade a  todas as instâncias de saúde do país. 

O Boletim Epidemiológico é uma publicação periódica do Ministério da Saúde em conjunto  com a Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente. De caráter técnico-científico, tem como  principal objetivo a disseminação pública de informação acerca de doenças específicas  sazonais, sendo, portanto, importante para orientar ações em Saúde Pública no país.

As variáveis estudadas foram: raça, sexo, faixa etária, escolaridade, Município de residência,  ano de diagnóstico, forma bacilífera, coeficiente de detecção (CD) e taxa de cura.  Posteriormente, foram utilizados os descritores “hanseníase” e “perfil de saúde” para busca na  base de dados Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e  SciELO, a fim de correlacionar resultados quantitativos e qualitativos. 

2.6. METODOLOGIA DA ANÁLISE DE DADOS 

Para exposição estatística e organização dos dados obtidos com a pesquisa do DATASUS,  eles foram adicionados em gráficos e tabelas, nos softwares Microsoft Word e Microsoft  Excel, as quais facilitaram a análise quantitativa minuciosa e a melhor exposição dos  resultados. Em seguida, esses dados foram confrontados e discutidos com a literatura  pertinente com o intuito de estabelecer possíveis relações com as variáveis estudadas. 

2.7. CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO 

Foram incluídos na análise 100% dos resultados obtidos mediante a pesquisa no  DATASUS sobre casos de notificação de hanseníase no estado do Pará no período de 2016 a  2022 e de acordo com as variáveis epidemiológicas e espaciais delimitadas. Quanto à pesquisa bibliográfica, foram analisadas e incluídas as publicações disponíveis nos sites  acadêmicos LILACS e SciELO com descritores “hanseníase”, “epidemiologia” e “perfil de  saúde”, publicados em período recente. 

Foram excluídos da pesquisa bibliográfica as publicações em idiomas diferentes do português  ou inglês, que estivessem incompletos, indisponíveis de forma gratuita, além das literaturas  com datas de publicação antes de 2010. 

2.8. RISCOS E BENEFÍCIOS 

O trabalho apresenta, como risco, a má interpretação dos dados coletados e, portanto, uma  conclusão equivocada do tema. Para evitar esse risco, os pesquisadores se comprometeram em  avaliar cuidadosamente tais dados, comparando as suas conclusões com estudos anteriores  para formar opiniões e lançar mão de hipóteses. 

Para a ciência, os riscos estão relacionados à possibilidade de erros nas notificações em  relação à incidência de novos casos da hanseníase, resultando na publicação de conclusões  que não condizem com a realidade do estado do Pará.  

Os benefícios advindos do estudo incluíram a produção de conhecimento acerca da  epidemiologia da hanseníase. Além da elucidação dos fatores agravantes que podem levar ao aumento do número de casos e de mortalidade, de modo que poderá ser utilizado em estudos  futuros que findem minimizar o problema exposto. Por fim, os pesquisadores foram beneficiados pelo ganho de conhecimento a respeito do assunto e experiência com a realização desta pesquisa científica, além do aperfeiçoamento de sua formação como futuros profissionais da saúde. 

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES 

Quando comparado aos outros 27 estados da nação, o Pará encontra-se em terceiro lugar no  número de notificações de Hanseníase com quase 10% do número total, atrás apenas do Mato  Grosso com 13,5% e do Maranhão com 11,5%. O estado com a menor frequência observada é  o de Roraima com 0,34% do total. 

TABELA 1 – Número de casos novos de hanseníase segundo UF de notificação no Brasil de 2016 a  2022.

FONTE: Secretaria de Vigilância em Saúde e Meio Ambiente/ Ministério de Saúde. 

Quanto ao número de casos notificados de hanseníase no estado do Pará por município, de  2016 a 2022, houve 15.003 casos. O ano de 2017 detém a maior parcela entre o período  estudado, com cerca de 17,3% do total de casos novos. Seguido dos anos de 2018 e 2019,  com 17,15% e 17%, respectivamente. A partir de 2020, houve queda, registrando 11, 10,9 e  9,8% até 2022. 

Dos 144 municípios do estado, a capital, Belém, apresentou o maior número de notificações  no período com 1522 novos casos, correspondendo a 10,14% do total; e Santarém Novo  apresentou o menor número: apenas 3 novos casos.

