AS FACES DO VAZIO EXISTENCIAL NA MODERNIDADE LÍQUIDA: UMA APROXIMAÇÃO CONCEITUAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11059559


Efigenia Vaz De Medeiros Fonseca1
Ruthyellem Ferreira A. De Mendonça2
Diogo Rogério Carlos3
Maria Da Conceição Carvalho Maciel4
Elaynne Félix Da Costa5
Ingrid Bianca Azevêdo De Melo6
Renata Batista Dos Santos Alves7
Joab Carlos Saraiva De Lira8
Fagner Emanoel Silva9
Dedeyelly Marques Almeida De Oliveira10


RESUMO

Introdução: O presente trabalho trata-se sobre descrever e explorar as faces do vazio existencial presentes na modernidade líquida, sob a perspectiva de Viktor Frankl e Zygmunt Bauman. Metodologia: A pesquisa foi realizada através de revisão bibliográfica, com base na abordagem qualitativa do tipo descritivo e exploratório. Foram selecionados artigos sobre a temática, disponibilizados nas bases de dados Scielo, entre os anos de 2008 a 2023, além de livros dos respectivos autores. Fundamentação Teórica: Essa pesquisa tem como objetivo geral, compreender e descrever quais as faces do vazio existencial presentes na contemporaneidade líquida e como isso afeta a personalidade e a saúde mental humana. Resultados e conclusão: Foi observado que os meios de manifestação do vazio existencial são demonstrados no comportamento do indivíduo na modernidade líquida. Bauman afirma, que cada vez mais, as relações e a própria formação da personalidade, estão desprovidas de eternidade, ou seja, de durabilidade, o que pode explicar o crescente consumismo.

Palavras-chave: Redes sociais. Personalidade. Saúde Mental.

ABSTRACT

Introduction: This work is about describing and exploring the faces of the existential void present in liquid modernity, from the perspective of Viktor Frankl and Zygmunt Bauman. Methology: The research was carried out through a bibliographical review, based on a qualitative, descriptive and exploratory approach. Articles on the topic were selected, made available in the Scielo databases, etween the years 2008 and 2023, in addition to books by the respective authors. Theoretical Foundation: This research has the general bjective of understanding and describing the aspects of the existential void present in liquid contemporary times and how this affects the personality and human mental health. Results and conclusion: It was observed that the means of manifesting existential emptiness are demonstrated in the individual behavior in liquid modernity. Bauman states that increasingly, relationships and the formation of personality itself are devoid of eternity, that is, of durability, which may explain the growing consumerism.

Keywords: Social media. Personality. Mental health.

INTRODUÇÃO

Ao longo da história houveram profundas transformações da sociedade nas esferas científica, religiosa, tecnológica e comunicativa. Isso impactou significativamente as crenças dos seres humanos acerca da vida e do sentido da existência, impulsionando-os ao surgimento de novos “porquês”.

Segundo Frankl (1991), a todo e qualquer momento a pessoa precisa decidir, para o bem ou para o mal, qual será o monumento de sua existência. Ao avaliar os impactos produzidos e provocados pelo contexto cultural, ao qual estamos inseridos, percebemos afetações que refletem tanto numa esfera coletiva, como na personalidade e saúde humana individual, quer seja no imaginário, passando pelo modo de nos relacionarmos com o outro, ou até nos meios de produção e suas coerções, trazendo uma relação de fluidez e desesperança num mundo cada vez mais acelerado e líquido.

É o sociólogo polonês Zygmunt Bauman que cria o conceito de modernidade líquida quando publica seu livro “Modernidade Líquida”, após o ano 2000, e diz respeito a uma nova época em que as relações sociais, econômicas e de produção são frágeis, fugazes e maleáveis, como os líquidos. Bauman (2000) entende que na modernidade sólida os conceitos, ideias e estruturas sociais eram mais sólidas e permanentes. O mundo tinha mais certezas. A passagem de uma modernidade para outra acarretou mudanças em todos os aspectos da vida humana. O que fez o referido autor observar que as pessoas passaram a entender a sociedade e a colocarem-se nela em um estado de liquidez, e não de solidificação, como era antes. Segundo Bauman (2000), na modernidade líquida, a única certeza, é a incerteza.

Diante disso, surge a pergunta: em tempos de modernidade líquida, quais faces do vazio existencial podem ser encontradas nos seres humanos? Entre as principais consequências advindas da modernidade líquida está o próprio modo como ela se “camufla” na esfera individual, produzindo faces, ou seja, diferentes prismas e resultados que impactam histórias e atuam desde um moldar na percepção, até um vazio existencial.

Constata-se que por mais que existam meios abundantes que auxiliam o homem em suas atividades diárias, trazendo inúmeras vantagens, como encurtamento da distância, promoção e prevenção de saúde, avanço tecnológico e científico, ainda há um vazio existencial sendo constantemente ocultado pelos mesmos, pois não se há uma reflexão sobre o motivo, sobre o verdadeiro sentido que o impulsiona a fazer algo, com isso há uma alienação do trabalho, tanto na esfera material, quanto ao trabalho da alma, como já dizia Vitor Hugo (1862) em sua obra, “Os Miseráveis”.

O objetivo geral dessa pesquisa é discutir a correlação entre os conceitos de Modernidade Líquida, Vazio Existencial e o processo de despersonalização. Para isso, busca-se compreender quais implicações o contexto cultural da modernidade líquida exerce na personalidade e na saúde mental humana e descrever sobre as faces do vazio existencial encontradas na modernidade.

A relevância desta pesquisa se dá para a discussão de estudos e estratégias que auxiliarão profissionais da área da Psicologia e Psiquiatria a ampliarem a compreensão da subjetividade e das relações humanas e a promoverem a identificação dos vazios existentes de forma mais ampla, visando tanto o acolhimento do sujeito, quanto o acompanhamento terapêutico, possibilitando assim, um melhor equilíbrio das funções mentais e um convívio social com autonomia e bem-estar diante de uma modernidade líquida. A importância do tema deste trabalho é reforçada, a fim de estimular iniciativas que promovam o avanço da informação nos âmbitos educacionais e sociais, unindo-se aos já existentes e futuros estudos que decorrerão nesta perspectiva.

