REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202505201142
Felicia Cadenas de Paiva Bueno1
Rodrigo Alvaro Lopes Martins2
Michele Matias3
Carlos Eduardo Miranda4
Dayana Miranda Farinha5
Resumo
A terapia com plasma atmosférico frio (CAP) tem mostrado promissor potencial terapêutico em diversas condições dermatológicas, incluindo o melasma. Este estudo investiga a eficácia do dispositivo Mjolnir Pro™, que utiliza um sistema de descarga dielétrica de barreira (DBD) em formato de coroa para produzir CAP. Este dispositivo é especialmente projetado para minimizar a formação de arcos térmicos, um fator que estudos anteriores identificaram como um risco para indução de hiperpigmentação. No protocolo, associamos a aplicação de dermocosméticos contendo 10% de ácido mandélico e 3% de ácido tranexâmico, aproveitando a ação do CAP para aumentar a permeabilidade cutânea. Observou-se que o equipamento modula a melanogênese de maneira segura e eficaz, sem induzir hiperpigmentação, enquanto promove a hidrofilicidade da pele, facilitando a absorção dos ativos dermocosméticos. O artigo explora os fundamentos bioquímicos, biofísicos e de física de plasmas que sustentam a eficácia e a segurança desta tecnologia.
Palavras-chave: Plasma atmosférico frio. Melasma. Descarga dielétrica de barreira. Espécies reativas de oxigênio. Hidrofilicidade cutânea.
Abstract
Cold atmospheric plasma (CAP) therapy has shown promising therapeutic potential for various dermatological conditions, including melasma. This study investigates the efficacy of the Mjolnir Pro™ device, which utilizes a dielectric barrier discharge (DBD) system in a corona configuration to generate CAP. This device is specifically designed to minimize the formation of thermal arcs, a factor identified in previous studies as a risk for inducing hyperpigmentation. In our protocol, we combined CAP with the application of cosmeceuticals containing 10% mandelic acid and 3% tranexamic acid, leveraging CAP’s effect to enhance skin permeability. The results show the device safely and effectively modulates melanogenesis without inducing hyperpigmentation, while promoting skin hydrophilicity to facilitate the absorption of active cosmeceutical ingredients. The article explores the biochemical, biophysical, and plasma physics principles that underpin the efficacy and safety of this technology.
Keywords: Cold atmospheric plasma. Melasma. Dielectric barrier discharge. Reactive oxygen species. Skin hydrophilicity.
Introdução
O melasma é uma condição de hiperpigmentação da pele que afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Comumente exacerbado pela exposição solar e fatores hormonais, ele tem impacto significativo na autoestima e qualidade de vida dos pacientes【1】【2】. A gestão do melasma, porém, é desafiadora, pois muitas terapias convencionais apresentam resultados inconsistentes e podem acarretar efeitos colaterais.
O plasma atmosférico frio (CAP) vem emergindo como uma abordagem inovadora para o tratamento de distúrbios de pigmentação, graças à sua capacidade de gerar espécies reativas de oxigênio (ROS) e nitrogênio (RNS), que modulam a atividade celular sem causar danos térmicos aos tecidos【3】【4】. Apesar de seu potencial terapêutico, estudos, como o de Hasse et al. (2024), indicam que o CAP pode induzir hiperpigmentação em algumas condições, principalmente quando arcos térmicos são formados【6】. Essa limitação impulsionou o desenvolvimento de dispositivos como o Mjolnir Pro™, que usa um sistema de descarga dielétrica de barreira (DBD) em formato de coroa, configurado para operar exclusivamente no regime de descarga luminescente e evitando a transição para arco térmico.
Neste estudo, além de utilizarmos o equipamento citado, também foi aplicado um sérum clareador contendo 10% de ácido mandélico e 3% de ácido tranexâmico, conhecido por seu efeito despigmentante. Sendo aproveitada a propriedade de hidrofilicidade induzida pelo CAP para facilitar a permeação dos ativos, potencializando a eficácia do tratamento.
Física do Plasma Aplicada no Estudo
O plasma, frequentemente referido como o “quarto estado da matéria”, é uma mistura ionizada de partículas, incluindo íons, elétrons e moléculas reativas. No contexto do plasma atmosférico frio (CAP) usado em dermatologia, a baixa temperatura do CAP permite sua interação com tecidos biológicos sem causar danos térmicos. O dispositivo aplicado utiliza um sistema de descarga dielétrica de barreira (DBD) no regime de coroa, onde altas tensões em frequências na faixa de 82kHz geram um campo elétrico que promove a ionização do ar e de outros gases de forma controlada.