TABELA 2 – Número de casos novos segundo municípios entre 2016 e 2022.

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação- Sinan Net. 

Dentro do período de 7 anos estudado é possível identificar que houve uma estabilidade  relativa no número de casos notificados entre 2016 e 2019, registrando cerca de 17% a cada  ano, totalizando 68% do total. O que se seguiu, então, foi um decréscimo de 41,9% de 2019 a  2022, atingindo o menor número de 1.479 casos. 

FIGURA 1 – Número total de casos notificados por Hanseníase no Pará de 2016 a 2022.

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação- Sinan Net. 

Uma avaliação da Tabela 1, em conjunto com a Figura 1, permite identificar uma estabilidade  no número de casos notificados de Hanseníase, durante o período de 2016 a 2019, no estado  do Pará, com abrupta queda no ano de 2020 (uma redução de cerca de 35,5%), e queda nos  dois anos seguintes. Sabe-se que o advento de novas formas de prevenção e tratamento da  doença possibilitou o decréscimo dos números de incidência da Hanseníase nas últimas  décadas. A OMS lançou, em 2016 a Estratégia Global 2016-2020, visando principalmente o  diagnóstico precoce de novos casos e início do tratamento dos enfermos em tempo oportuno.  No Brasil, programas nacionais como o Plano de Eliminação da Hanseníase e o Programa  Nacional de Controle da Hanseníase também obtiveram relativo sucesso no controle da  doença, alcançando altas taxas de cura, moderando o aumento da taxa de incidência de novos  casos e de incapacidades físicas causadas pela doença (SANTOS E IGNOTTI, 2020). No  entanto, em nenhum ano registrou-se uma redução tão acentuada quanto 35,5%, indicando  que essa redução está relacionada a outro fator. 

Em 2020, o mundo foi acometido pela nova pandemia do coronavírus (SARS-CoV-2), que,  dentre outros resultados, determinou, à população, o uso de medidas de prevenção contra o  vírus. No entanto, a disseminação do Bacilo de Hansen se dá, principalmente, no meio  familiar (BRASIL, 2022). O uso de novas formas de prevenção ao SARS-CoV-2 como o uso de máscaras, de álcool em gel e distanciamento social, não impede o contágio da hanseníase  dentro de casa, onde esses meios de prevenção não são utilizados. 

Portanto, essa redução pode ser explicada pelo diagnóstico tardio e subnotificação de novos  casos da Hanseníase. A pandemia do coronavírus restringiu a circulação das pessoas no país  todo; além de ter exigido prioridade total à pandemia do coronavírus, em detrimento dos  outros agravos, no sistema de saúde, segundo o Comitê do Conselho Nacional de Saúde de  acompanhamento da Covid-19 (2020). 

Além disso, a Tabela 1 também informa que o estado do Pará manteve a sua posição como 3º  colocado entre os estados com maior incidência do país, atrás apenas do Mato Grosso e do  Maranhão. Além disso, os 7 estados com mais notificação da doença se situam nas regiões  Norte e Nordeste. Tal resultado é esperado, pois a desigualdade social e o nível de pobreza  das duas Regiões mantiveram-se durante o período pesquisado, e a Hanseníase acomete principalmente as populações mais carentes, nas regiões mais pobres do Brasil e do mundo  (BRASIL, 2022). 

Tabela 3 – Taxa de detecção de casos novos de hanseníase e em menores de 15 anos por 100 mil  habitantes e taxa de prevalência por 10 mil habitantes. 

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net. 

De acordo com a tabela 3, o maior número de casos por 100 mil habitantes ocorreu em 2017  com 31,05 casos e o menor em 2022 com 18,22. A partir da análise estatística da frequência  de notificação, pode-se estimar o coeficiente de detecção (CD), ou taxa de incidência: na  população de 0 a 14 anos, o coeficiente de detecção se manteve sempre acima de 1, sendo a menor no ano de 2022 de 3,48; e a maior, no ano de 2016 com o valor de 11,40. A taxa de  prevalência se manteve entre 1 e 4 durante o período estudado. 