METODOLOGIA

O presente estudo trata-se de uma Revisão Bibliográfica de Literatura do tipo narrativa, tendo como base a abordagem qualitativa do tipo exploratória e descritiva. A abordagem qualitativa se destina ao estudo das relações, representações, crenças, percepções e opiniões, frutos das compreensões que os humanos fazem a partir do modo como vivem, de como criam seus artefatos e a si mesmos (Minayo, 2007).

Foram utilizados aportes teóricos de artigos bibliográficos de língua portuguesa no período estipulado de 2008 a 2023, a partir dos descritores: “vazio existencial”, “modernidade líquida, “personalidade”, “redes sociais”, “saúde mental”, além de livros dos respectivos autores, Zigmund Bauman, Vitor Frankl e Byung Chul Han. Os critérios de inclusão utilizados foram, artigos e livros sobre a temática Vazio Existencial e Modernidade Líquida, com foco direcionado na personalidade humana, redes sociais e impactos na saúde mental e os de exclusão foram materiais que não estão relacionados aos critérios expostos acima.

O trabalho da pesquisa exploratória tem como objetivo aproximar o autor do problema, tornando viável a construção de hipóteses em que tende a ser flexível, considerando os vários aspectos sobre o fato ou fenômeno estudado (Gil, 2017).

A pesquisa do tipo bibliográfica possibilita ao pesquisador um amplo alcance de informações e auxilia na definição do quadro conceitual que melhor envolve o objeto de estudo, conforme o pesquisador se envolve e avança nas suas etapas: escolha do tema, levantamento bibliográfico preliminar, formulação do problema, elaboração de plano provisório de assunto, busca de fontes, leitura de material, fichamento, organização lógica do assunto e redação do texto (Gil, 1994, p. 59-60).

Com base nos objetivos eleitos, a pesquisa é classificada como descritiva, pois visa descrever a relação dos conceitos vazio existencial e modernidade líquida, podendo se aproximar também da pesquisa explicativa, uma vez que é possível refletir sobre a correlação conceitual, e a natureza desta correlação entre as variáveis do fenômeno (Gil, 1994). Buscou-se assim compreender, quais faces do vazio existencial podem ser encontradas na modernidade líquida e os impactos na personalidade e saúde mental.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Intercruzando conceitos: Modernidade Líquida e Vazio Existencial

O termo Modernidade Líquida foi criado pelo sociólogo polonês e escritor Zygmunt Bauman, no século XX. A modernidade líquida é caracterizada como sendo um tempo de ruptura do homem moderno com as instituições e estruturas sociais herdadas do passado. Assim sendo, a vida antiga que visava o cidadão e sua realização através do processo de trabalho, se transforma em uma modernidade onde os vínculos estabelecidos são cada vez mais instáveis e substituídos pela busca desenfreada do consumo e do individualismo. Percebe-se, então, o transpor de algo sólido para líquido.

Alguns acontecimentos da segunda metade do século XX, como instabilidade econômica mundial, o surgimento de novas tecnologias e a globalização em si, contribuíram para a perda da ideia de controle sobre os processos do mundo, trazendo incertezas e medos quanto à nossa capacidade de nos adequar aos novos padrões sociais, que se liquefazem e mudam constantemente. Bauman (2001, p. 3) diz: “[…] os fluidos não se atêm muito a qualquer forma e estão constantemente prontos (e propensos) a mudá-la; assim, para eles, o que conta é o tempo, mais do que o espaço que lhes toca ocupar; espaço que, afinal, preenchem apenas ‘por um momento’.

A vida líquida, nesse sentido, está relacionada a uma sociedade fundamentada no individualismo, ou seja, uma sociedade que se transformou em algo temporal e efêmero, que carece de aspectos permanentes e com significado. Com isso, as relações e as formas sociais, como por exemplo, a família, o trabalho, o amor e a própria identidade, sofrem uma liquefação, produzindo angústia, ansiedade constante, violência e o medo de não se sentir pertencente a esse “novo mundo”.

O corpo, que é o contato que registra nosso estar-no-mundo, sendo uma expressão de obra de arte, já que se manifesta tanto na estética (forma) como na linguística (comunica o tempo todo), também sofre os impactos dessa nova maneira de viver e interpretar o mundo e os outros. Pois, muitas vezes, a vida do consumidor para de estar mais ligada à valorização da posse de algo e passa a dar mais importância ao estar em movimento, pois a satisfação já não pode ser duradoura. Assim, há também um processo de não aceitação e constrangimento do próprio corpo.

Na busca por tornar-se um símbolo ideal, os corpos são colocados como mercadorias expostas à venda, procurando ser o alvo de validações e de realizações de desejos. Nesse enredo, perde-se de vista o real corpo e mais ainda, a subjetividade de cada ser humano, carregado de marcas, histórias e singularidades.

Os tipos de mercadorias com as quais foram treinados a se sociabilizar são para tocar, mas não têm mãos para tocar, são despidas para serem examinadas, mas não devolvem o olhar nem requerem que este seja devolvido, e assim se abstêm de se expor ao escrutínio do examinador, enquanto placidamente se expõem ao exame do cliente (Bauman, 2008, p. 25).

A maneira de conhecer o outro, prezando pelo contato face a face, também vai se perdendo nesse “novo mundo”. Com o advento das mídias sociais, a velocidade e a superficialidade acabam se tornando a identidade dos vínculos, principalmente amorosos. Com o enfoque no experimento imediato da satisfação, não há abertura para a gênese do mistério, das incertezas e fragilidadades reveladas na relação com o outro. Além disso, o verdadeiro sentido que pode ser encontrado no amor, por exemplo, que visa a transcedência, fica restrito ao puro egoísmo. “Em outras palavras, não é ansiando por coisas prontas, completas e concluídas que o amor encontra o seu significado, mas no estímulo a participar da gênese dessas coisas. O amor é afim à transcendência […]” (Bauman, 2003, p. 18).

Por sua vez, o conceito de Vazio Existencial foi criado pelo psiquiatra, psicólogo, escritor e fundador da Logoterapia, Viktor Frankl, no século XX, e é um termo que aponta para uma falta de sentido no ser. Segundo Gomes (1988), o conceito de vazio existencial se traduz como um sentimento de inutilidade existencial extrema, caracterizado pelo fato de que, para a pessoa, a vida perde sua graça, seu sentido; este sofrimento produz angústia. O ser humano que se vê tomado por esse sentimento sente-se abandonado, com sua vida perdendo o significado.