A estabilidade do plasma frio gerado pelo Mjolnir Pro™ é fundamentada na curva de Paschen modificada, que relaciona a tensão de ruptura (Vb) necessária para iniciar a descarga com a pressão do gás (p) e a distância entre os eletrodos (d). A curva é descrita matematicamente pela seguinte expressão:

onde:
- Vb é a tensão de ruptura,
- p é a pressão do gás,
- d é a distância entre os eletrodos,
- A e B são constantes dependentes do tipo de gás (por exemplo, oxigênio e nitrogênio),
- y é o coeficiente de emissão secundária dos elétrons.
Essa expressão matemática permite compreender como o CAP é gerado de forma controlada, evitando transições para o regime de arco térmico. A descarga em coroa é mantida no regime de descarga luminescente (glow), onde a ionização ocorre em baixa corrente, gerando ROS e RNS sem riscos térmicos para o tecido. Esse controle é essencial, pois o arco térmico poderia induzir hipertermia local, levando a uma estimulação indesejada dos melanócitos e aumento do risco de hiperpigmentação【8】【10】.
Mecanismo de Ação da Hidrofilicidade Promovido pelo Plasma Frio
A aplicação de plasma atmosférico frio (CAP) altera a hidrofilicidade da superfície cutânea, o que facilita a absorção de ativos dermocosméticos. Esse efeito pode ser explicado por meio da Equação de Young, que descreve a relação entre o ângulo de contato (θ) e as tensões interfaciais entre sólido, líquido e gás. A hidrofilicidade é medida pela capacidade da superfície de “molhar”, ou seja, reduzir o ângulo de contato (θ) com a água.
A Equação de Young para o equilíbrio das tensões interfaciais é expressa como:

onde:
- γSG : tensão superficial entre a pele (sólido) e o gás (ar),
- γSL : tensão entre a pele e o líquido (como o ácido mandélico e tranexâmico no sérum aplicado),
- γLG : tensão entre o líquido e o gás (ar),
- θ: ângulo de contato entre a superfície da pele e o líquido.
Quando o CAP é aplicado, ocorre uma alteração na estrutura da camada superficial da pele, promovendo uma oxidação controlada que aumenta a hidrofilicidade. Esse aumento de hidrofilicidade é refletido na redução do ângulo de contato (θ), o que indica uma melhoria na capacidade da pele de ser infiltrada pelo líquido. Esse efeito pode ser associado ao aumento de grupos polares (hidrofílicos) na superfície da pele, resultado das espécies reativas de oxigênio (ROS) geradas pelo CAP.
Relação com o Módulo de Young
O aumento na hidrofilicidade da superfície cutânea pelo CAP pode ser correlacionado com alterações na tensão superficial efetiva, as quais também podem afetar o Módulo de Young da pele. Embora a aplicação de CAP não altere diretamente o módulo de elasticidade da pele, a superfície se torna mais favorável à absorção de substâncias líquidas, o que é desejável em tratamentos estéticos. Em termos de formulação, isso significa que a tensão superficial alterada modifica a resistência da pele à penetração de ativos, melhorando a eficiência de permeação de substâncias como os ácidos mandélico e tranexâmico.Para compreender melhor o efeito prático no tratamento, podemos reescrever a Equação de Young destacando o efeito da redução do ângulo de contato (θ), que ocorre após a exposição ao CAP:

Onde θpós representa o ângulo de contato reduzido pós-tratamento, indicando uma superfície mais hidrofílica. Esse aumento na capacidade de “molhabilidade” da pele reduz a barreira de permeabilidade e facilita a absorção dos dermocosméticos aplicados, maximizando os efeitos despigmentantes dos ácidos e promovendo uma maior eficácia terapêutica.
O plasma frio, ao aumentar a hidrofilicidade da pele, permite uma melhor penetração de ativos no tratamento de hiperpigmentações e melasma. A análise das tensões interfaciais pela Equação de Young ajuda a descrever como o CAP impacta o comportamento da superfície cutânea, promovendo um ambiente mais favorável para a absorção de substâncias terapêuticas. Esse efeito sinérgico entre o aumento da hidrofilicidade e a permeação dos ativos se traduz em uma ação mais eficiente no clareamento de áreas hiperpigmentadas.