O CD de novos casos no estado do Pará, por 100.000 habitantes, apresenta valores próximos  de 30 durante o período de 2016 a 2019, o que classifica a região como “Muito Alto” no que  tange à tendência secular da endemia. Esse indicador mede a força de morbidade da doença, a  sua magnitude e tendência da endemia (BRASIL, 2022). Portanto, tal estimativa se mostra  preocupante. Por outro lado, no ano de 2020, a estimativa foi menor, decrescendo ainda mais  até 2022 e mantendo valor menor do CD menor que 10, valor que equivale ao parâmetro  “Médio”, reflexo da redução significativa dos casos notificados neste período. 

TABELA 4 – Frequência por município no Estado do Pará de 2016 a 2022.

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net. 

Quando analisamos os municípios paraenses, Ananindeua, Belém, Marabá, Parauapebas e  Redenção recebem destaque com o maior número de notificações registradas no período  estudado. Belém tem o maior número de casos novos, com 1.522 em todo o período estudado. A soma das notificações dos 5 municípios corresponde a 27% do número total de notificações  entre os 144 municípios do estado do Pará.  

Além disso, verificou-se que houve uma redução no número de notificações de 42,5% em  Parauapebas, 21% em Marabá e 49% em Belém. Entretanto, houve um aumento desse número  de 24% em Redenção e 6% em Marituba, como pode ser visualizado no gráfico a seguir.  

FIGURA 2 – Evolução da frequência do número de casos novos por Hanseníase no Estado do Pará por  município de 2016 a 2022. 

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net. 

A capital paraense apresentou significante contribuição em 2016 e 2017, porém nos anos  seguintes, destacou-se como o município com maior queda nas notificações registradas. Os  municípios de Marabá, Parauapebas e Redenção apresentaram pouca variação na quantidade  de notificações registradas. Todos os 5 municípios apresentaram queda nas notificações no  ano de 2020, possivelmente devido à pandemia do novo coronavírus. 

TABELA 5 – Frequência segundo escolaridade no Estado do Pará de 2016 a 2022.

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net. 

A leitura da tabela 5, sobre as notificações quanto a escolaridade, mostra que há uma  população expressiva de casos notificados entre aqueles que estudaram até a 4ª série incompleta do Ensino Fundamental, totalizando 3468 novos casos no período estudado. A  população que estudou a 5ª série completa até a 8ª série incompleta do Ensino fundamental  ocupa o segundo lugar da população com mais casos notificados, com 2790 casos. A  população que iniciou o Ensino Médio, tendo completado ele, ou não, totaliza 3024. Por fim,  o número de pessoas que estudaram algum grau do Ensino Superior foi de 613.

Tal resultado é esperado, visto que está em concordância com outras literaturas (VÉRAS et al,  2021). E, considerando esta variável como indicadora de condições de vida, isto reforça  também o caráter de negligência. Nesse contexto, pode-se inferir que a baixa escolaridade está  diretamente ligada às condições socioeconômico-espaciais no recorte de tempo analisado.  Essa característica impacta de maneira expressiva a infraestrutura responsável pelo bom  aproveitamento dos serviços de educação e saúde, o que pode explicar o maior número de  notificações de casos em pessoas com baixa escolaridade (VÉRAS et al, 2021). 

TABELA 6 – Frequência segundo raça no Estado do Pará de 2016 a 2022.

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net. 

Quanto a raça, o maior número de notificações está entre os autodeclarados pardos, que  corresponde a 74% do total de casos e o menor número está entre os indígenas com apenas 54  casos, ou 0,36% do total. Não houve diferença estatística significativa entre pretos e brancos.  Brito et al. (2014), aponta que a variável em questão deve ser subestimada, pois pode estar  relacionada com a região do estudo do que com a doença propriamente dita. Assim,  considerando a miscigenação brasileira com a maioria da população parda, foi encontrada a  maior prevalência paraense de doentes de raça/cor parda, devido também à elevada  miscigenação no estado, correspondendo os pardos à 69,9% da população no Pará (IBGE,  2022).

TABELA 7 – Número de casos novos de hanseníase segundo faixa etária.

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net. 