Para Frankl (2008, 2011), o vazio existencial é caracterizado por duas principais perdas que o homem sofreu ao longo de sua história. A primeira é advinda da perca e ou rejeição dos instintos primitivos básicos que ditavam o comportamento do homem, o instruindo do que deveria fazer. A segunda advém da diminuição do poder da influência da tradição sobre o comportamento individual. Isto significa que, em decorrência do sentimento de falta de sentido, o homem perde sua autonomia individual, recaindo assim no conformismo, ou seja, realizando tudo que os outros fazem ou no totalitarismo, realizando o que as pessoas querem que o indivíduo faça. Portanto, o vazio existencial é pelo menos um dos componentes que explica ambos os fenômenos de seu tempo. Em sua época, Frankl avaliava que o vazio existencial era o estado predominante na nova geração norte-americana, e que também havia se disseminado para as demais sociedades ocidentais e orientais.

Para Frankl (2005), há uma liberdade limitada ao homem, ou seja, o homem não pode escapar de certas condições, já que essas serão inerentes à sua vida, porém este homem também é dotado de liberdade para se posicionar diante dessas situações, podendo até superá-las e abrir um novo caminho para penetrar na dimensão humana. Nesse universo de possibilidades, na busca pelo prazer, muitas vezes o homem faz da sua liberdade da vontade uma fuga, pois a todo instante tenta evitar o desprazer que é refletido nas frustações e dores inerentes à vida humana. Com isso, pela “não tolerância” e o “não saber” lidar com esses sentimentos o ser humano recorre a comportamentos compulsivos para compensar esse vazio, como por exemplo, o consumismo, uso de fármacos, entre outros. Ao primeiro sinal de mal-estar provocado pelos sentimentos de angústia, recorre-se aos anestésicos e aos poucos, o sentido da vida vai desaparecendo.

Segundo Frankl (2011), o sentido da vida é uma experiência única e particular, isto é, para cada ser humano há um sentido a ser encontrado, como uma espécie de vocação, pois o mesmo não pode ser dado arbitrariamente. O homem deve utilizar a sua liberdade com responsabilidade visando encontrar esse sentido, caso contrário pode tornar-se escravo de si mesmo e recorrer à ansiedade, depressão, compulsão, entre outros. Frankl verificou que a palavra Ex-sistir significa emergir, ou seja, sair de si mesmo e transcender para os valores na existência, considerando que o ser hominal é aberto para o mundo dos valores. Portanto, o ser humano não é constituído para autocontemplação mas, para se entregar a algo ou a alguém por meio da transcendência de si mesmo, para valores existenciais que estão no devir (Frankl, 1995).

Em determinado momento esses dois conceitos se intercruzam, já que na modernidade líquida o vazio existencial pode ser fragmentado e refletido em diversas faces produzindo assim, inúmeros resultados que afetam desde o indivíduo da sociedade moderna, incluindo o modo de pensar até à forma de agir no mundo e com os outros.

O vazio existencial instala-se diante da perda de sentido, algo muito comum numa sociedade onde nada é feito para durar, nas palavras do próprio Bauman (2000), em que as relações escorrem pelo vão dos dedos e os encontros humanos vão perdendo o aspecto de união, passando a ser mero acúmulo de experiência.

Modernidade Líquida, Vazio Existencial e o processo de Despersonalização

Etimologicamente, o termo personalidade nasceu da palavra grega Persona, que significa máscara, porém, no sentido mais profundo, está vinculada a palavra Personare, que significa “ressoar através de”. No teatro grego, a máscara servia ao ator como um instrumento que expressava seu personagem e lhe permitia, através da entonação de voz, pela máscara, esta expressão. Isto traz à tona a ideia de interioridade. Existe uma pessoa (por trás da máscara) que se manifesta através de seus valores e características subjetivas.

GillesDelisle (1999), caracteriza a personalidade como um específico e relativamente estável modo de organizar os componentes cognitivos, emotivos e comportamentais da própria experiência. O significado (cognitivo) que uma pessoa atribui aos eventos (de comportamento) e os sentimentos (emocional) que acompanha esses eventos permanecem relativamente estáveis ao longo do tempo e proporcionam um senso individual de identidade.

Ao estudar sobre personalidade humana deve-se levar também em consideração alguns fatores, como as disposições genéticas, que constituem o ser humano com suas características e temperamentos; e os fatores adquiridos, que são as vivências relacionais com a família, escola, a cultura e o meio que se está inserido.

Marinho (2019) traz ainda, nessa perspectiva, algo que também é proposto por Viktor Frankl (2013), que é a autodeterminação, melhor dizendo, a atitude livre do homem para escolher e responder às circunstâncias vivenciadas. E nesse movimento de liberdade há uma intencionalidade, ou seja, uma busca de sentido nas atividades realizadas. Mesmo que sua liberdade sofra limitações e condicionamentos, o ser humano é livre e, assim, consciente e responsável por suas escolhas. Nesse sentido, o que este ser humano é e o que será, depende apenas dele, tornando-se construtor de si mesmo e de sua existência (Frankl, 1946, 2013).

Para Frankl (1989), o ser humano é o ser que sempre decide o que é; o que também aponta para responsabilidade, que compreende responder às situações que a vida apresenta. Assim, ainda segundo esse autor, cada escolha feita também remete ao que foi deixado de escolher, e este movimento como é único, descarta qualquer outra possibilidade de escolha. Cada momento encerra milhares de possibilidades, mas só pode ser escolhida uma delas para realizar, condenando todas as outras ao não-ser.

O homem é um ser livre, pode não ser livre de algo, mas é livre para algo; pode não ser livre para evitar o sofrimento, mas é livre para escolher como irá sofrer, é livre para sofrer com dignidade. Sempre é possível ao ser humano dar a sua própria resposta.

Em última análise, viver não significa outra coisa senão arcar com a responsabilidade de responder adequadamente às perguntas da vida, pelo cumprimento das tarefas colocadas pela vida a cada indivíduo, pelo cumprimento da exigência do momento (Frankl, 2008, p. 102).