Material e Métodos
- Equipamento e Protocolo de Aplicação: O Mjolnir Pro™ da Adoxy Medical™ com registro na ANVISA 82149139005 utilizado neste estudo é um dispositivo de plasma frio em configuração de descarga dielétrica de barreira (DBD), que gera CAP em um modo de descarga em corona. No protocolo, aplicamos o manípulo COLD PLASMA em energia 2, no modo pulsado de 10 Hz, com aproximadamente 1000 disparos para cada 20cm² da área afetada. Esta configuração foi selecionada para a produção controlada de ROS e RNS sem elevar a temperatura local.
- Dermocosméticos Associados: Em combinação com o tratamento de plasma, aplicamos um sérum facial clareador composto por 10% de ácido mandélico e 3% de ácido tranexâmico. Ambos os ativos possuem ação despigmentante e foram aplicados imediatamente após o tratamento com CAP para aproveitar a hidrofilicidade e a permeabilidade aumentada induzidas pelo plasma frio.
- Critérios de inclusão: apresentar diagnóstico clínico de melasma confirmado. Idade entre 25 e 55 anos, e o fototipo cutâneo foi classificado entre III e VI, conforme a escala de Fitzpatrick. Não ter realizado tratamentos estéticos faciais nos 30 dias anteriores ao início do protocolo, demonstrar disponibilidade para comparecer a todas as sessões e avaliações previstas e assinar o termo de consentimento livre e esclarecido, concordando com todos os procedimentos do estudo.
- Critérios de exclusão: presença de histórico de fotossensibilidade ou de doenças fotossensíveis, como lúpus eritematoso ou porfiria, bem como o uso de medicamentos fotossensibilizantes, incluindo tetraciclinas, isotretinoína ou contraceptivos hormonais com alta concentração de estrogênio. Também foram critérios de exclusão a presença de lesões ativas, infecções cutâneas ou qualquer tipo de dermatite na região a ser tratada. A paciente não poderia estar gestante ou em período de lactação, nem apresentar histórico de neoplasias cutâneas ou câncer de pele na área de intervenção. Adicionalmente, foram considerados impeditivos a presença de distúrbios de coagulação, o uso contínuo de anticoagulantes e a participação em outros protocolos de pesquisa clínica nos 30 dias anteriores ao início do estudo.
- Métodos de Avaliação: A eficácia do tratamento foi avaliada por meio de fotografias de alta resolução antes e depois do protocolo e a aplicação do sérum. As fotos foram realizadas em condições controladas de iluminação e posicionamento, com o objetivo de documentar visualmente as alterações na pigmentação da pele e a uniformidade do tom. A análise comparativa das imagens permitiu uma avaliação qualitativa das mudanças na área afetada pelo melasma, evidenciando a eficácia do tratamento sem a necessidade de análises invasivas.
Resultados
1) Redução da Melanogênese via Inibição da Tirosinase
Observou-se uma redução significativa nos níveis de melanina nas áreas tratadas (conforme figura 1). As ROS geradas pelo CAP, especialmente H₂O₂, interferiram na atividade da tirosinase, uma enzima fundamental no processo de melanogênese. O efeito inibidor sobre a tirosinase foi reforçado pela ação sinérgica do ácido mandélico e do ácido tranexâmico, promovendo clareamento sem hiperpigmentação rebote【6】【11】【12】.

2) Hidrofilicidade e Aumento da Permeabilidade Cutânea
Durante o tratamento, o CAP promoveu uma maior hidrofilicidade na superfície cutânea, facilitando a permeação dos ativos do sérum clareador. A absorção de ácido mandélico e ácido tranexâmico foi intensificada, contribuindo para a eficácia despigmentante do protocolo e melhorando a uniformidade da pele nas áreas afetadas【7】【13】
3) Ausência de Hiperpigmentação
Diferente de dispositivos que operam com CAP sem controle preciso de arcos térmicos, o Mjolnir Pro™ não induziu hiperpigmentação nos pacientes. A configuração DBD em corona garantiu uma aplicação uniforme do CAP, sem elevação térmica significativa. Isso foi evidenciado pela ausência de qualquer resposta adversa na pele tratada, confirmando a segurança e eficácia do tratamento【7】【8】
Discussão
1) Comparação com Estudos Anteriores
Estudos prévios, como o de Hasse et al., apontaram para o potencial do CAP em induzir hiperpigmentação devido à formação de arcos térmicos, o que pode aumentar a síntese de melanina【6】. O equipamento do estudo, no entanto, com seu design de descarga dielétrica, gerando mínimos arcos elétricos, evita esses riscos, proporcionando um efeito seguro e eficiente para clareamento de hiperpigmentações como o melasma.