O presente estudo revelou que entre a faixa etária de 20 a 69 anos houve grande número de  notificações, representando um total de 77% de todos os casos notificados. Tendo importância  as idades de 30 a 39 anos, com 2.791 do total de casos no espaço temporal estudado, resultado  semelhante ao encontrado em outras pesquisas. Isto nos permite pressupor que a faixa etária  correspondente à população economicamente ativa é a mais infectada pela infecção da leprae.  Segundo Santos e Ignotti (2020), há chances de ocorrer prejuízos sociais e econômicos, uma  vez que a classe acometida pode desenvolver múltiplas incapacidades físicas.  

Vale ressaltar, que a análise de indicadores de hanseníase segundo os grupos etários é  utilizada para estimar o risco de exposição ao bacilo e de detecção de casos da doença, além  de subsidiar intervenções operacionais de acordo com a situação encontrada. Por exemplo, um  aumento de casos novos na população idosa (maiores de 60 anos) associa-se à diminuição da  transmissão da doença, no entanto, se o aumento ocorre entre os menores de 15 anos de idade ratifica a persistência da transmissão ativa do bacilo leprae, indicando uma situação  hiperendêmica (ROCHA et al, 2020). 

Neste contexto, segundo os dados colhidos, vemos uma taxa de detecção de casos novos  relevante e superior nos idosos, comparada a faixa pediátrica, condizente com os dados  disponíveis na literatura (ROCHA et al, 2020). Tal fato pode ser explicado por outros fatores,  como o declínio natural do sistema imune, aumentando a susceptibilidade às doenças e maior  incidência de patologias associadas. 

Ademais, Pescarini e colaboradores apontaram que o contato com familiares adultos  infectados pela forma multibacilar da doença foi considerado a fonte mais provável de  infecção do bacilo em crianças, o que explica um quantitativo também relevante na população  infante (PESCARINI et al, 2021). 

TABELA 8 – Número de casos novos de hanseníase segundo sexo.

FONTE: MS/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net. 

Com relação ao gênero, a análise dos dados coletados do DATASUS sinaliza a maior  predominância de hanseníase no sexo masculino no estado do Pará, com mais de 60% do total  de casos registrados. Ademais, ainda que a hanseníase acometa tanto homens quanto  mulheres, a OMS (2010) afirma que, na maior parte dos países, o sexo masculino é afetado na  proporção de 2:1. Embora esta diferença percentual de infecção pelo bacilo entre os gêneros  no Pará não tenha sido tão significativa, prevalece também em outros estados brasileiros casos  entre a população masculina (PESCARINI et al, 2021). 

Ademais, um fator relacionado à maior ocorrência de hanseníase masculina pode estar  vinculado ao baixo nível de autocuidado deles, maior exposição por atividades laborais e  menor acesso a informações. Isto porque, a representação do cuidar ainda é vista hoje em dia pela sociedade como uma tarefa feminina, então, questões relacionadas ao trabalho,  principalmente o uso de equipamento de proteção individual, seria de fundamental  

importância na prevenção da doença (OLIVEIRA et al, 2022). Portanto, pode-se concluir que  o imaginário social projeta no homem uma imagem de invulnerabilidade que contribui de  maneira negativa para que ele se exponha a situações de risco e se cuide cada vez menos,  dada sua posição, muitas vezes, ilusória de protetor e provedor do sustento da família. 

TABELA 9 – Casos novos de hanseníase segundo classe operacional notificada no Estado do Pará de  2016 a 2022. 

FONTE: MS/SVS- Sistema de Informação de Agravos de Notificação- Sinan Net. 

Quanto à análise do bacilo da hanseníase, verifica-se que a classe Multibacilar com mais de 5  lesões, é predominante, responsável por 11.486 dos novos casos, correspondendo a 76% do  total. As formas multibacilares ocorrem pela instabilidade imunológica na infecção pelo M.  leprae em indivíduos que apresentam menor imunidade celular contra o bacilo (BRASIL,  2022). Visto que o Pará é um estado hiperendêmico, onde ainda há elevada circulação do  bacilo na sociedade, e o contato com pacientes portadores da forma multibacilar sem  tratamento é o principal fator de risco para infecção pelo bacilo Mycobacterium leprae, a  detecção precoce, assim como o tratamento duradouro e exames de contatos, são desafios  importantes a serem superados. 