Com isso entende-se que a personalidade é um conjunto de características únicas que proporcionam o senso de identidade de cada ser humano, mas que não está formada em absoluto e que pode, com o passar do tempo, sofrer mudanças de acordo com as vivências experimentadas. Porém, na sociedade atual, essa autodeterminação tem sido “mascarada”, pois ao invés da externalização de quem de fato é, há uma “falsificação” de si próprio e sutilmente, principalmente através dos meios de consumo e tecnológicos, há uma modificação, desde a sua percepção até seu comportamento, que visa ressoar uma interioridade distinta, trazendo um fenômeno que pode ser chamado de despersonalização ou até mesmo, objetificação, já que ocorre a perca da identidade.

A subjetividade dos consumidores é feita de opções de compra – opções assumidas pelo sujeito e seus potenciais compradores; sua descrição adquire à forma de uma lista de compras. O que se supõe ser a materialização da verdade interior do self é uma idealização dos traços materiais ‘objetificados’- das escolhas do consumidor (Bauman, 2007, p. 24).

Na sociedade líquida dos consumidores, pelo fato de tudo está em constante dinamismo, prestes a ser substituído, há uma relação de contraste, ou seja, aquele que produz algo também se torna, ele mesmo, em uma determinada medida, uma mercadoria. Compram-se e vendem-se símbolos de construção da identidade, as quais são incentivadas como condições fundamentais para a forma de relacionamentos bem-sucedidos. Segundo Bauman (2007), ser consumidor em uma sociedade remodelada ao mercado é condição sinequa non  para todas as relações intersubjetivas na sociedade de consumo, isto é, para ser atrativo às “negociações”, o indivíduo necessita ser um “produto” atrativo e lucrativo antes de se relacionar.

Quanto mais se é exposto para algo que supostamente atenda às necessidades, mais vulnerável e impelido o indivíduo se sente para adquirir, visando uma realização não só de seus desejos, mas de desenvolver uma sensação profunda de pertencimento a uma comunidade, em outras palavras, relacionar-se com o outro. Nesse movimento, torna-se, portanto, um escravo sem face, ou seja, uma personalidade diluída no meio de um metabolismo consumista, ouvindo, incorporando e fortalecendo, muitas vezes, a crença de que é preciso ter para ser. Assim ele tende a condicionar toda a sua vida para obtenção de algo que nunca se completa em sua totalidade e não para uma verdadeira mudança no seu eu. “Numa sociedade de consumidores, tornar-se uma mercadoria desejável e desejada é a matéria de que são feitos os sonhos e os contos de fada” (Bauman, 2007, p. 22).

O indivíduo, preocupado em manter a atividade e desempenho, muitas vezes, se isola e recorre ao doping farmacológico ou tecnológico para se manter na alta performance, o que frequentemente resulta em uma não tolerância com seus próprios sentimentos de tristeza e frustração, o que pode levá-lo a desenvolver problemas de saúde mental. Ao não abrir um espaço para a negatividade, ou seja, para o dizer não, aquilo que deveria ser sinônimo de liberdade, acaba por se transformar em novas coerções autoimpostas.

Nas doenças psíquicas de hoje, não se vê a influência do processo de repressão e de negação. Remetem antes, a um excesso de positividade, portanto não estão referidas à negação, mas antes a incapacidade de dizer não, não ao não ter direito, mas ao poder-tudo (Byung-Chul Han, 2015, p. 14).

Percebe-se que mesmo diante de tantas conexões e possibilidades existentes que auxiliam o homem, o mesmo se perde e frustrado rende-se ao cansaço e à desesperança, pois não encontra um real sentido que o impulsiona a viver a cada instante, além disso, frente a uma vida transitória e de consumo, reage com uma hiperatividade e histeria.

Quanto à origem do sentimento de falta de sentido, pode-se dizer, ainda que de maneira muito simplificadora, que as pessoas têm o suficiente com o que viver, mas não tem nada porquê viver; têm os meios, mas não têm o sentido (Frankl, 2000, p. 69). Assim, observa-se que a Sociedade do Cansaço de Chul Han (2015) e a Modernidade Líquida de Bauman é a mesma Sociedade do Vazio Existencial de Frankl. Zygmunt Bauman (2000), traz um contraste de palavras tais como, “fluidez e solidez”, para exemplificar e discorrer acerca do mundo contemporâneo e suas transformações advindas principalmente, do capitalismo, que impactou profundamente as relações de trabalho e consumo, assim como também as relações interpessoais, onde as pessoas mantinham-se em relações que perduravam e criavam laços fixos. A grande ruptura da modernidade líquida é, justamente, o modo de encarar as relações sociais estabelecidas, tais como família, amizade, amor, entre outros, como meros contratos superficiais e temporários.

Por sua vez, Byung-Chul Han (2015), nos traz a ideia de que um dos grandes problemas do tempo atual é o excesso de positividade, que é a busca desenfreada pelo desempenho e alta performance. O homem ao não se permitir não ter algo, ao não poder dizer não, recai em uma histeria de um consumismo individualista de vida, e também se torna mercadoria. Sem uma reflexão do real motivo e sentido desta busca, os resultados mais prováveis são os adoecimentos psíquicos; e que a infelicidade, a frustração e a angústia pertencentes à vida, são vistas como sinônimas de desajustes e, portanto, devem ser constantemente silenciadas e repelidas, perdendo assim de vista, o verdadeiro ser, o humano.

Desta forma, o indivíduo torna-se totalmente incapaz de transcender, de ir além de si mesmo, de estabelecer vínculos duradouros com o outro e não sabendo lidar com o ritmo acelerado e exigente da modernidade, nem com seus sentimentos de aborrecimento, esgota-se, não tendo sucesso em encontrar o sentido da vida e cai na “[…] tríade da neurose em massa: a depressão, a agressão e a toxicodependência” (Frankl, 2016, p. 25).

E assim, o homem não conseguindo preencher esse vazio acaba por se entregar a prazeres efêmeros como modo de “anestesiar”, mesmo que momentaneamente essa angústia e tédio. Para o autor, o vazio existencial, vem crescendo e difundindo-se a ponto de ser chamada “neurose em massa”, pois, compreende que assim como existe um sentido para a vida, o ser humano se caracteriza por ter vontade e necessidade de encontrar o mesmo. “É uma característica fundamental do ser humano: a busca por sentido é a motivação primária da vida do homem” (Frankl, 2008, p. 124).                                                                                                       

Frankl falou com algumas décadas de antecedência, aquilo que Chul Han (2015) veio a classificar como um diagnóstico da sociedade contemporânea do início do século XXI; assim dizendo, a ausência de um sentido para a vida torna o ser humano, sujeitos vulneráveis e propensos à Sociedade do Cansaço e da pressão por consumo, prazer e desempenho. O incentivo que fica dessa reflexão é encontrar sentido para a vida e ajudar outros a fazerem o mesmo.