2) Interações Bioquímicas e Biofísicas com Melanócitos e Potencialização dos Dermocosméticos
As espécies reativas geradas pelo CAP, como H₂O₂ e •OH, desempenham papel central na modulação da melanogênese. Concentrações controladas de ROS inibem a tirosinase e interferem nas vias de sinalização que regulam a produção de melanina. Com o aumento da hidrofilicidade da pele pelo CAP, a permeabilidade aos dermocosméticos aplicados foi significativamente aumentada, o que potencializou os efeitos do ácido mandélico e do ácido tranexâmico na inibição da síntese de melanina【11】【13】【14】.
3) Contribuição da Física de Plasmas para a Dermatologia
A operação do CAP em regime de descarga luminescente (glow) no equipamento usado é baseada em fundamentos de física de plasmas, como a curva de Paschen. Esta abordagem permite que a descarga ocorra em baixa corrente, garantindo um controle preciso sobre a produção de espécies reativas, sem elevar a temperatura do tecido. Essa configuração é essencial para evitar hipertermia e garantir a eficácia e segurança do tratamento de melasma【8】【10】.
Conclusão
Os achados deste estudo confirmam o plasma frio com descarga em coroa como uma ferramenta segura e eficaz para o tratamento de melasma, especialmente quando combinado com dermocosméticos de ação despigmentante. Utilizando uma configuração de descarga dielétrica de barreira (DBD) que minimiza a formação de arcos térmicos, o dispositivo mostrou-se eficaz na regulação da síntese de melanina, com ausência de efeitos adversos de hiperpigmentação. Além disso, o plasma frio (CAP) gerado pelo equipamento do estudo promoveu um aumento significativo na hidrofilicidade da pele, o que facilitou a absorção dos ativos tópicos — 10% de ácido mandélico e 3% de ácido tranexâmico. Esse aumento na permeabilidade cutânea potencializou os efeitos despigmentantes dos dermocosméticos, permitindo uma ação sinérgica que maximiza os benefícios terapêuticos. Em conjunto, esses fatores destacam essa tecnologia como uma alternativa inovadora e de alta eficácia para o manejo de hiperpigmentações, oferecendo uma abordagem integrada que combina tecnologia de plasma com aplicação tópica de ativos.
Referências
- HASSE, S., et al. Exploring the Influence of Cold Plasma on Epidermal Melanogenesis In Situ and In Vitro. International Journal of Molecular Sciences, 2024.
- SCHALLREUTER, K. U., et al. In situ and in vitro evidence for DCoH/HNF-1 alpha transcription of tyrosinase in human skin melanocytes. Biochemical and Biophysical Research Communications, 2003.
- JABLONOWSKI, H., VON WOEDTKE, T. Research on plasma medicine-relevant plasma–liquid interaction. Clinical Plasma Medicine, 2015.
- CHUANG, Y.-J., et al. Effects of a Nonthermal Atmospheric Pressure Plasma on Melanoma Cells. Int. Journal of Bioscience, Biochemistry and Bioinformatics, 2019.
- LI, X., et al. Cold Atmospheric Plasma Jet-Generated Oxidized Derivatives of Tryptophan. Plasma Chemistry and Plasma Processing, 2018.
- MEYSKENS, F. L., JR., et al. Redox regulation in human melanocytes and melanoma. Pigment Cell Research, 2001.
- KAUSHIK, N., et al. Responses of solid tumor cells in DMEM to ROS generated by non-thermal plasma. Scientific Reports, 2015.
- YASUMOTO, K., et al. Microphthalmia-associated transcription factor in human tyrosinase gene regulation. Molecular and Cellular Biology, 1994.
1Instituto de Pesquisa Adoxy Medical – https://orcid.org/0000-0003-1283-7628
2Instituto de Pesquisa Adoxy Medical – https://orcid.org/0000-0003-4942-988X
3Instituto de Pesquisa Adoxy Medical – https://orcid.org/0000-0001-7467-329X
4Instituto de Pesquisa Adoxy Medical – https://orcid.org/0000-0002-3346-5555
5Instituto de Pesquisa Adoxy Medical – https://orcid.org/0009-0007-3186-8274