Vale ressaltar que a literatura mostra uma relação entre o atraso no diagnóstico da hanseníase  e a classificação da doença como multibacilar, com presença de incapacidade física  (SANTOS E IGNOTTI, 2020). Assim, tendo como objetivo maior das ações de controle da  doença é o diagnóstico precoce, havendo, assim, um predomínio da forma clínica indeterminada. Com isso, é indispensável realizar atividades de pesquisa e controle sobre a  hanseníase, tanto em áreas erradicadas, quanto em áreas endêmicas.

TABELA 10 – Proporção de cura nas coortes de casos novos de hanseníase.

FONTE: MS/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net. 

À análise da tabela 10, nota-se uma proporção de cura variando de 69,1% em 2021, a menor,  a 77,7%, a maior taxa, em 2016. Apesar das taxas serem superiores a 70% no período  estudado – com exceção do ano de 2021 – esses valores estão abaixo da média nacional no  mesmo período (BRASIL, 2023). Além disso, é possível observar que os valores a partir do  ano de 2020 não sofreram variações significativas quando comparados aos valores das taxas  de notificações, apontando que a pandemia do SARS-Cov 12 não afetou o tratamento dos  enfermos e, consequentemente, a cura da doença. 

4. CONCLUSÃO 

A partir da análise dos dados obtidos, o estado do Pará é o terceiro colocado em número de  notificações, atrás apenas do Mato Grosso e do Maranhão. Além disso, entre os municípios  paraenses, Belém, Marabá, Parauapebas, Ananindeua e Redenção, são os municípios com  maior incidência de novos casos no período avaliado, tal fato pode estar relacionado com seus  índices de desenvolvimento humano – IDH, além da grande população. Dessa forma, fica  claro que a distribuição de casos notificados de hanseníase no Brasil e no Pará está  relacionado com o grau de desenvolvimento socioeconômico-espacial e com o número  populacional das regiões. Portanto, é imprescindível que ações em saúde sejam realizadas nas  regiões expostas, com a finalidade de reduzir o número de novos casos, principalmente dentro  do público mais acometido exposto neste trabalho. 

Além disso, foi verificado que o surgimento de novos casos de hanseníase no Pará está  relacionado com diversos fatores epidemiológicos. Como exemplo, pessoas com menor  escolaridade são mais acometidas que pessoas com maior grau de escolaridade, estando diretamente relacionado, portanto, com as condições socioeconômico-espaciais. Além disso,  pessoas do sexo masculino também são maioria no número de casos, tal fato está associado a  frágil cultura do autocuidado masculino. Além disso, a incidência de novos casos é maior na  faixa etária de 20 a 69 anos de idade, correspondendo a população economicamente ativa. Por fim, pessoas autodeclaradas pardas são maioria, sendo esse fato mais relacionado com a  própria região de estudo. 

A Hanseníase é uma doença de difícil controle, sobretudo em determinadas localidades, como  no estado do Pará. É indispensável a vigilância epidemiológica constante pelo poder público;  assim como a produção de mais estudos e pesquisas, como esta, que elucidem os fatores de  risco e a população mais acometida pela doença, para que esforços e medidas possam ser  realizados para combatê-la de forma mais eficiente, assim como a suas complicações. 

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1Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade do Estado do Pará Campus Centro de Ciências  Biológicas e da Saúde. e-mail: jeanfcc@icloud.com
2Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade do Estado do Pará Campus Centro de Ciências  Biológicas e da Saúde. e-mail: mayaraaquino16@gmail.com
3Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade do Estado do Pará Campus Centro de Ciências  Biológicas e da Saúde. e-mail: alineandrade7@gmail.com
4Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade do Estado do Pará Campus Centro de Ciências  Biológicas e da Saúde. e-mail: eduardaform@gmail.com 
5Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade do Estado do Pará Campus Centro de Ciências  Biológicas e da Saúde. e-mail: raony.eq@gmail.com
6Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade do Estado do Pará Campus Centro de Ciências  Biológicas e da Saúde. e-mail: threispereira@gmail.com
7Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade Federal do Pará Campus Belém. e-mail:  cssamarah@gmail.com
8Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade Federal do Pará Campus Belém. e-mail: mayse.lins@gmail.com
9Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade Federal do Pará Campus Belém. e-mail: vitória.negrao@icloud.com
10Discente do Curso Superior de Medicina da Universidade Federal do Pará Campus Belém. e-mail: ritafeio.med@outlook.com