Consumismo, Busca de Prazer e de Poder: Uma face do Vazio Existencial

Para Bauman (2008), o consumo é um processo histórico e atemporal, tão antigo quanto os próprios seres vivos, sendo uma parte integral e permanente da sobrevivência biológica compartilhada com outros organismos vivos. A atividade de consumo na época da produção, por exemplo, era orientada pela promessa de segurança a longo prazo e a vontade humana almejava algo ordenado, regular e resistente ao tempo. Já na contemporaneidade, segundo Canclini (1999), ocorre uma ressignificação social do consumo, ou seja, o consumo extrapola a definição de aquisição de bens e serviços de utilização pessoal, degenerando em “consumismo”.

Pode-se dizer que o consumismo é um tipo de arranjo social resultante da reciclagem de vontades, desejos e anseios humanos (Bauman, 2008). Portanto, não tem como foco a satisfação das necessidades básicas do homem no que tange a segurança, mas busca a promoção de desejos constantes, implicando assim em uso e substituição dos objetos de satisfação. A felicidade numa sociedade consumista, se torna uma busca imediata que condensa necessidades do ser num ato instantâneo do ter, que se desfaz rapidamente, daí seu caráter líquido e viciante. “A visão do ‘imediato’ e ‘agora’ dos consumistas de plantão é direcionada pela pressa, relacionada a necessidade de descartar e substituir ao invés de comprar em decorrência de suas necessidades básicas” (Bauman, 2008, p. 27).

O desejo não é estático, está sempre fluindo e se renovando através das nossas experiências. Quando concluído em determinado objeto, transpassa-o, abrindo espaço para que novas faltas surjam, o que impulsiona o ser humano a um ciclo de repetição de esforço, visando a tentativa de preenchimento. Pelo fato da não completude do desejo, se gera a angústia e a sensação do vazio existencial. Consequentemente, o ser humano modifica esse desejo de completude para novas formas, como por exemplo, para lojas e redes sociais. A necessidade legítima que parte do ser se transforma então, numa alienação que visa apenas o ter sem um porquê. Além disso, a felicidade se torna uma busca assídua e nunca uma concretude.

A sociedade do consumo prospera enquanto consegue tornar perpétua a não-satisfação de seus membros, e assim em seus próprios termos, a infelicidade deles […] O que começa com um esforço para satisfazer uma necessidade deve se transformar em compulsão ou vício. E assim ocorre, desde que o impulso para buscar solução de problemas e alívios para dores e ansiedades nas lojas, e apenas nelas, continue sendo um aspecto do comportamento não apenas destinado, mas encorajado com avidez, a se condensar num hábito ou estratégia sem alternativa aparente (Bauman,2008, p. 64).

Observa-se que na sociedade do consumo os funcionamentos de compulsão e vício decorrem do sentimento de infelicidade oriundos da não-satisfação dos seus membros. Ainda citando o mesmo autor: “a consumação está sempre no futuro, e os objetivos perdem sua atração e potencial de satisfação no momento de sua realização, se não antes” (Bauman, 2001, p. 26). Tudo é tão reduzido ao puramente material, que os valores e princípios são constantemente diluídos. O homem não aspira mais a algo que seja permanente, nem tão pouco eleva seu olhar para a transcendência, ou seja, para além de si mesmo. Com isso, uma das consequências é o esvaziamento de significados nas atividades realizadas, comprometendo também, a falta de sentido da sua própria existência.

A atividade permanente, uma urgência, após a outra, dá a segurança de uma vida plena ou de uma carreira de ‘sucesso’, únicas provas de autoafirmação num mundo em que as referências ao ‘além’ estão ausentes e onde a existência, com sua finitude, é a única certeza (Bauman, 2008 apud Aubert, 2003, p. 123).

Para Bauman (2008), no tempo pontilhizado da sociedade de consumidores, a eternidade não é mais um valor e um objeto de desejo, nessa sociedade líquida a velocidade é sinônima de sucesso, tanto para não precisar refletir e lidar com constantes sentimentos de ansiedade e inadequação, quanto para preocupar-se em usar seus esforços, para no menor tempo possível, estar à frente dos outros, tendo a posse de algo e exibindo-o. “A síndrome consumista envolve velocidade, excesso e desperdício” (Bauman, 2008, p. 111).

O indivíduo mal tem tempo para recuperar-se de um último acontecimento e já adentra diversos ciclos sucessivos, com uma intensidade que reflete seu maior anseio e zelo: ocupar lugares de destaque. No entanto, nesse ato de “emancipação” da sua liberdade, o mesmo não se apercebe o quanto sua felicidade está condicionada a coisas tão efêmeras e vazias, além de uma constante fuga da responsabilidade, caracterizando assim também, uma fuga de si. “A cultura presentista recompensa a velocidade e a eficácia, mas não favorece a paciência nem a perseverança” (Bauman, 2008, p. 136).

Viktor Frankl (2008), escreve que o vácuo existencial ainda pode estar mascarado por diversos tipos de compensações, até mesmo por meio de formas mais primitivas da vontade de poder, assumindo a forma de ganância financeira, vontade de dinheiro, ou vontade de prazer. Para o fundador da Logoterapia, na falta de um sentido para viver, o sujeito perder-se na busca de prazer ou na busca de poder. Frankl cunha o termo “vontade de sentido” em contramão aos conceitos de “princípio do prazer” da Psicanálise e “vontade de poder” da Psicologia Individual de Alfred Adler.

Alguns autores sustentam que sentimentos e valores são nada mais que mecanismos de defesa, formações reativas e sublimações; porém, para Frankl, o que ocorre é que o ser humano é capaz de viver e até morrer por seus ideais e valores. Segundo Frankl (2008), a busca do indivíduo por um sentido é a motivação primária em sua vida, e não uma “racionalização secundária” de impulsos instintivos. Esse sentido é exclusivo e específico, uma vez que precisa e pode ser cumprido somente por aquela determinada pessoa.

Outro resultado possível ao lidar com os problemas relacionados ao sentido da vida, é a frustração existencial; esta ocorre quando a vontade de sentido é frustrada; isto é, quando as pessoas duvidam do sentido de sua vida ou já perderam as esperanças de encontrá-lo. A frustração existencial não se constitui, patológica por si só, mas pode ocasionar o que Frankl (2008), chamou de neuroses noogênicas, o termo noogênica faz referência a nous, que em grego significa mente. “As neuroses noogênicas não surgem de conflitos entre impulsos e instintos, mas de problemas existenciais. Entre esses problemas, a frustração da vontade de sentido desempenha papel central” (Frankl, 2008, p. 126).

Os vínculos estabelecidos na cultura consumista refletem fragilidade e já têm em vista, um prazo de validade para os mesmos. Levados pela falta de uma boa comunicação e na busca frenética pelas realizações individuais, os indivíduos incorrem numa inconstância e superficialização nas relações, procurando rapidamente substituir o outro, caso não alcance “prazer e/ou felicidade”, evitando assim a dor de encarar divergência e o sacrifício para cultivar uma relação.

Como as habilidades necessárias para conversar e buscar entendimento estão diminuindo, o que costumava ser um desafio a ser confrontado de maneira direta e encarado se transforma cada vez mais num pretexto para romper a comunicação, fugir e queimar pontes atrás de si. Ocupados em ganhar mais dinheiro em função de coisas de que creem precisar para serem felizes, homens e mulheres têm menos tempo para a empatia mútua e para negociações intensas, por vezes tortuosas e dolorosas, mas sempre longas e desgastantes. E ainda menos para resolver seus mútuos desentendimentos e discordâncias (Bauman, 2008, p. 153). 

Correlacionando com a teoria de Viktor Frankl, a felicidade aparece como efeito colateral do cumprimento do dever. Para Frankl (2011), enquanto o sujeito busca a felicidade como um fim em si mesmo, ele se frustra, pois, ao transformar a felicidade como alvo, em vez de uma consequência espontânea, a felicidade desaparece, escorre como líquido diluído. O referido autor sugere que sucesso e felicidade devem acontecer naturalmente, e quanto menos nós nos importarmos, mais eles acontecem.

Um vazio ocultado pela liquidez das redes

Através de mecanismos e ferramentas, como por exemplo, de anúncios, notificações e propagandas nas redes sociais, há uma disseminação no imaginário coletivo e individual de uma suposta “necessidade” de se ter algo. Visando a realização de pedidos urgentes, verbos são colocados no imperativo, como por exemplo, “compre”, “venda”, “troque”, entre outros, não só para chamar atenção, mas principalmente para induzir essa “necessidade” no pensamento do consumidor e não o fazer descansar até que consiga, funcionando como um reforço.

Depois de provocar uma espécie de manipulação do desejo e dessa imaginação ao produto, há um comprometimento da vontade humana, que é refletida através das suas ações, o que pode gerar possíveis mudanças no comportamento, como ansiedade e compulsão. “O método explícito de atingir tal efeito é depreciar e desvalorizar os produtos de consumo logo depois de terem sido promovido no universo dos desejos dos consumidores” (Bauman, 2007, p. 64).

Isso pode levar o indivíduo para um não reconhecimento de si, como um desconhecimento acerca de quem é, de quais são suas limitações, habilidades criativas e defeitos, pois cada vez mais os seus desejos e ações, não pertencerão a si mesmo, apenas refletirá uma “obediência cega” às ordens difundidas para uma certa “busca da felicidade”.

A respeito desta perspectiva, Chul Han (2015), afirma que a cultura pressupõe um ambiente onde seja possível uma atenção profunda. Essa atenção profunda é cada vez mais deslocada por uma forma de atenção bem distinta, a hiper atenção. Essa atenção dispersa se caracteriza por uma rápida mudança de foco entre diversas atividades, fontes informativas e processos.

A Sociedade do Cansaço, como denomina Han (2015), precisa urgentemente aprender com Nietzsche, a habituar o olho ao descanso, à paciência, ao deixar-aproximar-se-de-si. O problema é que cada vez mais nossa atenção é fragmentada por notificações, aplicativos, redes sociais. Logo, o excesso de estímulos se torna um vício e não só a nossa capacidade de atenção profunda e contemplativa se desfaz, como também nosso cérebro pode desenvolver problemas mentais de memória, agressividade, esgotamento mental, entre outros.

A respeito do excesso de estímulo, a Dra. Danielle H. Admoni, psiquiatra na Escola Paulista de Medicina UNIFESP e especialista pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria) afirma que, “diariamente ficamos expostos a uma quantidade enorme de estímulos, nos motivando a fazer várias tarefas simultaneamente. O problema é que o cérebro não está acostumado a receber tantos estímulos e a processar inúmeras informações de uma vez só. O resultado é o esgotamento mental, e para absorver todos os impulsos, o cérebro acaba tomando para si a energia que deveria ser utilizada para o funcionamento de outros órgãos e músculos, o que justifica o desgaste físico” (Portal da Cidade de Mariana, 2021)

O papel das redes sociais e da comunicação pela via digital também é abordado por Han (2015), com a compreensão de que o mundo digital enfraquece relacionamentos mais profundos, é pobre em alteridade e principalmente promove um narcisismo exagerado.

Sobre essas ferramentas tecnológicas, Carr (2011, p. 209) afirma que “[…] quanto mais as usamos, mais nos moldamos às suas formas e funções”. O autor ainda afirma que toda ferramenta apresenta suas limitações bem como suas possibilidades. Desta forma, “[…] quando usamos uma ferramenta para exercer maior controle sobre o mundo exterior, nós mudamos nosso relacionamento com esse mundo exterior” (Carr, 2011, p. 212).

O que podemos compreender paralelamente com a ação das mídias sociais, pois, enquanto oferecem seus benefícios, também oferecem inúmeros e quase que imperceptíveis malefícios. “Como nossa janela para o mundo, e para nós mesmos, um meio popular molda o que vemos e como vemos – e eventualmente, se o usamos o suficiente, ele muda quem nós somos, como indivíduos e como sociedade” (McLuhan 1993 apud Carr, 2011, p. 03).

O homem contemporâneo, embora detentor de meios tecnológicos que o auxiliam, forja a sua existência através de entretenimentos para não ter que lidar com o seu eu, nem com seus conflitos existenciais e ao invés de ser o agente ativo – aquele que narra a sua história, assumindo suas próprias responsabilidades e visando conhecer e desenvolver a si mesmo – fixa-se em ser um agente passivo – que apenas acumula informações e pouco faz para aprender a exercer as suas reais vontades nas relações com o outro. Assim, perde-se de si e vai tornando a sua existência inautêntica e sem sentido. O ser, ao recorrer à fuga das redes vai construindo uma identidade num campo virtual, buscando uma exaustiva aprovação de terceiros como alternativa para auto-satisfação.

Não é verdade que o homem, propriamente e originalmente, aspira a ser feliz? Não foi o próprio Kant quem reconheceu tal fato, apenas acrescentando que o homem deve desejar ser digno da felicidade? Diria eu que o homem realmente quer, em derradeira instância, não é a felicidade em si mesma, mas, antes, um motivo para ser feliz (Frankl, 1990, p. 11).

Quem busca a felicidade em si, parece desejá-la de modo absoluto e individual, sem estar implicado com a idéia de “razão” para ser feliz. “Essa busca ‘direta’ de uma felicidade incondicional – pode ser entendida como uma motivação possivelmente patogênica” (Frankl, 1988, p. 33) − também deve ser entendida segundo aquilo que Frankl denominou “princípio auto anulativo”.

 O princípio auto anulativo, é aquele segundo o qual quanto mais o sujeito se propõe a perseguir uma ideia acabada e auto-suficiente de “bem” − como a felicidade, o prazer ou o sucesso, por exemplo, em detrimento da realização de sentido − mais esse sujeito se desviará desse intento (Frankl, 1988). Assim, uma tal “busca da felicidade”, de uma auto-realização ensimesmada, acabaria por constituir uma motivação potencialmente neurótica. A medida em que houver uma razão para a felicidade, ela decorrerá espontânea e automaticamente.

Em condições normais, o prazer nunca é a finalidade última da atividade humana, mas, sim – e deve continuar sendo – um efeito, mais especificamente um efeito colateral da consecução de uma meta. Realizar um objetivo constitui uma razão para ser feliz (Frankl, 2011, p. 48).

Não se pode perseguir a felicidade, pois, na medida em que se faz da felicidade um objeto motivacional, ela passa a se constituir em objeto de atenção, perdendo-se de vista a razão para ser feliz, o que, consequentemente, afastaria o sujeito da felicidade. Frankl (1988) entende, portanto, uma excessiva preocupação com a auto-realização como um possível sinal de uma frustração da vontade de sentido, fazendo uso da metáfora do bumerangue, que só volta ao caçador que o atirou, se seu alvo não tiver sido atingido. Da mesma forma, o homem só se volta para si como centro maior de suas preocupações se tiver falhado na busca de sentido.

A auto-realização não constitui a busca última do ser humano. Não é sequer sua intenção primária. A auto-realização, se transformada num fim em si mesmo, contradiz o caráter auto transcendente da existência humana. Assim como a felicidade, a auto-realização aparece como efeito, isto é, o efeito da realização de um sentido. Apenas na medida em que o homem preenche um sentido lá fora, no mundo, é que ele realizará a si mesmo. Se ele decide realizar a si mesmo, ao invés de preencher um sentido, a auto-realização perde imediatamente sua razão de ser (Frankl, 1988, p. 38).

Com o advento das redes sociais houve um aumento da exposição daquilo que antes era privativo e íntimo; com isso, problemas como ansiedade e angústia pela comparação cresceram bastante. Através de ferramentas virtuais como likes e filtros, as pessoas desejam a captura de uma “imagem perfeita” de si para outros, porém o verdadeiro “Eu” é dinâmico e não pode ser paralisado e/ou aperfeiçoado por uma tela. Ao tentar ocultar o “Eu real”, mais profundo, aquele que sente dores, mas também celebra vitórias, ocorre uma consequência devastadora: a retirada da autonomia humana pela própria história e o enfraquecimento do sentido da vida, fortalecendo assim um personagem inautêntico, forjado pelo medo de não viver, validado pelos outros.

[…] Os homens se esforçam por suas palavras, por seu silêncio e pelas obras que realizam, que realizam em produzir uma imagem de si mesmos em conformidade, não ao que eles são, nem mesmo ao que desejam ser, mas ao que desejam que acreditem que eles são (Lavelle, 2012, p. 68).

O olhar excessivo para si, desvirtua o belo da transcendência, pois o verdadeiro sentido da vida está para além de si mesmo. Abre-se assim, o grande abismo para o apaixonar-se pela própria imagem, o narcisismo, em outras palavras: “contemplar-se narcisicamente é um processo compulsivo, um guante interior que agarra e sufoca o eu, paralisando o movimento de ir além de si e transcender o círculo vicioso da auto fruição” (Lavelle, 2012, p. 12). Ao fazer isso, valores, tradições e o próprio amor, que nos impulsiona a intimidade compartilhada, são diluídos, resta assim, um grande eco solitário que ressoa em vazio existencial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o objetivo de discutir a correlação entre os conceitos de Vazio Existencial de Viktor Frankl, de Modernidade Líquida de Zygmund Bauman e o processo de despersonalização, esta pesquisa abordou desde as implicações do contexto cultural da modernidade líquida, o fenômeno das redes sociais, a busca de poder e a busca de prazer, como também a perda de sentido na vida, e como todos esses processos estão de alguma forma, muito próximos, e podem ser descritos como faces do vazio existencial encontradas na modernidade.

Em meio as várias conexões e possibilidades de uma modernidade líquida, há também uma sociedade cansada, conforme afirma o filósofo sul coreano Byung-Chul Han, e repleta de uma falta de sentido para a vida. E assim, através das perspectivas de Viktor Frankl, Zigmund Bauman e Byung-Chul Han, foram apresentados conceitos, pontos e contrapontos a respeito de temas que conversam entre si, vazio existencial e modernidade líquida, numa narrativa onde objetivou-se discutir essa correlação e contribuir na compreensão de como certos fenômenos sociais podem ser faces desse vazio existencial e expressões dessa liquidez.

Esse vazio carece de ser preenchido, porém, muitas vezes a forma como se escolhe a preenchê-lo é ineficaz. Esse tipo de comportamento é majoritariamente visto na sociedade de consumo, onde Bauman discorre sobre os excessos provocados pelo consumismo, onde tenta-se suprir a falta de algo com coisas rasas e superficiais, coisas essas que estão sujeitas ao mecanismo do capitalismo. Outros comportamentos escapistas ou compensatórios foram levantados como forma de fugir do vazio: doping farmacológico e uso excessivo das redes sociais/internet.

Tanto na Modernidade Líquida, quanto na visão de Viktor Frankl a massificação dos modos de viver é uma problemática, pois, ao se impor o mesmo modo de estar no mundo para um contingente, se exclui a liberdade individual de escolha. Quando se escolhe apenas o que há à disposição, sem dar voz à liberdade criativa do ser perante seus gostos e afinidades, tira-se o potencial de existir de forma autêntica que está em cada ser humano. Desse modo, no mundo contemporâneo, umas das formas de se deparar com o vazio existencial é esse mecanismo, que tira a autonomia de escolha e criação de cada indivíduo.

Ainda, pensando na perspectiva de se encontrar um sentido de vida, abordou-se nesse texto a ideia de Frankl quando o mesmo descreve que nessa questão, a massificação anula o decorrer autêntico desse processo, levando o indivíduo ao adoecimento psíquico, constatando-se a partir da ótica de Frankl, que o vazio existencial é um sintoma comum no mundo moderno, não sendo algo a priori patológico, já que há uma falta inerente à vida humana. Entretanto, se o indivíduo não compreende o porquê do vazio e não tenta transformar sua situação, esse sintoma tende a ocasionar patologias.

O ser humano, na Modernidade Líquida, corre a um ritmo de vida que não o proporciona tempo para reflexão nem para olhar para si e compreender o que se passa em seu mundo interno. Para Frankl, uma das formas de superar o vazio é encontrar um sentido na vida, que é único e individual e não algo a ser imposto por terceiros. O sentido da vida é então percebido, quando a partir da consciência se identifica a conduta correta para dada situação e assume a responsabilidade de levá-lo a cabo. Respondendo adequadamente às demandas que a vida traz, neste momento encontra-se o sentido da vida e a realização. 

Além disso, o materialismo usado para dar sentido à vida por algumas pessoas, nada mais é que um disfarce, pois, encontrar um sentido na vida está atrelado à autenticidade, à uma missão ou vocação. Sobre a felicidade Frankl afirma que quanto mais se busca, mais o ser humano se afasta dela, pois é necessário, uma razão para ser feliz, uma causa-de-ser e não colocar como objetivo último de suas ações. Desse modo, ao encontrar um sentido, a felicidade se torna consequência de suas ações; e ao se encontrar um sentido apesar do sofrimento, o que resta ao indivíduo é olhar para sua luta com bravura, pois é compreendido o porquê de seu sofrimento, podendo retirar certa plenitude frente as suas dificuldades.

Ainda acerca da felicidade, Bauman afirma que ela é um valor máximo de desejo para o indivíduo moderno, porém, os meios que se procuram a satisfazê-la são voláteis e superficiais, muitas vezes sujeitos ao consumo. Os modos autênticos de encontrar a felicidade como, o amor, a amizade, as vivências que preenchem verdadeiramente, não podem ser comercializadas.

O processo de desenvolvimento deste trabalho possibilitou momentos de reflexão e compreensões sobre a vida, visto que os temas aqui abordados são comuns e importantes a todos os seres humanos.

Portanto, não presumimos com esta aproximação conceitual, exaurir as discussões necessárias para elaboração de formas de tratamentos terapêuticos específicos, voltados para as faces do vazio existencial presentes na sociedade; contudo objetivamos unir esforços na promoção de reflexões para a necessidade em desenvolver estudos acadêmicos e métodos de intervenções no acompanhamento psicológico clínico e social que contribuam para o fortalecimento da personalidade humana e da saúde mental, em meio a fluidez de uma modernidade líquida.

Compreende-se assim, que para alcançar uma vida autêntica e com sentido, se faz necessário que o ser humano resgate a consciência de responsabilidade, tendo isso como um aspecto fundamental em sua existência, afinal somos aquilo com o que estamos comprometidos e quando estamos no caminho do sentido, a vida nos ajuda; é proposta deste trabalho que as reflexões presentes contribuam para os benefícios de uma psicologia que não se centra na utilidade da pessoa humana, mas em sua dignidade, pois acreditamos que ser um ser humano é trabalhar por algo que está para além de si mesmo.

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1– Psicóloga clínica pelo Centro Universitário Maurício de Nassau (2024), Caruaru – PE.

2– Psicóloga clínica pelo Centro Universitário Maurício de Nassau (2024), Caruaru – PE.

3– Professor do Centro Universitário Maurício de Nassau – Caruaru PE, Mestrando em Psicologia Social – UFLO, Buenos Aires – ARG (2024), Especialista em Análise Existencial e Logoterapia (2021). Graduação em Psicologia pela UNIFAVIP (2012).

4– Doutora em Educação Contemporânea (2022) pela UFPE; Mestre em Saúde Coletiva e Gestão Hospitalar (2015); Especialista em Saúde Pública. Graduação em Serviço Social pela Universidade Católica de Pernambuco (1995). Professora do Centro Universitário Maurício de Nassau, Caruaru.

5– Psicóloga pelo Centro Universitário Unifavip/Wyden (2015-2019). Possui Residência Multiprofissional em Urgência, Emergência e Trauma do Hospital Getúlio Vargas (Universidade de Pernambuco- ICB/FCM – 2020-2022).

6– Psicóloga pela UNIFAVIP (2015), pós-graduada em Avaliação e Reabilitação Neuropsicológica e Neuropsicologia da Educação, pela Faculdade ESUDA (2017). Pós graduação em Psicologia Organizacional e do Trabalho, pela UNIFAVIP (2019). Responsável Técnica da Clínica-Escola do Centro Universitário Maurício de Nassau – Caruaru,

7– Bacharela em Direito pelo Centro Universitário Tabosa de Almeida  ASCES UNITA. Estudante de Psicologia do Centro Universitário Maurício de Nassau.

8– Psicólogo clínico pelo Centro Universitário Maurício de Nassau (2024), Caruaru – PE.

9– Psicólogo clínico pelo Centro Universitário Maurício de Nassau (2024), Caruaru, PE.

10– Psicóloga Clínica pelo Centro Universitário Santo Agostinho (2021), Teresina – PI.